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de esgarçamento das relações a um ponto de extrema miséria , a ética é outra . ( … ) Reconheço que O Maior Amor do Mundo não está muito no mainstream do cinema brasileiro . Não está nem na ponta das comédias românticas de grande sucesso nem na outra ponta , dos filmes pessimistas . É o que eu posso fazer . ” Sim , porque Cacá diz que seu filme quis dizer duas coisas simultaneamente : “ Ao mesmo tempo em que estamos dizendo ‘ Olha a situação de miséria assombrosa em que essas pessoas vivem no seu cotidiano ’ , também dizemos : ‘ Olha como existem virtudes e qualidades que você pode encontrar aí ’ . ” Acho estranho Cacá dizer que seu filme não é pessimista . Me pareceu terrivelmente pessimista , triste , sem saída , sem solução . Acho que devo ver o filme mais uma vez . Caro Walter , estas são as músicas da trilha sonora do filme . Espero que ajude : Estrela , com Gilberto Gil ; Águas de Moloch , com Afroreggae ; Memórias , com Pitty ; Vida da gente , com Zeca Pagodinho ; Casa da minha comadre , com Mart’nália ; Funk Dennis DJ , com Dennis DJ ; Não identificado , com Caetano Veloso ; Sempre , com Chico Buarque ; Braço de Mar , com Quito Ribeiro ; Coisa de Negão , com Afroreggae ; Férias , com Leléo ; Confidências , com Itamar Assiere ; Volta , com Orlando Silva ; Bachianas Brasileiras no . 4 . Cantinflas – A Magia da Comédia / Cantinflas De : Sebastian del Amo , México , 2014 Nota : O cinema mexicano homenageou o mais popular de seus atores com uma superprodução cara , luxuosa , com um jeitão hollywoodiano – e que dá uma imensa importância a Hollywood . A cinebiografia Cantinflas , dirigida por Sebastian del Amo , ele também um dos dois autores do roteiro , lançada em 2014 , mostra diversos episódios da vida de Mario Moreno ( 1911-1993 ) , o criador da persona Cantinflas , adorada por gerações e gerações não apenas de mexicanos , mas de todos os países de língua espanhola , desde sua juventude , em 1931 , em Veracruz , até o auge do sucesso e da fama . Mas dedica boa parte de seus 102 minutos aos episódios envolvendo o produtor americano Mike Todd e sua batalha para criar A Volta ao Mundo em 80 Dias , o filme que deu a Cantinflas fama planetária e o Globo de Ouro de melhor ator em musical ou comédia – batendo Marlon Brando , Glenn Ford , Yul Brynner e Danny Kaye . O filme começa com um programa da TV mexicana em que os apresentadores falam sobre os filmes que parecem sérios candidatos aos Oscars na cerimônia a ser realizada em 1957 – os filmes , portanto , lançados em 1956 . São citados Assim Caminha a Humanidade / Giant , O Rei e Eu ,
Os Dez Mandamentos – todos os três seriam , de fato , indicados em várias categorias , inclusive na de melhor filme . E a apresentadora fala que a United Artists , a empresa fundada por Charlie Chaplin , Douglas Fairbanks , Mary Pickford e D.W . Griffith , ainda não tinha seu candidato aos prêmios – as filmagens de seu grande projeto , A Volta ao Mundo em 80 Dias , não haviam sequer começado . E então surge um letreiro informando que estamos em Los Angeles , 1955 . Mike Todd , celebrado produtor da Broadway , milionário , está chegando de Nova York a Hollywood para produzir seu primeiro filme , A Volta ao Mundo em 80 Dias , baseado na obra de Jules Verne . O projeto era ambiciosíssimo : não só as filmagens seriam nos mais diferentes países – Inglaterra , França , Espanha , Tailândia , Índia , China , Japão – , como Todd pretendia usar umas duas dezenas de grandes nomes do cinema mundial em participações especiais , ou cameo roles , como se diz lá . Esses grandes astros e estrelas não receberiam pagamento pela participação – na cabeça de Todd , participar daquele que seria o maior sucesso de toda a história do cinema já era um pagamento mais do que suficiente . Vemos Mike Todd ( interpretado por Michael Imperioli ) visitando o escritório do agente de ninguém menos que Elizabeth Taylor ( interpretada pela uruguaia de nascimento radicada no México desde criança Bárbara Mori , uma moça de beleza espantosa , na foto ) . Todd explica seus planos , e o agente faz a pergunta fundamental : e por que o senhor acha que Elizabeth Taylor , a maior estrela do cinema mundial , aceitaria trabalhar de graça no seu filme ? Não se pode negar que Mike Todd sabia fazer as coisas . Ele improvisa no ato : cachê , a srta . Taylor não receberia – mas ganharia uma limousine de presente , para chegar com ela na estréia mundial do filme . E complementa : – “ Posso mandar forrar o interior de violeta , para combinar com seus olhos ” . Bárbara Mori-Liz Taylor dá um belo sorriso . Ao sair do encontro e entrar no carro que o esperava , Todd comenta com seu secretário particular que achava que Liz Taylor tinha topado – mas eles teriam que arranjar uma limousine . O secretário diz que Todd precisa se lembrar de falar com Mario Moreno – e fica claro que o produtor não tinha , então , a menor idéia de quem era Mario Moreno . Ele diz algo como : mande para ele uma passagem de burro aéreo para ele vir falar comigo . O ator que faz Cantinflas de fato tem uma semelhança incrível com o astro E aí corta , e um letreiro informa que estamos em Veracruz , México , em 1931 . O jovem Mario Moreno está chegando à cidade , à procura de um trabalho ,
um bico – qualquer coisa , . Ele tinha tido alguma experiência como boxeador , mas vê uma placa de precisa-se de ajudante junto de um teatrinho bem mambembe , montado numa pequena tenda como de um circo , e se apresenta ao dono . Veremos então que , por acaso , por pura sorte , por causa de um acontecimento fortuito , Mario Moreno , contratado como faz-tudo da tenda – varredor , faxineiro , expulsador de bêbado inconveniente , tomador de conta da filha do patrão para evitar assédio dos frequentadores – terá uma oportunidade de aparecer no palco . Fala umas coisas , alguns espectadores riem – e começa ali sua carreira de comediante . Entre os espectadores estava um rapaz chamado Estanislao Shilinsky ( Luis Gerardo Méndez , à esquerda na foto ) , ele mesmo um ator em uma tenda – bem maior e melhor do que aquela – na Cidade do México . Namorava uma das duas filhas do proprietário da tenda , e escrevia uns esquetes cômicos que ele e as duas moças apresentavam na tenda . Como viu que aquele sujeito tinha algum talento , Shilinsky o procura , se apresenta , deixa um cartão com ele . Algum tempo depois , Mario Moreno está na Cidade do México , e resolve procurar Shilinsky . Acaba não só contratado como também virando namorado da outra filha do patrão , Valentina Ivanova ( Ilse Salas ) . O roteiro do diretor Sebastian del Amo e Edui Tijerina alterna , ao longo de toda a narrativa , as duas épocas e os dois assuntos diferentes : as andanças de Mike Todd em Los Angeles para conseguir dar início à produção de A Volta ao Mundo em 80 Dias , e a carreira de Mario Moreno ao longos dos anos , até chegar exatamente aos contatos com o produtor americano e as filmagens da grande aventura . Uma das grandes qualidades do filme , uma sorte imensa que os realizadores tiveram , é o ator que interpreta Mario Moreno , Óscar Jaenada . É impressionante a semelhança física que ele tem do Mario Moreno real ( na foto ) – e o ator parece ter visto vários filmes de Cantinflas , e estudado cuidadosamente seu jeito de falar , de vestir , de gesticular . É absolutamente impressionante . O personagem criado por Mario Moreno tem muito do Carlitos de Chaplin Pelo que o filme mostra , foi ainda no teatrinho mambembe em que trabalhava ao lado da namorada Valentina , da irmã dela , Olga ( Gabriela de la Garza ) , e de Estanislao Shilinsky , que Mario Moreno teve a idéia de criar Cantinflas , a persona que o catapultou para a fama . Cantinflas tem muito a ver com o Vagabundo criado por Charlie Chaplin . O filme não mostra isso , mas é bem provável que Mario Moreno tenha visto os filmes de Chaplin e se inspirado um pouco em Carlitos para criar Cantinflas . Cantinflas é um homem do
povo , muito pobre e muito boa pessoa , um tanto enrolado , um tanto enrolador – algo como o Carlitos de Chaplin com uma boa dose de malandragem latina . Como Carlitos depois de passar por um período de intensa imersão na malandragem carioca dos anos 30 e 40 . Tem aquele bigodinho ridículo , cortado ao meio , usa umas roupas velhas , andrajosas , e – o detalhe fundamental , a marca registrada – tem a mania de usar as calças bem abaixo da cintura . Sobretudo , Cantinflas fala muito . Fala depressa , usa muita gíria , e consegue enrolar quem está diante dele com toda aquela interminável torrente de palavras . Ao meu lado , Mary fez uma definição fantástica : o Cantinflas inventado por Mario Moreno foi um dos primeiros artistas da stand up comedy ! É bem isso mesmo . Cantinflas me faz lembrar … Posso estar absolutamente errado ao fazer essa comparação , mas é o que eu acho : Cantinflas me faz lembrar o Jeca criado por Mazzaropi . Foram contemporâneos , Mario Moreno e Amácio Mazzaropi . Criaram tipos , personas , e se identificaram tanto com suas criações que criador e criatura passaram a ser vistos como uma pessoa só . Os dois passaram de apenas atores , comediantes , a diretores , donos de suas produtoras , e tiveram imensa fama , tornaram-se ídolos de gerações . A diferença – a favor de Mario Moreno – é que Mazzaropi falava português , e então sua popularidade ficou restrita apenas ao Brasil , enquanto Cantinflas foi adorado em toda a América Latina e também na Espanha . Nos anos 50 , Mario Moreno ganhava uma vez e meia o salário de Liz Taylor O filme se detém bastante no início da carreira , para em seguida mostrar , em pinceladas um tanto rápidas , a ascensão meteórica de Mario Moreno , primeiro via teatro , e logo em seguida pelo cinema . Pelo que o filme mostra seguidas vezes ( e isso seguramente deve ser verdade ) , Mario Moreno não era de decorar falas , de seguir o que estava escrito no roteiro . O negócio dele era improvisar , em tudo , mas em especial na falação sem fim – e essa é a característica fundamental de Cantinflas , a coisa de falar demais e depressa , com muita gíria e de um jeito enrolado e enrolador . Essa característica explica por que passou muito rapidamente a dirigir a si mesmo – os diretores de seus filmes cuidavam de todo o resto , menos do astro , que fazia o que bem entendia . Sua filmografia como ator tem 51 títulos . Ficou milionário . Nos anos 50 , no auge da carreira , ganhava o equivalente a US$ 1,5 milhão por ano – uma vez e meia o salário de Liz Taylor por Cleópatra ( 1963 ) , então o maior salário pago a uma atriz no mundo . Cantinflas , o filme , mostra
bem como ele foi enriquecendo , e tornando-se uma figura fundamental no cinema mexicano . Mostra também que ele teve participação importante nas organizações ligadas ao cinema e à cultura mexicana como um todo – sindicatos de atores , associações de classe , organismos dos produtores , lobbies junto ao governo . Ao mostrar o desgaste do casamento com Valentina ( na foto , Ilse Salas , que a interpreta ) , à medida em que ele ficava mais rico , mais famoso , mais influente e mais cercado por belas mulheres , como a atriz Miroslava Stern ( Ana Layevska ) , o filme tem momentos de novelão mexicano – e aí , nada melhor que um bom bolero de Agustín Lara ao fundo . Agustín Lara , aliás , aparece no filme , assim como o pintor Diego Rivera e diversos dos grandes atores mexicanos da época , como Pedro Armendáriz e Dolores Del Rio . A Charlie Chaplin , os roteiristas Edui Tijerina e Sebastian del Amo deram uma participação importante na história . É ele que acaba dando ao atarantado Mike Todd uma dica fundamental para convencer Mario Moreno a , afinal de contas , aceitar o convite para trabalhar em A Volta ao Mundo em 80 dias . Só não faz sentido algum o fato de Todd não ter reconhecido que aquele senhor sentado perto dele em um restaurante de Los Angeles era Charlie Chaplin . Ora , pessoa alguma do mundo deixaria de reconhecer Charlie Chaplin , mesmo velhinho . Uma figura , esse Mike Todd , que o filme mostra como um sujeito de vontade férrea , porém um tanto inocente , um tanto bobo . De bobo o cara , na vida real , não tinha nada . Ele conseguiu fazer com que umas duas dezenas de grandes astros internacionais aparecessem em participações especiais em seu filme – que foi um absoluto sucesso de público e crítica , teve oito indicações ao Oscar e levou cinco , inclusive o de melhor filme . Liz Taylor não participou do filme , afinal de contas – mas casou-se com Mike Todd . Ele foi o marido número 3 dos 8 casamentos dela . Casaram-se no dia 2 de fevereiro de 1957 , em Acapulco , no México . O padrinho dele foi Mario Moreno , o Cantinflas . A informação está naqueles letreiros usuais nos filmes baseados em fatos reais , que contam para o espectador o que aconteceu com os personagens depois do que foi mostrado na última cena . ( Na foto , o Mike Todd interpretado por Michael Imperioli . ) Cantinflas foi escolhido pela Academia Mexicana para representar o país na corrida pelo Oscar de melhor filme estrangeiro . Acabaria não sendo indicado , mas foi um tremendo sucesso de público . Tornou-se o quarto filme mexicano mais visto nos Estados Unidos . Em seu próprio país , foi a segunda maior bilheteria de uma produção nacional , e a sexta maior bilheteria incluindo os blockbusters feitos acima do Rio
Grande . E teve ótima bilheteria também na Bolívia , Equador , Colômbia e Chile . Então , em suma , é assim : não é um grande filme , este Cantinflas . Tem defeitinhos : alguns atores são muito ruins , a direção de atores é claramente bem fraca . Há aquele erro comum a produções de TV : todas as roupas dos personagens são novíssimas , acabadas de serem produzidas – porque são mesmo , é claro , mas a produção se esqueceu de cuidar para que algumas delas parecessem já usadas , em especiais as roupas dos pobres . O mesmo vale para todos os ambientes internos mostrados ao longo do filme – é tudo limpíssimo , não há uma poeira em lugar algum , o que dá uma sensação danada de artificialidade . Mas são defeitinhos . Como fala de um artista talentoso , importante , de vida cheia de emoções , e revela muito sobre o cinema e a própria história do México , é um filme que deve ser visto . Não é o tipo de filme que me animo a ver , principalmente pelos detalhes que você falou das roupas todas novas ( a gente percebe até pelas fotos que é tudo limpo , bonito e arrumado demais , uma coisa que eu critico sempre no cinema americano ) , da superprodução pendendo para uma coisa hollywoodiana etc . De todo modo , viva o “ México Lindo Y Querido ” ! Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * VISÃO DO MERCADO Os shopping centers sempre foram vistos como grandes centros de compras , um verdadeiro cenário da vida dos brasileiros . Além disso , os shopping centers têm um grande poder de marketing que muitas vezes passava despercebido de uma análise estratégica . Acontece que poucos refletiam sobre sua importância no processo de marketing , através das relações de trocas , mercado , e também seu papel como varejista . Com a grande concorrência de empresas e organizações , o marketing tem um papel fundamental para melhor orientar os estabelecimentos no seu planejamento e influenciar os consumidores a adquirirem suas marcas e produtos ao invés dos concorrentes . Para isso é necessário criar um valor superior , que é a relação percebida entre o que é pago por um produto ou serviço e aquilo que é recebido , mantendo os clientes atuais e atraindo novos clientes . E quando as pessoas resolvem obter o que necessita e deseja e estão dispostas a dar algo em troca ocorre o marketing . O marketing atua nas áreas referentes às relações de trocas e o conceito de troca está diretamente ligado ao conceito de mercado , onde um possível grupo de compradores com necessidades e desejos estão determinados a realizá-los . Entretanto , é preciso encaminhar de uma maneira eficiente os produtos até os compradores finais através dos canais de distribuição , escolhendo aqueles que possam vender seus produtos nos locais corretos
e no tempo certo . Todos os meses , 329 milhões de pessoas passam pelos 408 shopping centers em operação atualmente no Brasil . O que mais chamou a atenção foi a grande virada dos shoppings , que deixaram de ser simples centros de compras para se tornarem centros de inovação , entretenimento , tecnologia e construção de reputação de marca . O espaço do shopping virou mídia , com enorme potencial de contato a ser explorado e que é pouco conhecido . Nos domingos à noite , as lojas estão fechadas e , mesmo assim , os shoppings permanecem lotados . Nas conversas com os executivos e administradores desses espaços , nos surpreendemos ao ouvir histórias curiosas sobre a relação que os frequentadores passaram a ter com os shoppings , que viraram um local de convivência , como se fosse a praça de uma pequena cidade do interior . Nesse sentido , estudamos 3 dimensões da comercialização de lojas e produtos em um centro de compras : O Mistério da Viúva Negra / Black Widow De : Ralph Rafelson , EUA , 1987 Nota : Anotação em 2007 , com complemento em 2008 : Já vi este filme várias vezes , e cada vez que revejo gosto mais . ( Anotei que o vi em março de 1992 e janeiro de 1993 , mas na primeira anotação já há um R de revisto . ) Foi este filme que me fez me apaixonar pela Debra Winger , essa atriz talentosíssima que deveria ter feito muito mais filmes . Exigente , preciosista , parece que ela recusou vários papéis , e depois simplemente sumiu de cena – não fez nenhum filme entre 1995 , o ano de Esqueça Paris / Forget Paris , e 2001 , quando fez um filme chamado Bad Love ; de lá para cá fez apenas três filmes , em papéis secundários . Debra Winger está absolutamente extraordinária como Alex , uma agente do FBI workaholic , sem vida pessoal , desleixada com sua própria aparência , solitária , obcecada em comprovar que têm conexão casos de milionários mortos – que eles na verdade foram assassinados pela mesma mulher , a viúva negra do título , interpretada pela bela e sensual Theresa Russell . A obsessão vira inveja e ao mesmo tempo quase uma paixão pela assassina , quando as duas se encontram , no Havaí , e acabam disputando o mesmo homem , o milionário que seria a vítima seguinte ( Sami Frey ) . O filme já valeria única e exclusivamente pela interpretação de Debra Winger . Mas ele tem várias outras qualidades . As cenas no Havaí são ótimas , num cenário deslumbrante , belíssimo , e variado ( o filme mostra muito a vegetação exuberante do interior das ilhas , e também a região vulcânica da maior das ilhas , a do Havaí propriamente dito , além das praias maravilhosas ) . E é brilhante ao mostrar a complexidade da relação entre as duas mulheres , cheia de diferentes climas , várias
sensações díspares . E é sensacional a transformação visual de Alex depois que ela se aproxima de Catherine Petersen , a viúva negra ; incentivada pela assassina que ao mesmo tempo persegue , odeia , inveja e deseja , a policial desleixada de antes vira uma mulher linda , chiquérrima , atraente . Outra qualidade é a escolha do tipo de narrativa , que é o anti-Agatha Christie , o anti-quem-foi-que matou , o anti-whodunit . O diretor Ralph Rafelson e o roteirista Ronald Bass optaram pelo estilo que Hitchcock usou muitas vezes , de mostrar tudo para o espectador ; sabemos desde o início do filme que Catherine Petersen é mesmo a assassina . O que mantém o espectador atento , preso à trama , é exatamente a vontade da agente Alex de descobrir a verdade , de conseguir provar a culpa da assassina . É dureza , viu , Renata ? Muitos filmes não são mantidos em catálogo pelas empresas ; a tiragem acaba , e pronto . Deve ser o caso deste “ O Mistério da Viúva Negra ” ; dei uma olhada nos sites de venda , e de fato o filme não aparece . Um abraço . Sérgio A Onda / Die Welle De : Dennis Gansel , Alemanha , 2008 Nota : Anotação em 2009 : A Onda é um filme absolutamente extraordinário , marcante , impressionante . É denso , pesado , seriíssimo . O tema – forte , duro , apresentado com maestria – é nada menos que o seguinte : como é fácil , mesmo em um país rico , desenvolvido , criar as condições para um grupo grande de pessoas aderir a práticas fascistas . E , logo nos créditos iniciais , há o aviso : Baseado em fatos reais . A ação se passa ao longo de uma semana apenas , nos dias de hoje , em um cidade da Alemanha – o filme não explicita qual é , ou seja , pode ser qualquer uma . Temos um professor de ciências sociais ( e também de educação física ) , Rainer Wenger ( Jürgen Vogel , excelente ator ) , sujeito jovem , aí entre os 35 e 40 anos , informal , fã de rock , sempre vestido com camisetas com nomes de bandas , que evidentemente é benquisto pelos seus alunos , na faixa dos 17 anos – uma turma que seria o correspondente aqui ao nosso terceiro ano do ensino médio , o antigo colegial . É uma boa escola , com belíssimas instalações , coisa de Primeiro Mundo mesmo ; a turma é mista em todos os sentidos – há homens e mulheres , garotos bem ricos , outros que já trabalham para se sustentar , gente de veio da antiga Alemanha Oriental , um filho de imigrantes turcos . Haverá uma semana dedicada a um trabalho especial , temático , e Rainer Wenger quer pegar o estudo sobre anarquia , que ele conhece bem . Um professor bem mais velho e mais formal
, careta , no entanto , passa à sua frente , e assume o tema . Sobra para Wenger o tema autocracia . Os alunos podem escolher o tema sobre o qual trabalhar . Alguns prefeririam estudar anarquia , mas acabam indo para a turma da autocracia porque Wenger é um professor melhor do que o outro , mais aberto , mais acessível . No primeiro dia , a segunda-feira , há diferentes reações quando Wenger apresenta para a classe a definição do que é autocracia . ( Vamos lá : governo exercido por um único grupo , com poderes ilimitados e absolutos . ) Alguns reclamam que aquele trabalho será a repetição de outros já feitos anteriormente sobre o nazismo , e eles já estão cansados de saber dos males do nazismo . Um deles faz a afirmação : não existem hoje condições para haver de novo uma ditadura na Alemanha . Wenger acha aí um mote para o curso que vai dar . Passa a adotar um estilo autocrático dentro da sala de aula , para surpresa dos alunos , acostumados a tê-lo como o professor jovem , próximo , a quem todos chamam pelo primeiro nome . Exige ser chamado , durante aquele curso , naquela semana , de sr . Wenger , e não de Rainer . Exige que o aluno que desejar falar peça licença e fique de pé na hora de falar . E passa a incitar a turma a se sentir e agir como um grupo unido , coeso . Logo depois virão outros sinais . Pede que a turma escolha um nome para o grupo – vence o nome A Onda . Pede que todos passem a usar um uniforme , para tornar mais fácil a identificação , a identidade do grupo – jeans , camisa branca . Um aluno cria um logo para o grupo . Outro inventa uma saudação com as mãos , imitando uma onda . Uniforme . Símbolo visual , logotipo . Saudação com as mãos . Na quarta-feira as coisas já estarão totalmente fora do controle de Wenger . Diálogos sensacionais Os diálogos todos – dos alunos fora da classe , entre eles , com os pais , em suas casas , mas sobretudo , os diálogos na sala de aula – são bem feitíssimos , sensacionais . Coisa escrita por gente madura , muito inteligente , muito bem preparada . As coisas não são apresentadas de maneira simples , de um lado o preto , de outro lado o branco ; muito ao contrário , é tudo matizado , tudo multifacetado . Em alguns momentos , o filme lembra , e muito , o extraordinário e também recente Entre os Muros da Escola – a recriação do clima da sala de aula , os diferentes tipos dos alunos , tudo é uma riqueza fascinante , como no filme do francês Laurent Cantet . Mas , enquanto o filme francês se concentra mais na questão da disciplina dentro da sala de aula , numa sociedade complexa ,
com alunos de diversas classes sociais , diversas origens culturais , este aqui vai fundo na questão política mesmo , a atitude de cada um resultando num comportamento político do grupo que vai chegando cada vez mais perto do fascimo . Paralelamente , o filme vai nos mostrando as personalidades de alguns dos alunos da turma , de uns seis ou oito . E faz isso com grande maestria . Karo ( Jennifer Ulrich ) , aluna séria , estudiosa , compenetrada , de família bem de vida e na vida , é um tanto dominadora na relação com o namorado Marco ( Max Riemelt ) , solitário , sem família . Mona ( Amelie Kiefer ) tem opiniões fortes demais para admitir aquela lição prática de autocracia dentro da sala de aula , e casca fora . Lisa ( Cristina Do Rego ) , um tanto insegura , ela também solitária , vai aproveitar os crescentes desentendimentos entre Karo e Marco para se aproximar do rapaz . Tim ( Frederick Lau ) , solitário , perdido , sem ligação com nada , vai se aferrar à Onda como a melhor coisa que já havia surgido em sua vida . ( Na foto abaixo , Karo e Lisa . ) E , à medida que os acontecimentos vão se precipitando , criando uma dinâmica própria , até mesmo a ótima relação do professor Wenger com sua mulher grávida , Anke ( Christiane Paul ) , ela também professora da mesma escola , vai ser abalada . Com brilho , o roteirista Peter Thorwarth e o diretor Dennis Gansel vão traçando e trançando as histórias pessoais de alunos e professores com a história do grupo A Onda . O microcosmo , um espelho da sociedade como um todo . Questões importantes sobre as quais devemos pensar É de tirar o fôlego , de assustar , de levantar questões , de pôr o espectador para pensar sobre todo aquele turbilhão de informações importantes sobre um tema da maior relevância . Todo o elenco está sensacional – os garotos são fantasticamente bem dirigidos , e esse Jürgen Vogel dá um show . O diretor Dennis Gansel demonstra segurança , maturidade . Sua narrativa é fluente , sem frescuras ou invencionices . Há momentos em que o ritmo do filme se acelera , e a música , como os rocks que o professor Wenger ouve , fica muito alta – mas faz sentido , dentro da história que ele está contando , e não há exageros . A câmara dele – e isso foi Mary que reparou , antes mesmo que eu reparasse – demonstra uma predileção por ficar , em diversos momentos , abaixo do nível dos olhos das pessoas , colocada bem perto do chão , em plongée – mas nem esse pequeno tique nervoso chega a incomodar . A coisa do “ baseado em uma história real ” impressiona . Fiquei curiosíssimo , ao longo do filme , para saber se a história se basearia em livro escrito por aquele professor
alemão . Não , não é nada disso . Uma história bem parecida com a do filme aconteceu na realidade , mas foi em Palo Alto , na Califórnia , na segunda metade dos anos 60 . Um professor de História numa high-school daquela cidade americana , frustrado ao perceber que seus alunos não tinham o menor interesse em acompanhar suas aulas sobre a ascensão de Adolf Hitler ao poder na Alemanha , decidiu fazer uma dramática experiência : fez os alunos criarem um novo movimento radical chamado A Onda , que daria a eles “ uma sensação de que eles passariam a fazer parte de algo que é mais importante do que cada um ” . Rapidamente , a experiência saiu de seu controle e A Onda atingiu praticamente toda a escola . A experiência foi retratada numa reportagem de revista e depois em um livro de autoria de Todd Strasser . Em 1981 , a rede ABC fez um longa-metragem a partir do livro , chamado A Onda / The Wave , dirigido por Alex Grasshoff , com atores que eu não conheço ( o professor é interpretado por Bruce Davison ) . Em geral , são os americanos que refilmam obras feitas em outros países . Neste caso aqui , temos uma refilmagem de uma obra americana feita na Alemanha . O fato de o filme ser feito na Alemanha , e a ação se passar na Alemanha , a terra onde surgiu o nazismo , dá ainda mais força ao tema – que já era , por si só , fascinante , impressionante , impactante . É um brilho de filme . Toda pessoa que tenha interesse por política e por educação – e por bom cinema – deveria vê-lo . Vi hoje . Excelente em todos os aspectos . Mas mete medo , assusta mesmo . Tão fácil virar tudo ao contrário , não é ? O meu desgraço país é uma democracia jovem e parece que há ventos de mudança no sentido de regressar à ditadura . Quando a crise é grande há sempre essa tentação . Acabei de assistir.Com tôda certeza um filme excelente . É isso , um excelente filme . Um dos melhores filmes que vi nos últimos 30 dias . Tenho muito medo desses movimentos . Tenho muito medo dessas experiências . O mal se propaga de maneira muito rápida . Já não eram mais alunos e , sim , “ soldados ” . E fica muito pior quando existem os “ Tins ” . Isso não nos traz bôas lembranças , não é ? Algumas músicas que tocam no filme não me agradam por que me lembram drogas,violencia . De certa forma me lembrou outro filme alemão chamado ” A experiência “ . Essa experiências quando fogem ao contrôle é trágico . Aquele certo aluno viu que é perfeitamente possível haver uma nova ditadura na Alemanha . Como disse o professor , era exatamente o que estava acontecendo ali . Como bem diz o José Luiz , em alguns
momentos assusta de verdade . Um abraço , Sergio ! ! ” Não há como explicar racionalmente lembranças , e os dois filmes têm pouco em comum , a não ser o fato de que ambos tratam , cada um à sua maneira , de escolhas afetivas . ” Dizes isto no início do teu texto de hoje sôbre o filme “ Je L’aimais ” . Com isso deixas bem explicito o que eu quis dizer ontém , quando falei que este filme de certa forma me lembra ” A Experiência “ . São dois filmes diferentes mas que tratam de um mesmo tema . Aqui , no caso , cada um trata , à sua maneira , de “ uma experiência perigosa . ” Obrigado . [ … ] Ulrich , também berlinense , também de 1984 . Sua filmografia tem 44 títulos , inclusive o excelente A Onda / Die Welle ( 2008 ) e o muito provavelmente bobo As Donas da Noite ( 2010 ) , sobre um trio de jovens vampiras que [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * El Dorado / El Dorado De : Howard Hawks , EUA , 1967 Nota : Anotação em 2005 , com complemento em 2008 : Rever mais uma vez El Dorado me deixou surpreso . Eu de fato não me lembrava de como esse filme é bom – tão bom quanto , ou talvez melhor ainda , se é que isso possível , que Onde Começa o Inferno / Rio Bravo , de 1959 , o primeiro dessa trilogia em que o veterano e eclético Howard Hawks conta a mesma história . Me impressionou como é bem contada a história , como é tudo contextualizado , como os conflitos se explicam , e não são gratuitos , fúteis . Como é bem feita a construção dos personagens , embora eles sejam basicamente os mesmos que nos dois outros filmes – o fortão meio solitário mas solidário ( John Wayne nos três ) , o bêbado ( Mitchum aqui , Dean Martin no anterior ) e o garoto ( James Caan aqui , Rick Nelson no anterior ) . E , sobretudo , como são inteligentes , sagazes , espertos , engraçados os diálogos . Um grande bangue-bangue . Leonard Maltin deu 3 estrelas ( em 4 ) : “ Continuação de Rio Bravo mostra pistoleiro já envelhecendo Wayne ajudando amigo xerife Mitchum a enfrentar uma guerra contra um bando . Um Hawks tipicamente suave , que mistura comédia e ação , com saboroso roteiro de Leigh Brackett e interpretações exemplares , especialmente de Mitchum , de Caan como o jovem jogador que não consegue atirar , e George como o ultra-tranquilo pistoleiro de aluguel . ” Pauline Kael desce a lenha sem piedade . “ John Wayne e Robert Mitchum fazem paródia deles mesmos , e parecem exaustos . Quando o filme começa , você tem a sensação de estar vendo um
episódio de uma série de TV que começou faz tempo ” , diz ela – e é só o começo . Deus Sabe Quanto Amei / Some Came Running De : Vincente Minnelli , EUA , 1958 Nota : Anotação em 2008 : Muito estranho rever este filme uns 40 anos depois da primeira vez . É um filme que tem sua importância ; tem a marca do talento de Vincente Minnelli , um visual extremamente bem cuidado , e uma seqüência final muito impressionante . É a mais pura expressão de sua época , dos costumes e modos do final dos anos 50 , e do melodrama do cinemão americano do seu tempo . Tem boas atuações no elenco cheio de nomes importantes na época . Frank Sinatra está bem , de novo no papel de um soldado , cinco anos depois de A Um Passo da Eternidade / From Here to Eternity , também baseado em livro do mesmo autor , James Jones . Dean Martin , saído havia pouco da dupla com Jerry Lewis , no primeiro dos muitos filmes que faria com o amigo Sinatra , no início do Rat Pack , como ficaria conhecida a turma do cantor-astro , está ótimo , bem à vontade num papel que parece ter sido feito para ele , um bêbado , jogador , gozador . E Shirley MacLaine , bem , a jovem Shirley MacLaine , apenas três anos depois de sua estréia na deliciosa comédia hitchcockiana O Terceiro Tiro / The Trouble With Harry , simplesmente rouba a cena , o filme . Não é a toa que , 40 anos depois , eu me lembrava bem do personagem dela . Mas porém todavia contudo , o filme tem falhas feias , pesadas , fortes , embaraçosas . Parece que o livro de James Jones é uma trolha gigantesca , um Guerra e Paz , e os roteiristas foram obrigados a resumir passagens . O que acontece então é que há várias ocasiões em que os personagens surpreendem pela rapidez com que tomam decisões inesperadas – um único dia após conhecer Gwen ( Martha Hyer ) , Dave Hirsh ( Frank Sinatra ) está profundamente apaixonado por ela , quer casar . Horas depois de flagrar o pai em atitude indecente , a jovem , pura e delicada Dawn ( Betty Lou Keim ) resolve sair se embebedando com o primeiro caixeiro-viajante que encontra pelo caminho – para citar apenas dois exemplos . O personagem do cara de Chicago , Raymond ( Steve Peck ) , é simplesmente incompreensível , absurdo , inverossímil – e , cacilda , numa produção tão cara e bem cuidada , não poderiam ter achado um coadjuvante melhor ? Esse tal de Steve Peck é pior do que qualquer ator de quinta categoria da pior novela do SBT . Bem , mas acho que botei um pouco o carro na frente dos bois . Vamos a um pouquinho da narrativa . O filme começa com a câmara – um belíssimo CinemaScope ,
nos anos iniciais do formato de tela grande – colocada dentro de um ônibus interestadual ; vemos um soldado dormindo esculachadão numa poltrona ; o ônibus tem muitas cadeiras vazias . Pelas janelas , vamos vendo diversas paisagens , até que chegamos , ao fim da apresentação , os créditos iniciais , a uma pequena cidade do interior . O motorista acorda o soldado : “ Ô soldado , estamos em Parkman . Me disseram para acordar você em Parkman ” . O soldado – Dave Hirsh , saberemos logo em seguida , o papel de Frank Sinatra – acorda inteiramente desentendido , mas tentando não parecer desentendido . “ Quem disse isso ? ” , pergunta ao motorista . E o outro responde : “ Os amigos que puseram você no ônibus em Chicago . ” Dave Hirsh desce do ônibus com sua mochila de soldado e uma mala em Parkman , Indiana – uma pequena cidade do interiorzão bravo , interiorzão profundo , algo como Bom Jesus da Lapa , BA , ou Ipameri , GO . Neste momento , vemos pela primeira vez uma moça sentada numa outra poltrona do ônibus , que acorda naquela instante e desce do ônibus . É Ginna ( Shirley MacLaine ) , um tipo que faz lembrar , e muito , a Cabíria de Giulietta Masina , que Fellini havia criado um ano antes em Noites de Cabíria / Le Notti di Cabiria . Um vestido barato , horroroso ; uma bolsa em forma de cachorrinho de pelúcia ; muita maquiagem , maquiagem pesada ; cabelo preto visivelmente tingido de ruivo . Ginna saúda Dave com uma suave reclamação , tipo , pô , Dave , você convida uma garota para viajar com você e já vai logo abandonando ela ? Dave não tinha a mínima idéia de que tinha convidado alguém para vir com ele , assim como não tinha a mínima idéia de que viria para Parkman , Indiana . Tinha dito às pessoas com quem enchera a cara em Chicago que essa era a sua cidade natal , e os camaradas o enfiaram no ônibus . Ele pede desculpas a Ginna , diz que foi um grande engano , me desculpa , toma aqui um dinheiro , tem ônibus de volta daqui a pouco . Deixa a moça no meio da rua e segue para um hotel , onde pede o melhor quarto e duas garrafas de uísque – qualquer um . Da bagagem , tira uma garrafa quase vazia , um monte de roupa suja , um livro de Steinbeck , um livro de Faulkner , vários outros livros , e um manuscrito amarfanhado . Estamos com menos de dez minutos de um filme de quase duas horas e vinte minutos . Sim , a clássica história do filho pródigo que volta à sua cidade natal . Já houve várias com esse tema básico . Doce Pássaro da Juventude / Sweet Bird of Youth , baseado em Tennessee Williams e dirigido por Richard Brooks , quatro anos
depois deste filme aqui , para lembrar apenas de um . Mas são dezenas , talvez até centenas . Com dez minutos de filme , já temos então que Dave Hirsh bebe demais , e é escritor . Em seguida veremos que seu irmão Frank ( Arthur Kennedy , muito bom , na medida certa ) é um dos homens mais ricos da cidade ; tem uma joalheria e é um dos diretores de um dos dois bancos . Os dois não se viam havia 16 anos . Quando a mãe deles morreu , Frank , o mais velho , botou Dave num internato , de onde ele saiu assim que pôde para só voltar agora , a época em que se passa a ação . Agnes , a mulher de Frank , tem ódio eterno pelo cunhado Dave , por ter se identificado com a personagem do primeiro dos dois romances que ele havia publicado – nele , Dave descreve a mulher do homem rico como uma bruaca mesquinha , imbecil . O casamento de Frank com Agnes é uma coisa horrorosa , um suplício para os dois e para a filha adolescente Dawn – vivem em uma mansão gigantesca como se ela fosse uma jaula para animais perigosas . Temos então que Minnelli conta a história como se estivesse dando um gigantesco zoom para trás : a partir da história de Dave , e depois de seu irmão Frank , o filme como que puxa a câmara para trás e mostra o quadro mais amplo , as pessoas , a sociedade daquela pequena cidade , onde tudo é pequeno , mesquinho , ganancioso , falso , reprimido , hipócrita , babaca . A essa sociedade careta , conservadora , castradora , que vive de aparências , se contrapõe um mundo meio marginal , à parte , simbolizado por Bama , o jogador e beberrão interpretado por Dean Martin , que fica conhecendo Dave no dia em que ele chega a Parkman . Bama vive rodeado de mulheres , bêbados e jogadores . A ele se junta nossa Ginna , a triste putinha que seguiu Dave e resolveu não voltar para Chicago . Atrás dela , veio de Chicago o tal Larry , descrito como gângster , mas que parece um cachorro grande que ladra muito mas não morde . Larry está enfurecidamente ( e incompreensivelmente ) apaixonado por Ginna , que se apaixona a cada dia mais por Dave . Ainda no primeiro dia da chegada de Dave à sua pobre , mesquinha cidade natal , ele conhecerá Gwen ( Martha Hyer ) , a doce , suave , bela , inteligente professora de redação que admira os livros de seu conterrâneo filho pródigo . Coup de foudre , paixão à primeira vista . Um bom triângulo amoroso : escritor bêbado em crise que não consegue escrever mais , uma doce , suave , bela , inteligente professora de redação , e uma puta . Ou , para citar o título de um filme da época , Entre
Deus e o Pecado . Mestre do musical , Vincente Minnelli faz um drama sem canções de quase duas horas e meia com pouquíssimos close-ups . Seus planos são gerais , ou , na maioria , de conjunto – aquele que consegue captar um grupo de pessoas , vistas inteiras , dos pés às cabeças . Aqui e ali , surge um plano americano , aquele em que vemos meio corpo das pessoas , da cintura para cima , mas a predominância é dos planos de conjunto . Não é à toa . O diretor queria fazer o melhor uso possível da nova tela comprida , grande , o CinemaScope , a arma recente do cinema para enfrentar a competição com a TV ; e o que ele está fazendo , mais que contar a história de Dave , sua família , seu triângulo amoroso , é uma descrição ampla de um tipo de sociedade , a cidadezinha pequena como um microcosmo da América que se enriquece e se brutaliza após a Grande Depressão e a Segunda Guerra . E são planos longos . Não demoradamente longos , como os planos-seqüência de Hitchcock , ou , mais exagerados ainda , os de Brian De Palma . Mas são planos longos , adequados aos diálogos , em que as duas partes aparecem juntas , sem necessidade de cortes , de plano e contraplano . A câmara é calma , suave , tranqüila ; não há travellings rápidos , zooms frenéticos . Tudo isso muda inteiramente na longa seqüência final , toda em exteriores , Parkman à noite , transformada numa gigantesca feira , num imenso parque de diversões na comemoração do centenário de fundação da cidade . A música de Elmer Bernstein também muda , fica mais nervosa . Os planos agora são rápidos , feéricos , com cores superexpostas – vermelho fortíssimo , azul fortíssimo , todas as cores do arco-íris e muitas outras juntas e fortes e aceleradas no fechamento do drama . É uma seqüência belíssima , impressionante . Então , temos aquelas adversativas todas que eu coloquei lá em cima , falhas , fraquezas brutais . Mas porém todavia contudo este é um filme forte , importante , poderoso . Ainda hoje , cinco décadas depois . *** Antes de rever o filme , anotei o que eu me lembrava dele : Sinatra faz um soldado que volta para sua cidade . Bebe muito ; é um romancista frustrado . Shirley MacLaine faz uma puta que se apaixona por ele , mas não entende o que acontece com ele , suas angústias ; não entende o que ele escreve , não entende o que quer dizer . Ele tinha uma antiga namorada na cidade , o papel de Martha Hyer , uma mulher rica . Errei na coisa da Martha Hyer : Gwen não era antiga namorada . Mas o resto está lá . Um filme que deixa essa impressão forte na memória por 40 anos não é de se desprezar . Flores do Amanhã / Xiang
ri kui De : Zhang Yang , China , 2005 Nota : Anotação em 2010 : Belo , sensível filme , feito com extrema competência em todos os quesitos . Um drama sério sobre paternidade , educação , dificuldade de comunicação entre as gerações , tendo como pano de pano as mudanças no Planeta China ao longo das últimas cinco décadas . O narrador é o filho – Xiang Yang nasceu em 1967 , conforme nos informa a voz dele em off , na abertura . A câmara do diretor Zhang Yang mostra em close a dor do parto da mãe , Xiu Qing ( interpretada pela grande , bela estrela Joan Chen ) . Xiu Qing dá à luz em parto normal , dentro de casa . Mais de duas horas de bom cinema depois ( a versão do filme em DVD tem 133 minutos ) , veremos outro parto , no ano 2000 , e portanto em hospital , com os cuidados da medicina moderna , tudo sendo filmado em câmara de mão pelo pai , como hoje em dia acontece . A narrativa do diretor Zhang Yang é daquelas que gostam voltar ao princípio , fechar o círculo , encerrar o ciclo . Coisa de gente grande , de quem sabe fazer . Mas voltemos ao início . Na abertura do filme , a voz em off de um Xiang Yang adulto nos conta então que ele nasceu em 1967 . E que , quando era ainda bebê , engatinhando , os pais puseram diante dele diversos objetos , para ver qual o garotinho pegaria primeiro . E o bebê pega um pincel , para imensa satisfação do pai , Gengnian Zhang ( Haiying Sun , excelente ator ) , ele próprio um pintor . Num pequeno canteiro diante de sua casa , Zhang , o pai , havia plantado girassóis , nos conta a voz em off do filho adulto , enquanto a câmara mostra belos girassóis . Não tenho a menor idéia do que significa o título original do filme , que , passando para o alfabeto ocidental , vira Xiang ri kui , mas deve ter a ver com girassóis . O título em inglês do filme é Sunflower , girassol – e os girassóis permeiam a história da família . Não dá muito para entender por que os distribuidores brasileiros acrescentaram o “ amanhã ” ao título , Flores do Amanhã , mas títulos brasileiros um tanto sem lógica são velha tradição . Um intróito em 1967 , depois um longo segmento em 1976 Depois do rápido intróito , com o nascimento do garoto , em 1967 , há um fade out , e temos um grande letreiro anunciando que estamos em 1976 . O garoto Xiang Yang está agora com nove anos de idade , e é um moleque travesso : sobe no telhado das casas , e usa , com o maior amigo , o bodoque – epa , bodoque é o termo mineiro ; perdão , o estilingue , para
atingir as meninas do bairro . Atinge também um adulto que chega ali , bem na testa – danada de boa pontaria tem o moleque Xiang Yang , não erra uma . O adulto que está chegando e acaba de ser atingido na testa é Zhang , o pai do garoto travesso . Zhang está naquele exato momento voltando de um campo de trabalho , onde ficou internado durante seis anos . Depois , novo segmento em 1987 , outro em 1999 O segmento do filme passado em 1976 é longo . Mostra a situação dura , duríssima , de um pai que esteve ausente praticamente durante toda a vida do filho , e tem que reassumir a chefia da casa , da educação do moleque . Xiang Yang não reconhece Zhang como seu pai ; uma criança de nove anos dificilmente tem lembranças da época em que tinha três , e portanto o garoto a rigor não sabia o que era um pai , que seu pai era aquela pessoa que de repente entra em sua casa , faz sua mãe gemer na cama e dá um monte de ordens a ele . Zhang é um pai severo , rigoroso , até demais – e já parte de um gap , um buraco , uma lacuna gigantesca . O pai cai de pára-quedas na vida do garoto , exigindo dele uma disciplina férrea que ele jamais havia conhecido . É um belo drama familiar , esse que a trama do filme desenha . Haverá , depois , um pulo para o ano de 1987 , Xiang Yang portanto com 20 anos , e depois outro salto para 1999 , o filho então com 32 , e um epílogo em 2000 . Um belo retrato de décadas de difícil relação pai e filho Haveria enciclopédias para se falar a respeito deste filme . Já seria uma obra fascinante apenas e tão somente pelo retrato que faz da relação de várias décadas entre pais e filho . O fato de que tudo se passa no Planeta China , feito por habitantes daquele estranho , obscuro , misterioso lugar , torna tudo mais absolutamente fascinante . “ Seus filhos não são seus filhos , são filhos da vida ” , escreveu , num momento de especial genialidade , Gibran Khalil Gibran . A grande questão é que mais de 90% dos pais não percebem isso . Ter filhos é uma loucura absoluta . “ Os bebês , na maioria , são coincidências ” , diz um texto brilhante em Uma Prova de Amor / My Sister’s Keeper , de Nick Cassavetes . “ Duas pessoas transam , ou coisa assim , e pronto . Coincidência . Claro , a gente ouve essas histórias sobre como todos planejam suas famílias perfeitas , mas a verdade é que a maioria dos bebês é produto de noites de bebedeira e falta de controle da natalidade . São acidentes . Só as pessoas que têm problemas para fazer bebês é que de fato planejam tê-los .
” Se ter filhos já é uma total loucura , saber como criar os filhos , como educá-los , é uma loucura mais arrematada ainda . Os putos não vêm com bula , com manual de instruções – e mesmo que os pais sejam esforçadíssimos , seriíssimos ( embora só as pessoas que têm problema para fazer bebês é que de fato planejam tê-los , e portanto , são a princípio esforçadíssimos , seriíssimos ) , tudo que eles fizerem pode resultar num bobo , ou num deliqüente , em maior ou menor grau . Os pais de Xiang Yang amam o filho – mas não sabem como criá-lo Zhang e Xiu Qing , os pais de Xiang Yang , se amam , e amam o filho único . Viúva de marido vivo , levado para campo de trabalho , Xiu Qing foi permissiva com o garotinho , que virou um moleque travesso demais , sem medida . Ao voltar para casa depois de seis anos ausente , caindo de pára-quedas na vida do garoto de nove anos , Zhang vai para o extremo oposto , a rigidez absoluta , marcial . Não dá certo . Muita gente da minha geração – a de nós que nascemos entre a bomba de Hiroshima e o surgimento do rock’n’ll , os dez anos entre 1945 e 1955 , a geração que achava que não só podia mas que de fato iria mudar o mundo – babou com o diálogo entre pai e filho que Cat Stevens compôs quando tinha 22 anos . O artista malucamente precoce fazia as duas vozes , a do pai , grave , séria , e a do filho , aguda , lancinante . O pai propunha calma , reflexão , antes que o filho se decidisse por qualquer coisa ; o filho reagia agressivo , dizendo que o pai não sabia nada sobre o que ele , filho , pensava e vivia : “ Desde o momento em que aprendi a falar me deram ordem para ouvir ” . ( Credo : que verso absolutamente fantástico – “ From the moment I could talk I was ordered to listen ” . O cara tinha 22 anos , e tem gente na face da Terra que acha que Cat Stevens é de segunda categoria . ) Muitos pais , em 1970 , o ano da canção “ Father and Son ” , eram tão absolutamente rígidos , donos da verdade absoluta , e pouco afeitos a qualquer tipo de diálogo , que , quando mostrei a tradução da letra para uma amiga mais jovem , ela fez um comentário que jamais esqueci : “ Pô , se meu pai conversasse comigo desse jeito , eu não teria o que reclamar dele ” . Os pais pecam por ausência , por permissividade ou por rigidez absoluta Em 1987 , diante do filho de 20 anos , Zhang era tão autoritário quanto o pai da minha então jovem amiga de 1970 . Só a palavra dele importava , só a
vontade dele deveria ser atendida . A imensa maioria dos pais , acho eu , peca pela ausência , que é o pecado maior . Mais recentemente , depois de toda a revolução dos costumes a partir dos anos 60 e 70 no Ocidente , os que não pecam pela ausência passaram a pecar pela permissividade total . O Planeta China . Ainda haveria muito o que dizer sobre as relações familiares mostradas neste belo filme . Mas é importante , é fundamental lembrar que a história se passa no Planeta China – essa coisa tão distante e misteriosa quanto Plutão , ou a sétima lua de um astro que gire em torno de alguma estrela da Ursa Maior . Flores do Amanhã foi exibido no Ocidente . Teve versão em que os créditos aparecem tanto nos anagramas chineses quanto em inglês . Está aí disponível nas locadoras , e provavelmente também na internet para ser baixado . O eventual espectador ocidental do filme talvez não se lembre , mas em 1966 – um ano antes do nascimento de Xiang Yang – iniciou-se no Planeta China a Revolução Cultural . A Revolução Cultural , que durou de 1966 a 1976 , exatamente o ano do segundo período focalizado no filme , foi , a muito grosso modo , algo assim como o AI-5 da ditadura militar brasileira instaurada em 1964 , o golpe dentro do golpe , a revolução dentro da revolução , a radicalização do radicalismo . Algo mais ou menos assim : apesar de estarmos no poder há 20 anos , ainda restam entre nós alguns que não aderiram aos nossos ideais ; são burgueses incorrigíveis , filocapitalistas , esdrúxulos , exógenos : cacemo-los , ó povo orgulhoso ! – e lá foram as hordas de jovens da Guarda Vermelha caçar não-comunistas até embaixo do tapete . Como aliás havia sido feito nos Estados Unidos dos anos 50 , na louca caçada aos comunistas ou filocomunistas ou whatever , comandada por Joseph McCarthy . A caça ao “ inimigo ” – mesmo que ele não exista , mesmo que seja preciso inventá-lo . Velhíssima tática dos regimes de exceção , e até mesmo de períodos sombrios das democracias , como demonstra o macartismo , ou ainda o governo Bush filho , ou a Venezuela sob o tacão do bufão Chávez . Um filme da China de hoje que mostra barbaridades do regime Zhang volta à sua casa em 1976 – o ano em que se encerrou a Revolução Cultural , o ano da morte de Mao Tsé-Tung – após seis anos no que é referido no filme como “ campo de trabalho ” . No campo de trabalho , Zhang apanhou muito ; torturaram-no batendo nas suas mãos , as mãos de pintor , embora ele pedisse para que batessem em qualquer outro lugar , menos nas mãos . ( No Estádio Nacional de Santiago do Chile , os sádicos loucos então a mando de Pinochet , muito parecidos com os sádicos loucos de qualquer regime de exceção
, diga-se ele “ de esquerda ” ou “ de direita ” , cortaram as mãos de Victor Jara , antes de darem o tiro de misericórdia . ) Zhang volta para casa sem poder usar as mãos para criar sua arte . Isso é dito com todas as letras no filme no Zhang Yang : que houve tortura – e casos e casos de extrema injustiça – no tempo da Revolução Cultural . Muitas outras faces do regime ditatorial chinês são expostas no filme – e é muito doido , é muito difícil para alguém que , como eu , ou , penso , a imensa maioria de nós que sabemos pouco sobre o Planeta China , entender como a censura da ditadura de partido único deixou que o filme fosse feito , e fosse distribuído pelo mundo , e chegasse ao Ocidente capitalista , decadente , doente . Não dá para saber por que permitiram o filme – mas ainda bem que permitiram E aí vou tentar me informar um pouco . Até aqui , expressei minhas sensações , minhas opiniões . Vou tentar ver o que se diz a respeito do filme , na tentativa de entender por que a ditadura chinesa permitiu que esta bela obra – bela , mas que fala demais da realidade – chegasse ao Planeta Terra . ( Na foto , Joan Chen , como Xiuqing , e Haiying Sun , como Zhang , já idosos . ) Não há informações sobre o diretor Zhang Yang nos meus muitos livros ; ele não consta dos meus três dicionários de cineastas , nem está no livro Cinema Now , que fala de 60 cineastas em atividade nos anos 2000 . O iMDB informa apenas que ele nasceu em 1967 – exatamente como o seu jovem personagem – , e é autor de seis filmes , que receberam 16 prêmios e cinco outras indicações . Em sites diversos , vejo que Zhang Yang ( na foto abaixo ) formou-se em Literatura Chinesa em 1988 , e depois estudou no Departamento de Direção na Academia Dramática Central de Pequim , onde se formou em 1992 , e passou a trabalhar no Estúdio de Cinema de Pequim . Seu filme de 1999 , Banhos , também uma história sobre vida em família , ganhou 17 prêmios mundos afora – no Planeta China e no Planeta Terra . Essas informações do parágrafo acima indicam que não é um contestador , um rebelde , um dissidente . Muito ao contrário – é aprovado pelo Sistema , pelo Establishment . O AllMovie traz uma sinopse bastante correta do filme – e mais nada . Leonard Maltin não o inclui entre os 18 mil filmes resenhados no seu Movie Guide de 2009 . Luciano Ramos fala sobre o filme em seu livro Os Melhores Filmes Novos ( Editora Contexto , 2009 ) . Conta que o filme foi premiado no Festival de San Sebastian , na Espanha , em 2005 . “ O jovem cineasta demonstra o pulso e a
sensibilidade de um veterano , com um estilo neo-realista comparável ao de Ettore Scola . ” Eu não chamaria o estilo de Scola de neo-realista , mas de fato há semelhança : como este filme aqui , Scola gosta de mostrar histórias que percorrem décadas e décadas , o panorama político e social da Itália como pano de fundo . “ Claramente inspirado no pai do diretor , o protagonista é um pintor que , nos anos 1970 , teve as mãos quebradas por ter sido acusado de refratário ao partido . Voltando para casa após uma temporada na prisão , não consegue mais trabalhar , nem se relacionar satisfatoriamente com o filho . O roteiro mostra a evolução desse relacionamento até os dias de hoje . Isso permite admirar a impressionante habilidade dramática do ator Haiying Sun , que até este filme só tinha trabalhado na TV chinesa . Ao contrário da igualmente talentosa Joan Chen , que interpreta a sua esposa e que já fez 49 filmes . Desde 1987 , com O Último Imperador , de Bertolucci , ela passou a filmar no Ocidente e ficou famosa com a série Twin Peaks , de David Lynch . ” A rigor , a rigor , o mais correto seria dizer que o protagonista não consegue mais trabalhar como pintor ; trabalhar , ele trabalha . Mas me parecem muito boas todas as afirmações do crítico , professor e estudioso Luciano Ramos . De fato , o desempenho de Haying Sun como o pai , ao longo de várias décadas – com um trabalho de maquiagem excelente , que o faz envelhecer – é extraordinário . O personagem do filho , Xiang Yang , é interpretado – e bem interpretado – por três diferentes atores , um para cada época focalizada , 1976 , 1987 e 1999 . Continua para mim sendo misterioso o fato de a censura chinesa ter permitido que o filme fosse exibido . É verdade que o filme mostra , nos trechos passados nos anos mais recentes , como houve grande progresso material na China , e isso é obviamente do interesse dos dirigentes do Partido Comunista . Mas antes assim , claro , óbvio . Maravilha que permitiram que a gente veja esta bela obra . Armadilha Selvagem / In the Gloaming De : Christopher Reeve , EUA , 1997 Nota : Anotação em 1997 : Um show de sensibilidade , de seriedade . Todos nós espectadores poderíamos estar a favor do filme por ele ser a estréia de Christopher Reeve , o Super-Homem dos anos 70 e 80 na direção depois do acidente trágico que o transformou em paralítico . Mas não é por aí . É que o texto é brilhante , corretíssimo , e o filme de fato esbanja sensibilidade . E que beleza de elenco . É um filme sobre aids em que a palavra aids não é pronunciada uma única vez , assim como não é pronunciada a palavra soropositivo . Na verdade , é um filme sobre aids
que na verdade é um filme sobre relações familiares , a dificuldade de comunicação entre pessoas letradas de uma família muito , muito rica . Gente Como a Gente , do Redford , em que as pessoas não são exatamente como a gente , porque têm muito mais dinheiro , mas ao mesmo tempo são como a gente porque são incapazes de falar as verdades , maiores ou menores , com o filho , o pai , o irmão , a irmã . É belíssimo o encontro da mãe com o filho que vem pra casa pra morrer . É emocionante , é lindo , é extremamente sensível como os laços vão sendo refeitos entre a mãe e o filho , as conversas só agora abertas sobre o namorado dele , e também sobre a relaçào dela com o marido , tão vaga , distante , embora ela seja uma mulher maravilhosa , sensível , rica , inteligente – e o marido possivelmente não perceba muito isso . Interessante como nada é dito muito às claras . Tudo é dito por meias palavras , como acontece mesmo na vida real . É uma família típica , igual a todas as outras , com a única redfordiana diferença de que é mais rica que as demais . Há um diálogo no filme que é soberbo , definitivo , brilhante . É entre a mãe que se sente na obrigação de estar perto do filho condenado à morte , mas que mais que isso se sente bem estando perto do filho condenado à morte , e a irmã yuppizinha ( a promissora Bridget , a terceira geração dos Fonda ) que vem tentar tirá-la de casa , para que ela descanse um pouco do clima pesado . O diálogo é de brilho puro . Gostaria de tirá-lo do filme e gravá-lo em texto . É todo ele em tom menor , sem clareza clara , embora tudo esteja sendo dito implicitamente – como em tantos diálogos da vida real . Tirei . Lá vai . ( Como a gente tinha trabalho , naqueles tempos pré-IMDB . Hoje é tudo mais fácil , é só copy e paste . ) A mãe ( Glenn Close ) , que é entendida de cinema , está vendo um filme P & B no vídeo , janelas fechadas . A filha yuppinha ( Bridget Fonda ) chega , vai abrindo todas as janelas . Mãe – Por que você não está trabalhando ? Annie – Decidi tirar o dia de folga . Que tal irmos ao centro almoçar ? Mãe – Não sei . Onde está o Johnny ? ( É o único neto dela , filho de Annie . ) Mãe – Annie … Eu amei vocês dois do mesmo jeito . Por que você nunca me disse nada ? Annie – Porque nós não falamos destas coisas nesta casa . Nunca . Mãe – Querida , se no passado dei mais atenção ao Danny do que a você ou a seu pai , havia
razões . Annie – Ah , por favor . Você sabe o que sua atenção fez com ele . ( Está implícito tudo aqui . Annie culpa o excesso de atenção da mãe pelo fato de o irmão ser homossexual . ) Mãe – O que você está sugerindo ? Annie – Desculpe . Não vim aqui brigar com você . Mas , mãe … Mãe – O quê ? ( Annie oferece um tranquilizante , a mãe diz que não precisa , e diz que tem algo a perguntar . ) Mãe – Por que você não trouxe o Johnny ? Você tem medo de que ele pegue algo ? Annie – É engraçado , sempre que sou cuidadosa com o Johnny , me afasto para não cometer o mesmo erro que você . Mãe – É mesmo ? Então você deveria reexaminar suas fontes psicológicas , porque atualmente acham que é genético . Há um outro diálogo impressionante . A mãe , repito , é uma entendida em cinema . O filho pergunta de que filmes ela gosta , ela diz que a cada dia é de um . E aí diz que o de que mais tem gostado ultimamente é E.T . Ele ri , pergunta por quê . E ela diz : “ Os melhores filmes são os que nos fazer rir e chorar ao mesmo tempo . ( … ) Sabe o que é divertido ? Quando odeio a vida , gosto de ver um filme violento . É muito punitivo . ” Que maravilha , que maravilha : Hollywood se reflete sobre ela mesma . Que brilho . Vincent Quer Ver o Mar / Vincent will Meer De : Ralf Huettner , Alemanha , 2010 Nota : Um filme alemão , de diretor e atores desconhecidos ( por mim , pelo menos ) , sobre três jovens em uma clínica para pessoas com problemas psiquiátricos . Pode parecer pesado , soturno , angustiante – e chato . Certo ? Erradíssimo . Vincent Quer Ver o Mar é uma beleza , um ótimo filme , e até alegre , de bem com a vida . Tivemos essa agradabilíssima surpresa ao zapear . Quando passávamos pelo Max Prime ( que ultimamente , aleluia ! , tem exibido muitas produções européias recentes ) , estava anunciando : a seguir , Vincent Quer Ver o Mar . Resolvemos ver o lead , e aí decidir se continuaríamos assistindo ou não . E era impossível não continuar , não ver inteiro . Delícia trombar de repente com um filme do qual não se sabe absolutamente nada – e ser conquistado por ele . Mal estar na igreja , durante o ofício fúnebre A ação começa em uma igreja , onde se realiza um ofício fúnebre . O padre está falando da personalidade da mulher morta , de sua vida dedicada a amar e ajudar os outros , o filho . Na primeira fileira de bancos , vemos um homem de meia idade , obviamente o viúvo , e um
jovem aí entre os 25 e os 30 anos ( veremos depois que ele está com 27 ) . O jovem começa a apresentar tiques nervosos , no rosto , no corpo . Saem sons de sua boca ; ele tenta abafá-los , mas não consegue . As pessoas param de olhar para o padre , olham para o rapaz . Ele se levanta , sai quase correndo ao longo de toda o corredor central , senta-se na escada diante da igreja . Lá dentro , a cerimônia prossegue , mas é impossível não ouvir os ruídos que o rapaz produz – e os ruídos se transformam em palavras , xingamentos , palavrões . Corta , e em seguida o pai , Robert Gellner ( Heino Ferch ) , está levando Vincent ( Florian David Fitz , os dois na foto acima ) para uma clínica . Uma belíssima clínica , instalações impecáveis – estamos na Alemanha , e Robert , o pai , é homem rico , importante , político , cheio de afazeres , de compromissos . Quem os recebe é uma médica aí na faixa dos 40 e tantos anos , cabelos negros , olhos claros , expressão firme , de profissional dedicada , séria , decidida – a dra . Rose ( Katharina Müller-Elmau , na foto abaixo ) . Depois que o pai de Vincent vai embora , a dra . Rose leva o rapaz para o quarto que ele irá ocupar . Não será um quarto só para ele : lá está Alex ( Johannes Allmayer ) , que fica irritadíssimo ao saber que terá que dividir o aposento que até então era só seu . Alex – é fácil perceber – tem uma doença obsessiva . É obsessivamente preocupado com limpeza . Mais tarde será dito explicitamente que ele tem TOC , transtorno obsessivo compulsivo . Uma garota também na faixa dos 25 anos , Marie ( Karoline Herfurth , na foto mais embaixo ) , vai procurar Vincent : deram a ela a tarefa de mostrar para o recém-chegado os ambientes da clínica . Eles fazem um tour pelo lugar , os internos , sala de TV , refeitório , e os externos – há um belo campo de futebol , um jardim . Eis a definição dada no site do dr . Dráuzio Varela : “ Síndrome de Tourette é um distúrbio neuropsiquiátrico caracterizado por tiques múltiplos , motores ou vocais , que persistem por mais de um ano e geralmente se instalam na infância . Na maioria das vezes , os tiques são de tipos diferentes e variam no decorrer de uma semana ou de um mês para outro . Em geral , eles ocorrem em ondas , com frequência e intensidade variáveis , pioram com o estresse , são independentes dos problemas emocionais e podem estar associados a sintomas obsessivo-compulsivos ( TOC ) e ao distúrbio de atenção e hiperatividade ( TDAH ) . É possível que existam fatores hereditários comuns a essas três condições . A causa do
transtorno ainda é desconhecida . ” O filme poderia mergulhar num clima pesado , opressivo , depressivo . Os realizadores , no entanto , optaram pelo inverso disso . O clima do filme é , repito , até alegre , de bem com a vida . Não que a narrativa vá fugir dos problemas , fingir que eles não existem . Os três personagens centrais , os jovens , têm transtornos psiquiátricos graves , e sua vida não é fácil , não é nada cor-de-rosa . No entanto , com imenso talento e muita maturidade , os realizadores conseguiram criar uma narrativa que chega a ser bem humorada : os próprios jovens irão rir de seus problemas , suas doenças . Tenho feito grande esforço para não revelar fatos que ocorrem depois de uns 15 , 20 minutos de ação . Ou então , quando é necessário revelá-los , tomo o cuidado de avisar . Está aí o aviso : aqui vão alguns spoilers . Como o próprio título indica , Vincent quer ver o mar . Antes de morrer , sua mãe dissera a ele que gostaria que suas cinzas fossem espalhadas no mar , numa praia da Itália , num lugar com o nome de San Vincent . A partir aí de uns 15 , 20 minutos , o filme se transforma em um road movie . Um road movie cheio de momentos encantadores , de belíssimas paisagens – a fotografia é esplendorosa – , em que se alternam momentos de muito bom humor com outros inquietantes . Tudo extremamente saboroso , bem feitíssimo – um filme muitíssimo bem realizado , fascinante mesmo . Atuações impecáveis dos atores que fazem os cinco papéis principais As atuações dos cinco atores principais – que fazem os três jovens , a dra . Rose e Robert , o pai de Vincent – são impecáveis . Cada um está perfeito em seu papel . O elenco dá um show . Assim que o filme acabou , vi , assustado , que o autor do roteiro é de Florian David Fitz , o ator que faz o papel central , de Vincent . É muito impressionante , até assustador , porque é um roteiro que parece ter sido escrito por alguém bastante maduro , experiente . É uma narrativa sóbria , em termos formais , sem nenhuma invenciocine – mas segura , firme , com todo o jeito de resultar do trabalho de um veterano , que domina o ofício . Não é veterano – parece que é daqueles gêniozinhos precoces . Nascido em Munique , em 1974 , Florian David Fitz estudou música no Conservatório de Boston entre 1994 e 1998 , segundo informa o IMDb . Graduou-se com a maior honra – magna cum laude . Toca piano e saxofone . Fala fluentemente ( além do alemão , é claro ) , inglês , italiano e espanhol . Interessante que sua formação seja musical . No filme que Florian David Fitz escreveu , Alex , o rapaz que sofre de TOC
, é um apaixonado por música erudita , em especial por Johann Sebastian Bach . Uma sequência especialmente bela é quando , no meio de montanhas maravilhosas , Alex , ao som de um Bach que toca no rádio do carro ali perto , finge reger a orquestra . Sua filmografia como ator no IMDb tem 36 títulos . Não reconheço nenhum dos títulos . Ahá ! Tinha que ter alguém maduro , experiente , velho de guerra nessa história . O diretor Ralf Huettner , também de Munique , é de 1954 . É daqueles profissionais que passaram por várias áreas : foi cameramen , passou por iluminação , foi diretor de segunda unidade , assistente de direção , ator , roteirista , depois diretor e produtor . Tem 21 filmes como realizador . Dou uma olhada na filmografia e , mais uma vez , nada – não reconheço um título sequer . A gente não conhece nada , nadica de nada . Detalhe : o cigarro Ando reparando na coisa do cigarro nos filmes . Na Alemanha civilizadíssima de 2010 , a personagem de Katharina Müller-Elmau , bela mulher , bela atriz , a dra . Rose – justo uma médica , uma terapeuta competente – fuma compulsivamente , um cigarro após o outro . Robert , o pai de Vincent , se orgulha de ter parado de fumar há três anos . Mas , numa situação de grande tensão , pedirá um cigarro à dra . Rose . Eu , que tento diminuir a porra do cigarro mas não consigo – quanto mais parar , que isso ainda nem tentei – , me senti suavemente vingado . Um filme caprianamente otimista Vincent Quer Ver o Mar é uma beleza de filme , carregado de um grande amor pelas pessoas , pela vida , pela amizade , pela solidariedade . Remando contra a maré destes tristes tempos atuais , é um filme que faz lembrar o humanismo de Frank Capra – é caprianamente otimista , acha que alguns problemas , como relações familiares , afetivas , conflituosas , podem , sim , ser resolvidos , ou pelo menos minorados , se houver vontade , persistência , ânimo . 6 Comentários Desde que li esta sua resenha , estou obcecado em conseguir uma cópia do filme , tanto porque tenho síndrome de Tourette desde os 8 anos , quanto porque mantenho um blog sobre esta doença e suas comorbidades ( TOC , TDAH e transtornos similares ) . Obrigado por tanta sensibilidade e informações . Tenho assistido filmes ótimos neste canal Max , 75 na Net . Ontem , assisti dois magníficos filmes “ Brilho de uma paixão ” sobre o poeta John Keats e sua amada Fanny . Em seguida , comecei a ver Vincent quer ver o mar e não pude mais parar . Que filme maravilhoso . Fotografia , roteiro , música , tudo é perfeito . Exatamente como se lê acima na resenha do filme . Há quanto tempo eu não via nada tão bom
. Fiquei encantada . Recomendei a amigos e continuarei a fazer isso para poder compartilhar essa experiência inesquecível . Mary 2 Trackbacks [ … ] de Lorenzo ( ALD , ou adrenoleukodystrophy , em inglês ) , Decisões Extremas ( síndrome de Pompe ) , Vincent Quer Ver o Mar ( Síndrome de Tourette ) , Uma Prova de Amor ( um tipo raro de leucemia ) , Um Certo Olhar ( um tipo de [ … ] Os Infratores / Lawless De : John Hillcoat , EUA , 2012 Nota : Alex DeLarge muito certamente adoraria este filme , Lawless , sem lei , no Brasil chamado de Os Infratores . Para quem não se lembra , Alex DeLarge é o protagonista da distopia Laranja Mecânica / A Clockwork Orange , escrita por Anthony Burguess , e filmada por Stanley Kubrick em 1971 . Ele é um jovem adepto da ultraviolência . Pois é : Os Infratores é um filme voltado para as pessoas que , como o Alex DeLarge , adoram a ultraviolência . Para quem gosta de violência , de ultraviolência , ulalá , é a perfeição . Para esse povo , olha , o filme pode dar gozo mesmo . Orgasmo . Corta-se o pescoço – e esguicha sangue . Ah , é pouco ? Pois não : corta-se o saco . Ah , é pouco ? Pois não : mostram-se os bagos cortados . Por que raios esses bons atores aceitaram participar deste filme ? Lawless é um daqueles filmes que dão nojo da humanidade . Que fazem a gente acreditar que a humanidade é uma invenção que deu errado . Tem bons atores – e isso é apavorante . Por que , meu Deus do céu e também da terra , aceitaram participar dessa idiotice Shia La Beouf , Guy Pearce , Jessica Chastain , Mia Wasikowska ? Por que raios um ator tão completo , tão perfeito , tão camaleônico como Garty Oldman aceitou fazer uma quase participação especial neste filme grotesco , horroroso ? A história se passa no condado de Franklin , interiorzão da Virginia , nos anos 1920 , a época da Lei Seca nos Estados Unidos . Era proibida a venda de toda e qualquer bebida alcoólica – e vendia-se uísque fabricado em destilarias caseiras , clandestinas , como provavelmente nunca se vendeu tanto em qualquer outra época da história . Contam-se as aventuras de três irmãos , os Bondurant , que foram dos maiores produtores e vendedores de uísque da região – uma região onde havia dezenas e dezenas de destilarias clandestinas . O mais velho , Forrest ( interpretado pelo inglês Tom Hardy ) , tinha lutado na Primeira Guerra Mundial e sobrevivido , e por isso se considerava invencível , imortal – e todo mundo no condado de Franklin acreditava na lenda . O irmão do meio , Howard ( Jason Clarke ) , era um gigante fortíssimo . E o caçula , Jack ( o papel de Shia LaBeouf ) , ao contrário dos outros
dois , era baixinho , meio fracote – e , também ao contrário dos outros dois , não tinha coragem de atirar para matar sequer um porco . Teremos então que Forrest e Howard vão dar muita porrada nos desafetos – e Jack , o caçula fracote , que é o narrador da história , vai levar muita porrada de todo mundo , dos desafetos e dos próprios irmãos mais velhos . Tudo ia muito bem com a comercialização de uísque clandestino na região – o xerife era um freguês de carteirinha do produto dos irmãos – até que chega ali um assistente do promotor mau como o diabo , chamado Charlie Rakes ( interpretado , histrionicamente , exageradamente , caricaturalmente , pelo australiano Guy Pearce ) . Rakes quer pedágio dos produtores para deixá-los trabalhar . Todos os produtores topam – menos os bravos irmãos Bondurant . E dá-lhe porrada . Lawless tem mais porrada que a obra completa de Sylvester Stallone . O diretor fez todos os seus atores atuarem de forma quase caricatural , exageradíssima Os irmãos Bondurant existiram na vida real . Se deram ou levaram tanta porrada , não dá para saber , mas a história deles foi contada em um livro chamado The Wettest County in the World , o condado mais molhado do mundo , de autoria de Matt Bondurant . Matt vem a ser neto de Jake , o caçula dos três irmãos . Quem escreveu o roteiro do filme foi Nick Cave , o cantor e compositor australiano , que também assina a trilha sonora do filme . Aliás , a trilha sonora , cheia de canções blue grass e folk , é a melhor coisa do filme , além da beleza estranha e esplendorosa de Jessica Chastain . O diretor John Hillcoat , ele também australiano , como Nick Cave e Guy Pearce , tem 16 filmes no currículo , inclusive A Estrada / The Road , uma ficção-científica sobre o mundo pós-Apocalipse com Viggo Mortensen e Charlize Theron . Esse John Hillcoat fez todos os seus atores atuarem de forma quase caricatural , exageradíssima , falsa como uma moeda de dois guaranis . Na minha opinião , só se salva a atuação das duas atrizes , que representam o tal de female interest , Jessica Chastain e Mia Wasikowska . Gastaram US$ 26 milhões para fazer essa porcaria pancadão . E pior ainda é saber que a platéia ainda aplaude e ainda pede bis : o filme rendeu US$ 53 milhões . Hum … Mundo inteiro fora EUA , US$ 16 milhões ; EUA e Canadá , US$ 37 milhões . Parece que os americanos gostam especialmente de ver tanta violência . Depois reclamam dos atiradores malucos à la Columbine . Vejo que o filme foi exibido em competição no Festival de Cannes . Não é por nada , não , mas o pessoal de Gilles Jacob já foi mais criterioso na escolha dos concorrentes . Um Comentário Eu não acho que esse filme seja horroroso . Ele tem
, sim , alguns problemas de montagem , duração um pouco excessiva , a interpretação equivocada de Guy Pierce ( over ) mas , quanto à violência , não vejo como gratuita . Ora , retratar a América profunda em pleno anos 30 nos EUA ( Grande Depressão , Lei seca ) é como retratar a época do cangaço no Nordeste brasileiro . Terra de ninguém ! Daí o título do filme em inglês : Lawless . A violência , aqui , não é pitoresca ou cartunesca , como por exemplo , nos filmes do Quentin Tarantino , é factual . Basta lembrar que dois dos melhores filmes sobre a época : Bonnie e Clyde , que tem aquele final violentíssimo ( isto porque já estávamos no final dos anos 60 ) e Vinhas da Ira que , embora não seja explícito , contém uma violência e um retrato da desumanidade daqueles tempos , poucas vezes visto no cinema . 3 Trackbacks [ … ] alegres , brincalhões . Parecem ser carinhosos uns com os outros . Keith ( o papel do australiano Guy Pearce ) dá aula de música na high school em que estuda a filha única , Lauren ( Mackenzie Davis ) ; é [ … ] [ … ] Corte no tempo , novo letreiro : “ Reichstag , Berlim , 1945 ” . O nazismo acaba de ser derrotado , os soldados do Exército Vermelho estão tomando o prédio do Parlamento alemão . Alguns soldados sobem até a torre mais alta do prédio para pendurar lá no topo uma grande bandeira vermelha da União Soviética . Um deles usa no pulso diversos relógios , roubados de alemães mortos ou rendidos : chama-se Vassili ( Joel Kinnaman ) , e veremos que , além de ladrão , é um absoluto crápula . Há também no grupo dois soldados muito amigos , Alexei ( Fares Fares ) e Leo ( Tom Hardy ) . [ … ] O Motim / The Rising : Ballad of Mangal Pandey De : Ketan Mehta , Índia , 2005 Nota : Anotação em 2007 , com complemento em 2008 : Um épico indiano sobre episódio real ocorrido no século XIX . É uma superprodução de deixar babando de inveja o Cecil B.de Mille . O episódio foi uma revolta , em 1857 , contra os colonizadores ingleses , da qual fez parte o personagem do título original , Mangal Pandey ( Aamir Khan ) , um soldado a serviço da Companhia da Índia Oriental – uma das empresas britânicas mais poderosas a operar na colônia , tão poderosa que tinha a sua própria milícia , supervisionada pelo exército de Sua Majestade . Mangal Pandey viraria um herói indiano , um proto-mártir da independência indiana , algo assim como um Tiradentes na história do Brasil . A revolta teve o apoio de um oficial britânico ( Toby Stephens ) , amigo e parceiro de Mangal Pandey . O filme tem belíssimos planos gerais , uma multidão de figurantes de fazer justiça ao
absurdo tamanho da população indiana , ótimas seqüência de música e dança de deixar babando de inveja o Gene Kelly e duas atrizes ( Rani Mukherjee e Amisha Patel ) de beleza extraordinária , exuberante , gostosas como Sonia Braga no auge do auge do auge . Um leitor do iMDB , muito provavelmente indiano , que se assina Hanharan , termina assim sua longa e superlativa resenha : “ O filme conta uma história de amigos , amantes e inimigos , exploradores e explorados , e o crescimento e a consciência de um homem e uma nação . É a história de um homem e seu sonho de liberdade . Este épico é baseado em acontecimentos históricos reais , vistos como um gatilho para a independência da Índia ” . Hurra ! É isso aí que ele falou . E é também a ) um exemplo do luxo de que é capaz o cinema da Índia , o país que mais produz filmes em todo o mundo ; e b ) um exemplo de como é uma pena a gente ter tão pouco acesso a essa cinematografia . 11 Comentários O filme é lindíssimo , de uma força e uma delicadeza incríveis . Para mim , realmente uma superprodução . As imagens , a música , o colorido mostram uma Índia riquíssima culturalmente , com sua luz e sombra também . Uma história de luta pela liberdade , pela vida , também pelo amor … que encanta e seduz a todos … não consigo imaginar que alguém possa não se comover com a beleza , com a vida , com o êxtase que movem os dramas do filme . Um grande filme com interpretações fortes e sutis . Realmente , o filme tem a dimensão de uma obra épica e nos apresenta,de forma extraordinária,toda a vivacidade e os conflitos,ainda pulsantes,de uma Índia “ Hindumuçulmana”.As imagens , as músicas,as danças…toda a obra , anestesiaram-me de tal forma que,passados dois anos desde que a assisti pela primeira vez , ainda guardo a lenbrança de cada cena…o filme é simplesmente fantástico . Sou professor de história e , qundo estou trabalhando o imperialismo no seculo XIX,passo este filme para os alunos.È um excelente filme que nos mostra como se deu a exploraçao dos ingleses na Índia , mas nem por isso devemos deixar de critica-lo.Por exemplo , o filme traz uma leitura muito romantizada da Índia ja fiz meu comentario bobo . Agora para compensar , um outro comentario menos bobo : alguem sabe se , apos o episódio do Gandhi , a índia realmente é TOTALMENTE independente da inglaterra , ou ainda mantém algum laço ? ( como outras nações subordinadas à coroa britânica , como o canadá e australia ) A Índia , segundo a Wikipedia , pertence à Commonwealth of Nations , que já foi chamada no passado de British Commonwealth . É , ainda segundo a definição da Wikipedia , uma organização intergovernamental de 54 estados membros independentes – 52 dos quais pertenceram no passado ao Império Britânico
. Não há qualquer relação de dependência dos países membros em relação à Grã-Bretanha . É completamente diferente , por exemplo , da situação do Canadá , que é uma monarquia constitucional soberana , mas cuja chefe de Estado é a Rainha Elizabeth II . Sérgio Um Homem Como Poucos / Le Voyou De : Claude Lelouch , França-Itália , 1970 Nota : Le Voyou , que Claude Lelouch fez em 1970 e foi lançado no Brasil com o título Um Homem como Poucos , é um policial , mas não um drama . Uma das tramas policiais mais inteligentes , criativas e bem resolvidas das que Lelouch criou , senão a melhor de todas , Le Voyou é uma gostosa aventura , um divertissement . O herói da história , o mocinho , por quem o filme torce abertamente , é um bandido , um fora-da-lei , um escroque . Esse herói bandido é interpretado por Jean-Louis Trintignant , no auge de sua beleza jovem ; foi a primeira vez que se reencontraram os dois , Lelouch e o ator que ajudou a garantir o extraordinário sucesso de Um Homem , Uma Mulher , lançado quatro anos antes , em 1966 . ( Lembrando , bem rapidinho : quando se preparava para filmar Um Homem , Uma Mulher , Lelouch era então um jovem praticamente estreante ; Trintignant , que havia começado a carreira em 1956 , já era então um astro em ascensão . Aceitou de pronto o convite , e , segundo depoimento do próprio Lelouch , ajudou-o a convencer Anouk Aimée , já grande estrela , a topar a aventura de fazer um filme com realizador iniciante , com baixíssimo orçamento . A aventura é a aventura , e Um Homem , Uma Mulher , Palma de Ouro em Cannes e Oscar de Melhor Filme Estrangeiro , foi um gigantesco sucesso comercial . Na verdade , Lelouch jamais teria outro igual . ) Na abertura , um musical com um gângster que atira e canta e mata Le Voyou começa de uma forma um tanto , ou talvez bastante , desconcertante : as primeiras seqüências que vemos são de algo que parece um musical hollywoodiano , algo assim como uma mistura de West Side Story , do iniciozinho de Quanto Mais Quente Melhor e dos filmes de gângsteres dos anos 30 e 40 . Em uma garagem , um bando de belas mulheres , em vestidos coloridíssimos que permitem a visão das coxas , dançam ao som de uma melodia do mesmo Francis Lai dos filmes anteriores de Lelouch , em torno de um primeiro bailarino negro que carrega uma metralhadora e atira ao ritmo da música . Já na primeira tomada , antes do canto e dança , quatro homens são mortos . E , quando cantam , os bailarinos cantam em inglês ! Atrás , ao fundo , um letreiro em neon anuncia : VOYOU . Um letreio informa que “ voyou ” é a gíria parisiense para “ gângster ” , “ vagabundo
” . E , depois do final do número de dança em torno do gângster que canta em inglês , e dos créditos iniciais , vemos um casal entrando num apartamento , que , obviamente , pertence à mulher . O homem é interpretado por Trintignant ; a mulher , veremos que se chama Janine ( Danièle Delorme , na foto ) . As expressões dos dois são sérias , pesadas ; não parece que estão vindo de uma longa conversa num bar , já íntimos , já se encaminhando para a cama . De forma alguma . Assim que Janine desaparece da sala , o homem – Simon Duroc é seu nome – tranca a porta de entrada . Pede uma cerveja . Ela diz que vai preparar algo para ele comer – e ele arrebenta o fio do telefone . Não : definitivamente não é o encaminhamento de um fim de noite de um casal de namorados , ou um casal que começa a namorar . Não é hora de preliminares : está claro que Simon está invadindo à força o apartamento de Janine . Ela faz um omelete , e ele come sozinho . Pergunta se ela não vai comer , ela diz que comeu antes de ir ao cinema . Ele pergunta se ela vai muito ao cinema … E aí corta , e vemos Janine no cinema . Simon está sentado uma ou duas fileiras atrás dela . O filme que está sendo exibido , é claro , é Voyou , o musical que parece ambientado na Chicago de Al Capone . Simon se levanta , vai se sentar ao lado de Janine . Dois homens entram no cinema , evidentemente policiais , à procura de algum bandido . Simon está beijando Janine . A câmara mostra que ele tem uma faca encostada nela . Voltamos ao apartamento de Janine , após a refeição rápida de Simon . Ela quer saber quanto tempo ele pretende ficar ali , ele faz planos para o dia seguinte : ela não irá trabalhar , mandará recado de que está doente . Ela diz que tem um carro , pode levá-lo até onde ele quiser . A conversa é tensa , mas controlada . Janine se mostra mais calma do que seria de se esperar de qualquer pessoa que está sendo mantida refém dentro de sua própria casa por um bandido . O diálogo termina com uma frase do bandido : – “ É melhor você ser gentil comigo , porque tive um dia bastante carregado ” . Um encontro com a ex-mulher em um parque Corta , e Simon está saindo de um prédio . Vai até uma daquelas cabines de fotografias 3 x 4 automáticas , faz uma série de fotos – com bigode falso , sem bigode , com óculos , sem óculos . Pega um táxi , chega a um parque , senta-se ao lado de uma mulher , que está diante de uma área para crianças . Ele diz , olhando para a garotinha
que brinca diante do banco em que estão sentados : – “ Ela é muito bela . Você também . Posso dar um beijo nela ? A mulher , Martine ( interpretada por Christine Lelouch , na foto abaixo ) , não hesita um segundo , e chama a filha , Françoise , para que chegue perto dos dois , no banco do parque . Pelos diálogos entre Simon e Martine , o espectador fica sabendo que Martine foi mulher de Simon , e Françoise , que está aí com quase cinco anos , é filha dos dois . Logo depois do nascimento de Françoise , Martine se casou com um sujeito rico , industrial , dono de uma fábrica de iogurtes ; vive bem , e o marido trata muito bem a filha dela . Martine pergunta onde ele está se escondendo , e Simon diz que há 15 dias está na casa de uma amiga . Martine comenta que ele não emagreceu muito , e ele responde que a amiga cozinha muito bem . Ele quer saber se ela contou sobre os dois para seu marido , e Maetine responde que , durante o julgamento dele , o país todo ficou sabendo a respeito dos dois . Nos primeiros 16 minutos , truques no roteiro Estamos aí com uns 16 minutos de filme , e o roteiro já nos produziu alguns truques , alguns joguinhos com a ordem cronológica . Tudo bem : que aquelas primeiras imagens – o musical com as dançarinas , o gângster , os tiros – eram um filme dentro do filme , isso fica bem claro . Era o filme que estava passando quando Simon se sentou ao lado de Janine e , para não ser visto pelos policiais que faziam a busca , a beijou , enquanto exigia silêncio com a faca . E em seguida , na saída do cinema , foram para a casa dela . Primeiro vimos o filme dentro do filme , depois a chegada do casal à casa de Janine , e em seguida , num rápido flashback , vimos o que havia acontecido logo antes de os dois irem para o apartamento dela – o encontro no cinema . Mas o diálogo entre os dois termina com Simon dizendo que teve um dia muito carregado – e em seguida há as seqüências em que Simon se encontra com a ex-mulher , Martine , e a filha que jamais havia visto antes . Não é obrigatório , é claro , mas , como já tinha havido um rápido flashback antes , com a cena do encontro do bandido com a moça inocente no cinema , o espectador pode achar que aquilo que está vendo quando o filme está aí com 15 , 16 minutos – o encontro do bandido com sua ex-mulher – é outro flashback , explicando como tinha sido o dia muito carregado de Simon . A rigor , acho que foi isso que os roteiristas pretenderam : eles quiseram induzir o espectador a crer
que o encontro de Simon com a ex-mulher era um novo flashback . Se o espectador caísse , tudo bem . Se não , tudo bem também . Um cineasta que diz e repete que partiu da imagem para as histórias A história de Le Voyou é de Lelouch . Lelouch é o autor da história , da trama , do argumento da imensa maioria de seus filmes . Segundo o próprio Lelouch diz e repete , uma das diferenças entre ele e os cineastas da nouvelle vague é que eles partiram da literatura para o cinema , enquanto ele partiu da própria imagem , para só muito mais tarde fazer adaptações de obras literárias . ( Ele fez a afirmação pessoalmente para este reles anotador sobre filmes aqui , quando o reles anotador sobre filmes sentiu-se obrigado a – na falta de outro profissional mais qualificado e competente – entrevistá-lo durante sua visita ao Brasil para divulgar Um Homem , Uma Mulher Vinte Anos Depois , em 1986 . Eu era editor de Cultura da revista Afinal , a época era de vacas magras , muitos dos profissionais que tinham lançado a revista haviam saído ; não havia ninguém que eu pudesse escalar para a entrevista , e então lá fui eu . ) Vão aí , nessa afirmação que Lelouch faz repetidas vezes , uma dose de verdade , outra de ironia , outra de amargura , outra de desafio . Lelouch quer dizer com isso – entre outras coisas – que sua origem foi mais humilde que as dos seus conterrâneos e praticamente contemporâneos Godard , Truffaut , Rohmer , Chabrol . Que esses , os grandes nomes da nouvelle vague , cujos primeiros filmes foram lançados a partir de 1958 , 1959 , 1960 , são mais letrados do que ele , iniciaram as carreiras na crítica de cinema – e que , em muitos de seus filmes , fizeram adaptações de obras literárias , enquanto ele , filho de imigrante africano , começou a vida como operador de câmara em documentários . Se os argumentos de boa parte de seus filmes são de sua autoria , na tarefa de escrever os roteiros Lelouch tem a humildade de pedir ajuda a outros . Seu colaborador mais constante nos roteiros é Pierre Uytterhoeven . O roteiro de Le Voyou é assinado por Lelouch , Uytterhoeven e mais Claude Pinoteau . O próprio realizador , cuja humildade não chega a ser muito grande , de forma alguma , assina os diálogos – no cinema francês , o crédito dos diálogos é muito importante – e também o trabalho de câmara . ( Talvez porque tivesse começado como cameraman , talvez por saber que é extraordinariamente competente nesse ofício , Lelouch continuou carregando a câmara durante muitos de seus filmes , mesmo depois que ficou rico , dono de uma produtora rentável . ) Mas o roteiro é assinado a seis mãos . E é um roteiro brilhante . Até mesmo por esses truquezinhos iniciais de sugerir que pode
estar havendo um flashback quando na verdade não se está . O que vem aqui é quase um spoiler . Pode-se pular para o próximo intertítulo Revelei até aqui sobre a trama o que rola até aí uns 16 minutos dos 120 da duração do filme . Virão a seguir muitos acontecimentos completamente inesperados , fascinantes , engraçados , inteligentes , bem sacados . Quando estamos já bem perto do desenlace da história , o espectador perceberá que – epa ! teve algo aí que me escapou . E é verdade . Quase ao fim da narrativa , cai a ficha de que houve algo , anteriormente , que não ficou exatamente claro . Voltamos atrás , Mary e eu , para checar onde foi . E checamos : os roteiristas Lelouch , Uytterhoeven e Pinoteau dão um chapéu no espectador quando o filme está aí por volta de 45 minutos . Um chapéu . Um truquezinho . Uma enganadazinha . Um pequeno jogo . Na minha opinião , esse pequeno jogo não é uma sacanagem contra o espectador . É apenas isso : um pequeno jogo . E aí fico me perguntando se eu não sou um sujeito profundamente incoerente . Ao falar de alguns filmes recentes do cinemão comercial , reclamo do que chamo de “ Essa regra cada vez mais comum segundo a qual Podendo-Complicar-a-Narrativa,-Por-que-Simplificar ? ” No entanto , como este é um filme de Claude Lelouch , um dos cineastas que mais admiro , digo que o que ele faz é apenas um pequeno jogo com o espectador . Um realizador de filmes autorais , pessoais , intransferíveis Um dos motivos de minha admiração absoluta por Lelouch é o fato de que seus filmes são autorais , pessoais , intransferíveis feito dor de dente . OK : admito que outro dos motivos pelos quais Lelouch me fascina é o fato de que 99,99% dos críticos de cinema , do pessoalzinho de nariz empinado que se diz amante dos “ filmes de arte ” , que tem como projeto de vida poder dizer que detesta o “ cinema americano ” ( uma entidade de resto mais inexistente que Papai Noel ) , detestam Lelouch . Mas o principal motivo de minha admiração por esse realizador detestado por 99,99% dos “ entendidos em cinema ” é mesmo pelo fato de que , desde sempre , ele faz filmes pessoais . É um autor . E é esquisito pensar que os “ entendidos em cinema ” veneram todos os autores , de D.H.Griffith até Quentin Tarantino , passando pelos grandes todos , Bergman , Buñuel , Ford , Eisenstein – mas detestam Lelouch . Autor , Lelouch sempre volta aos mesmos temas , às mesmas manias . Parece o criminoso da frase velha , sempre querendo voltar ao local do crime . Seu crime maior , Um Homem , Uma Mulher , ele não pára de revisitar . Em La Bonne Année , no Brasil A Dama e o Gângster , de 1973 , exibe-se para os presos
– entre os quais o protagonista , interpretado por Lino Ventura – Um Homem , Uma Mulher . Em Robert e Robert , de 1978 , os pobres corações solitários que precisam recorrer à agência de encontros para encontrar um(a ) possível companheiro(a ) cantarolam numa festinha o tema que Francis Lai criou para Um Homem , Uma Mulher e ficou mundialmente conhecido . Revisita de novo seu maior sucesso neste Le Voyou . Primeiro , com a presença de Jean-Louis Trintignant . E até mesmo com o sobrenome de seu protagonista , Simon Duroc . Duroc era o sobrenome do personagem central de Um Homem , Uma Mulher , Jean-Louis Duroc . ( E Simon é o prenome do filho que o realizador teve com Christine Lelouch , sua mulher na época , que interpreta Martine , a ex-mulher do protagonista do filme . ) Lá pelas tantas , quase perto do final da narrativa , o comissário de polícia , interpretado por Yves Robert , diz a Simon Duroc que foi visto um casal , “ um homem , uma mulher ” – e então Simon Duroc-Jean Louis Trintignant assobia os primeiros acordes da canção tema que Francis Lai criou para Um Homem , Uma Mulher . O grande Yves Robert aceitou fazer um pequeno papel no filme Mas péra lá ! Yves Robert ! Sim , sim , eu vi o nome nos créditos iniciais . Mas era muita informação junta , e aí me passou . Vejo agora , enquanto estou escrevendo esta anotação , que o comissário de polícia – beleza de atuação , mas , também , quem não atua bem dirigido por Lelouch ? – é interpretado por Yves Robert ! Fui checar se não seria um homônimo , mas não , é Yves Robert mesmo . O realizador que fez A Guerra dos Botões , de 1962 , um filme fetiche , um filme maior , dos mais fascinantes que já foram feitos sobre crianças , comparável apenas a algumas poucas obras maiores , como Na Idade da Inocência/L’Argent de Poche , de Truffaut , de 1976 . E mais Alexandre , o Felizardo , um dos filmes que Regina mais amava , e ainda o esplêndido díptico A Glória de Meu Pai e O Castelo da Minha Mãe . Em sua autobiografia , Lelouch dá a entender que o único colega seu de metier , o único cineasta francês que era seu amigo , que o tratava bem , era Jean-Pierre Melville . Vai aqui portanto uma prova de que há inverdade no livro de Lelouch . Ele conseguiu fazer com que Yves Robert trabalhasse em seu filme – e Yves Robert está extraordinário , maravilhoso , como o comissário de polícia . Mais uma vez a trama inclui o Olympia . E tem Charles Denner Mas volto então às coisas do autor Lelouch , sua mania de botar sempre as mesmas coisas em suas histórias . Por exemplo , o Olympia . O Olympia aparece em Toda Uma Vida ,
o filme de 1975 . Gilbert Bécaud , fazendo o papel dele mesmo , canta no Olympia . O Olympia aparece em Robert e Robert – o encerramento da narrativa é lá , naquele teatro centenário por onde passaram todos , todos , exatamente todos os grandes músicos franceses do século XX . ( Até mesmo alguns não franceses passaram por lá . Aqueles garotinhos de Liverpool inclusive . ) O Olympia tem uma importância grande na trama de Le Voyou . E aí tem Charles Denner . Mas que ator extraordinário é Charles Denner . Ele só aparece neste Le Voyou quando estamos aí pela metade do filme . Faz o pai do garoto que será sequestrado à entrada do Olympia . O papel dele cresce a partir daí . Deve ser engraçado ser ator francês e trabalhar ora com um realizador incensado , ora com um realizador odiado . Charles Denner ( 1926-1995 ) trabalhou tanto com Truffaut quanto com Lelouch . Com Truffaut , fez um dos homens procurados pela noiva que estava de preto , no maravilhoso filme de 1968 ; esteve em Uma Garota Tão Bela Quanto Eu , de 1972 ; mais tarde , em 1977 , seria o protagonista do excepcional , maravilhoso O Homem que Amava as Mulheres . Paralelamente , trabalhava com Lelouch . Em Le Voyou , fazia um papel relativamente pequeno ( afinal , só surge no meio do filme ) , mas importantíssimo . Participou de Uma Aventura é uma Aventura , de 1972 ; em Toda uma Vida , fez três papéis , de avô , pai e filho de um dos personagens centrais – uma interpretação maravilhosa . Voltou a trabalhar com Lelouch em Se Tivesse que Refazer Tudo / Si c’était a refaire , de 1976 , e seria um dos protagonistas de Robert e Robert , de 1978 . Fico pensando aqui : será que Charles Denner levava confidências de um lado para outro , todos os grandes cineastas franceses de um lado versus esse outro aí execrado por toda a crítica mundial ? Com Truffaut , certamente , ele não teria feito intriga , mesmo que quisesse – e não acho que ele tenha querido . Truffaut era gente fina , da paz , do bem . Lelouch é como sua personagem Anne Gauthier : quanto mais a crítica malha , mais ele faz filmes Lelouch , no discurso , preza muito la generosité . Euzinho o ouvi prezar diversas vezes la generosité , e babei com isso , fã eterno que sou dele , e da generosidade . Talvez por ser filho de imigrantes , talvez por ter sido tão combatido , tão malhado , tão espezinhado por 99,99% dos 1,432 milhões de críticos de cinema do mundo , Lelouch tenha reagido virando um casca grossa , uma tartaruga gigante , fingindo-se imune às críticas – ao mesmo tempo em que reage a elas com agressividade . Joe Giddeon , o alter ego de Bob Fosse em All That Jazz , aquele
gênio que fez apenas cinco filmes , não tinha forças para aguentar um pau da crítica . Quando , recém-operado do coração , vê a crítica de plantão na TV ( seria ela inspirada em Dame Pauline Kael ? ) destruir seu novo filme , Joe Giddeon tem novo piripaque cardíaco . Anne Gauthier , a personagem de Um Homem , Uma Mulher , que na continuação do filme , Um Homem , Uma Mulher 20 Anos Depois , é uma grande produtora de cinema , não se deixa abater nem mesmo quando seu namorado mete o pau em sua mais recente produção . De imediato , parte para fazer um novo filme . Joe Giddeon é Bob Fosse escarrado – um gênio cheio de medo , de pavor , com o que a crítica vai dizer sobre sua obra . Lelouch finge ser tão seguro demais que cria , em Le Voyou , uma situação que ele não tinha nenhuma necessidade de criar . Quando Simon foge da polícia , há dois cinemas , lado a lado , nos quais ele poderia entrar . Era 1970 , e então num cinema estava passando A Confissão/L’Aveu , filme extraordinário , sério , profundíssimo , feito pelo mestre do cinema político , Costa-Gavras , estrelado por Yves Montand ( que havia trabalhado com Lelouch em Viver por Viver , o filme que ele realizou logo depois de Um Homem , Uma Mulher ) . No cinema ao lado , estava passando Voyou , filme inexistente , filme dentro de filme , invenção de Lelouch . No rádio , o locutor diz que é interessante o fato de que o bandido perseguidíssimo pela polícia tenha podido escolher se se escondia em um cinema que passava A Confissão e outro que passava Voyou . E , fã de cinema , o locutor diz : – “ Eu teria indicado A Confissão , mas meu gosto cinematográfico não é o que importa … ” Le Voyou não é sério . A rigor , é até moralmente errado A Confissão/]L’Aveu , de Costa-Gravras , digo euzinho agora , é um filme importante , importantíssimo , maior . Em todos os sentidos – artísticos , e políticos . Ao mostrar a tortura executada pela polícia política da Checoslováquia , marcou o rompimento definitivo de Jorge Semprum e de Yves Montand com o comunismo stalinista . É um absoluto brilho , e de uma imensa força . Le Voyou , ao contrário , não é um filme sério . É uma aventura – l’aventure c’est l’aventure . Se for visto com rigor , é um filme moralmente indefensável . Muitos grandes cineastas fizeram filmes mostrando bandidos como heróis . A simpatia do cinema pelos bandidos , pelos foras-da-lei - , vem desde que o cinema existe . E o cinema , coitado , não inventou nada . Quando surgiu , no final do século XIX , já havia uma centenária , quase milenar tradição de a arte admirar o fora-da-lei . Tá aí a folk song para
não me deixar mentir . E então , no frigir dos ovos , devo dizer que Le Voyou é bem realizado , gostoso , divertido – mas é moralmente errado . Não é admirando ladrões , achacadores , sequestradores , que vamos poder ir em frente . Se quisermos ir em frente . Se for mesmo para falar sério , assim como os mestres Akira Kurosawa e Satyajit Ray , não dá para compactuar com o crime , a corrupção . Qualquer que seja , em que nível seja . Amores Inversos / Loveship Hateship De : Liza Johnson , EUA , 2013 No finalzinho dos anos 70 , inicio dos 80 , Fernando Brant fez um verso de uma tristeza abolutamente profunda : “ Como é miúda e quase sem brilho a vida do povo que mora no vale ” . Vida miúda e quase sem brilho . A imagem fortíssima da canção “ Itamarandiba ” me veio à mente a propósito de Johanna Parry , a protagonista de Loveship Hateship , no Brasil Amores Inversos . Johanna ( interpretada por Kristen Wiig ) tem uma vida duríssima , só de trabalho e nada , ou quase absolutamente nada de prazer , contentamento , satisfação . Nasceu pobre , no interiorzão do distante estado de Iowa ; aos 15 anos , começou a trabalhar como empregada doméstica na casa de uma senhora da região , Mrs . Willets ( Lauren Swinney ) . A sra . Willets envelheceu sem parentes , e Johanna tornou-se sua cuidadora . Na primeira sequência do filme – uma obra absolutamente feminina , dirigida por Liza Johnson e baseada em conto da escritora canadense Alice Munro – , a sra . Willetts , muito idosa e doente , na cama com toda certeza há muito , muito tempo , diz que quer usar seu vestido azul . Daí a pouco , quando Johanna volta ao quarto , a velha senhora está morta . A câmara de Liza Johnson e do seu diretor de fotografia Kasper Tuxen mostra então Johanna tendo aquele trabalho insano , pavoroso , de vestir o corpo inanimado de sua agora ex-patroa com o vestido azul que ela havia pedido . O tom pesado , duro , cru , cruel , dessa primeira sequência estará presente em quase todos os longos – porque dolorosos – 104 minutos de duração do filme . Uma garota peçonhenta arma uma cilada , e a pobre Johanna cai como um patinho O pastor da igreja de Johanna irá arrumar um novo emprego para ela . Passará a trabalhar na casa de Bill McCauley ( o papel de Nick Nolte , num desempenho inesperadamente contrito , sem os gestos largos e o abuso do vozeirão que em geral acompanham o ator ) , um senhor aposentado , que vive com a neta , Sabitha ( interpretada Hailee Steinfeld , na foto abaixo , a garotinha indicada ao Oscar por sua interpretação na refilmagem de Bravura Indômita ) . Quando Johanna chega à casa de McCauley ,
estão lá também , além do dono da casa e de sua neta , Ken ( Guy Pearce ) e Edith ( Sami Gayle ) . Edith é a grande amiga da garota Sabitha , colega dela de escola , unha e carne . Ken é o pai de Sabitha . Johanna ficará sabendo rapidamente – assim como o espectador – que Marcella , a mãe de Sabitha , está morta . Com o tempo , saberá que ela morreu em um acidente em uma lancha dirigida por Ken – e Ken estava entupido de cachaça e cocaína no momento da tragédia . McCauley responsabiliza o genro pela morte da filha . Na verdade , McCauley acha o genro um absoluto irresponsável – e não é só ele . A mãe de Edith não permite que a filha ande num carro dirigido por Ken . E Ken é de fato – conforme o filme mostrará exaustivamente – um sujeito fraco , sem força de vontade , sem capacidade de trabalho , preguiçoso , indolente . Não chega propriamente a ser um bandido , um mau caráter , um filho da mãe , que se compraz em fazer mal aos outros . Não , não chega a ser isso – é apenas um fraco , um zero à esquerda , um pustema . Ao voltar para Chicago , onde está morando – e onde comprou um motel caindo aos pedaços , que tenta aprumar para com ele ganhar a vida – , Ken deixa um bilhete simpático para Johanna , agradecendo a ela porque a partir de então ela passaria a cuidar de Sabitha . Johanna escreve de volta para ele um bilhete – algo normal , formal . Sabitha e Edith – sobretudo a última – se oferecem para botar o bilhete no correio . Sabitha , um pouco como o pai , não chega a ser uma má pessoa – mas é facilmente influenciável , manipulável por Edith , e esta , sim , é uma figurinha já peçonhenta , embora tão jovem . As duas , lideradas por Edith , escrevem para Johanna uma carta como se fosse de Ken , sugerindo que eles passem a trocar mensagens via e-mail , que é mais rápido . Começa a troca de e-mails – e as garotas falseiam que Ken está vivamente interessado em Johanna . A moça – uma pessoa humilde , de pouco estudo , que não tinha tido oportunidade alguma na vida – cai como um patinho no conto das vigaristas , e acredita que Ken está apaixonado por ela . Lá pela metade , o filme surpreende com uma reviravolta inesperada Quando o filme chegou nesse ponto , aí com uns 20 , talvez 25 minutos de narrativa , Mary e eu pensamos seriamente em parar de ver . Apertar a tecla stop , simplesmente . Parar , desistir . Não que o filme fosse ruim até ali . Não . Os bons atores estão bem dirigidos , os personagens são bem construídos , a narrativa
flui de maneira quase normal , sem invencionices , fogos de artifício . Digo quase normal porque na verdade a diretora Liza Johnson , propositadissimamente , ralenta cada pequeno episódio mostrado . Faz a coisa andar lentamente , penosamente – para realçar que a vida de Johanna anda lentamente , penosamente . Pensamos em parar exatamente por isso – porque é uma vida penosa demais . É uma vida por demais miúda e sem brilho – para usar as palavras do poeta . E , quando essa pobre Johana se vê vítima da maldade extrema das duas adolescentes , algo assim como Madame de Tourvel se vê vítima da vileza combinada do visconde de Valmont e da marquesa de Meurteil em Ligações Perigosas , o clássico de Chardelos de Laclos que Stephen Frears transformou em filme soberbo , achamos que era sofrimento demais para ver numa tarde de feriado ( era a quinta-feira da Semana Santa ) . Acabamos – depois de uma paradinha para parlamentar – indo em frente . Surpreendentemente , o filme deu um drible na nossa expectativa . Deu , literalmente , um drible à la Garrincha – ele indicava que ia para um lado , de repente foi para o lado oposto . Não deixa nunca de ser um drama denso , pesado , amargo . Mas , ao contrário do que imaginávamos – que ele mostraria uma história cada vez mais cruel , desencantada , desenganada – , o roteiro assinado por Mark Jude Poirier , com base no conto “ Hateship , Friendship , Courtship , Loveship , Marriage ” , de Alice Munro , dá uma reviravolta inesperada . Atenção : spoiler . Quem não viu o filme deve pular para o próximo intertítulo É uma reviravolta inesperada – mas não ilógica , irracional , inverossímil . Não vou revelar detalhes , é claro , mas de qualquer forma os próximos parágrafos contêm spoiler . O ótimo colunista Ancelmo Gois , de O Globo , costuma dizer , citando o Barão de Itararé , que de onde menos se espera é dali que de fato não sai coisa alguma . É uma grande verdade – mas toda verdade tem uma ou outra exceção a contradizê-la , e aqui temos uma exceção . De onde menos se espera de repente , uma vez na vida e outra na morte , sai alguma coisa boa . As chanches de sair alguma coisa boa dessa história da pobre coitada dessa Johanna , que parecia condenada à miséria eterna e total , até a morte , com esse infeliz pustema desse Ken eram , como dizia Bob Dylan em uma canção do seu segundo disco , a million to one . Pois às vezes os dados , as cartas , a roleta dão o que é uma chance em um milhão . Não é inverossímil . Já vi isso acontecer , pertinho de mim . E não é ilógico , inverossímil . Johanna parece condenada a uma vida sombria , sem brilho , quase sem vida
– mas tem força , tem vontade , tem determinação . Tem tutano , estômago , guts . Capacidade de trabalho . Ao fim e ao cabo , a trama deste Loveship Hateship , tão árdua , tão dolorosa , faz uma bela defesa da capacidade de trabalho . Nestes tempos de lulo-petismo , roubo-petralhismo , de cotas de todos os tipos e todos os tipos de execração do mérito pessoal , este filme é uma bênção . É como diz a frase monumental de Graciliano Ramos , comunista dos bons : “ Certos escritores se desculpam de não haverem forjado coisas excelentes por falta de liberdade – talvez ingênuo recurso de justificar inépcia ou preguiça . Liberdade completa ninguém desfruta : começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas com a Delegacia de Ordem Política e Social , mas , nos estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei , ainda podemos nos mexer . ” Nos estreitíssimos limites a que sua vida sem brilho , quase sem vida , a condenava , Johanna consegue , com brilhantismo , se mexer . E a diretora Liza Johnson acaba , depois de expor tanta crueza , tanta crueldade , tanta tristeza , inoculando no espectador o virus da esperança . Kristen Wiig é uma atriz que me impressionou muito Por que , entre tantos milhares e milhares de filmes à disposição , escolhi ver este Hateship Loveship ? Essa é uma questão que só interessa a mim mesmo – mas falo um pouquinho aqui sobre isso . Pois é : por que raios um sujeito que tem um site de filmes , com cerca de 2.250 filmes comentados , escolhe para ver Hateship Loveship , em vez de rever para comentar obras absolutamente fundamentais que ainda não estão no site , como , por exemplo , só para ser bem rápido , curto e grosso , Encouraçado Potemkim , Ivan , o Terrível , Intolerância , Nascimento de uma Nação , Jules et Jim , Bye , Bye , Brasil , A Noviça Rebelde , West Side Story , Lugares Comuns , O Regate do Soldado Ryan , A Lista de Schindler , O Bebê de Rosemary , Acossado , O Leopardo ? Eu respondo . É porque isto aqui é para minha diversão . Não é obrigação . Vejo os filmes que simplesmente me dá na telha ver – não apenas porque são importantes e precisam estar no site . O site é uma brincadeira , uma diversão – não pretende ter todos os maiores filmes , os mais importantes , de forma alguma . Jamais pretendeu . E agora respondo especificamente à pergunta que ninguém me fez , mas eu mesmo me faço – sim , mas por que ver exatamente este filme aqui , e não qualquer outro ? Por causa de Kristen Wiig . Peguei para ver este Loveship Hateship porque a atriz principal era Kristen Wiig . A quantidade de atrizes e atores de grande talento que aparecem a cada ano é
algo muito assustador , e então muitas vezes a gente se perde . Mas Kristen Wiig é impressionante . Vi essa atriz numa comédia louca , aloprada , Paul – O Alien Fugitivo ( 2011 ) , e depois num fantástico filme de ação / considerações sobre a condição humana , A Vida Secreta de Walter Mitty ( 2013 ) . No primeiro , ela faz uma cristã xiita bobona , quase debilóide – e , diacho , tem a cara de uma pessoa bobona , quase debilóide . No segundo , ela faz o papel da mulher ideal do protagonista , interpretado por Ben Stiller – uma nova-iorquina esperta , moderna , lindérrima . O rosto que ela exibe num filme não tem absolutamente nada a ver com o rosto que ela expõe no outro – é como se fossem duas pessoas absolutamente diferentes . Em Walter Mitty , ela tem todo o jeito e a cara de uma mulher descolada , moderna , que vive em metrópole – e lindérrima . Uma jovem fadada ao insucesso que ousa brigar com os fados – e derrotá-los Os grandes atores são assim – camaleônicos . Há grandes atores que têm sempre a mesma cara , embora interpretando personagens diferentes : James Stewart , por exemplo , é o mesmo velho e bom James Stewart de sempre , esteja num western de Anthony Mann como Winchester ’ 73 , numa comédia deliciosa de Frank Capra como A Felicidade Não se Compra , ou num suspense de Alfred Hitchcock como Um Corpo Que Cai / Vertigo . Há grandes atores que têm quase a mesma cara em diversos filmes , mas têm interpretações totalmente diferentes entre uns e outros , como Robert de Niro e Al Pacino – preguiçosos às vezes , geniais em outras . Essa moça Kristen Wiig é camaleônica camaleônica mesmo – em cada filme ela tem uma cara , como Meryl Streep , para dar o exemplo mais exemplar , como a maravilhosa Bridget Fonda , que trabalha menos do que deveria . Neste filme aqui , Kristen Wiig está uma jovem mulher triste , desafortunada . Tem uma expressão séria que não sai do seu rosto quase absolutamente nunca . E é mais que séria – é triste , é sem esperança , é quase trágica de tão sem esperança . Quando Paul McCartney e todos os outros autores de belas canções que falam de ordinary people criam suas músicas , seguramente pensam em pessoas comuns , não geniais , não excepcionais , mas não tão tristes , tão marcadamente infelizes quanto essa Johanna Parry de Kristen Wiig . Este Loveship Hateship não chega a ser um grande filme , mas é bom . E a melhor coisa que ele tem , disparado , disparado , é a interpretação dessa fantástica , camaleônica Kristen Wiig como a personagem central . Só uma atriz com as características dessa moça poderia interpretar essa jovem fadada ao insucesso que ousa brigar com os fados – e derrotá-los . Não é
garotinha , é já uma jovem madura . Nasceu em 1973 , no interior do Estado de Nova York , descendente de ingleses , escoceses e irlandeses . Passou pelo famosérrimo programa humorístico da TV Saturday Night Live em 2008 e 2009 e naquele ano foi colocada na lista das 25 mulheres mais engraçadas de Hollywood feita pela Entertainment Weekly . Também por sua participação no Saturday Night Live , teve nada menos de seis indicações ao Primetime Emmy – o Oscar da TV . O que é outra prova de sua versatilidade – já que está maravilhosa neste drama pesadíssimo , sombrio . O primeiro filme em que teve um papel de alguma importância foi Ligeiramente Grávidos ( 2007 ) . Em 2012 , foi uma das roteiristas e uma das atrizes de Missão Madrinha de Casamento / Bridesmaids – e foi indicada tanto ao Oscar de melhor roteiro original quanto ao Globo de Ouro de melhor atriz em comédia ou musical . É necessário registrar que uma atriz extraordinária , das melhores que já houve em Hollywood , faz um pequeno papel neste filme . A fantástica – e também camaleônica – Jennifer Jason Leigh interpreta Chloe , a mulher com quem Ken está tendo um caso em Chicago . Chloe é uma drogada que ajuda Ken a se afundar mais e mais na apatia , na inação . Tenho sentido falta de Jennifer Jason Leigh em mais filmes . Então , para encerrar : este Amores Inversos é um filme pesado demais – mas que , surpreendentemente , revela ao final uma radiosa esperança na capacidade do ser humano de melhorar . Apesar disso , não é um filme que deva ser visto em momentos em que o eventual espectador está triste , pra baixo . Nesse caso , periga provocar depressão profunda . 2 Comentários Grande Sérgio , graaaaaaande Sérgio … rapaz , como vc é bom . Ler sobre os filmes aqui em geral é muito melhor do que vê-los . E vc tem esse jeito de ir contando e informando ao mesmo tempo que é o que há ! ! ! Mas quero te sugerir um desafio , quem sabe te diverte também : criar uma sessão aqui que conte a história dos filmes em uma frase só . Um ponto final só . Tipo : Psicose : secretária dá golpe no patrão , foge com o dinheiro e vai parar numa espelunca de beira de estrada onde acaba morta por fulano , louco de pedra que mantém o esqueleto da mãe no sótão há anos . Que tal ? Grande Heitor ! Você andava sumido … Adorei sua observação . Mas eu jamais conseguiria resumir em uma frase a história de um filme . Eu sou o contrário disso , da capacidade de síntese … Mas você poderia assumir esse desafio , e , sempre que entrasse aqui um filme que você viu , escreveria uma sinopse . Mas sem contar o final das histórias , que aí é sacanagem , ne ?
Um abraço . Sérgio Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * Buena Vida Delivery De : Leonardo Di Cesare , Argentina-França-Holanda , 2004 Nota : Anotação em 2008 : Não é dos melhores da nova safra do cinema argentino , mas , como essa nova safra é excelente , mesmo este filme menor dela tem qualidades . É bem feito , como tudo que los hermanos têm feito ultimamente , com boas atuações . E , como a maioria dos demais filmes argentinos dos últimos anos , consegue falar ao mesmo tempo do macro e do micro , mistura a história pessoal de seus personagens com o pano de fundo da grande História , a situação sempre difícil de um país eternamente à beira de uma crise econômica , ou saindo de uma , ou entrando em outra . É amargo e triste . Como Mary bem notou , deixa o espectador angustiado . O personagem central é um motoqueiro que trabalha numa loja de entregas , a do título ; depois que o irmão emigra para a Espanha , em busca de vida melhor , fica sozinho na sua casa da periferia de Buenos Aires . Generoso , oferece um quarto para uma bela moça que trabalha como frentista num posto de gasolina vizinho ; a moça acaba trazendo para a casa a filhinha , a mãe e o pai – um golpista que vai tomando conta da casa e instala ali uma fabriqueta de churros . Impotente , sem saber direito o que fazer , o rapaz vai engolindo os sapos , um atrás de outro . Teve oito prêmios e três outras indicações . Aparentemente , foi o primeiro filme do diretor e co-roteirista Leonardo Di Cesare , um rapaz nascido em 1968 . 11:14 De : Greg Marcks , EUA , 2003 Anotação em 2007 , com complemento em 2008 : Eis aí um filme surpreendente , com um roteiro muito inteligente . É uma pena que o diretor erre a mão , exagere demais ao criar cenas da mais abjeta violência . Tirando isso , no entanto , é um daqueles assustadores panoramas de como é imbecil a vida numa pequena cidade do maior Império do planeta . O retrato que o cara faz do absurdo de parte da sociedade americana chega a parecer com Caçada Humana / The Chase , do grande Arthur Penn . Todas as pessoas são loucas ou profundamente infelizes ou vazias ou tudo isso junto ; não há absolutamente ninguém que não seja ruim da cabeça e doente do pé ; a violência está presente em tudo , a todo momento . A inventividade do roteiro é descrever sob várias diferentes perspectivas – em cinco histórias que aparentemente não têm nada uma a ver com a outra , mas que de alguma maneira se entrelaçam – um acidente de carro acontecido exatamente às 11h14 da noite , o motivo do título . As histórias são assim :
um motorista bêbado ( Henry Thomas , que no passado foi o garotinho de E.T . , de Spielberg ) bate em alguma coisa sob uma ponte , numa estrada ; um garoto rouba uma loja , com a ajuda de uma amiga que trabalha ali ( o papel de Hilary Swank ) ; uma garota ( Rachel Leigh Cook ) que só pensa em sexo e dá mais que chuchu na cerca diz que está grávida e tenta conseguir dinheiro para fazer um aborto ; um homem ( Patrick Swayze ) acha um cadáver jogado em um cemitério e tenta sumir com ele ; três rapazes dirigindo uma caminhonete atropelam uma mulher , e , na batida , um deles perde um pedaço de seu pau , que cai na rua . Foi o primeiro longa-metragem do diretor e roteirista Greg Marcks , que tinha então apenas 27 anos ; antes deste filme , que é de 2003 , ele havia feito um curta-metragem , Lector , em 2000 , que ganhou dez prêmios . Parece que o filme foi produzido graças a Hilary Swank , essa boa atriz feia mas que ultimamente tem se achado bonita e gostosa . ( Em Dália Negra , de Brian De Palma , por exemplo , ela está toda vamp . ) Ela já havia ganho o Oscar de melhor atriz por Meninos Não Choram / Boys Don’t Cry , em 1999 , e era portanto um nome bom de bilheteria ; leu o roteiro , gostou muito de um personagem e topou trabalhar no filme ; a partir daí o garoto conseguiu atrair outros atores de nome , e grana para filmar . Só em 2008 Greg Marcks voltaria a dirigir : fez um thriller chamado The Gift , com Edward Burns , Ving Rhames e Martin Sheen . Não Somos Anjos / We’re No Angels De : Neil Jordan , EUA , 1989 Nota : Anotação em 2010 : Este Não Somos Anjos , feito em 1989 , é um fenômeno . Raras vezes na história tanta gente de talento e respeito se reuniu para fazer um filme tão absolutamente idiota . O diretor é o irlandês Neil Jordan , que eu pessoalmente acho bastante irregular , mas é celebradíssimo , vencedor de um Oscar ( pelo roteiro original de Traídos pelo Desejo / The Crying Game , de 1992 ) e de 31 outros prêmios , fora 29 outras indicações . O roteiro se baseia numa peça francesa , La Cuisine des Anges , a cozinha dos anjos , de Albert Husson , que já havia sido a origem de um filme homônimo , Não Somos Anjos/We’re no Angels , dirigido em 1955 pelo grande Michael Curtiz , o autor de Casablanca , e estrelado por Humphrey Bogart , Peter Ustinov , Aldo Ray , Leo G . Carroll e Joan Bennett . No original e no filme de Michael Curtiz , três prisioneiros conseguem escapar da Ilha do Diabo , junto da Guiana Francesa , às vésperas do
Natal , acabam invadindo a casa de uma família e – surpresa ! – se tomam de amores por ela . Para criar uma nova trama a partir da idéia básica da peça , os produtores chamaram nada menos que David Mamet , grande , brilhante dramaturgo , roteirista e diretor . Se de Neil Jordan eu , pessoalmente , desconfio um pouco , de David Mamet sou fã de carteirinha . Como se não bastassem todos esses nomes já mencionados , ainda tem mais um : George Fenton , um dos grandes compositores do cinema nas últimas décadas , autor de lindíssimas trilhas para diversos filmes importantes ( Ligações Perigosas , O Pescador de Ilusões , Terra de Sombras , Terra e Liberdade ) , compôs a música . Um insulto à inteligência do espectador Com uns 15 minutos de filme , já dava para ter certeza plena : o filme é uma absoluta porcaria . Nada funciona , é tudo ruim , grotesco , imbecil – é um insulto ao currículo de tanta gente boa envolvida na produção , e , em especial , um insulto à inteligência do espectador . Poderíamos perfeitamente ter parado de ver , com a tranqüila certeza de que não estaríamos perdendo nada que prestasse . Acabamos vendo até o fim – e tudo só vai ficando mais bobo , a mesma piada sem graça se repetindo de novo e de novo e de novo . Boa parte da culpa , acho , é do próprio Mamet . Não sei como , mas ele conseguiu criar uma trama idiota , babaca : dois dos três fugitivos , os interpretados por De Niro e Penn , acabam sendo confundidos por padres famosos , autores de importante livro , e são recebidos como heróis num mosteiro numa cidadezinha americana junto da fronteira do Canadá , nos anos 30 , no fundo da Grande Depressão . A piada – os bandidos fugitivos são instados a fazer alguma declaração ou oração , não sabem o que dizer , acabam dizendo uma asneira qualquer e todos os religiosos babam como se aquilo fosse expressão de grande sabedoria – não tem graça alguma , devido à total falta de sentido , de lógica , de verossimilhança . Mas é repetida umas trocentas vezes . A personagem da mulher interpretada por Demi Moore não tem qualquer sentido , não se sustenta , é uma caricatura . A rigor , tudo , no filme , é uma grotesca caricatura . Mas a caricatura mais grotesca de todas é a que De Niro cria . De Niro passa o filme inteiro com uma careta babaca esculpida no rosto . Como é possível que um ator com o talento de De Niro , o cara que fez Taxi Driver , O Touro Indomável , A Missão , Coração Satânico , tenha se permitido ser tão ridículo ? Como é possível que o diretor Neil Jordan , que afinal de contas é experiente , testado , tenha permitido aquilo ? Não dá pra saber
. Mistério neste mundo de mistérios – embora o maior mistério seja haver mistérios , como diz Renato Teixeira . Consternant , lumbering e lugubrious Algum fanático anti-religioso pode até enxergar no filme uma saudável gozação das crenças católicas . Bobagem . Para fazer crítica é preciso alguma inteligência – coisa de que o filme passa muito longe . Já me alonguei demais numa anotação sobre filme tão vagabundo . Vou a outras opiniões rapidinho , por desencargo de consciência . Vai ver que tem gente que adorou . Ufa : Leonard Maltin dá 1.5 estrela em 4 , e usa uns adjetivos que vou ter que catar no dicionário . Lumbering , dimwitted ( essa até que dá pra sacar – wit é inteligência , dim deve funcionar como sem , não possuidor ) , lugubrious . Olhe , é isso aí – mesmo antes de ver exatamente a acepção dos adjetivos , já concordo : eta filmezinho lumbering , dimwitted e lugubrious . “ Desajeitada comédia sobre uma dupla de condenados estúpidos que inadvertidamente escapam da prisão e encontram refúgio fazendo-se passar por padres em visita a um santuário próximo . De Niro , que também foi produtor executivo , faz caretas como nunca antes . Bela direção de arte não consegue compensar o roteiro lúgubre de David Mamet , ‘ sugerido ’ pela peça que já havia sido filmada em 1955 . ” Não é sempre que concordo com as opiniões de Leonard Maltin , mas acho que desta vez ele acertou em cheio . E lugubrious , obviamente , é lúgubre – belo adjetivo para este que é certamente o pior texto que Mamet já cometeu em toda a sua vida . Já Rober Ebert , que admiro muito , vai na contramão . Dá 3 estrelas em 4 , e elogia as caretas dos dos grandes atores . Diz que na verdade os dois personagens centrais estão fugindo é de um filme dos anos 30 sobre prisões . Como deu empate , recorro ao Guide des Films de Jean Tulard . Hêhê : ele mata em uma frase só , depois de uma rápida sinopse . “ Jordan + Mamet + De Niro – um filme consternador , apesar de tais créditos e Demi Moore no auge ” . O que é verdade : o personagem que ela interpreta não faz sentido , e a câmara do diretor Neil Jordan não pára muito sobre ela , mas Demi Moore está no auge da beleza . Um filme consternador . Consternant , lumbering e lugubrious . Em suma , idiota . [ … ] Barbican Centre , em Londres ) , jamais me esqueci da frase dita por Harry para o grande amigo Jess ( Bruno Kirby ) , que está para se casar com a grande amiga de Sally , Marie ( Carrie Fisher ) : – “ Anotem seu [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * Vício Maldito
/ Days of Wine and Roses De : Blake Edwards , EUA , 1962 Nota : Não é , de jeito nenhum , um filme gostoso nem fácil de ver , este Days of Wine and Roses , no Brasil Vício Maldito , que Blake Edwards dirigiu em 1962 . É um grande filme , um filmaço – mas não é , repito , prazeroso de se ver . É duro , amargo , denso , pesado . É uma angustiante viagem ao fundo do poço do alcoolismo – e o espectador é obrigado a entrar nela , pela maestria da direção , pelo estilo realista , cru , e pelas interpretações extraordinárias de Jack Lemmon e Lee Remick . Como na vida real , não se chega ao fundo do poço do alcoolismo de maneira rápida , abrupta . Bem ao contrário . As primeiras doses dão uma sensação de leveza , de euforia . Os créditos iniciais mostram rosas ao fundo , enquanto vamos vendo os nomes dos atores , da equipe , ao som da canção criada para o filme por Henry Mancini , com letra de Johnny Mercer , que viraria um clássico e teria vida independente do filme . Seria gravada por Frank Sinatra , Tony Bennett , Andy Williams , Perry Como , mais tarde Cassandra Wilson ; viria a ser , como diz a Wikipédia , “ a jazz standard ” , um clássico da Grande Música Americana , como uma obra dos irmãos Gershwin , de Cole Porter ou de Irving Berlin . Nos créditos iniciais , a canção vem com a orquestra de Henry Mancini e afinadíssimas vozes femininas , que cantam os versos bem construídos de Mercer – “ The days of wine and roses laugh and run away like a child at play / Through a meadow land toward a closing door ” . Dias de vinho e rosas . Parece o paraíso . Uma linda moça de faiscantes olhos azuis – e o homem se irrita com ela A primeira sequência se passa em um belo e amplo bar , superpovoado por homens de terno e gravata . Joe Clay ( o personagem interpretado por Jack Lemmon ) tem um copo na mão , mas ainda está trabalhando . Um amigo deu a ele o telefone de uma moça , e ele liga para ela , convida-a a ir , no final da tarde seguinte , a uma festa no iate de um príncipe árabe . Às 18h30 , no cais número tal , uma lancha estará esperando para levá-la até o iate . Ela aceita o convite . Enquanto fala ao telefone , tampando o outro ouvido por causa do vozerio do bar , Joe pede outra dose ao barman . Veremos que a cidade é San Francisco , e que Joe trabalha numa grande agência como relações públicas . The public relations man , como será definido num diálogo logo adiante . Seu trabalho inclui recrutar moças bonitas , atraentes , que saibam se vestir bem
, e levá-las a festas promovidas por ou para alguns de seus clientes . Às 18h30 do dia seguinte , ele está numa lancha num dos cais de San Francisco em meio a seis belas mulheres , vestidas para festa noturna , embora ainda seja dia . Chega então de táxi uma moça loura , de faiscantes olhos azuis . ( Os olhos de Lee Remick são tão faiscamente azuis que a gente vê a cor deles mesmo no preto-e-branco deste filme , e também no de dois outros grandes da mesma época , Escravas do Medo / Experiment in Terror , do mesmo Blake Edwards , do ano seguinte , 1963 , e Anatomia de um Crime , de Otto Preminger , de 1959 . ) É linda , mas não está vestida para festa para agradar aos amigos de um príncipe árabe . Usa roupas elegantes , mas formais , do tipo que se usa em escritórios . Irritado , em voz alta , Joe dá bronca nela : – “ Você está atrasada . E está vestida do jeito errado . Era para ser um vestido de coquetel . ” Kirsten Arnesen – veremos que esse é o nome da personagem interpretada por Lee Remick – não dá a mínima bola para aquele sujeito . Quando a lancha encosta no belo iate , ele ainda tenta dar uma bronca nela . Ela embarca primeiro no iate , e entrega alguns papéis ao homem que está ali para receber as moças . Joe não conhecia ainda o homem , o sr . Trayner ( Jack Albertson ) , que vem a ser o cliente de sua agência , o homem de negócios que , por algum motivo , quer agradar o príncipe árabe levando para seu iate meia dúzia de louras elegantes , gostosas – e que topam um programa . Trayner cumprimenta o homem de relações públicas , e comenta que ele então já havia conhecido sua secretária , Kirsten . A primeira fala de Kirsten-Lee Remick é : – “ Bem , não oficialmente . Ele estava muito ocupado ” . Mas Trayner já nem estava prestando atenção : olhava para as moças que Joe havia trazido . Olhava e gostava do que via . Joe tinha dado um tremendo fora com a secretária de seu cliente , mas seu cliente parecia satisfeito com o material que ele trouxera para o iate . Solitária , Kirsten aceita o convite de Joe e saem para jantar No dia seguinte , um arrependido Joe vai ao imenso escritório da empresa de Trayner , levando um presentinho para a secretária que ele havia confundido com uma das acompanhantes , escort girls , call girls , party girls . O termo exato – puta – não será usado em momento algum , embora Joe mais tarde vá usar a palavra pimp , cafetão , para descrever a si próprio . O segundo encontro entre Joe e Kirsten é tão desastrado quanto o primeiro . Kirsten mantém-se fria , distante –
e , além de tudo , detesta biscoitos de amendoim , o presentinho escolhido por Joe como uma oferta de paz . Depois de alguns momentos extremamente embaraçosos , no entanto , de repente Kirsten muda completamente de atitude e resolve aceitar o convite para jantar com aquele sujeito que havia sido grosseiro , mal educado . É uma mudança de atitude sem dúvida brusca demais , exageradamente brusca , e até um tanto inverossímil . Mas há uma desculpa para isso . Veremos depois que Kirsten – apesar de sua beleza espantosa – é uma jovem muito solitária ; chegou há pouco a San Francisco , ainda não tem amigos , mora sozinha num apartamento que segundo ela é cheio de baratas . Havia sido criada ali mesmo , na região da Baía de San Francisco , mas na área rural . Seus pais , imigrantes noruegueses , sempre viveram de vender flores , plantas e pequenas árvores que cultivam no seu sítio . Poucos meses antes , ela havia se cansado de viver na área rural e se mudado para a cidade . Kirsten toma a primeira gota de álcool da vida . Estamos com 18 minutos de filme Vão jantar juntos , aqueles dois seres solitários , depois de terem sido extremamente ríspidos um com o outro . Joe manda brasa no uísque . Até aquele dia , Kirsten jamais havia bebido álcool . Sua paixão , ela conta , é chocolate . Joe levanta-se , vai até o barman e encomenda sem que ela ouça um Brandy Alexander – conhaque e chocolate . A princípio , Kirsten não quer , mas Joe insiste : é especial , tem chocolate . Ela dá um pequeno golinho – e gosta . Estamos com exatos 18 minutos de filme . Deveria haver mais filmes sobre o vício É difícil ver Days of Wine and Roses e não lembrar de The Lost Weekend , que Billy Wilder lançou em 1945 , 17 anos antes , portanto , do filme de Blake Edwards . No Brasil , The Lost Weekend recebeu o título de Farrapo Humano . Farrapo Humano em vez de O Fim de Semana Perdido . Vício Maldito em vez de Dias de Vinho e Rosas . Os exibidores brasileiros gostavam de títulos dramáticos , exagerados , com um gosto de tango argentino ou bolero mexicano . Dramáticos , exagerados – mas não propriamente errados . O personagem de Ray Milland na obra-prima de 1945 é , sim , um farrapo humano , e o vício é mesmo maldito . Qualquer vício de droga forte – heroína , crack , cocaína , álcool . “ Lost Weekend moderno passado em San Francisco , com Lemmon se casando com Remick e a levando ao alcoolismo ” , define Leonard Maltin em sua resenha , que vem acompanhada da cotação de 3.5 estrelas em 4 . “ Direção realista e texto sem meios-termos se combinam para dar excelente resultado . ” O CineBooks ’ Motion Picture Guide – que dá ao
filme 4 estrelas em 5 – diz : “ De tempos em tempos Hollywood decide fazer um filme sobre alcoolismo . Ray Milland em The Lost Weekend ( 1945 ) foi um , Jimmy Cagney em Come Fill the Cup ( 1951 ) foi outro , e o retrato de Lemmon como um cachaceiro deve figurar junto com os citados anteriormente . ” ( O termo que o CineBooks ’ usa é boozer , de booze , o substantivo para designar bebida de uma maneira geral , com um tom depreciativo . Gosto de usar cachaça como sinônimo de booze ; mais que aguardante de cana , pinga , o substantivo cachaça é a designação genérica de qualquer bebida forte . ) Me deixou indignado essa forma com que o CineBooks ’ se refere ao filme . Como se fosse um absurdo que houvesse mais de um filme sobre alcoolismo . A cada ano são feitas centenas de filmes sobre assassinos , ladrões , bandidos das mais variadas espécies . Há mais filmes sobre bandidos do que sobre gente como a gente , gente comum – e não há no mundo mais bandidos do que gente como a gente . E seguramente há muito mais bêbados no mundo do que assassinos . Deveria é haver muito mais filmes sobre vício . Na minha opinião , este é um dos dois melhores filmes sobre alcoolismo jamais feitos Nunca vi esse filme de 1951 com James Cagney , e na verdade jamais tinha ouvido falar dele . Degradação Humana , chamou-se no Brasil , confirmando o que eu disse sobre a escolha de títulos que parecem nomes de tango . Foi dirigido por Gordon Douglas – um realizador mediano , não mais que isso . Na minha opinião , The Lost Weekend e este Days of Wine and Roses são os dois melhores filmes já feitos sobre alcoolismo . Acho que todos eles são importantes . E na verdade todos eles têm qualidades intrínsecas , são bons filmes fora o fato de abordar esse tema fundamental . O inferno do alcoolismo a dois consegue ser pior do que o de um único cônjuge Days of Wine and Roses tem uma importância especial : é o único desses filmes citados acima que trata do alcoolismo quando ele se transforma numa doença do casal , uma espécie , bastante deletéria , de folie à deux . Em The Lost Weekend , o personagem de Ray Milland enfrenta o inferno sozinho . A mulher que o ama é sóbria como um juiz . Dos filmes sobre alcoolismo que conheço , este aqui é o único que mostra um casal em que um alimenta o vício do outro . O inferno do alcoolismo a dois , mostrado no filme de Blake Edwards , consegue ser pior do que o de um único cônjuge . ( A palavra é horrorosa , mas não existe outra . ) Regina Lemos dizia que os encontros não são uma pessoa + uma pessoa . Um casal não é uma simples
soma – o que uma pessoa mais outra juntas formam depende de diversos fatores . Num encontro , as duas pessoas potencializam suas especificidades . Cada relação se constrói de acordo com a forma com que se combinam as características individuais . Podem ser duas pessoas positivas mas que , juntas , formam uma união que rola escada abaixo ; e às vezes pode haver um encontro de uma pessoa que tende mais para a tristeza com outra , que , com a união , forma um casal que vê a vida com a tendência de ir morro acima . O que o filme de Blake Edwards mostra é exatamente isso . Quando dois viciados se unem , a tendência é que ajam como náufragos : o mais desesperado vai sempre puxar o outro para baixo . Na vida não existe fast forward . O cinema é mais belo que a vida A seqüência da recaída , dos dois desesperados que puxam um ao outro primeiro para a rápida euforia que a cachaça dá , e em seguida para o fundo do poço , e que acontece quando o filme está bem no meio , é uma das coisas mais pavorosas que já vi no cinema – e talvez até na vida real . Pensei seriamente em parar de rever o filme – ou em dar um fast forward para não enfrentar tanta dureza , tanta angústia , tamanho desespero . Se na vida fosse possível dar fast forward como se dá nos filmes , que maravilha seria a vida . No momento em que estamos em algum dos muitos fundos de poço com que a vida nos brinda , simples – apertamos uma tecla , vamos para o capítulo seguinte . Infelizmente , o cinema é mais belo que a vida . Na vida não existe fast forward . Aquela sequência em que Joe-Jack Lemmon vai até a estufa à procura da terceira garrafa é uma das mais tristes , desesperadas , angustiantes , dolorosas , doloridas que há no cinema . Que jamais houve . E aí talvez o espectador pense que já chegou ao fundo do poço . Errado . O fundo do poço é sempre mais fundo . A seqüência do motel , bem mais tarde , é ainda mais furiosamente angustiante , desesperante . O filme realça , sem meios-termos , para usar a expressão de Leonard Maltin , como é impossível a convivência de um viciado com um viciado que tenta ficar limpo . Para quem está bêbado , é uma afronta , um acinte , uma agressão o fato de o ex-companheiro de bebedeira não estar bebendo . Essas duas sequências – a da primeira recaída , que prossegue na estufa , e a do motel – são de doer , de doer feio , fundo . São extraordinariamente belas , em termos de arte – e extraordinariamente cruéis , dolorosas . Há viciados que conseguem sair – aleluia ! Mas a possibilidade é pequena A possibilidade de happy ending para os viciados
é pequena . Existe , sim . Eu pessoalmente conheço alguns casos de gente bem próxima de mim , e digo a eles todas as aleluias que podem ser ditas . Mas a possibilidade é pequena . Billy Wilder , um artista que era tudo menos um otimista , um believer , evidentemente não tinha interesse algum em arranjar um happy ending para o bêbado interpretado por Ray Milland em The Lost Weekend . No entanto , foi forçado pelo estúdio , pelos produtores , pelos distribuidores , a inventar um final feliz – uma coisa que não combina em nada com todo o resto do filme . Pode ter sido uma questão de tempo : em 1962 as coisas talvez fossem um pouco melhores do que eram em 1945 entre criador de um lado e , de outro , os produtores , a maior ou menor rigidez da censura , as normas de comportamento da própria sociedade . Blake Edwards conseguiu o que Billy Wilder não pôde : Days of Wine and Roses não tem happy ending . Não chega a não ser o horror dos horrores , como foi , por exemplo , o fim de À Procura de Mr . Goodbar / Looking for Mr . Goodbar , maravilha de filme que Richard Brooks fez em 1977 . Mas , ao contrário do filme de Billy Wilder , e exatamente como Billy Wilder gostaria de ter feito , Days of Wine and Roses passa longe do final feliz . E aí repito : a possibilidade de happy ending para os viciados é pequena . Melhor , muito melhor seria sair fora antes que a queda no inferno fosse inevitável . Depois da submissão total ao vício , é difícil imaginar enfrentar a vida sem a droga . Tudo parece sem graça , bobo , imbecil , vazio , sujo . Days of Wine and Roses mostra isso com todas as letras . Jack Lemmon e Lee Remick foram indicados ao Oscar , mas não levaram A frase ‘ dias de vinho e rosas ” vem – como a personagem interpretada por Lee Remick mostra – de um poema . O verso que Kristen cita é o seguinte : “ They are not long , the days of wine and roses : Out of a misty dream Our path emerges for a while , then closes Within a dream . ” Segundo a Wikipedia , são versos do poema “ Vitae Summa Brevis ” , de autoria de Ernest Dowson ( 1867–1900 ) . O filme teve cinco indicações ao Oscar : ator para Jack Lemmon , atriz para Lee Remick , direção de arte em preto-e-branco , figurinos em preto-e-branco , canção . Venceu apenas nesta última categoria . Muitas canções vencem o Oscar e desaparecem na poeira da história . “ Days of Wine and Roses ” , como já se falou lá acima , virou um clássico , um standard ; poderia não ter levado o Oscar , viraria standard do mesmo jeito . Teve
quatro indicações ao Globo de Ouro – filme na categoria drama , direção , atriz , ator . Não levou nenhum . A Academia costuma cometer injustiças bravas . Mas , naquele ano , a disputa era feia . Jack Lemmon concorria com Peter O’Toole em Lawrence da Arábia , Burt Lancaster em O Homem de Alcatraz , Marcello Mastroianni em Divórcio à Italiana e Gregory Peck em O Sol é para Todos . Gregory Peck , interpretando Atticus Finch , um dos personagens mais extraordinários já mostrados em um filme , levou o prêmio . A disputa pela estatueta de melhor atriz era tão dura quanto a pela de melhor atriz . Lee Remick disputava com Katharine Hepburn em Longa Jornada Noite Adentro , Bette Davis em O que Aconteceu com Baby Jane ? , Geraldine Page em Doce Pássaro da Juventude , e Anne Bancroft em O Milagre de Annie Sullivan . Anne Bancroft , em um desempenho extraordinário , um tour-de-force absurdo , levou o prêmio . Credo em cruz . Ao ver o nome desses atores e desses filmes que concorriam aos Oscars de 1962 , é difícil não pensar aquela coisa : como o cinema já foi melhor . Mas isso pode ser só bobagem de velhinho nostálgico – embora eu não seja nostálgico . Sou velhinho , mas nunca fui e não sou nostálgico , de forma alguma . Para encerrar , gostaria de situar cronologicamente Days of Wine and Roses na obra desse realizador talentosíssimo que não tem o devido reconhecimento . Blake Edwards tem uma filmografia ampla que passa pelos mais diversos gêneros . É autor ou co-autor de 66 roteiros , e dirigiu 47 filmes . Acabou tendo seu nome associado mais aos filmes da série A Pantera Cor-de-Rosa , mas , da mesma maneira com que fez comédias engraçadíssimas , soube fazer belíssimos dramas . Em 1959 , fez Anáguas a Bordo / Operation Petticoat , uma comédia deliciosa . Em 1961 fez Bonequinha de Luxo / Breakfast at Tiffany’s , aquele luxo absoluto . Em 1962 , fez dois dramas em preto-e-branco , ambos com Lee Remick – este Days of Wine and Roses e o ótimo Escravas do Medo / Experiment in Terror . 4 Comentários Ainda não consegui assistir este filme … e como quero . Gosto demais do Lemmon e da Lee Remick . Ela , além de ótima atriz , era também uma mulher muito linda . Mas , “ Farrapo Humano ” já assisti tres vezes ; duas na TV e uma em filmes online . Ray Milland era um grande ator . “ Days of Wine and Roses ” nem é preciso dizer o quanto esta música é linda , lindíssima . Mancini estava inspiradíssimo quando a compôs . Tenho esta musica em LP – é , ainda os guardo – com ele ( Mancini ) e também com Ray Conniff , para mim , o maior de todos . Aliás , me desculpe Sergio mas , as vozes femininas maravilhosas que voce
cita nos créditos iniciais não seriam das ” meninas ” do coral de Ray Conniff ? Me desculpe , por favor mas , é só curiosidade e confirmação ou não . Como eu disse , ainda não vi o filme mas existe um clipe no Youtube que mostra esse trecho da abertura do filme e a musica com o Conniff . Não sei se colocaram a musica em cima das imagens . Ainda tenho esperanças de ver este filme via online ou no TCM ou no CULT , quem sabe ? Um abraço ! ! As letras de Mercer foram muito bem colocadas , como apontado por você , Sérgio . Na continuidade , da sua citação , “ towards an open door , that wasn’t there before ” , tem-se uma fantástica descrição da evolução da drogadição : ela parece “ abrir uma nova porta para a vida ” , uma porta que não estava lá ; porém , ultrapassados seus umbrais , ela fecha-se miseravelmente e o indivíduo vê-se aprisionado . O poema é maravilhoso , porque diz muito mais do que aquilo que está escrito ! Os comentários foram excelentes , uma autêntica aula : muito obrigado ! Osmir Um Trackback [ … ] ao longo da narrativa , tanto quanto bebe o casal interpretado por Jack Lemmon e Lee Remick em Vício Maldito / Days of Wine and Roses ( 1962 ) , tanto quanto bebe o personagem feito por Ray Milland em Farrapo Humano / The Lost Weekend [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * A Isca / L’Appat De : Bertrand Tavernier , França , 1995 Nota : Anotação em 1997 : A caixinha do filme diz que o filme ganhou o Urso de Ouro em Berlim , 1995 . No Festival de Gramado , ganhou melhor atriz e melhor montagem . Acho muito incenso , desproporcional ao que o filme é – mais um filme francês mostrando as barreiras sociais e como os jovens da classe média e média-alta são amorais , ambiciosos , egoístas , sem qualquer tipo de valor moral . ( Assim , sem fazer esforço , dá pra lembrar Um Estranho na minha Casa , com Belmondo e Cristiana Reali , Viver e Amar , que vi no final de 1996 no cabo e Loulou , aquela bobagem ; isso sem falar em Os Ladrões , do Téchiné , em tudo superior a este da Tavernier . ) Não que o filme seja uma merda . Não é . Os atores são bons , inclusive os três jovens principais ; a violência é mostrada de forma crua e forte que incomoda o espectador , dá engulho ; Tavernier usa muita câmara de mão e planos longos , bem feitos ; há uma óbvia denúncia da desestruturadora influência da cultura americana , especialmente os filmes que exaltam a violência . Mas é tudo muito sem qualquer emoção ou brilho especial . Nathalie tem 18
anos , é classe média média , trabalha numa loja de roupa , mora em apartamento que ganhou da mãe e sonha vagamente com a possibilidade de virar manequim ou cantora ou atriz – e Tavernier parece dizer que esse é o sonho de toda menina parisiense . Fez colegial , e não tentou faculdade . É tida como burrinha ; não é capaz de entender piadas , por exemplo . É despreocupadamente amoral ; frequenta um bar elegante , usa o maître para marcar encontros com homens ricos ou influentes que possam eventualmente ajudá-la na vida ; nos encontros , nunca chega às vias de fato , mas usa todas as armas para seduzi-los com a implícita possibilidade de um novo encontro no futuro . Numa agenda , guarda os cartões dessas pessoas ricas , com anotações sobre os contatos e os bens materiais que elas possuem . Nathalie mora com o namorado , Eric , filho de judeus ricos que querem que ele arranje trabalho , e por isso vão diminuindo a mesada , cortando a conta bancária . Eric ( como tantos outros jovens da classe média e da média alta mostrada nos filmes franceses ) não acredita em hard work . Assiste sem parar a filmes americanos ( diz que os filmes franceses são chatos ) , em geral thrillers cheios de violência , e quer ficar rico rapidamente , e ir para os Estados Unidos , onde será dono de uma rede de lojas , não importa bem de quê . Eric tem uma relação não bem explicada com Bruno , um rapaz pobre , humilde , um excluído , que resolveu acolher – na casa de Nathalie , bem entendido . ( À casa dos pais ele não leva Bruno ; sequer leva Nathalie – o que a deixa grilada . ) Pois bem : Eric e Bruno resolvem juntar capital pra vencer na América roubando . E usam para isso a agenda de Nathalie . A idéia é que ela marque encontro com algum desses homens em sua casa , e dê um jeito de deixar as portas abertas para que os dois entrem e roubem . Depois de algumas tentativas frustradas , entram na casa de um advogado ; quando não encontram dinheiro nem cofre com fortunas , começam a espancar o pobre homem ; para não dar na vista que Nathalie era a isca , a amarram também , e a levam para outro cômodo ; para amedrontá-lo , dizem que mataram Nathalie ; como ele não diz onde guarda sua fortuna ( seguramente porque não tem fortuna alguma em casa ) , e ele suspeitaria da armação se visse Nathalie viva , resolvem matá-lo . O serviço é executado por Bruno , enquanto Nathalie põe fone de ouvido e ouve música alto no cômodo ao lado . Não há remorso , não há crise de consciência , não há absolutamente nada parecido com isso . Para os jovens parisienses de hoje , parece dizer o Tavernier , a vida humana
é como mostram os filmes americanos : vale tanto quanto a vida de uma barata , ou uma pulga . Nathalie faz muxoxo de criança enquanto ouve música para não ouvir os gemidos de dor do homem que ela atraiu para o assalto e primeiro está sendo espancado e depois assassinado . Não tem qualquer consciência de absolutamente nada . É o produto de uma sociedade insana , apenas . Há um segundo assassinato , que cabe , pela regra da alternância lembrada por Bruno , a Eric . A vítima ( interpreta pelo lelouchiano Richard Berry ) tenta amolecer Eric , dizendo que é judeu como ele , que tem um filho de cinco anos ; Eric não consegue matar com revólver , e pede a Bruno que vende os olhos e a boca da vítima ; executa o serviço com 30 golpes de estilete . Se você não viu o filme , não leia a partir de agora Nathalie começa a dar sinais de enfado , não por qualquer razão moral , mas porque o cheiro deles depois dos assaltos e assassinatos não é bom , e incomoda muito a ela o fato de eles usarem seu bidê para lavar as roupas manchadas de sangue . Conta o que aconteceu para uma amiga , Karine , sem qualquer preocupação de que ela possa contar à polícia . E em seguida é presa na loja em que trabalha . Depois de tentar negar autoria durante algum tempo , conta tudo , assegurando que não fez nada , que os dois é que fizeram tudo . A cena final é muito boa e forte . Close no rosto dela ( é uma atriz bonitinha , nada esplendoroso , mas bonitinha , de uma beleza bem comum , bem gostosinha , tipo mignon ) . Depois de assinar a confissão , ela se vira para cima , para o policial que está de pé , e diz : “ Bem , agora que já acabou tudo eu posso ir embora , não é ? Vou passar o Natal com meu pai ” . As Palavras / The Words De : Brian Klugman e Lee Sternthal , EUA , 2012 Nota : As Palavras / The Words é um filme que fala sobre livros – livros , e honestidade . O nome do filme é o nome de um livro que um dos personagens está lançando , e que , por sua vez , conta a história de um escritor que está lançando um livro . Fascinantemente , As Palavras não se baseia em um livro , e sim numa história original escrita para o cinema . E , na minha opinião , a melhor qualidade desse filme sobre palavras , livros , é a trilha sonora , de autoria de Marcelo Zarvos . Leio os parágrafos acima para Mary , aqui ao lado , e ela não concorda : diz que a trilha sonora é , sim , belíssima , mas que o filme tem muitas outras qualidades . Não discordo
dela neste ponto específico : o filme tem muitas qualidades . Mas , na minha opinião , a trilha de Marcelo Zarvos é a maior delas . Dos filmes que vi recentemente , duas trilhas me impressionaram de maneira especial : a de W.E . – O Romance do Século , de Madonna , sobre o romance da americana Wallis Simpson com o príncipe Edward , depois rei Edward VIII da Grã-Bretanha , e a deste As Palavras . Da mesma maneira que W.E . , da mesma maneira que nove entre dez filmes recentes , As Palavras não tem créditos iniciais . A moda de não haver créditos iniciais pegou de vez , não tem jeito . E então o pobre coitado do espectador ou bem examina a ficha técnica do filme que vai ver na internet – e aí corre o risco de ver spoilers absurdos , porque muitas sinopses insistem em contar coisas sobre a trama que o filme só vai revelar lá pela metade – , ou bem vê o filme sem saber quem dirigiu , quem são os atores , quem fez a música , quem fez a fotografia . Exatamente como havia acontecido com W.E . , vi As Palavras impressionado com a trilha sonora – e sem saber quem era o raio do compositor . Fiquei imaginando quem poderia ser : Alexandre Desplat ? Rachel Portman ? Jan A.P.Kaczmarak ? Zbigniew Preisner ? Patrick Doyle ? Quem sabe Philip Glass ? Não levava jeito de ser um dos mais manjados compositores americanos , tipo John Williams ou Hans Zimmer . Parecia mais um europeu – ou um americano próximo do erudito , como Philip Glass . O autor da trilha sonora de W.E . não era nenhum desses nomes – era de alguém de quem eu nunca ouvira falar , Abel Korzeniowski , um polonês da Cracóvia . Quem escreveu a maravilhosa trilha de As Palavras – o espectador fica sabendo depois que o filme termina – é Marcelo Zarvos . Marcelo Uchoa Zarvos , nascido em São Paulo em 1969 , um ano depois que cheguei à cidade da qual não saí mais . Aparentemente , saiu de São Paulo tão jovem quanto eu cheguei , e radicou-se nos Estados Unidos , onde estudou no Berklee College of Music . Sua página pessoal na internet – em inglês , naturalmente – diz que ele é um pianista e compositor brasileiro que tem escrito para praticamente todos os meios , de dança às salas de concerto , filmes , televisão e teatro . É extraordinário : uma busca no site 50 Anos de Filmes localiza sete filmes com trilha sonora assinada por Marcelo Zarvos . E aí pergunto , à toa : quantas reportagens sobre Marcelo Zarvos o eventual leitor já viu nos jornais e revistas e TV ? Um escritor faz a leitura do início de seu livro para um auditório cheio A primeira tomada de As Palavras , enquanto o espectador ouve a música envolvente , impressionante , de Marcelo Zarvos
, mostra uma mesa organizadíssima em um belo escritório , em que está um livro de capa dura , grosso , cujo título é absolutamente visível : The Words . Um homem chega perto da mesa , em plano americano . Não vemos seu rosto . Está de terno , gravata . Recolhe as poucas coisas que havia sobre a mesa – uma caderneta com algumas fichas anotadas , um chaveiro , uma caneta , o livro . Guarda aqueles objetos no paletó , nos bolsos da calça . Fecha o paletó , abotoa . Alisa o paletó cuidadosamente , e pega o livro . Corta , e na tomada seguinte vemos que o personagem é interpretado por Dennis Quaid . Ele se olha no espelho , dá mais um acertozinho na gravata . A tomada ainda é esta – Dennis Quaid se olhando no espelho - , mas já ouvimos palmas . O diretor do filme , seja ele quem for , porque o espectador só saberá seu nome nos créditos finais , daí a 95 minutos , usa aquele recurso espertinho , aquele suave fogo de artifício , de colocar numa tomada anterior o som de ação que só irá acontecer na tomada seguinte . As Palavras foi escrito e dirigido por uma dupla , Brian Klugman e Lee Sternthal . É o primeiro longa-metragem dirigido por cada um deles . Os dois são também os autores do roteiro original deste filme sobre palavras , escrito diretamente para o cinema , e não para as páginas de um livro . Corta . Plano geral do momento seguinte : vemos Dennis Quaid de costas , diante de um auditório de bom tamanho , lotado . As palmas que se insinuaram no plano anterior continuam , é claro – agora é que é a hora delas . Corta . Plano Americano no contracampo – vemos Dennis Quaid da metade do peito para cima , diante de dois microfones e uma pequena bancada . Corta . Plano Americano no contracampo – vemos Dennis Quaid da metade do peito para cima , diante de dois microfones e uma pequena bancada . A música de Marcelo Zarvos sobe – e vemos o que o livro que o autor começa a ler relata . Uma rua , a chuva , a porta de um hotel elegante . A voz de Dennis Quaid , lendo as palavras que o personagem que ele interpreta , o escritor Clay Hammond , havia escrito , agora se sobrepõe às imagens que mostram a história que seu livro começa a contar . – “ Ficou observando Rory e Dora Jensen dirigirem-se à limousine . De alguma forma , parecia que os pingos da chuva não o atingiam . ” É uma maravilhosa tomada , enquanto ouvimos Dennis Quaid-Clay Hammond com a voz agora em off : debaixo da chuva , a câmara faz um zoom da rua para a calçada , a entrada do hotel ; vemos os personagens Roy Jensen e sua mulher Dora entrando na imensa limousine
; o zoom continua , por sobre a limousine , o porteiro do hotel que acompanhou o casal até o carro já se foi , e então a câmara se aproxima do velho , com uma capa cáqui , chapéu cinza . Corta , e o velho está entrando em um pequeno quarto de hotel . Anda encurvado , sob o peso da idade . A música de Marcelo Zarvos domina a cena . O velho toma água da pia , a porta do pequeno armário aberta mostrando remédios . Ele fecha a porta do armário , vemos o rosto do velho refletido no espelho : é Jeremy Irons . Jeremy Irons aparece fortemente maquiado para parecer bem mais velho Jeremy Irons estava com apenas 64 anos quando o filme foi lançado , em 2012 . Ele é de 1948 , só dois anos mais velho do que eu . Em As Palavras , aparece duramente maquiado para parecer muito , muito mais velho do que 64 anos . Se fizermos as contas , o personagem de Jeremy Irons – que não tem nome , é apenas O Velho – teria que ter nascido em torno de 1926 . Se o filme se passa na época atual , na época em que foi feito , O Velho estaria então com uns 86 anos . Corta . Da tomada do velho diante do espelho , passamos para a limousine que transporta Rory e Dora Jansen ( interpretados por Bradley Cooper e Zoë Saldana ) para a cerimônia em que um prestigiadíssimo prêmio literário será entregue a Rory por seu livro de estréia , “ As Lágrimas da Janela ” . Uma mulher belíssima se aproxima do escritor no intervalo da leitura Então , recapitulando : As Palavras conta a história de Clay Hammond , um escritor de sucesso que acaba de lançar um novo livro , chamado As Palavras , que por sua vez conta a história de um escritor , Rory Jansen , que acaba de lançar seu primeiro livro , As Lágrimas da Janela , que foi de imediato um tremendo sucesso de público e crítica . No livro de Clay Hammond , fala-se de cara de uma figura de um Velho – estranho ? sinistro ? misterioso ? todas as alternativas anteriores – que é assim uma espécie de fantasma , de assombração , que está de olho no autor do livro dentro do livro . Neste ponto , estamos com menos de cinco minutos de filme . Para não dar spoiler , não vou adiantar mais nada da trama do filme que conta a história de um livro dentro de outro livro – a não ser que , quando Clay Hammond termina de ler a Parte Um de seu livro As Palavras , uma bela mulher entra na história . Ela chega à leitura do livro pelo autor depois que esta havia começado . E , de alguma maneira , consegue chegar à festa nos bastidores e se aproximar de Clay Hammond . Chama-se , veremos quando
a narrativa já está bem adiantada , Daniella , e é interpretada por Olivia Wilde , essa jovem belíssima que parece ter chegado com tudo . Wilde , como Oscar . Como se já não bastassem todos os livros dentro de livros , toda a metalinguagem . Depois do intervalo , Clay Hammond volta ao auditório , e lê para a audiência a Parte Dois de seu livro . Por que raios as pessoas pagam para ouvir um autor lendo seu livro ? Me peguei pensando : mas isso de fato ocorre , nos Estados Unidos – leituras de uma obra pelo próprio autor ? Centenas de pessoas pagam por uma cadeira em um auditório para ouvir o autor lendo seu próprio livro ? Mas por que raios essas pessoas não vão simplesmente a uma livraria , compram o livro e o lêem em casa ? Bem , talvez seja assim que as coisas aconteçam em Manhattan . Pode perfeitamente ser assim . Não tenho a mínima idéia de como as coisas acontecem naquela ilhota que é o umbigo do mundo , o umbigo do capitalismo , o umbigo do umbigo . Mas , em nome da lógica , me pergunto : faz sentido um autor ler , num auditório , dois terços de um livraço que parece ter umas 600 páginas , para um público pagante e aparentemente fascinado ? Três interpretações marcantes , belíssimas , dos atores principais Em As Palavras , o filme , me deixaram impressionado as interpretações de Bradley Cooper , Dennis Quaid e Jeremy Irons . Na minha opinião , são a melhor coisa do filme , depois da extraordinária trilha sonora de Marcelo Zarvos . Jeremy Irons é um ator soberbo , dos melhores que há , tenham eles 5 ou 90 anos . Um pequeno gesto , um simples olhar de Jeremy Irons é capaz de transmitir mais emoções do que duas dúzias de novelas da TV Globo . Me pareceu que Jeremy Irons optou , ao interpretar O Velho , por alternar dois tipos de atuação : uma suave , contida – nas cenas em que não fala – e outra suavemente exagerada – nas cenas em que O Velho conta sua história . Quando está overacting , cigarro nas mãos , na boca , parece estar brincando de exagerar . Fala em inglês americano , ele , inglesérrimo da Ilha de Wight . Jeremy Irons saberia fazer qualquer sotaque do mundo – exatamente como Meryl Streep , um ano mais nova que ele , que contracenou com ele em A Mulher do Tenente Francês . Mas tudo bem , eu posso estar enganado sobre os sotaques . Dennis Quaid também me pareceu estar uma ou duas oitavas acima do tom . Me pareceu estar representando um personagem . Mas isso é perfeito , porque seu personagem , afinal de contas , é um escritor de sucesso , e os escritores de sucesso e ego gigantesco costumam ser atores que interpretam tipos . A melhor interpretação do filme , me pareceu
, é a de Bradley Cooper , esse jovem ator tão bem dotado , inclusive de fina estampa . Bradley Cooper me pareceu terrivelmente real no papel do escritor tomado por angústia , dúvida , amargura . Não vi ainda O Lado Bom da Vida , o filme pelo qual ele foi indicado ao Oscar de melhor ator , mas o fato é que sua interpretação como o pobre Rory Jansen me parece merecedora de tudo quanto é prêmio . É um filme extremamente bem realizado . Mas não cheguei a gostar dele Então , considerações finais . As Palavras é um filme extremamente bem realizado . Aborda tema importante , fundamental : a honestidade . Tem ótimos atores , ótimas interpretações . Tem um detalhinho que adoro – o casal inter-racial , essa coisa que por lei foi proibida em diversos Estados americanos até meados dos anos 1960 . Se houvesse mais mestiços no mundo , se fôssemos todos mestiços , talvez houvesse menos guerras , tumultos , cotas , pentelhações , palhaçadas , spikelees . Tem uma trilha sonora extraordinária . Mas … Sei lá . Por algum motivo , não me envolvi muito com o filme . Achei bom , mas não cheguei a gostar muito dele . É um filme que trata de honestidade , e de alguma maneira ele me deixou uma sensação de falsidade . Talvez as histórias do livro dentro do livro sejam menos interessantes do que deveriam ser . Talvez a coisa do imenso sucesso de um livro novo – que não conta uma história nada especial – tenha me incomodado . Talvez toda essa coisa de escritor que persegue o sonho de ser o novo Grande e Definitivo Autor Americano me canse um pouco Mas o fato é que Brian Klugman e Lee Sternthal têm talento . Têm garra , e vontade de fazer direito . Que façam mais filmes . Quando fiz minha anotação , propositadamente não quis revelar nada do que acontece na trama a partir dos primeiros minutos . Tenho tido muito cuidado em evitar spoilers , e a trama de As Palavras é muito interessante , bem engendrada . Ao não revelar praticamente nada da história , no entanto , meu texto acabou ficando fraco , capenga , porque não aborda o tema principal do filme , a questão da honestidade . Paciência . Foi o jeito que achei melhor para preservar os eventuais leitores de spoilers . 4 Comentários Não achei que o texto ficou capenga , não . Sobre um escritor ler para um auditório parte do livro também não vejo lógica . Eu não pagaria para isso , até porque não sou fã de que leiam pra mim , tenho dificuldade em me concentrar na leitura oral . Também gosto de casais inter-raciais , acho que estão cada vez mais comuns nos filmes . E que maravilha saber da existência desse músico brasileiro tão competente . Apos ver o filme duas vezes , fiquei muito impressionada , mas não com o fato da historia
num todo e sim com o fato de não poder saber as palavras e a historia do ” tal ” livro principal no roteiro do livro . assim como crepusculo a Bella lê um livro e ele existe Morro dos ventos uivantes , ou Harry Potter que le as cronicas de bardo . e todos existem de fato . teria como me ser informado se não existe mesmo , ou se existe o livro The window tears do filme As palavras ? Acabei de assistir . Eu gostei e muito , mas muito , mesmo . Assim como a Jussara também não achei que o texto tenha ficado capenga nem fraco . Autor lendo parte de seu poróprio livro para uma platéia ? Tbm não vejo sentido e , nem pagaria para ver isso . E também concordo na questão dos casais inter-raciais . Aliás , desde adolescente sempre achei bonito um negro casado – ou amigado ou seja lá o que fôr – com uma branca e vice-versa . A primeira vez que vi ” o velho ” , eu já sabia quem ele era . Além de livros e honestidade , este filme fala também de ética , felicidade e escolhas . ” Não se apaga o passado mesmo que se queira “ . ” Minha tragédia foi amar mais as palavras do que amava a mulher que me inspirou para escrever ” . DAQUI EM DIANTE TEM SPOILER QUEM NAO VIU POR FAVOR , NAO LEIA . Achei que o fim do casamento Rory deveria ter sido mostrado . Achei tbm que ele se apaixonou tanto pela história , que queria sentir como se ele a tivesse escrito , que ele era o autor . E acho até que ficaria por aí . Mas depois se deixa levar pelo que a esposa lhe disse e depois tbm pelo Joseph , aí , foi o xeque mate para ele . E , decidiu ser o autor . E isto me foi confirmado lá na frente quando ele já cheio de culpa conversa com a Dora . Essa foi a escolha dele . “ Todos fazemos escolhas na vida , difícil é conviver com elas ” . Achei a cena do trem , quando ele reencontra a Celia , muito tocante . Ali vemos como um simples gesto , um olhar , falam muito mais do que 200 palavras . Não interpretei como se ele tivesse roubado a história . Ele a encontrou anos depois dentro de uma pasta que foi esquecida dentro de um trem e que sua esposa comprou num antiquário . A pergunta é : quem não teria feito o mesmo ? Depois , é a tal coisa , tem que se pagar o prêço . ACABARAM OS SPOILERS A Nora Arnezeder ( Celia ) é muito mais linda do que está neste filme . Eu já vi , Sergio , “ O Lado bom da Vida ” e , te digo que o Bradley está muito bem mas , aqui neste “ As Palavras ”
como voce diz , ele está excelente e , merecia sim , o Oscar . Jeremy Irons soberbo como sempre . Um ator magnifico . “ Senhor , eu amo seu livro ” . Um abraço ! ! sobre honestidade ( ou não ) em autoria de livros , o Woody Allen já disse tudo no filme VOCE VAI CONHECER O HOMEM DOS SEUS SONHOS . Ps . Nao entendi o fim do filme … eae , o personagem do Dennis Quaid realmente papou a história de outrem ? Se a personagem da Olivia Wilde é realmente interessada em literatura , por que ela nao leu o resto do livro , então , ao invés de pedir pro prório autor contá-la ? 2 Trackbacks [ … ] após ter sido abandonado pela mulher com uma garota linda de 20 e poucos ( interpretados por Bradley Cooper e Jennifer Lawrence ) teve 8 indicações ao Oscar , levou 1 – o de melhor atriz para o fenômeno [ … ] As Bonecas / Le Bambole Anotação em 2010 : As Bonecas , comédia italiana de 1965 , tem quatro episódios , cada um com uma belíssima estrela – pela ordem , Virna Lisi , Elke Sommer , Monica Vitti e Gina Lollobrigida – , cada um dirigido por um nome respeitado : Risi , Comencini , Rossi e Bolognini . E , no entanto , o filme é muito pior que péssimo : é idiota . Mary e eu nos entusiasmamos quando ela achou na locadora o filme – lançado recentemente no Brasil em DVD . Ela nunca tinha visto ; eu acho que também não ; vi muitos dos filmes franceses e italianos em episódios como este , feitos nos anos 60 , com grandes atores , dirigidos por bons cineastas ; lembrava de ter ouvido falar dele , mas não me lembrava de ter visto . É uma decepção total , absoluta . A única coisa que se salva é a extraordinária beleza das quatro estrelas – e elas são magnificamente esplêndidas , as quatro . Mas é só . É tudo idiota . Todas as quatro historietas são imbecis , os atores agem como se estivessem num programa humorístico de décima-nona categoria de TV vagabunda . A intenção é fazer comedinhas sensuais , aproveitando o charme , a beleza , o magnetismo das estrelas . Vistos hoje , os episódios têm um gosto forte de piada de garoto ginasiano , ou daqueles shows de humoristas dos anos 50 e 60 , quando um hoje suave palavrão ou uma insinuação de sacanagem faziam as platéias dos teatros brasileiros gargalharem . São historinhas bobas , bocós , babacas . Idiotas . É assim : 1º episódio – O Telefonema , de Dino Risi . Um domingão começo de tarde . Virna Lisi está lendo um livro no sofá da sala , pernas à mostra . Nino Manfredi , o maridão , não se agüenta de tesão , mas Virna Lisi faz questão : quer terminar o livro . Quando finalmente
termina , e Nino Manfredi começa o ataque , toca o telefone , é a mamma da moça . E a mamma parla , parla , e não pára de parlare . 2º episódio – O Tratado de Eugenia , de Luigi Comencini . Uma turista lá pros lados do Norte ( Elke Sommer é alemã ) chega a Roma procurando o romano perfeito – seguindo umas instruções de manual do homem perfeito – para inocular nela um filho . Todas as situações criadas são débeis mentais , idiotas . 3º episódio – A Sopa , de Franco Rossi . Monica Vitti , casada com um velhinho ridículo , tenta contratar gente para matá-lo . Não se diz , mas sabemos que é uma cópia – ou uma tentativa de gozação – da história do americano James M . Cain , O Destino Bate à Sua Porta / The Postman Always Rings Twice . A mesma história – tão comum , tão óbvia – havia sido filmada por um jovem Luchino Visconti , em Obsessão / Ossessione , de 1942 . Tudo bem : em 1965 , quando o filme foi lançado , deveria mesmo ser engraçado ver Monica Vitti , a musa dos filmes cabeção de Antonioni sobre incomunicabilidade , fazer esse papel numa comédia boba . Hoje , é só patético . 4º episódio – Monsenhor Cupido , de Mauro Bolognini . Chegamos ao mais pretensioso e mais ridículo pedaço do filme . O episódio se diz baseado em um texto de Giovanni Boccaccio ( 1313-1375 ) . Há um texto em off citando Boccaccio . É o extremo da caricatura – Gina Lollobrigida , a pior atriz das quatro estrelas do filme , faz caras e bocas grotescas como a mulher do dono do hotel que quer porque quer comer o bonitão sobrinho do monsenhor interiorano que veio a Roma para um concílio ecumênico . As quatro atrizes são estonteantes . Mas o filme … Tudo tem a profundidade de uma piada ginasiana dos anos 60 . É tudo estúpido , idiota . É antigo como a moda siciliana de exibir publicamente o lençol sujo de sangue pós-primeira trepada no primeiro dia da lua de mel . É grotesco , é bárbaro , é primário , é pré-histórico , é pré-antigo . É idiota . E , para piorar ainda mais o que já é pior que péssimo , a versão em DVD lançada pela Classicline é dublada para o inglês – e com legendas em português que nunca batem com o que está sendo dito . 5 Comentários A comédia é muito boa e fez um grande sucesso na época , inclusive no Brasil , ficando um bom tempo em cartaz . A comédia da Lollobrigida é a melhor e a mais engraçada . O babaca dito critico é que é ridiculo , comédia é para divertir e não para masturbação mental . Por aqui se vê como o Sérgio é uma pessoa tolerante e educada ao deixar estes comentários despropositados à vista de todos .
Ele dá uma excelente demonstração do que é respeito pelos outros ao contrário dos seus críticos . Ô , amigo José Luís , talvez eu tenha sido , mais que tolerante , permissivo demais com essas pessoas sem o mínimo de educação . Quando comecei a receber comentários desse tipo , pensei : bem , se não tiver ofensa com palavrão , com incitação a coisas tipo racismo , publico e pronto . Talvez eu devesse ser mais rigoroso … Agradeço demais por seu comentrário sempre elegante , sempre gentil . Um abraço . Sérgio [ … ] sua frente uma mulher danada de gostosa . Se repararmos direito , o desenho , muito bem feito , é de Gina Lollobrigida . Alguém o chama : a ligação para Roma se completou . Robert Talbot , biliardário businessman [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * Vidas Que Se Cruzam / The Burning Plain De : Guillermo Arriaga , EUA , 2008 ´ Nota : Anotação em 2010 : O título brasileiro do primeiro-longa metragem dirigido pelo mexicano Guillermo Arriaga define não só o próprio filme como também o estilo dos roteiros do autor . Exatamente como em 21 Gramas , de 2003 , e Babel , de 2006 ( os dois dirigidos pelo também mexicano Alejandro González Iñárritu ) , Vidas Que Se Cruzam apresenta diversos personagens como se pusesse na mesa as várias peças de um quebra-cabeças , que deverão ir sendo encaixadas ao longo da narrativa . Vidas que se cruzam . O filme abre com um plano geral de uma planície – há montanhas ao fundo – em que há um incêndio . Corta , e vemos um plano mais aproximado do que é que está pegando fogo : uma casa ; na verdade , um trailer . O título original do filme é The Burning Plain – planície em chamas . Corta , e temos uma mulher nua sentada em uma cama . Ela dá uma ordem seca para o homem que está deitado : “ Levante-se ” . Ele pede mais cinco minutos de sono , ela repete a ordem seca : “ Levante-se ” . Ela mesma se levanta , nua – a vemos pelas costas - , pega um cigarro , aproxima-se da janela . Pode ser vista , nua , por quem passa lá fora ; não está nem ligando para isso . A mulher , interpretada por Charlize Theron – veremos depois que se chama Sylvia – , tem uma expressão de angústia profunda . Uma amiga , Laura ( Robin Tunney ) , vem pegar Sylvia para levá-la para o trabalho . Um homem com a barba por fazer , cabelos longos , está observando , na rua ; quando o carro com Laura e Sylvia começa a andar , o homem entra num carro , passa a segui-las . Uma profissional competentíssima , uma mulher em profunda angústia Veremos em seguida que Sylvia
é a gerente de um restaurante fino , elegante , numa colina , debruçado sobre um mar bravio – o filme não diz explicitamente , mas Sylvia vive no Oregon , no extremo noroeste dos Estados Unidos . É uma profissional extremamemente competente , dá ordens na cozinha ( vemos que o homem com quem ela havia dormido trabalha na cozinha do restaurante ) , dá ordens no belo salão do restaurante , recebe pessoalmente os clientes mais importantes , dá sugestões de vinhos a quem pede um tratamento diferenciado . Ao mesmo tempo , paralelamente , como se tivesse esquizofrenicamente duas caras , duas personalidades , é uma pessoa profundamente angustiada , se automutila , e trepa insaciavelmente com qualquer um que aparece . O filme nos dá esse retrato de Sylvia nos primeiros dez minutos , com bastante competência . E é preciso notar que a lindérrima Charlize Theron , essa mulher que me parece a segunda coisa mais bela que a África do Sul deu ao mundo – depois da extraordinária lição de reconciliação levada a cabo por Nelson Mandela – , mais uma vez faz um filme em que é maquiada para parecer menos bela do que é . ( Em Monster – Desejo Assassino , conseguiram transformá-la literalmente em um monstro . ) Sua Sylvia não tem glamour : a beleza faiscante da atriz é sombreada pela expressão de angústia . Diversos outros personagens , outras histórias Paralelamente , enquanto vai nos apresentando Sylvia , o roteirista e agora diretor Guillermo Arriaga nos mostra seus outros personagens : * Há um mexicano , Nick ( interpretado pelo bom ator português Joaquim de Almeida ) , que vive no Novo México e tem um caso com uma mulher casada , Gina ( Kim Basinger ) ; os dois morrem no incêndio do trailer mostrado nas primeiras seqüências do filme ; morreram trepando , segundo constatou a polícia ; * Há o garoto Santiago ( J.D . Pardo ) , filho de Nick , de uns 16 , 17 anos , mais seu irmão e sua mãe . Santigo é que conta para o irmão e um amigo o que ficou sabendo através da polícia , diante das cinzas que restaram do trailer , que ficava estacionado no meio de uma grande planície , um deserto , longe de tudo . Todo mundo na região ficou sabendo que Nick e Gina tinham um caso , e que morreram queimados juntos . A mãe de Santiago , mulher de Nick , ficou sabendo – e , cheia de humilhação , vergonha e ódio , amaldiçoa o marido morto . * Também o marido de Gina , Robert ( Brett Cullen ) , naturalmente , ficou sabendo do escândalo . Vai ao enterro de Nick amaldiçoar aos berros o homem que comia sua mulher . Gina e seu marido têm quatro filhos – a mais velha deles , Mariana ( Jennifer Lawrence ) , de uns 16 anos , já sabia , fazia algum tempo , da infidelidade da
mãe . * Santiago procura Mariana ; quer saber como era a história paralela , secreta , de seu pai , com a mãe da garota . Vão acabar ficando muito próximos , o filho do pai infiel e a filha da mãe infiel ( na foto ) . * E ainda há um outro grupo de personagens : uma dupla de amigos que ganha a vida jogando pesticidas em plantações , de um pequeno avião , mais a filha de um deles , Maria ( Tessa Ia ) , garota de uns 12 anos , esperta , inteligente , que participa do trabalho com o pai e com o amigo dele , voa com eles , trabalha como navegadora , dando coordenadas através de um GPS . Maria e seu pai ( Danny Pino ) conversam às vezes em espanhol , às vezes em inglês ; o amigo do pai , Carlos ( Jose Maria Yazpik ) , só fala espanhol . Exatamente como em 21 Gramas , como em Babel , o roteiro de Guillermo Arriaga vai entremeando as histórias desses vários personagens . E será só lá pela metade do filme que o espectador perceberá que Arriaga usou um truque . Muitos elogios ao filme Parece que foi bem recebido , de maneira geral , esta estréia de Arriaga como diretor ( ele havia dirigido apenas dois curta-metragens , antes ) . O Los Angeles Times teria dito que o filme é “ poderoso , profundo e maravilhosamente filmado ” , segundo diz a capa do DVD . Vejo no AllMovie : “ Como seu trabalho como roteirista em Babel , 21 Gramas e Amores Perros , a estréia de Guillermo Arriaga na direção é um drama complexo , emocional , que não se limita a uma única narrativa . Em vez disso , The Burning Plain pula para trás e para frente através de quatro diferentes épocas e histórias . ( … ) Como as vidas de seus personagens , este filme é emocionalmente devastador , enquanto a audiência testemunha a crueldade que as pessoas podem causar aos outros , e a si mesmas . ” E mais tarde : “ Apesar de seus defeitos , The Burning Plain é tecnicamente forte . O diretor de fotografia Robert Elswit , que fez tomadas belíssimas de paisagens em filmes como There Will Be Blood e Syriana , traz seu talento para as histórias passadas no Sul , enquanto John Toll captura belamente o cinzento de Portland . O montador Craig Wood faz com talento as transições entre as diferentes histórias , permitindo que as tomadas sirvam , elas próprias , como chaves para o mistério que começa com o plnao inicial de um trailer incendiado no deserto do Novo México . ” Direção de atores fraca . E um gosto forte de artificialidade Isso colocado , vou dar minha opinião pessoal . É um filme muito bem feito , sem dúvida alguma . Não há como discutir isso , ou negar . Embora a fotografia seja de
fato sensacional , assim como a montagem , a música ( falo dela um pouco abaixo ) , e o roteiro prossigam na mesma fórmula que deu extremamente certo em 21 Gramas e Babel , achei falha a direção de atores . Não há propriamente atuações péssimas , que derrubem o filme . Não , isso não há . Mas também não há grandes atuações ; são interpretações medianas , às vezes um pouco fracas . Dá para sentir – bem , eu senti – que falta experiência a Arriaga nessa parte fundamental do trabalho de direção . Há momentos em que as interpretações são francamente inconvincentes . E a verdade é que não consegui propriamente gostar do filme . Percebia as qualidades , percebia o talento do roteirista que sabe criar essa teia de aranha de interconexões de histórias , vidas que se cruzam – mas ( fazer o quê ? ) achei tudo … artificial . Pouco real . Pouco crível . E não pude deixar de me sentir um tanto enganado , quando , lá pela metade do filme , chega o momento em que o espectador percebe que Arriaga usou um truque . ( Obviamente , não teria sentido revelar que truque é , mas todo espectador vai percebê-lo , é claro . ) Sei lá . Pode ter também essa coisa muito particular minha , de uma certa irritação com personagens que só conseguem escolher o pior caminho a tomar , que perseguem a infelicidade . Sim , claro , há muitas pessoas que são assim – mas quando todos são perseguidores de infelicidade , não consigo me envolver com a história . Dá uma certa repulsa . Mas tudo isso , é claro , são minhas opiniões pessoais e intransferíveis . E – repito – são inegáveis as qualidades do filme . Uma trilha sonora semelhante às dos filmes anteriores Uma pequena observação sobre a trilha sonora . O autor das trilhas de Amores Perros , 21 Gramas e Babel – todos com roteiro de Guillermo Arriaga , é bom lembrar – foi o argentino Gustavo Santaolalla , sujeito de grande talento , autor de outras belas trilhas , como de O Segredo de Brokeback Mountain , de Ang Lee , de Diários de Motocicleta , de Walter Salles , e Terra Fria / North Country , de Niki Caro , por coincidência também com a estonteante Charlize Theron . Na maior parte dessas trilhas , Santaolalla fez melodias minimalistas , um pouco no estilo do grande Philip Glass , em vários momentos com apenas pequenos toques de violão ou guitarra . A trilha sonora deste Vidas Que Se Cruzam não é de Santaolalla ; assinam a trilha Omar Rodriguez-Lopez e Hans Zimmer . Hans Zimmer tem feito trilhas belas – porém fortes , quase chegando à grandiloqüência , com grandes orquestras , muitas cordas . A antítese do trabalho que Santaolalla criou para os demais roteiros de Arriaga . Pois aqui , no entanto , esses dois compositores criaram uma trilha bem próxima
às do compositor argentino . Mínima , minimalista . Impressionante . Ficou extremamente coerente com os filmes anteriores baseados nos relatos de vidas que se cruzam que Arriaga escreveu antes . Teve personalidade própria , Arriaga : os compositores se moldaram ao estilo de seus filmes anteriores . Achei isso fascinante . E repito : é um filme bem feito , e que tem muitas qualidades . Não me apaixonei por ele , não gostei muito dele , mas é um filme de qualidades . Quem gostou dos anteriores escritos por Arriaga seguramente vai gostar também deste aqui . 2 Comentários Engraçado , quando vi o filme vim aqui ver se vc já tinha escrito sobre ele , mas não tinha . E fiquei pensando o que vc iria achar , mas não quis te indicar pq não indico filmes que achei ruins ( e agora sei que vc já tinha assistido ) . Eu tb não gostei , não me apaixonei , pelo contrário : achei fraco , raso e de um psicologismo chinfrim ; do tipo que subestima a inteligência de quem está assistindo . Mas gostei dos anteriores dele , embora não tenha achado essa Coca-Cola toda que todo mundo disse nas respectivas épocas em que foram lançados . Assisti agora . É como voce diz , não é um grande filme mas é um filme bem feito e que tem muitas qualidades . E , eu gostei . E com isto , acho que pela primeira vez , estou discordando da querida amiga , Jussara . Não entendi quando a Mariana diz pro namorado que amava a mãe mas não gostava dela . É possível amar alguém e não gostar desse alguém ? Quis entender que era do jeito de ela ser e ( ou ) agir . Será isto ? Coisa meio louca aquela da cicatriz . Mas , me lembrou de uma passagem quando eu tinha 20 anos e junto com meu melhor amigo,os dois já embriagados , juntamos nossos braços e largamos um cigarro sôbre eles e apostamos que quem tirasse primeiro pagava duas “ cubas libres ” . Teve de vir um outro amigo tirar o cigarro . Tenho essa cicatris até hoje . Coisa louca,insana . Depois culpamos as cubas . Como diria Agildo Ribeiro,coisa horrorooosa ! ! Não gostaría de estar na pele da Mariana . Incrível como ainda podia haver , naqueles dias , aquele ranço entre famílias pelo que houve . Acho que é como voce diz , tem gente que gosta de procurar o pior , de ser infeliz . Gostei de ver a menina Tessa La Gonzales . Tinha visto com ela e gostei muito e aí ela já era adolescente , ” Depois de Lúcia ” . Tens razão Sergio , aquele trabalho de maquiagem na Charlize em ” Monster ” foi uma coisa “ monstruosa ” . ” 21 Gramas ” eu assisti já tem bastante tempo e gostei muito . ” Voce não vem ” ? Ali estava o perdão . Um abraço
! ! [ … ] com 10 , 12 anos , interpretado por Kodi Smit-McPhee . A mulher sem nome vem na pele estonteante de Charlize Theron . Com muita competência , o filme deixa claro que aquelas imagens são memórias , sonhos , pesadelos [ … ] [ … ] uma estrutura multiplots , passada em vários lugares do planeta . Algo como as histórias de Guillermo Arriaga e Alejandro González Iñárritu . Além da Vida tem um quê de Babel , de vidas que se cruzam , sim [ … ] [ … ] adora esse tipo de história – é o autor do roteiro de 41 Gramas e Babel e ele mesmo dirigiu Vidas Que Se Cruzam / The Burning Plain , que , como o próprio título brasileiro indica , também é uma espécie de La Ronde , de Short [ … ] [ … ] Tessa Ia estava em seu terceiro filme : havia feito antes uma série de TV e tinha tido um papel em Vidas Que Se Cruzam / The Burning Plain , de 2008 , o primeiro longa-metragem de Guillermo Arriaga , conhecido por seus roteiros para filmes [ … ] [ … ] O Xangô de Baker Street , de 2001 , trabalhou com Guillermo Arriaga na produção americana Vidas que se Cruzam , de 2008 , fora trabalhos com realizadores portugueses , Mulheres – Amizades Simples , Vidas [ … ] [ … ] 2014 , ao mesmo espírito de seu filme de 2005 . Três Enterros tem argumento e roteiro do mexicano Guillermo Arriaga – o autor dos roteiros de 21 Gramas e Babel , dirigidos por Alejandro González Iñarritu – , e [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * Um Bom Partido / Playing for Keeps De : Gabriele Muccino , EUA-Itália , 2012 Nota : Alguém mal-humorado poderia dizer que a contribuição deste Um Bom Partido para a cultura seja mostrar que o futebol – o futebol mesmo , o esporte bretão – parece estar finalmente chegando aos Estados Unidos . Ou então mostrar que as esposas da classe média americana têm um insaciável apetite sexual . Bem , de fato o filme mostra esses dois fenômenos . Mas eu não sou mal-humorado , e então me diverti um tanto com essa comedinha romântica de 2012 dirigida pelo italiano Gabriele Muccino , que parece ter se estabelecido de vez em Hollywood . Voltou à Itália para lançar , em 2010 , O Último Beijo / Baciami Ancora . Dois anos depois veio este Um Bom Partido , no original Playing for Keeps . Fala de futebol , de infidelidade conjugal – mas , sobretudo , é , como foram os filmes anteriores do realizador , sobre a relação pai-filho . E vejo no IMDb que Muccino está preparando , em maio de 2014 , um novo filme sobre o mesmo tema , Fathers and Daughters . O cara é de fato
useiro e vezeiro . Tenho grande simpatia por realizadores que insistem em um tema que é importante para eles . E gosto demais do tema pais-filhos . George torrou toda a montanha de dinheiro que ganhou , e agora está duro O filme abre com imagens de partidas de futebol . Legendas informam : “ George Dryer 1993 ” – e George faz um golaço . “ George Dryer 1996 ” – e George faz outro golaço . “ George Dryer 2005 ” – um novo golaço . Um locutor anuncia que , aos 36 anos , George Dryer , chamado pelas torcidas dos times ingleses e escoceses em que jogou de King George , se machucou . E temos então um letreiro “ George Dryer hoje ” . O ex-jogador , ex-ídolo das torcidas – interpretado pelo galã George Butler – , está em casa , diante de uma pequena câmara , fazendo um comentário sobre partidas de futebol . Sonha em levar uma fita demo para alguma emissora , tentar emplacar como comentarista . Não vai muito bem , o ex-King George . Enquanto ele tenta gravar seu comentário , o telefone toca , a secretária eletrônica atende : é da empresa de cartão de crédito , ele está com 120 dias de atraso . Mora numa pequena casinha dos fundos , atrás de uma bela casa ocupada por um indiano , Param ( Iqbal Theba ) . Assim que o vê , Param vai atrás dele para cobrar os aluguéis atrasados . Grandes jogadores , craques , a gente sabe muito bem , ganham fortunas . Sua vida útil é curta , mas dá perfeitamente – para quem sabe se planejar – para juntar bastante dinheiro para ter uma vida confortável depois de deixar o esporte . Não foi o caso de George Dryer , que torrou esplendidamente sua grana enquanto ela chovia , em viagens pela Europa , Ferraris , aluguel de belas villas , essas coisas . Fez isso em companhia da mulher , Stacie ( o papel de Jessica Biel ) , que conheceu quando ele estava no auge da fama e ela era uma jovem americana da Virginia de 23 anos em viagem à Inglaterra . Tiveram um filhinho , Lewis . Separaram-se , ela voltou para a Virginia . Depois que ele teve que se aposentar do futebol devido à contusão , resolveu se mudar para a cidade da mulher , para poder ver o filho com freqüência . Quando a ação começa , Lewis ( interpretado por Noah Lomax ) está com 9 anos de idade , e faz três anos que Stacie mora com Matt ( James Tupper ) , um cara legal . Ele vira treinador do time de futebol da escola . Os alunos o adoram . As mães deles também O cinema já mostrou outros grandes atletas ou desportistas em má situação depois que o auge da carreira passa . Kevin Costner , por exemplo , interpretou um ex-campeão de beisebol que vive enchendo a cara ,
no interessante A Outra Face da Raiva / The Upside of Anger , de Mike Binder ( 2004 ) . Há ex-atletas que caem em poços profundos , em vários outros filmes . Mas esta aqui é uma comedinha romântica . George não vai se afundar na cachaça ou alguma outra droga , e o espectador já sabe que no fim – afinal , é um filme do cinemão comercial americano ! – tudo tudo vai dar pé . O George que vemos no início da narrativa é apenas um sujeito um tanto imaturo , desorganizado , avoado . E sem grana , claro . Embora tenha se mudado para aquela cidade para estar perto do filho ( e também , como veremos depois , para estar perto da ex-mulher ) , perde os horários , chega atrasado para os encontros marcados com Lewis . O menino adora o pai , mas é claro que se ressente quando ele se atrasa , ou simplesmente dá o cano . Lewis faz parte do time de futebol da escola – e isso é que é fascinante : agora há times de futebol nas escolas americanas ! E o time é misto : há também garotas . Ao ver os treinos , George se impacienta : o técnico é um despreparado , não dá a menor atenção aos garotos , fica o tempo todo falando ao celular . Da primeira vez que vemos George assistir a um treino , ele fica impaciente , mas quieto . Da segunda vez , com o técnico ausente , fora do campo , falando ao telefone , ele não aguenta : entra no campo , conversa com os garotos e garotas , mostra a eles como chutar a bola . Os pais que vêem o treino ficam fascinados . As mães , mais ainda : afinal , George é um tipão , fina estampa , e ainda por cima tem aquele sotaque escocês . Querem que George assuma o posto de técnico . A princípio ele não se entusiasma . Nunca tinha sido treinador , e precisa investir na futura talvez possível carreira de comentarista de TV . Mas Stacie , a ex , dá-lhe uma dura : pô , você não pode , uma vez na vida , fazer o que seu filho está pedindo ? E ele topa . Em papéis pequenos , duas atrizes belíssimas : Uma Thurman e Catherine Zeta-Jones Os meninos e meninas adoram o novo treinador . O pai de um dos garotos , Carl ( Dennis Quaid , com os cabelos pintados para não mostrar a idade e fazendo muito mais caretas do que seria necessário ) , um ricaço , se entusiasma : depois de ver , na internet , que George foi um herói , um craque , no Reino Unido , o enche de lisonjas , dá ao time uma farta contribuição em dinheiro . É um personagem interessante , esse , interpretado por Dennis Quaid . É o típico sujeito rico para quem tudo , tudo
, tudo na vida é dinheiro e aparência . O roteiro ( de Robbie Fox , também autor do argumento ) não se preocupa em dizer qual é a origem do dinheiro de Carl , mas não deve lá ser algo muito legal . Carl é casado com um avião , um baita de um Boeing , Patti , que vem na tela no corpo infindável de Uma Thurman . Carl trai Patti constantemente , mas ao mesmo tempo tem um ciúme patológico dela . Patti e mais duas mães de garotos do time vão partir para cima do treinador bonitão . Dessas outras duas , uma é divorciada , e profundamente insegura – Barb , interpretada por Judy Greer . A outra é casadíssima , e profundamente segura de si – Denise , interpretada por uma Catherine Zeta-Jones que parece ter feito algumas plásticas erradas . Um filme simpático , divertido , e que acerta no fundamental Aparentemente o filme foi um fracasso na bilheteria . Teria custado US$ 35 milhões , e nas bilheterias americanos rendeu apenas US$ 13 milhões . Isso apesar dos nomes famosos todos no elenco . O futebol está começando a chegar aos Estados Unidos , mas , pelo jeito , só começando . Detalhinho : não conhecia a expressão “ play for keeps ” . Aprendo ( nunca é tarde para aprender , embora no dia seguinte já seja difícil lembrar ) que play for keeps é fazer as coisas com efeito permanente , ser sério nas ações . É o que o nosso George vai aprendendo ao longo do filme . Não é , de forma alguma , um grande filme , este Playing for Keeps . Mas é simpático , divertido – e acerta no que é fundamental : pai que presta é pai que dá atenção e carinho ao filho . Testemunha de Acusação / Witness for the Prosecution De : Billy Wilder , EUA , 1957 Anotação em 2010 : Testemunha de Acusação é o máximo . É uma obra-prima , uma perfeição . A gente não cansa de ver – cada vez que vê , é de novo um prazer imenso , renovado . Não são muitos os filmes assim . De forma alguma . Não sei quantas vezes já vi o filme . Tento ser organizado , tento anotar tudo direitinho , mas não consigo , conforme mostra o caso de Testemunha de Acusação . Só achei registro de duas vezes , antes desta mais recente revisão agora , em julho de 2010 , e já vi o filme umas seis , oito , dez vezes . Mas isso não importa . É um filme absolutamente genial . Enquanto revia pela sei lá quantas vezes o filme , fiquei pensando coisas como : – ficam aí tentando criar histórias com reviravoltas ; tudo bem , é um direito das pessoas . Mas nunca vão criar uma história com reviravoltas como esta ; – ficam aí tentanto fazer filmes que surpreendam ; tudo bem . Mas já foram
feitos filmes perfeitos que surpreendem muito , demais ; – ficam aí criando todo tipo possível de fogos de artifício , de truquezinhos , de invençõezinhas , para parecer moderno , e novo , e inovador , e genial ; tem nego que acha que o cinema começou com Quentin Tarantino . Volta e meia criam uma novidade de tamanho de tela – nos últimos anos tem um monte de nego apostando no 3D . Besteira , tudo besteira , coisa periférica . Para fazer um grande filme , é preciso de uma bela história , um belo roteiro para contar bem a história , um grande diretor , grandes atores . Só isso – ou melhor , tudo isso . O resto é perfumaria , armazém de secos e molhados . Modismo . Coisa que passa , que nem chuva de verão . Um grande encontro de artistas fora do comum Testemunha de Acusação é , entre muitas outras coisas , o encontro de quatro artistas fora do comum : Agatha Christie , Billy Wilder , Charles Laughton e Marlene Dietrich . Agatha Christie ( 1890-1976 ) , aquela velha inglesa louca de pedra , criou , sei lá , mais de 400 histórias . Tinha mais idéias de histórias do que o Tio Patinhas tinha moedas em seu cofre , e felizmente viveu muito . Qualquer professor de literatura terá trocentos argumentos para dizer que Agatha Christie é uma autora menor – mas as pessoas não dão a menor bola para o que os doutores falam em suas emproadas teses . As pessoas adoram as histórias envolvendo crimes , e a velhinha louca soube como ninguém bolar essas histórias . Das 400 histórias que ela bolou , e das , sei lá , 50 que li , costumava achar que O Assassinato de Roger Ackroyd fosse a melhor . Não é , não . Acho que a melhor é Testemunha de Acusação . É uma trama intensa , rica , que fala de fidelidade e traição , amor e ódio , admiração e inveja , competência e ambição , crime e castigo . Testemunha de Acusação talvez não seja o melhor filme de Billy Wilder ( 1906-2002 ) , acho eu . Até porque é difícil definir qual é o melhor filme desse diretor excepcional , extraordinário , que fez de tudo – de drama soturno sobre alcoolismo , Farrapo Humano , a filme de guerra , Inferno Inferno nº 17 , de denúncia violenta do jornalismo sensacionalista , A Montanha dos Sete Abutres , à essência do film noir , Pacto de Sangue , da comédia mais trágica que pode haver , Se Meu Apartamento Falasse , à comédia mais escrachada , Quanto Mais Quente Melhor . Charles Laughton ( 1899-1962 ) é um gigante – seu talento consegue ser maior que seu corpanzil . É um dos melhores atores destes primeiros cento e tantos anos de história do cinema . Segundo Billy Wilder , é o melhor ator com que ele trabalhou . Em Testemunha de
Acusação , dá um show absurdo . O Sir Wilfrid Robarts que ele cria é um dos personagens mais marcantes da história do cinema – o melhor advogado criminal da Inglaterra , uma lenda , já um sir , que teve um ataque cardíaco , ficou em coma , ficou semanas no hospital , e , no dia em que volta finalmente para sua casa e seu escritório , protegido por uma enfermeira linha dura e por um mordomo fiel até a mais completa sabujice , fica sabendo de um caso interessante – um homem suspeito de assassinar uma senhora sua amiga que jura inocência , mas cujo único álibi é sua mulher , e os jurados não costumam acreditar muito em um único álibi provido exatamente pela mulher do réu . Ninguém dirigido por Billy Wilder trabalha mal O acusado , Leonard Vole , é interpretado por Tyrone Power ( 1914-1958 ) , o ator que fez suspirar milhões de mocinhas nos anos 30 e 40 – mas o filme é de 1957 , e o astro estava já um tanto velhinho . Foi seu último filme , aliás . Não está mal , Tyrone Power , como o homem que tudo indica que é o assassino , mas que consegue convencer o veterano , brilhante , advogado da sua inocência . Demonstra uma certa calma , em algumas seqüências , um certo estupor em outras , e pavor , temor , desespero , em outras . Ninguém dirigido por Billy Wilder trabalha mal . Mas o show é de Charles Laughton como Sir Wilfrid Robarts , o melhor advogado criminal da Inglaterra , e de Marlene Dietrich , como Christine Vole , a mulher de Leonard , seu único álibi . ( E aí não consigo me impedir de anotar sobre a extraordinária riqueza da língua inglesa . Há bem no começo do filme um diálogo que usa três palavras para o que , na última flor do Lácio inculta e bela , temos apenas uma , “ advogado ” . Num único diálogo , quando Sir Wilfrid conhece Leonard , fala-se em lawyer , solicitor e barrister . Lawyer é o termo genérico , o cara que estudou Law , a lei ; solicitor é o advogado das causas cíveis , acho eu ; barrister – aí está a riqueza – é o advogado que fica diante da bar , a barra do tribunal , ou seja , o advogado criminal , que enfrenta júris . Não sei se é riqueza da língua ou da civilização inglesa – ou um indício de que aquele povo tem mais respeito à lei do que outros povos , mais recentes , mais novos , criados nos trópicos – povos mais chegados a uma ginga de corpo , ao jeitinho , à esperteza , à Lei de Gérson , a presidente da República que zomba das leis . ) As lentes das câmaras se derretem por Marlene E então chegamos a Marlene Dietrich ( 1901-1992 ) , a quarta artista fora
do comum deste filme em que quatro artistas maiores , extraordinários , fora do comum , se encontraram . Marlene é uma diva , uma das maiores que já passaram pelas telas do cinema . Que beleza , que poder tem aquele rosto , feito para deixar apaixonadas as câmaras de cinema que passassem à sua frente . Como eu mesmo já disse , não é à toa que as câmaras de Hitchcock , de Orson Welles , de David O . Selznick ( o cara era mais que um simples produtor , era o autor dos seus filmes ) , de Rouben Mamoulian , de René Clair , de Stanley Kramer , de Fritz Lang , de Billy Wilder , se apaixonaram por Marlene Dietrich . As lentes das câmaras parecem se derreter diante dela . Marlene ( é sempre bom lembrar ) deixou sua Alemanha natal em 1930 , três anos antes de Hitler assumir o poder . Foi levada para Hollywood por seu conterrâneo Josef Von Sternberg , depois que os dois fizeram juntos , ainda na Alemanha , O Anjo Azul , e deixaram o mundo babando . Os alemães tentaram atraí-la de volta , antes e depois da ascensão do nazismo , mas Marlene continuou nos Estados Unidos ; durante a guerra , botou uniforme americano , trabalhou entretendo as tropas aliadas que lutavam contra Hitler e Mussolini . Conquistou com isso o ódio de muitos alemães . Só voltou à terra natal em 1960 , quando fez uma turnê como cantora ; segundo o CineBooks ’ , naquela ocasião “ disseram a ela que poderia haver uma recepção raivosa por parte de alguns alemães , inclusive com violência ( e houve registros de que alguém poderia atirar nela durante as apresentações ) . ” Uma personagem extraordinária para uma atriz idem Billy Wilder fez não um , mas dois filmes em que Marlene Dietrich interpreta uma alemã vivendo no seu país destruído , dizimado , devastado pela Segunda Guerra , e que encontra ajuda com soldados aliados . Esta é uma coincidência , ou repetição , que me parece absolutamente fascinante . Em A Mundana / A Foreign Affair , de 1948 , ela é Erika Von Schluetow , mulher de um importante oficial nazista , agora ( a ação se passa logo após o fim da guerra , em 1946 ) vivendo em penúria entre os escombros do que sobrou de Berlim ; para sobreviver , canta num cabaré no meio das ruínas , e , em troca de sua beleza , recebe presentes fartos de um capitão do exército americano . Em Testemunha de Acusação , faz o papel de Christine , que , logo após o fim da guerra , vivia em penúria entre os escombros do que sobrou de Hamburgo ; para sobreviver , canta num cabaré no meio das ruínas . É lá que conhece Leonard Vole , então um sargento do Exército . Leonard casa-se com ela e a leva para a então bem mais segura e rica
Inglaterra . Alguns anos depois , em 1952 – é aí que se passa a ação – , Leonard Vole é preso , acusado de assassinar uma senhora muito rica , e sua única chance de salvação , seu único álibi , é a palavra de Christine . Christine-Marlene demora a aparecer na tela . Entra em cena quando já se passaram uns 30 minutos de filme – 30 rápidos minutos de um filme em tudo brilhante . Mas , depois que ela aparece , o filme melhora ainda mais . É uma atriz extraordinária , Marlene Dietrich . É uma personagem extraordinária , Christine Vole . O espectador é obrigado a concordar com Sir Wilfrid quando ele diz , a boca aberta de espanto : “ Que mulher extraordinária ! ” Personagens interessantes , bem construídos , bem interpretados É impressionante como todos os personagens são interessantes , bem construídos – e bem interpretados . A velhinha Una O’Connor , feia que nem a fome , é impagável como Janet McKenzie , a escocesa pobre que trabalha como empregada na casa da viúva rica que será assassinada . Aparece em duas seqüências , apenas , mas é perfeita . Elsa Lanchester faz com brilhantismo a enfermeira Miss Plimsoll , que trava uma guerra sem tréguas contra seu paciente indócil , que , mal se recuperando de um ataque cardíaco , se expõe à batalha no tribunal e não abre mão dos charutos e do conhaque . A simpática e talentosa atriz era casada , na vida real , com Charles Laughton , o ator que faz o papel de Sir Wilfried . Até Diana ( interpretada por Ruta Lee ) , uma bela jovem morena que se senta ao lado da enfermeira Plimsoll , nas galerias do tribunal , e aparece menos de três minutos na tela , é bastante interessante . O filme teve seis indicações ao Oscar – melhor filme , melhor diretor , melhor ator para Charles Laughton , melhor atriz coadjuvante para Elsa Lanchester , melhor montabem para Daniel Mandell , melhor som para Gordon Sawyer . Não levou nenhum . Elsa Lanchester levou o Globo de Ouro como coadjuvante ; houve indicações também para melhor filme , melhor diretor , melhor ator para Charles Laughton e melhor atriz para Marlene Dietrich ( na categoria drama , é claro ) . “ Só trabalhei com dois grandes diretores : Billy Wilder e von Sternberg ” Marlene não fala uma palavra sobre Testemunha de Acusação em sua bela autobiografia , lançada em 1987 . Marlene Dietrich ( autobiografia ) é um livro fascinante , muitíssimo bem escrito , pontuado por observações inteligentes , de imensa sensibilidade – mas não é um relato cuidadoso e detalhado , que respeite muito a ordem cronológica . Distraída , pouco metódica , a diva não costuma dar direito as datas dos fatos . Aprofunda-se em alguns temas , passa ao largo de outros . Fala de Billy Wilder , mas sobre A Mundana . Depois da guerra , retornou aos
Estados Unidos e , segundo ela mesma afirma , voltou a representar “ para ganhar dinheiro ” . “ Billy Wilder tinha chegado a Paris para convencer-me a interpretar o papel de uma mulher nazista no seu filme . Havia recusado ao telefone . Na ocasião , não sabia que não se consegue escapar de Billy Wilder . A ação de A Mundana está intimamente ligada aos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial . Wilder rodou em Berlim todas as cenas em que o ator principal não aparece . Então , viajou a Paris , onde me encontrava na ocasião , para falar-me de seu projeto . Claro que não pude resistir . ” Quando Marlene e Wilder voltaram a trabalhar juntos , em 1957 , para fazer Testemunha de Acusação , Marlene estava mais envolvida com sua nova carreira de cantora . Fazia turnês por diversos países do mundo , mas seu interesse pelo cinema era quase nenhum – depois deste filme , só faria mais dois , A Marca da Maldade / Touch of Evil , de Orson Welles , e Julgamento em Nuremberg , de Stanley Kramer . Trabalhou com diversos diretores , Orson Welles entre eles , mas , quando Peter Bogdanovich a entrevistou para seu livro Picture Shows , e disse a ela “ A senhora trabalhou com muitos grandes diretores … ” , a diva o interrompeu : “ Não , não . Só trabalhei com dois grandes diretores , von Sternberg e Billy Wilder ” . Um dos melhores filmes de Hitchcock – só que feito por Wilder Marlene e Wilder haviam se conhecido ainda em Berlim , em 1929 , antes que os dois fossem para Hollywood . Ela estava começando no teatro , fazia uma revista musical , e ele , que trabalhava como jornalista , foi entrevistá-la . Ficaram amigos em Hollywood , nos anos 30 . Billy Wilder conta , no livo Billy Wilder – e o resto é loucura , uma biografia do mestre escrita pelo professor e crítico alemão Hellmuth Karasek , que contém longos depoimentos do próprio biografado , que foi escolhido para dirigir Testemunha de Acusação graças a Marlene : “ Marlene Dietrich me perguntou se não queria filmar com ela o livro Testemunha de Acusação , de Agatha Christie . Ela condicionou sua participação , dizendo que só aceitaria se eu assumisse a direção . ” Na mesma biografia-relato , o diretor conta que , ao longo de sua carreira , aconteceu apenas duas vezes de ele ter sido elogiado pelo autor do livro em que se baseou . A primeira foi com Pacto de Sangue , de 1944 : James M . Cain , o autor do livro , disse a Wilder que ele havia melhorado sua narrativa com o filme , “ o que posteriormente só me ocorreu uma única vez : com Agatha Christie , depois da primeira exibição de Testemunha de Acusação . Há uma frase brilhante de Hellmuth Karasek que define com perfeição este filme . Vai aí : “
Testemunha de Acusação é um dos melhores filmes de Hitchcock – só que dirigido por Billy Wilder . ” Sem dúvida , Hitchcock teria tido o maior prazer em assinar este filme . Ao final do filme , há um pedido ao espectador : “ A gerência deste cinema sugere que , para maior entretenimento de seus amigos que ainda não viram este filme , não contem o segredo do final de Testemunha de Acusação . ” Três anos depois , Hitchcock usaria essa mesma idéia : toda a campanha de marketing de Psicose , lançado em 1960 , era em torno da recomendação para que ninguém revelasse o final do filme . Esperto , grande marqueteiro , o velho inglês ainda bolou um expediente a mais : os cinemas não permitiam a entrada de espectadores depois de iniciada cada sessão de seu filme . Hellmuth Karasek está certíssimo : “ Testemunha de Acusação é um dos melhores filmes de Hitchcock – só que dirigido por Billy Wilder . ” 13 Comentários Pode-se escrever frases e frases sobre o cinema e com poucas eu concordaria mais do que com essa : “ é preciso de uma bela história , um belo roteiro para contar bem a história , um grande diretor , grandes atores ” . Basta . É exatamente isso . E , sim , Testemunha de Acusação é um dos melhores . Revi inúmeras vezes , a última foi agora nas férias de julho . É um filme adorável . Porque adoro a velhinha louca . Já li e tenho mais de 80 livros ; adoro Billy Wilder , diretor impecável e , claro , como não adorá-la : Marlene . E , já que fui liberada em comentários , só um a mais : é ao rever filmes assim que sinto justificada minha nostalgia . Realmente , esse filme é o máximo ! Eu o vi lá pelos anos 60 , creio , no cine Metrópole em BH.Depois de tudo que você escreveu , estou com uma vontade imensa de revê-lo . Farei isto . Concordo plenamente com você - Para nos satisfazer , bastam = um grande diretor , um belo roteiro , grandes atores e uma história bem contada . Não necessitam firulas , 3ds , etc Ah ! Marlene Dietrich ! Que beleza diferente , que pernas , que atriz ! tio , por que não uma ferramenta que permita o envio das anotações ? por exemplo , falei pro geraldão , especificamente sobre a radação , o texto , o conteúdo da nova anotação do testemunha de acusação … vou então copiar o link e enviar ao papai . olha , a tua página está sensacional . simples , objetiva , fácil , ‘ leve ’ … tua cara . um abraço teu sobrinho curitibano beto vaz Tudo o que foi dito é verdadeiro…ou quase tudo , pois faltou dizer uma dura verdade : por mais extraordinário que o filme seja , Billy Wilder cometeu um erro primordial : não foi o advogado
quem deu a idéia para a personagem de Marlene Dietrich , não ! Quando o filme começa , o personagem de Marlene já está à procura ESPECIFICAMENTE do personagem de Charles Laugton , pois toda a trama já estava armada…O que , aqui pra nós , elimina a desculpa de “ adaptação ” , até porque não havia como “ adaptar ” a coluna vertebral da história de Agatha ( que é de 1954 ) . Quem leu o texto original da ” velhinha louca ” vai entender o que estou dizendo … Esse é um dos motivos pelo qual frequento seu blog ! Nunca tinha ouvido falar desse filme ( me envergonho disso ) e o 1001 filmes para ver antes de morrer lista seis filmes de Billy Wilder , mas não testemunha de acusação . Nesse caso , eles deveriam se envergonhar também , principalmente pelo fato de listarem lixos como avatar e filmes por demais supervalorizados , como onde os fracos não tem vez e quem quer ser um milionário . Consegui comprar o filme pela livraria da folha ( pena que com o terceiro homem e pacto de sangue não estou tendo a mesma sorte ) e já assisti duas vezes , a segunda delas com meu irmão , que também adorou . A frase com que vc inicia o texto , descreve perfeitamente o filme : “ É o máximo , uma obra prima , uma perfeição ” . Basta dizer que no dia seguinte a assistir ao filme , interrompi no meio a leitura de Admirável Mundo Novo e comecei a reler um livro da Agatha Christie ( para desespero dos professores de literatura ) . Novamente , obrigado pela dica ! “ ( E aí não consigo me impedir de anotar sobre a extraordinária riqueza da língua inglesa . Há bem no começo do filme um diálogo que usa três palavras para o que , na última flor do Lácio inculta e bela , temos apenas uma , “ advogado ” . Num único diálogo , quando Sir Wilfrid conhece Leonard , fala-se em lawyer , solicitor e barrister . Lawyer é o termo genérico , o cara que estudou Law , a lei ; solicitor é o advogado das causas cíveis , acho eu ; barrister – aí está a riqueza – é o advogado que fica diante da bar , a barra do tribunal , ou seja , o advogado criminal , que enfrenta júris . Não sei se é riqueza da língua ou da civilização inglesa – ou um indício de que aquele povo tem mais respeito à lei do que outros povos , mais recentes , mais novos , criados nos trópicos – povos mais chegados a uma ginga de corpo , ao jeitinho , à esperteza , à Lei de Gérson , a presidente da República que zomba das leis . ) ” Sem a menos sombra de dúvida a quantidade de termos sinônimos de um idioma claramente indica toda a riqueza e sofisticação da língua . Isso
para não mencionar seu óbvio respeito às leis e instituições – conseqüência natural da existência de diversos termos unívocos . Oi , Sérgio , concordo em gênero , número e grau com a Luciana , q diz q , traduzindo , um filme baseado em livro da dame Agatha Christie , dirigido pelo maravilhoso Billy Wilder e com um elenco de primeira como esse só poderia dar em um filme de primeira linha q a gente não cansa de rever ! Só gostaria de fazer uma observação : porque esse menosprezo pela autora de policiais ? Sei q os metidos a intelectuais consideram o policial um sub-gênero na literatura , mas há policiais e policiais . Uma escritora capaz de criar detetives do quilate do belga Hercule Poiror , q faz toda a sua investigação usando o q ele chama de “ massa cinzenta ” , ou seja , a Psicologia dos envolvidos no crime e a senhorinha inglesa Miss Marple , q consegue resolver crimes q a pp Scotland Yard não consegue , por meio de um paralelo com a vida em sua vila do interior não pode ser considerada menos importante e interessante q o Huxley , do livro citado pelo Rafael . Eu protesto contra esse preconceito , a meu ver , indevido . Beijos Guenia Bunchafthttp://www.sospesquisaerorschach.com.br Cara Guenia , você pergunta por que “ esse menosprezo pela autora de policiais ” . Da minha parte , não há menosprezo algum ; muito ao contrário . Eu curto Agatha Christie ; já li dela , como digo no texto acima , uns 50 livros . E adora o romance policial , como demonstro no site 50 Anos de Textos – basta você dar uma olhada na tag Livros , lá . Agora , quanto ao menosprezo por Agatha Christie , e pelo romance policial como um todo , por parte dos acadêmicos , dos críticos literários , sei lá eu – problema deles , uai ! Um abraço ! Sérgio Oi , Sergio , falei sobre a Agatha Christie não criticando vc , é claro , mas os professores do Rafael , q não sabem distinguir um bom policial de um mau policial ! Como em qq gênero , romance , drama , biografia etc há livros de boa e de má qualidade , o q me incomoda é achar q , pelo fato de ser policial é necessariamente ruim , como os cinéfilos cults acham q todos os filmes do Bergman são necessariamente “ bons ” . Generalizações costumam ser perigosas , me parece . Beijão Guenia Bunchafthttp://www.sospesquisaerorschach.com.br Oi , Sérgio Mas que maravilha de filme , para mim realmente é o melhor filme de Billy Wilder ! A primeira reviravolta , em que a Marlene Dietrich se coloca contra o marido eu já tinha esquecido , assim como a reviravolta final que levou a gerência do filme a pedir ao espectador que não comente com seus amigos o segredo do final de Testemunha da Acusação . Isso que é filme de tribunal , mas é
também um suspensaço muito humano , típico da Agatha Christie , cujos policiais eu adoro justamente porque levam muito em conta os sentimentos das pessoas e acho que isso é o mais importante em qualquer história e filme ! Guenia Bunchafthttp://www.sospesquisaerorschach.com.br [ … ] Douce , de 1963 , o policial finge ser cafetão , que por sua vez finge ser um inglês milionário . Em Testemunha de Acusação , de 1957 , o personagem de Marlene Dietrich finge … ( Não tem sentido revelar o que ela finge . ) Em [ … ] [ … ] anuncia no Times que precisa de uma babá . ( A babá anterior , Kate Nanna , interpretada por Elsa Lanchester , pede demissão no início da narrativa por não aguentar mais os dois filhos dos Banks . ) Mrs . [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * Sangue de Pantera / Cat People De : Jacques Tourneur , EUA , 1942 Nota : Credo em cruz , como é ruim Sangue de Pantera / Cat People , um clássico famoso , respeitado , elogiadíssimo , feito por Jacques Tourneur na sua fase Hollywood , em 1942 ! Não é que seja ruinzinho . É um horror , é pavoroso , é agressivamente , grotescamente , pateticamente ruim . Não há absolutamente nada nele que funcione , que tenha algo que remotamente lembre algum talento , alguma inteligência . A história , a trama é ridícula , inacreditavelmente ilógica , sem pé nem cabeça . As situações são canhestras , daquelas de dar profunda vergonha no pobre espectador . Os diálogos são caricatos . Os atores estão pessimamente dirigidos . Ed Wood , que passou para a história como o pior diretor de cinema do mundo , morreria de vergonha se seu nome fosse associado a esta monumental trolha . E , no entanto , o filme é tido como um clássico . Mereceu loas e loas ( em seguida vou transcrever algumas que certamente vou encontrar nos alfarrábios ) , deu origem a uma continuação , Maldição do Sangue de Pantera / The Curse of the Cat People , de 1944 , com o mesmo trio central de atores , mas dirigido por Gunther von Fritsch e Robert Wise . E teria uma refilmagem nos anos 1980 , com o mesmo título original , Cat People , no Brasil A Marca da Pantera . Vi essa refilmagem – dirigida por Paul Schrader , com a deslumbrante Nastassja Kinski no papel central – na época , e , fora a beleza da atriz , nada me impressionou muito . Um spoiler ? Ou seria chover no encharcado ? Claro , como a refilmagem é de 1982 , exatamente a época em que o cinema partia para a explicitude total , a transformação da heroína em pantera é absolutamente explícita , enquanto no original ela não é mostrada . Vixe – seria um spoiler dizer que heroína
se transforma em pantera ? Mas se o próprio título do filme já indica isso … Será que o filme é bom mesmo e eu é que estava num dia ruim , e isso é que explicaria por que o achei tão absolutamente horrendo ? Pode ser , pode ser . Essas coisas acontecem com frequência . Assim como o santo da gente simplesmente às vezes não vai com o santo de outras pessoas , isso também acontece em relação aos filmes . Pode ser , pode ser . Mas devo dizer que tinha imensa curiosidade em ver o filme tão badalado ; não tenho absolutamente nada contra Jacques Tourneur , ao contrário ; e me sentei para ver o filme com a melhor boa vontade do mundo . E gosto muito dos filmes de horror dos anos 30 e 40 . Mas só com base na primeira seqüência já dava para ver que o filme é ruim . A moça Irena ( Simone Simon ) está no zoológico , diante da jaula da pantera , com um grande bloco de papel de desenho à sua frente . Desenha um pouco , rasga uma folha , joga no chão . O rapaz Oliver ( Kent Smith , na foto acima com Simone Simon ) pega a folha , indica para a moça um cartaz que adverte contra a sujeira . Daí a pouco estão conversando , se apresentando , se conhecendo . Daí a dez minutos estão se casando – mas sem sexo , porque sexo e / ou ciúme , essas coisas fortes , poderiam despertar em Irena o sangue de pantera que ela carrega em suas veias originárias da Sérvia . Essa simples descrição pode não indicar algo tão ruim – mas é tudo ruim demais . Toda a situação , os diálogos , é tudo forçado , artificial , falso – falso , falso como uma nota de três guaranis . E ainda por cima a atriz central não tem qualquer tipo de graça ou charme A história que a moça conta para o rapaz , sobre o Rei João da sua Sérvia natal – o rei que expulsa os maus da Sérvia … É tudo bobo , bocó , bocó demais . E não adianta a argumentação de que a , a rigor , a rigor , as histórias de Drácula e Frankenstein são tão ilógicas quanto a do Rei João da Sérvia e o povo mau , povo de gato , que ele combateu . As histórias de Drácula e Frankenstein têm sua própria lógica interna , e , nessa lógica , tudo funciona . Já essa história aqui , não : ela não tem lógica alguma , não tem sentido , não se sustenta , é tudo falso e forçado . A própria atriz que faz Irena , a sérvia , Simone Simon … A moça não tem atrativo nenhum , absolutamente nenhum . Não é bela , não tem presença forte , não sabe atuar , o papel é ridículo , os diálogos
são falsos . Entre Simone Simon e Jane Randolph , a atriz que faz Alice , a colega de trabalho de Oliver que causa ciúmes em Irena , não pode haver dúvida possível : Jane Randolph ( na foto abaixo ) dá de cem a zero . É mais bonita , tem mais presença , tem mais charme . Um caso exemplar de má escolha de atores . A única coisa que Simone Simon tem que talvez justificasse sua escolha para fazer a sérvia é seu sotaquezinho francês . Bem , francês não tem nada a ver com sérvio , mas , para o público americano , sotaque estrangeiro é sotaque estrangeiro , e pronto . O sotaquezinho francês de Simone Simon vem acompanhado de um leve tique em que o canto direito dos lábios dela vira para cima . “ A história e os elementos da trama não se seguram , mas … ” Ah , bom … Bem , chega de reclamar que nem mendigo na chuva . Vamos à chuva de loas a este grande clássico do filme de terror . Leonard Maltin dá 3 estrelas em 4 : “ A história e elementos da trama não se seguram , mas momentos de choque e terror permanecem intocáveis no primeiro dos famosos filmes de horror do produtor Val Lewton . Smith se apaixona por mulher estranha , tímida ( Simon ) que teme a antiga maldição da pantera dentro de si . ” Pauline Kael , a grande dama da crítica americana : “ O psicanalista ( Tom Conway ) calmamente explica à sua paciente ( Simone Simon ) que sua idéia de que ela está se transformando num membro da família dos gatos é uma fantasia ; ela o silencia . Val Lewton fez seu nome como produtor com este irônico filme de horror , produzido para a RKO com um orçamento minúsculo . Enquanto outros produtores de horror de orçamento B ainda estavam usando gorilas , casas assombradas e braços decepados do corpo , Lewton e o diretor , Jacques Tourneur , empregavam a sugestão , efeitos sonoros horripilantes , e inventivos ângulos de câmara , deixando tudo para a imagem cheia de medo do espectador . Os filmes de Lewton não são propriamente muito bons , mas são tão imaginativos que a maioria dos filmes de horror que outros produtores estavam criando nessa época , e a sua ingenuidade parecia praticamente revolucionária . Algumas seqüências , como a do medo na piscina , são , à sua própria maneira , clássicas . A atuação da maior parte do elenco não está à altura dos efeitos . ” As coisas sob a perspectiva histórica . Tá bom . Mas … OK : Dame Pauline Kael pôs as coisas sob a perspectiva histórica , contextual , do momento . Isso é uma maravilha , isso é preciso ser feito . Eu mesmo quase sempre procuro fazer isso , e não fiz em relação a este filme aqui – só fiquei desencando com os piores adjetivos que
me vinham à cabeça . De fato , há bons ângulos de câmara . Há bom aproveitamento das sombras . Nada que o expressionismo alemão já não tivesse feito 20 anos antes , mas , sim , há bons ângulos , bom uso das sombras . Mas para mim uma pantera não é algo tão mais imaginativo como fonte de terror que um gorila , ou casas assombradas . A sequência da piscina , sim , a sequência da piscina . De fato é bem feita . Bastante bem feita , aliás . O uso das sombras , o teto da piscina coberta refletindo sombras e luzes . Os ruídos . Sim , é uma bela sequência – embora completamente gratuita dentro da história . Não havia nada para justificar que Alice fosse dar um mergulho naquele momento . Mas tudo bem – deixando a lógica de lado , é uma bela sequência . Só que o susto acaba ficando comprometido com a posição em que o diretor colocou a pobre Jane Rudolph-Alice no meio da piscina , sem poder ficar de pé , e então ela fica paralisada de susto mas ao mesmo tempo tendo que agitar braços e pernas , nadando feito cachorrinho , para não afundar . Não dá para o espectador se assustar , se ele está morrendo de vergonha do papelão que obrigaram a pobre atriz a fazer ! Mestre Jean Tulard também se seduziu pelas graças da felina que não quer saber de sexo porque o sexo – assim como o ciúme – poderia despertar a pantera que existia nela . Diz ele , no seu Guide des Films , sobre La Féline , como o filme se chamou na França : “ Admirável filme fantástico em que tudo é sugerido , pela falta de meios mas também por decisão voluntária , para mais amedrontar . A obra teve um enorme sucesso na época do lançamento e fortaleceria a RKO . ” Mestre Jean Tulard , Dame Pauline Kael , o contexto histórico , todos eles que me perdoem , mas para mim a verdade dos fatos é que Cat People não é um filme de horror : é um filme horroroso . É , caríssimo José Luís , todas as referências são elogiosas . Existem casos assim , que eu não consigo compreender . Alguns filmes passam a ser intocáveis ; todos os críticos fazem coro , ninguém ousa discordar . Alguns – como este aqui – são grandes blefes , imposturas . Um abraço . Sérgio Pegando em suas próprias palavras , caro Sérgio , você só podia estar mesmo em dia ruim quando assistiu a esta pequena jóia do Tourneur . Mas compreendo que haja filmes assim , que por qualquer motivo – quase sempre obscuro e pouco racional – não nos despertam outro sentimento que não a da embirração mais básica . E compreendo porque eu próprio já tive casos assim , que posso resumir no título português daquele filme com o Sidney Poitier e a Lulu dos anos 60
: “ O ódio que gerou o amor ” ( “ To Sir With Love ” ) Por isso deixe passar algum tempo e num dia não muito problemático volte a este filme . É capaz de nessa altura valer mesmo a pena a nova tentativa . Também gostei da versão dos anos 80 , com a Kinski e o McDowell , mas claro , o grande clássico é mesmo este . Um bom ano de 2012 Prezado Sérgio ! Este filme causou-me grande impacto pela cena da metamorfose . Já tinha visto metamorfoses de lobisomens , é claro , mas uma metamorfose sensual como aquela , foi a primeira . Realmente adorei a cena . Pena que os infelizes criaram uma sequência absurda , fazendo a pantera “ desistir ” de devorar o amante . A cena em que o mocinho devolve a mocinha ao mundo dos gatos também não me agradou ; foi um finalzinho muito fraco . Contudo , ainda assim gostei do filme , sem elevá-lo à categoria dos “ clássicos ” . Cordial abraço . Um Só Pecado / La Peau Douce De : François Truffaut , França , 1964 Nota : Anotação em 2011 : Não são felizes os amantes , nas histórias de amor filmadas por François Truffaut . La Peau Douce , a pele doce , no Brasil Um Só Pecado , de 1964 , é uma triste história de amor . Da mesma forma que o anterior Jules et Jim e os posteriores As Duas Inglesas e o Amor , A História de Adèle H . e A Mulher do Lado . Jules et Jim e As Duas Inglesas e o Amor baseiam-se em romances , os dois do mesmo escritor , Henri-Pierre Roché ( 1879-1959 ) . A História de Adèle H . se baseia nos diários da filha de Victor Hugo , Adèle . Este La Peau Douce , um de seus primeiros filmes , assim como A Mulher do Lado , seu penúltimo , são histórias originais do próprio Truffaut – La Peau Douce tem argumento e roteiro assinados por ele e Jean-Louis Richard . Sejam criações do próprio cineasta , sejam baseados em romances ou em fatos reais , todos eles mostram amores tumultuados , tempestuosos , trágicos – ou simplesmente amores que não dão certo . La Peau Douce é , entre esses cinco filmes que tratam das paixões amorosas , o de história mais simples , mais curtinha , mais linear , mais sem grandes surpresas – pelo menos até os dez minutos finais . Fala de uma história de amor que não dá certo . Um homem bem sucedido , casado com bela mulher – mas surge outra Truffaut estava com 32 anos quando fez este filme , em que o personagem central , Pierre Lachenay , está na faixa dos 40 e tantos . Jean Desailly – ator de teatro de imenso prestígio que interpreta o protagonista , na foto – , tinha 44 . Os números não são gratuitos . Indicam claramente
que Truffaut estava falando de uma experiência de vida que ele mesmo ainda não tinha tido . Pierre Lachenay é um homem bem sucedido . Tem uma pequena editora , edita uma revista literária , é autor de diversos livros sobre literatura , conhece profundamente a vida e a obra de Stendhal e Balzac , é convidado para dar palestras em diversos locais . Quando a ação começa , ele está chegando em casa – um amplo , confortável apartamento parisiense – , para pegar a mala e ir o mais depressa possível para o aeroporto , para uma viagem a Lisboa , onde faria uma palestra sobre Balzac . Mal tem tempo de conversar com sua mulher , Franca ( Nelly Benedetti , na foto acima ) , que está recebendo a visita de uma grande amiga , Odile ( Paule Emanuele ) . Discutem um pouco sobre ela levá-lo até Orly – ele não poderia ir sozinho de carro porque perderia muito tempo para estacional , e Franca lembra que ele sempre implica com o jeito dela de dirigir . Acaba pegando carona com o marido de Odile , que leva junto a filhinha de Pierre e Franca , Sabine ( Sabine Haudepin ) , garotinha de uns oito , nove anos . No avião de Paris a Lisboa , Pierre Lachenay vai ver pela primeira vez Nicole – o papel de Françoise Dorléac , belíssima , maravilhosa , radiante em seus 22 aninhos de idade . Uma narrativa feita de pequenos detalhes Ao rever o filme agora , depois de ter visto uma vez muitas décadas atrás , me impressionou demais como a narrativa de Truffaut , em La Peau Douce , se faz de pequenos detalhes . Um detalhe bem en passant : Pierre implica com o jeito como sua mulher Franca dirige . No caminho entre a casa de Pierre e o aeroporto de Orly , a câmara mostra duas ou três vezes o marido de Odile trocando a marcha de seu carro . Um pequeno detalhinho para mostrar a pressa que ele tinha , Pierre estando em cima da hora . Um pequeno detalhe que não tem qualquer importância na narrativa , mas é de especial interesse para os brasileiros : Pierre embarca num avião da Panair do Brasil . O nome Panair do Brasil será visível em diversas tomadas , a bandeira do Brasil , também . Uma pequena relíquia histórica . La Peau Douce é de 1964 , o ano do golpe militar que acabaria levando ao desaparecimento da Panair . Pierre viaja na primeira classe . Nicole é aeromoça da primeira classe do avião da Panair do Brasil . Quando o avião está chegando perto de Lisboa , Nicole vai para a área dianteira do avião , perto da cabine dos pilotos , e fecha a cortina . Entre a extremidade inferior da cortina e o chão fica um pequeno espaço de uns dez centímetros . Pierre vê – assim como o espectador – , naquele pequeno espaço , que Nicole
tira o sapato de salto baixo que estava usando até então , e calça sapatos de salto alto . Pierre chega a esboçar um sorriso ao ver a cena deixada à mostra pela fresta entre a cortina e o chão . Truffaut adora pernas de mulher , pés de mulher . Haverá mais detalhes sobre pernas e pés , no filme e nesta anotação . Uma coincidência , dessas de que a vida é cheia – e começa um caso de amor Na hora do desembarque , Nicole desce a escada do avião logo atrás de Pierre . Há fotógrafos e repórteres na pista , à espera da sumidade francesa que chega para dar palestra em Lisboa , e são feitas fotos em que a bela aeromoça aparece ao lado do conferencista . No dia seguinte , uma foto dos dois estará na primeira página de um jornal lisboeta . Evidentemente , não houve qualquer combinação , mas o hotel em que Pierre se hospeda em Lisboa , o Tívoli , é o mesmo em que está a tripulação . Uma coincidência , destas de que a vida é cheia . Entram juntos no elevador do hotel – Nicole , um colega dela , o co-piloto Franck ( Gérard Poirot ) , e Pierre . Franck desce primeiro – ficam no elevador Nicole e Pierre . Pierre estava hospedado no terceiro andar , mas não desce . Ninguém fala uma palavra . O elevador sobe bem devagar . Detalhes , pequenos detalhes . Um pacote que Nicole carrega cai no chão – e , junto com ele , a chave do quarto . Pode-se ver o número do apartamento – 813 . O pacote caiu no chão , simplesmente ? Ou Nicole o deixou cair de propósito , junto com a chave , para que Pierre soubesse o número do apartamento em que está hospedada ? Nicole fecha a porta para que a câmara , discreta , não veja a cena de sexo A narrativa prosseguirá sempre assim , feita de pequenos detalhes . No vôo de volta a Paris , Nicole anota o número de seu telefone no verso de uma daquelas caixinhas de fósforo promocionais , e , ao servir os passageiros da primeira classe , entrega a caixinha a Pierre . Ele faz menção de que não é necessário , mas ela insiste em que ele a guarde . Só algum tempo depois , já em Paris , ele abrirá a caixinha e verá o número do telefone . Guardará cuidadosamente o pedaço de papel em sua carteira – a câmara mostra o pedaço de papel em close-up mais de uma vez . Bem mais tarde , lá pelo meio da narrativa , talvez já na segunda metade , depois de uma desgastante , exasperante experiência de Pierre e Nicole em Reims , os dois amantes conseguem enfim ter um dia calmo num hotelzinho de província . É uma das raras vezes em que os vemos conversar , o intelectual maduro , respeitado , famoso , casado
e pai de uma filhinha encantadora , e a jovenzinha aeromoça tão inculta e bela quanto a última flor do Lácio do país em que se conheceram . Pierre faz perguntas sobre ela , seu passado , seus namorados , seus amantes . É também uma das poucas seqüências em que a câmara de Truffaut e do maravilhoso diretor de fotografia Raoul Coutard , o fotógrafo de 9 em cada 10 filmes da nouvelle-vague , repousa mais longamente sobre o rosto resplandescente de Nicole-François Dorléac . A conversa se encaminha para um ponto em que cessará para dar lugar à ação . Pierre abraça Nicole . Nicole se levanta , pega a bandeja do café do manhã e a leva para fora do quarto , deposita-a no chão , e fecha a porta . A câmara fica ali parada mostrando a bandeja com os restos do café da manhã no chão e a porta fechada . Como se , tímida , ou melhor , discreta , a câmara tivesse se recolhido para não mostrar o ato de amor que se passa entre as quatro paredes do quarto . É um pequeno detalhe – mas um pequeno detalhe maravilhoso , um toque de ternura , uma marca registrada do cineasta . Ele poderia ter cortado aquela tomada da bandeja no chão após alguns poucos segundos – seu recado já estava dado . Mas , não . A câmara continua fixa , mostrando a bandeja , e um gatinho se aproxima , experimenta as iguarias contidas na bandeja . Um pequeno detalhe , mais uma marca registrada de François Truffaut . Em A Noite Americana , de 1973 , seu filme sobre os filmes , o cinema , o universo do cinema , o próprio Truffaut , fazendo o papel do diretor do filme que está sendo rodado dentro do filme , colocará um gatinho em cena , para se aproximar de uma bandeja deixada diante de um quarto de hotel . O gato se recusa , durante algum tempo , a executar os movimentos desejados pelo diretor . Cinema com assinatura , pessoal e intransferível . O jeans esconde as pernas de Nicole – e então ela veste uma saia Antes da malfadada experiência em Reims , há outros pequenos detalhes fascinantes . Os dois , Pierre e Nicole , estão viajando no pequeno carrinho de Pierre ( como eram pequenos , os carros franceses da primeira metade dos anos 60 … ) de Paris para Reims . Há uma tomada de cima para baixo das pernas de Nicole , como se a câmara fosse os olhos de Pierre . Ele comenta que nunca a tinha visto de blue jeans – e acaba por confessar que prefere vê-la de vestido , ou saia . Param num posto de gasolina para reabastecer . Detalhe dentro do detalhe : a câmara focaliza diversas vezes a mangueira na abertura do tanque de gasolina , diversas vezes a bomba de gasolina marcando o número de litros e de francos . Sem que Pierre perceba ,
Nicole escapa . Tanque cheio , Pierre nota que Nicole não está no carro . Começa a ficar inquieto – e ela reaparece , vinda do banheiro do posto de gasolina , vestindo uma saia . Nicole adormece . E então Pierre e a câmara de Truffaut acariciam a pele doce Pierre havia sido convidado para dar uma palestra em Reims , e convenceu Nicole a ir com ele ; ele daria a palestra , e em seguida os dois teriam dois dias inteiros sozinhos , em algum pequeno hotel do interior , antes de voltar a Paris . A viagem a Reims acaba se tornando o centro , o fulcro , a essência da história de Pierre e Nicole , na minha opinião . É quando se evidencia mais a imensa diferença entre os dois , a distância que os separa – de idade , de classe social , de nível cultural , de tudo . Pierre não quer ser visto com Nicole pelas pessoas que o convidaram para a palestra . Simples medo de que seu caso extra-conjugal se torne público ? Sim , certamente – em parte por isso . Mas também para não expor que sua amante não é uma pessoa culta , de fina educação , de fina origem ? Em que medida há o temor de que a informação se espalhe e chegue aos ouvidos de Franca , a esposa , e em que medida há o preconceito social , o convencionalismo , a caretice pequeno-burguesa ? O que Nicole enfrenta em Reims é penoso , humilhante , degradante . O espectador fica com raiva de Pierre , de sua fraqueza , sua tibieza , sua pequenez . E no entanto Nicole o perdoa . Dessa vez , ao menos . Primeiro fala em voltar sozinha de trem para Paris , mas depois aceita ir com ele para os prometidos dois dias de calma , só para os dois , no hotelzinho sossegado de província . É logo após a chegada ao hotelzinho que há o que , para mim , é a seqüência mais bela do filme . Chegam ao hotel no início da manhã , depois da exasperante experiência em Reims e de uma madrugada na estrada . Nicole está exausta ; deita-se na cama e adormece instantaneamente , enquanto Pierre fecha as cortinas das janelas . Está toda vestida , não teve forças para tirar sequer o sapato . Pierre a contempla na penumbra . Tira seus sapatos , um a um , devagarinho – close-up dos pés . Depois ergue o vestido , e a câmara mostra em close-up a liga que prende a meia de nylon , no alto da coxa . Pierre acaricia a coxa enquanto tira a meia . A câmara de Truffaut acaricia a pele doce . La peau douce . The soft skin , como o filme se chamou nos Estados Unidos . Silken skin , como foi o título na Inglaterra . La piel suave , o título na Espanha . Os exibidores brasileiros
, idiotas , inventaram este Um Só Pecado . Em Portugal , para não ficar atrás , chamaram o filme de Angústia . Um homem fraco , que não toma decisões , atitudes , e é levado pela vida Não sei , é claro , exatamente o que Truffaut quis dizer , com essa história de amor que não chega propriamente a ser uma história de amor . É , a rigor , a história de um amor que não deu certo – ou sequer chegou a existir . Para mim , a sensação que ficou , nesta revisão , é que a rigor Pierre não consegue amar ninguém . Intelectual , autor de livros , respeitado , famoso , gosta , naturalmente , de ser admirado , incensado – mas dar amor , disso é absolutamente incapaz . O que se mostra de sua relação com Franca , a esposa , não é amor , respeito e admiração mútuos . Ele está sempre impaciente com ela , cobrando pequenas coisas , irritado com pequenas coisas . Se houve amor no passado , agora , ao menos , não há mais – é uma relação de comodidade , de hábito , ele fornecendo o dinheiro , ela cuidando das coisas materiais dele . Trata com simpatia a filhinha – mas não há , propriamente , interação entre eles , interesse dele em estar de fato com ela . E sua atração por Nicole … Nicole é a beleza jovem , com todo seu gigantesco poder de atração . A pele doce . Ele chega até a fazer perguntas sobre ela , demonstra interesse em conhecer um pouco dela – mas pára por aí . Chega até a escrever um telegrama em que declara amor a ela – mas não tem coragem de entregar . É um homem que se relaciona com o mundo via pensamento , estudo , verniz cultural . Não sabe expressar sentimentos , emoções – se é que os tem . Na verdade , Pierre é um homem fraco – como fica absolutamente explícito nas seqüências em Reims . Não toma decisões , não toma atitudes . É levado pela vida , pelos que os outros decidem . Em especial , pelo que as mulheres decidem . E Nicole , por sua vez … Pierre a atrai exatamente pela erudição , pelo conhecimento intelectual acumulado , pelo fato de ser famoso , respeitado , bem de vida . Não é uma base de atração que possa permanecer por muito tempo mesmo . Nicole é jovem demais , bela demais , forte demais , independente demais para dedicar muito tempo de sua primavera a Pierre . É uma história fadada a não dar certo . Delerue compôs para o filme uma trilha sonora terna , suave – e até um fado Quero ir aos alfarrábios , ver o que o próprio Truffaut fala de seu filme , mas , antes , é preciso registrar um pouco que seja sobre Georges Delerue . Para La Peau Douce , George
Delerue compôs até um fado . Chama-se “ À Lisbonne ” . É quase um fado legítimo – é uma bela canção , um prenúncio de romance . A trilha de Delerue para La Peau Douce é terna , suave , quase sutil . Perfeitamente apropriada a uma história simples de um amor que não chega a acontecer – bem diferente da trilha que ele faria quase duas décadas depois para A Mulher do Lado , uma história de um amor tempestuoso , agitado , nervoso , à beira de um ataque fatal . Para A Mulher do Lado ( uma cena do filme aparece na capa do CD que reúne as trilhas sonoras para os filmes de Truffaut sobre as paixões amorosas , na foto ) , Delerue faria uma trilha com toques fortes nos violinos – que chega até a fazer lembrar um pouco as melodias fortes , pesadas , trincantes , que Bernard Herrmann , o compositor de vários filmes de Hitchcock , compôs nas suas duas colaborações com Truffaut , em A Noiva Estava de Preto e Fahrenheit 451 . Delerue foi o autor de pelo menos 11 trilhas dos filmes de Truffaut . O cineasta trabalhou com outros compositores – além de Hermann , houve trilhas de Antoine Duhamel e Maurice Jaubert , além de colaborações esparsas com Jean Constintin e Maurice Le Roux . Mas a parceria mais constante foi , sem dúvida , com Delerue . La Peau Douce foi o quarto filme de Truffaut musicado por Delerue . Só oito anos mais tarde os dois voltariam a trabalhar juntos . É uma bela trilha – são músicas que criam os climas das seqüências , mas que têm vida própria , e são extremamente agradáveis de se ouvir sem o filme . Aos alfarrábios , finalmente . Truffaut escreve sobre Françoise Em 1968 , Truffaut escreveu para o número 200-201 dos Cahiers du Cinéma um belo , emocionante , emocionado texto sobre Françoise Dorléac , essa moça que passou pela vida rápido demais , feito um cometa : “ Os filmes desaparecem e também aqueles que os realizam , aqueles que os julgam e aqueles que a eles assistem . Aqueles que os representam também , e ainda que os Cahiers se interessem menos por estes , peço permissão para publicar uma ou duas fotos de Françoise Dorléac , que morreu em 26 de junho do ano passado ( 1967 ) num acidente de carro , a caminho do aeroporto de Nice . Para o público , era uma notícia qualquer , cruel porque atingia uma belíssima moça de 25 anos , uma atriz que ainda não tivera tempo de se tornar estrela . Para todos os que a conheceram , François Dorléac representava antes uma pessoa como se vê pouco na vida , uma jovem incomparável cujo encanto , feminilidade , inteligência , graça e incrível força moral a faziam inesquecível para qualquer um que falasse com ela por uma hora . ” E depois : “ O difícil , para jovens
atrizes , é efetuar harmoniosamente a passagem de adolescente para a mulher , abandonar os papéis juvenis pelos papéis adultos ; creio que Françoise Dorléac , mulher precoce e prematura com rosto e corpo já feitos , era a única jovem atriz de quem se podia achar que agradaria cada vez mais . ” O artigo de Truffaut tinha o título “ Ela se chamava Françoise ” . Muitos anos mais tarde , em 1996 , a irmã mais nova de Françoise , Catherine Deneuve , escreveu , juntamente com Patrick Modiano , uma fotobiografia da atriz morta aos 25 anos de idade , cujo título é exatamente o mesmo , apenas seguido de reticências : Elle s’appelait Françoise … Truffaut primeiro trabalhou com Françoise , neste filme aqui , de 1964 . Só mais tarde trabalharia com Catherine , em A Sereia do Mississipi , de 1969 , e O Último Metrô , de 1980 . Consta que se apaixonou por Catherine – ele sempre se apaixonou por suas atrizes - , e que tiveram um caso . Quando jovem crítico , ele reclamava dos diretores que diziam que o cinema é difícil A definição de Truffaut sobre o filme , numa entrevista em outubro de 1963 , antes , portanto , que a obra ficasse pronta e estreasse : “ É a história , bastante minuciosa , de um adultério . Foi escrita misturando histórias autênticas acontecidas nos últimos anos . Sou um grande amante de histórias reais , e tenho um grande dossiê . A partir de histórias que me intrigaram ou me apaixonaram , com Jean-Louis Richard , escrevemos La Peau Douce . ” Ninguém lê mais que dez linhas na internet , e já escrevi dez mil , mas paciência . Vou em frente . Numa outra entrevista , de 1964 , antes de concluir La Peau Douce – também transcrita no maravilhoso livro Truffaut par Truffaut , editado por Dominique Rabourdin – , o cineasta faz uma extraordinária confissão a respeito da imensa pretensão que ele , como crítico de cinema , tinha . Diz que , quando era crítico , tinha a tendência a ironizar os diretores que diziam que “ o cinema é muito difícil , ” . Preferia aqueles que diziam que “ é muito fácil ” . “ Depois que me tornei cineasta , percebi que me era proibido juntar àqueles da segunda tendência . A inquietude , a ansiedade , a dúvida , o ceticismo , o pessimismo , e eu ousaria acrescentar a angústia , são meu cotidiano desde o primeiro dia de redação do roteiro até a última noite de montagem . Já fiz três filmes ; La Peau Douce é o quarto . ( … ) Gostaria que meu quarto filme não fosse mais um navio em perdição , mas um trem que atravessa o interior . ” Que maravilha ! Não basta o cara filmar genialmente , e escrever genialmente – ele também fala genialmente … “ O fracasso dá vontade de trabalhar depressa ,
de recomeçar ” Em 1968 , quatro anos depois da estréia de La Peau Douce , em outra entrevista , ele diria : “ La Peau Douce , eu soube muito depressa que seria um fracasso . Desde que concluí a montagem . Vi o filme muito lucidamente , como se tivesse sido feito por outra pessoa , e vi que ele era deprimente , que era um filme que ‘ caía ’ . Compreendi então que seria um filme desagradável de se ver . Um filme que ‘ cai ’ raramente é amado . ” Aí então o entrevistador pergunta se o fracasso o deixou muito abatido . E François Truffaut responde que não , que , ao contrário , o fracasso é estimulante . Depois do sucesso , diz ele … “ a expressão ‘ repousar sobre os louros ’ não foi inventada de graça ” . “ Creio que há algo excitante no fracasso . Dá vontade de trabalhar depressa , de recomeçar . ” Tão díspares em quase tudo , Truffaut e Lelouch reagem ao fracasso da mesma maneira Em All That Jazz , de Bob Fosse , o cineasta-coreógrafo-escritor-roteirista-montador Joe Giddeon , ao ver na TV uma crítica de cinema descer a lenha em seu mais recente filme , sente os sintomas de um novo ataque cardíaco , mais um . Em Um Homem , Uma Mulher Vinte Anos Depois , de Claude Lelouch , a produtora Anne Gauthier , assim que percebe que seu mais recente filme é um fracasso , reúne sua equipe e parte para um novo filme . Quando vi o filme , em 1986 , terminei meu texto sobre ele na revista Afinal dizendo que para Lelouch não importa muito se sua obra mais recente foi um sucesso ou um fracasso : “ Como Anne , seu personagem , Lelouch responde partindo para mais um filme ” . É fascinante ver que Truffaut e Lelouch , dois dos cineastas que mais me encantam , tão díspares em quase tudo – um sempre incensado , com toda razão , o outro sempre vilipendiado , absurdamente – pensam e agem da mesma maneira . 4 Comentários Eu devo ter chegado por aqui em um post assim : um texto que faz parecer mais próximo e conhecido o que já me é familiar e faz desejável o que ainda tenho a ver . Dos textos que emocionam pelo quê , mas ainda mais pelo como . Acabo de assistir ao filme pela TV achei interessante as cenas com o avião da Panair e desconhecia o fato da atriz principal ser irmã + velha de Catherine Deneuve . Mas quem me impressionou mais foi Nelly Benedetti ( Franca ) , bonita mulher madura e decidida . Vi o filme hoje no Telecine Cult com curiosidade . Nem sabia que existia esse título na carreira de Truffaut . Também foi o único filme com Françoise Dorleac que vi inteiro . Mas me impressionou bem o ator que faz o intelectual . Um homem de seus
quarenta e tantos anos , não um galã , mas atraente , e uma garota adorável como a Dorleac ( ela tem mesmo certa semelhança com Catherine Deneuve ) . O filme me pareceu ter aquele ritmo frio , mas absorvente , dos de Chabrol , e , no entanto , não parece um thriller ( embora pareça sugerir , a todo momento , que aquele caso de amor vai acabar mal).Achei de fato o personagem do intelectual um fraco , um homem manipulável , e o episódio de Reims , em que ele não tem coragem de se livrar de um chato para se encontrar com a mulher que ama , é repleto da angústia dos covardes . Ele é bem o tipo que , diante de uma situação , ao invés de enfrentá-la , foge . Não tem a convicção de seus sentimentos , não está à altura deles , prefere talvez ( como você diz ) o distanciamento de uma vida mais cerebral , por isso seu comodismo e sua dependência das mulheres . Não quer problemas , em suma . Uma atitude irreal e pouco viril diante da vida . Mas achei um bom filme . E , ao contrário do que Truffaut diz , não é um fracasso . Mas certamente não é um filme para o grande público . 5 Trackbacks [ … ] achei fascinante esse fenômeno de os franceses , de uma maneira geral , e os grandes cineastas ( vide François Truffaut e Jacques Demy ) de maneira especial , admirarem mais o cinema americano do que boa parte dos [ … ] [ … ] François Truffaut , o cineasta da ternura , fez uma declaração de amor à literatura em Fahrenheit 451 ( 1966 ) , uma ao cinema em A Noite Americana ( 1973 ) . O Último Metrô ( 1980 ) é uma declaração de amor ao teatro . Mas , a rigor , todos os filmes dele são amplas declarações de amor a todas as formas de arte , a todas as formas de amor – mesmo os mais trágicos , mais amargos . [ … ] [ … ] a irmã mais velha de Catherine Deneuve , que morreria tragicamente aos 25 anos de idade ) , em Um Só Pecado / La Peau Douce ( 1964 ) . A história de amor dos dois é triste , muito triste – e , como outras histórias de amor [ … ] [ … ] Um plano-sequência , em especial , deixa o cinéfilo mesmerizado : a câmara pega toda a movimentação da praça , as dezenas de pessoas atarefadas montando seus palcos , suas barracas , gente dançando , gente cantando . E aí ela vai fazendo um zoom em direção a uma grande edificação de uns três andares diante da praça , e o zoom vai chegando mais e mais perto de uma janela do segundo andar , e aí a câmara entra na ampla sala que dá para a praça , e vemos
les demoiselles de Rochefort , as duas garotas românticas do título brasileiro , as gêmeas Delphine e Solange Garnier , interpretadas pelas irmãs Catherine Deneuve e Françoise Dorléac . [ … ] Postar um Comentário O seu email nunca é publicado ou compartilhado . Os campos obrigatórios estão marcados com um * O Grande Amor de Nossas Vidas / The Parent Trap De : David Swift , EUA , 1961 Nota : Era 1961 , e aqui , neste país periférico , atrasado , sequer existia divórcio , esse pecado implantado na Grã-Bretanha por Henrique XVIII lá por 1500 e tanto , que só chegaria ao Brasil em 1977 . Mas , no filme – uma produção dos estúdios Disney , voltada para toda a família , em especial o público juvenil – , as duas garotinhas de 13 anos de idade conversam sobre o tema . – “ É assustador como os casais já não ficam juntos hoje em dia ” , diz Susan , interpretada por Hayley Mills , aquela gracinha . “ Em breve vai ter mais divórcios que casamentos . ” The Parent Trap , ou armadilha dos pais , mais exatamente armadilha para os pais , que no Brasil teve o título de O Grande Amor de Nossas Vidas , é uma absoluta delícia de filme . Para muita gente , pode perfeitamente parecer um filme datado , velho , antiquado , bobo – e datado ele é , sem dúvida alguma . Mas até o fato de ser datado é interessante , fascinante . Ver The Parent Trap hoje , 54 anos e tanta revolução comportamental depois que ele foi feito , é também como observar uma peça de museu , com os ensinamentos sociológicos que isso traz . Uma produção Walt Disney de 1961 que fala de divórcio , afinal , serve também para nos mostrar quais eram os valores daquela época pré-pílula , pré-vitórias do feminismo , pré-Beatles , pré-minissaia , pré-hippies . Foi a atração dessa coisa histórica , museológica , que me fez , enquanto zapeava uma noite , querer gravar o filme . Mas , ao vê-lo , percebi de cara que seu valor não é apenas como peça histórica . Não : é também um filme gostoso , divertido . E , afinal de contas , tem Hayley Mills , num delicioso papel duplo , como a estudiosa , séria Sharon McKendrick , criada em Boston pela mãe de família rica tradicional , rígida , conservadora , e como a moderninha , espevitada , festeira Susan Evans , criada na Califórnia pelo pai , um rico fazendeiro chegado aos esportes e à convivência com a natureza . Hayley Mills foi uma imensa sensação no começo dos anos 60 Hayley Catherine Rose Vivien Mills , muito pouco lembrada hoje , estourou no inicinho dos anos 60 como a sensação de atriz mirim , a garotinha doce , suave , que poderia talvez vir a ser a nova Shirley Temple . Nascida em 1946 , em Londres , era filha
de uma dramaturga , Mary Hayley Bell , e do grande ator John Mills ( 1908-2005 ) , um dos preferidos do mestre David Lean ( 1908-1991 ) . Consta que o diretor J . Lee Thompson viu a garotinha Hayley representando uma cena na sua própria casa – e , encantando , insistiu com John Mills para que a menina participasse do filme que fariam juntos em seguida , Marcados pelo Destino / Tiger Bay ( 1959 ) , um thriller pesado , sério . A interpretação da garotinha de 13 anos foi premiada no Festival de Berlim , impressionou críticos mundo afora e foi suficiente para os estúdios Disney corressem para oferecer a ela um contrato de cinco anos . O segundo filme de sua carreira , o primeiro nos Estados Unidos , foi Pollyanna ( 1960 ) , tremendo sucesso de público e crítica . O filme seguinte foi este The Parent Trap . É uma delícia ver Hayley Mills em dose dupla na tela – e impressiona demais a competência dos técnicos responsáveis pelos efeitos especiais que tornaram possível esse milagre , décadas antes da Industrial Light & Magic de George Lucas e das imagens geradas por computação . Não , é claro , que tenha sido a primeira vez que se conseguiu efeito semelhante . Charlie Chaplin – para dar apenas um exemplo – já havia posto um único ator para fazer os papéis de gêmeos em O Circo , de 1928 . Não que as cenas com duas Hayley Mills tenham sido uma inovação – mas que é tudo feito com uma competência espantosa , ah , lá isso é . Foi a terceira bilheteria do ano nos EUA . E a história deu origem a quatro filmes The Parent Trap se baseia em uma história alemã , “ Das doppelte Lottchen ” , escrita por Erich Kästner , que já havia dado origem a um filme inglês em 1953 , Twice Upon a Time . O autor do roteiro foi o próprio diretor do filme , David Swift , que já havia dirigido Hayley Mills em Pollyanna . O filme foi grande sucesso de público na sua época ; nos Estados Unidos , foi a terceira maior bilheteria do ano , abaixo apenas das superproduções Os Canhões de Navarone e Exodus , suplantando O Professor Aloprado , O Álamo e Quando Setembro Vier . Marcou tanto que , cerca de um quarto de século mais tarde , em 1986 , foi lançado The Parent Trap II , no Brasil Operação Cupido 2 , com uma história bem semelhante à do filme original . Hayley Mills , então com 40 anos de idade , fazia a mãe de uma das duas garotinhas da história . Mais ainda : a história seria refilmada em 1998 , com o mesmo título original , The Parent Trap , no Brasil Operação Cupido , com a então garotinha Lindsay Lohan , aos 12 anos de idade , refazendo os papéis que haviam sido de Hayley Mills em 1961