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5 classes
Sr. Presidente, quero também interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos e colocar à consideração de V. Ex.ª uma questão que já ontem tivemos oportunidade de pôr à discussão na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, a qual tem que ver com a falta de condições, em nosso entender, para esta proposta de lei ser hoje apreciada e discutida na Assembleia da República. De facto, esta proposta de lei contém inúmeras normas que dizem respeito à legislação laboral. Dou apenas como exemplo a norma do artigo 122.º, que diz respeito à duração dos contratos a termo. Esta proposta não respeita os requisitos legais previstos no Código do Trabalho, nos artigos 524.º a 530.º, nomeadamente naquilo que diz respeito à apreciação pública. O processo de apreciação pública não ocorreu. Levantámos ontem esta questão, apresentámos uma proposta alternativa de parecer referindo precisamente a falta de condições legais para a discussão hoje, no Plenário da Assembleia da República, desta proposta de lei mas, infelizmente, votámo-la sozinhos. Portanto, gostaríamos de colocar à consideração de V. Ex.ª a falta de condições legais desta proposta para ser hoje discutida e votada no Plenário da Assembleia da República.
2PCP
0LEFT
Sr. Presidente, precisamente nos mesmos termos em que o fez o Sr. Deputado Luís Fazenda, gostaria de interpelar a Mesa sobre a falta de condições políticas que existem neste momento na Assembleia da República para esta discussão. É tão simples quanto isto: a proposta de lei foi em definitivo aprovada em Conselho de Ministros há 10 dias. De acordo com as informações que temos, terá de estar aprovada também em definitivo num prazo de menos de um mês. Quero recordar que a última lei de autonomia demorou meses e meses a ser discutida nesta Câmara, criando-se a possibilidade de ser amplamente aprovada por unanimidade. Esperamos bem que não se caia no erro político, para o qual, aliás, alguns Deputados do PS já chamaram a atenção, desde logo o Sr. Deputado José Vera Jardim e o Sr. Presidente da Comissão de Educação, de termos esta lei aprovada apenas por uma maioria que impõe um determinado posicionamento político. Esta é uma matéria grave. Esperemos bem que exista uma alteração, que já será difícil em relação ao início do processo legislativo mas, no mínimo, em relação ao seu fim. … a discussão, na generalidade, deste diploma sem qualquer contestação. O funcionamento da Assembleia da República tem regras. A democracia é procedimento, Srs. Deputa24 I SÉRIE — NÚMERO 100 dos, e, por isso, o procedimento significa que o debate na generalidade deve fazer-se, vai fazer-se agora e todo o restante procedimento, em termos da discussão na especialidade, com o rigor de procedimentos…
1CDS-PP
3LEAN_RIGHT
Sr. Presidente, nos mesmos termos, gostaria apenas de deixar clara a posição do PSD, uma vez que a questão foi levantada neste momento do debate. Parece-nos absolutamente consensual que, de facto, tivemos pouquíssimo tempo — para não dizer pior — para preparar este debate, na generalidade, na Assembleia da República. Contudo, numa matéria tão relevante, tão estruturante para o futuro do nosso ensino superior e, como tal, para o futuro do País, o PSD quer ter uma postura construtiva em todo este debate. Portanto, lançamos já publicamente um desafio, uma proposta concreta ao Governo, e julgo que este era um bom momento, se calhar, para esclarecermos este ponto: já que até este momento da discussão na generalidade tivemos esta escassez de tempo, seria relevante, muito importante, eu diria mesmo que seria decisivo e indispensável, que pudéssemos, nesta Assembleia da República, ter um tempo minimamente razoável para discutir esta matéria até chegarmos à versão final, para podermos aprovar uma lei que seja a melhor possível para o País. Apresentamos um calendário que mostra que, depois da discussão de hoje, poderemos realizar um conjunto de consultas com os mais diferentes intervenientes e poderemos todos nós, nomeadamente os partidos da oposição, reflectir sobre as propostas que estão em cima da mesa. Recordo que são 184 artigos só na proposta do Governo e que há também um projecto de lei do PSD em debate, discutido há umas semanas nesta Câmara. Portanto, julgo que era importante termos esse tempo. A nossa proposta é que até ao final de Outubro, num prazo que não prejudica em nada a sua aplicação, possamos ter a versão definitiva desta lei. Julgo que, do ponto de vista político, seria importante para todos nós que aqui estamos nesta Câmara, mas principalmente seria muito positivo para os jovens que vivem o dia-a-dia do nosso ensino superior, para os professores, para os funcionários, para os pais, no fundo para todos aqueles que estão preocupados com o futuro do nosso país. … a discussão, na generalidade, deste diploma sem qualquer contestação. O funcionamento da Assembleia da República tem regras. A democracia é procedimento, Srs. Deputa24 I SÉRIE — NÚMERO 100 dos, e, por isso, o procedimento significa que o debate na generalidade deve fazer-se, vai fazer-se agora e todo o restante procedimento, em termos da discussão na especialidade, com o rigor de procedimentos…
4PSD
2CENTER
Sr. Presidente, este conjunto de interpelações é, a nosso ver, insólito e inadequado de um ponto de vista do procedimento parlamentar. … a discussão, na generalidade, deste diploma sem qualquer contestação. O funcionamento da Assembleia da República tem regras. A democracia é procedimento, Srs. Deputa24 I SÉRIE — NÚMERO 100 dos, e, por isso, o procedimento significa que o debate na generalidade deve fazer-se, vai fazer-se agora e todo o restante procedimento, em termos da discussão na especialidade, com o rigor de procedimentos…
0PS
2CENTER
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, quero colocar-lhe duas questões muito simples e muito directas para ver se, desta vez, consigo obter uma resposta de V. Ex.ª, que é uma coisa que já vou ganhando o hábito de não ter. Primeira questão, Sr. Ministro: tenho comigo um ofício que o Sr. Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) dirigiu à Assembleia da República, chamando a atenção para a irrazoabilidade de um prazo de seis dias úteis para a emissão de parecer sobre um assunto desta natureza, importância e complexidade. Sr. Ministro, a questão, muito simples, é esta: este procedimento, no seu entendimento, é compatível com a dignidade e importância da discussão que temos em causa ou corresponde apenas a mais uma tentativa de silenciamento de opiniões potencialmente críticas relativamente à proposta de lei? Segunda questão, Sr. Ministro: o Governo traz-nos neste diploma várias propostas, de afastamento dos funcionários da gestão das instituições, de enorme redução da participação dos estudantes nessa gestão, de concentração de poderes no conselho geral e nos órgãos unipessoais ou da não previsão expressa da eleição do reitor. Gostaria de saber se entende que todas estas propostas correspondem à construção democrática e participada do ensino superior, como prevê a Constituição da República Portuguesa, ou se correspondem, antes, a uma tentativa de silenciamento e delimitação da capacidade de acção dos órgãos de gestão das instituições de ensino superior, que, por vezes, são tão críticas relativamente às políticas dos governos. … contraria a autonomia universitária e não segue as boas práticas internacionais, nomeadamente as da OCDE, e as recomendações do Debate Nacional sobre Educação, promovido por este Parlamento e pelo próprio Governo. Porque entendemos que a questão da requalificação dos recursos humanos é central para o desenvolvimento do País, o PSD propôs, e propõe, um entendimento com o Governo assente em cinco princípios. Para além dos quatro por mim enunciados, e face à proposta do Governo, adicionamos um novo princípio, que é o da não fragmentação do ensino superior. A lei que estamos hoje, aqui, a discutir deve obter um largo consenso. Não pode ser discutida atabalhoadamente nem no faz-de-conta. Deve haver um calendário curto, mas que permita um debate sério e participado. Nesse sentido, propomos o mês de Outubro para que o processo legislativo esteja finalizado — e, Sr. Ministro, esse mês de Outubro não põe, obviamente, em causa o funcionamento do próximo ano lectivo. Por isso, Sr. Ministro, quero colocar-lhe uma única questão, para obter uma resposta directa e clara: está o Governo disponível para esse entendimento avançado pelo PSD, quer quanto ao seu conteúdo, aos tais cinco princípios fundamentais, quer quanto ao calendário que aqui apresentamos? V. Ex.ª disse, na sua intervenção, que esta legislação foi largamente preparada. Foi, de facto, mas internamente pelo Ministério da Ciência. Gostaria de saber se podemos também preparar o debate na especialidade de forma séria, consciente e participada. Infelizmente, Sr. Ministro, esta é uma lei que fala de autonomia não a dando. Diria que, se aprovássemos estes 184 artigos sem mais, liquidávamos a autonomia universitária em Portugal. O Sr. Ministro acusou aqueles que tivessem a veleidade de criticar esta proposta de lei de conservado28 I SÉRIE — NÚMERO 100 rismo. Devo responder-lhe, Sr. Ministro, utilizando uma autoridade, que até é uma autoridade parlamentar, o Professor Adriano Moreira,…
2PCP
0LEFT
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, este é um debate sobre uma reforma verdadeiramente estruturante. O PSD apresentou, aqui, há um ano, uma proposta de ruptura com a situação actual, apresentando um novo modelo para o ensino superior com base em quatro aspectos fundamentais: a diversificação da organização, a flexibilidade da gestão, o aprofundamento da autonomia e a abertura à sociedade. O objectivo era, no fundo, haver maior responsabilidade para se obterem melhores resultados. A proposta que o Governo agora apresenta enferma, sinteticamente, de três pecados capitais: agrava, de forma ostensiva, a governamentalização do ensino superior; contraria a autonomia universitária e não segue as boas práticas internacionais, nomeadamente as da OCDE, e as recomendações do Debate Nacional sobre Educação, promovido por este Parlamento e pelo próprio Governo. Porque entendemos que a questão da requalificação dos recursos humanos é central para o desenvolvimento do País, o PSD propôs, e propõe, um entendimento com o Governo assente em cinco princípios. Para além dos quatro por mim enunciados, e face à proposta do Governo, adicionamos um novo princípio, que é o da não fragmentação do ensino superior. A lei que estamos hoje, aqui, a discutir deve obter um largo consenso. Não pode ser discutida atabalhoadamente nem no faz-de-conta. Deve haver um calendário curto, mas que permita um debate sério e participado. Nesse sentido, propomos o mês de Outubro para que o processo legislativo esteja finalizado — e, Sr. Ministro, esse mês de Outubro não põe, obviamente, em causa o funcionamento do próximo ano lectivo. Por isso, Sr. Ministro, quero colocar-lhe uma única questão, para obter uma resposta directa e clara: está o Governo disponível para esse entendimento avançado pelo PSD, quer quanto ao seu conteúdo, aos tais cinco princípios fundamentais, quer quanto ao calendário que aqui apresentamos? V. Ex.ª disse, na sua intervenção, que esta legislação foi largamente preparada. Foi, de facto, mas internamente pelo Ministério da Ciência. Gostaria de saber se podemos também preparar o debate na especialidade de forma séria, consciente e participada. Infelizmente, Sr. Ministro, esta é uma lei que fala de autonomia não a dando. Diria que, se aprovássemos estes 184 artigos sem mais, liquidávamos a autonomia universitária em Portugal. O Sr. Ministro acusou aqueles que tivessem a veleidade de criticar esta proposta de lei de conservado28 I SÉRIE — NÚMERO 100 rismo. Devo responder-lhe, Sr. Ministro, utilizando uma autoridade, que até é uma autoridade parlamentar, o Professor Adriano Moreira,…
4PSD
2CENTER
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, estamos a viver um momento importante do nosso ano parlamentar. Esta é, claramente, uma discussão sobre uma lei estrutural para o nosso país. Devo dizer que não é uma lei em que se esteja discutir nem mediocridade nem modernidade a nível universitário. Infelizmente, está a discutir-se muito o controlo que o Governo passa a fazer sobre as instituições de natureza universitária. Infelizmente, Sr. Ministro, esta é uma lei que fala de autonomia não a dando. Diria que, se aprovássemos estes 184 artigos sem mais, liquidávamos a autonomia universitária em Portugal. O Sr. Ministro acusou aqueles que tivessem a veleidade de criticar esta proposta de lei de conservadorismo. Devo responder-lhe, Sr. Ministro, utilizando uma autoridade, que até é uma autoridade parlamentar, o Professor Adriano Moreira, que se refere a muitas destas soluções como soluções de socialismo de mercado. E refere-se bem e com rigor. Vamos, desde logo, à questão das fundações, em relação à qual lhe vou colocar perguntas em concreto. Sr. Ministro, conhecemos bem o modelo de fundações que existe, por exemplo, nos Estados Unidos. Defendemos, na sequência, aliás, de relatórios do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), a existência de fundações como forma de disciplinar instituições do ensino superior privado, que são reguladas pelo Código Civil. No entanto, por onde vão ser reguladas estas fundações públicas de direito privado que não têm regime jurídico? Não seria melhor, Sr. Ministro, trazer aqui, primeiro, uma regulamentação jurídica para essa figura— que, aliás, nos tempos do Eng.º António Guterres, estava a ser trabalhada num projecto feito pelo Professor Vital Moreira, pelo Professor Rui Alarcão e por um colega seu de Governo, o Dr. Rui Pereira? E, Sr. Ministro, o que são estas fundações sem fundos? Será que estamos perante uma forma de desorçamentação? Será que estamos, aqui, a comprovar aquilo que é realmente o tal «socialismo de mercado»? Sr. Ministro, quanto aos curadores, que, de acordo com o artigo 131.º da proposta que nos é apresentada, são nomeados pelo Governo sob proposta das universidades, o que é isto se não a governamentalização das universidades? Será que vamos passar a ter uma espécie de «olheiros do Governo» dentro das universidades, Sr. Ministro? Sobre a matéria dos reitores e, evidentemente, do concurso público — que, se calhar, não sei, até se poderia passar a aplicar ao Governo —, Sr. Ministro, qual a necessidade de utilizar este esquema? Será que vamos passar a conhecer o Sr. Ministro Mariano Gago como uma espécie de «professor guilhotina» que corta a cabeça aos reitores? Será que é isso que vamos ter para o futuro? Não considera V. Ex.ª que esta é uma matéria em que não devíamos experimentar para ver se as coisas correm bem? É que qualquer situação de experimentação que aqui se faça tem efeitos de natureza definitiva. E, por muito que VV. Ex.as não queiram, a questão do tempo em que vamos discutir esta matéria é essencial. E falo do fim do processo. Este é, naturalmente, um processo em relação ao qual tem existido, em várias situações, unanimidade e a possibilidade de se votar aqui, na Assembleia da República, reformas de fundo. Vou concluir, Sr. Presidente. Mas vamos ter de discutir à pressa, até ao fim deste mês, estes 184 artigos que conseguiram uma coisa espantosa: pôr do mesmo lado da reivindicação professores e alunos. Olhe, Sr. Ministro, que é preciso ter arte para conseguir isso!
1CDS-PP
3LEAN_RIGHT
Sr. Presidente, peço a palavra. Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da bancada devido à forma como o Sr. Ministro se referiu a Deputados do CDS. Sr. Presidente, Sr. Ministro, que fique muito claro: sobre a questão dos curadores, peço, sob a forma de interpelação à Mesa, que seja distribuído o texto do artigo 131.º da proposta de lei que o senhor apresenta nesta Assembleia da República cujo n.º 2 diz que «Os curadores são nomeados pelo Governo sob proposta da instituição.» Portanto, quem nomeia é o Governo. O que é isto senão governamentalização, Sr. Ministro? Desde logo, Sr. Ministro, seria bom que, ao falar em rigor universitário, por exemplo, tivesse conhecimento que o regime das fundações se aplica, no Código Civil, a instituições que são criadas por privados e de acordo com o Direito Civil. É essa a forma de regulamentação. Já agora, já que fala em rigor universitário, o Sr. Ministro referiu, na sua intervenção, que estão dados todos os pareceres em relação a esta proposta de lei. Assim, Sr. Ministro, se tiver o parecer do Conselho Nacional de Educação, que não chegou a este Parlamento nem a nenhum grupo parlamentar, era muito positivo que no-lo fizesse chegar porque não o conhecemos. Sr. Ministro, vou dar-lhe um conselho. Estamos no início deste nosso debate, mas, Sr. Ministro, é melhor não seguir esse seu caminho, sob pena de terem de ser acusados de apenas estarem a querer impor a vontade de uma maioria numa matéria como esta. O Sr. Presidente: — Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, tem a palavra para dar explicações, se assim entender.
1CDS-PP
3LEAN_RIGHT
Sr. Presidente, peço a palavra. É para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente. Sr. Presidente, como teve ocasião de verificar, no pedido de esclarecimento que formulei, coloquei ao Sr. Ministro apenas uma singela questão, uma única. Portanto, gostava perguntar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o que é que o PSD tem de fazer para que o Sr. Ministro possa responder a uma questão tão simples como é a do calendário. É só isto. Queremos saber, através de V. Ex.ª, o que é que podemos fazer para que o Sr. Ministro responda à simples questão de se aceita ou não o calendário que propusemos.
4PSD
2CENTER
Sr. Presidente, Sr. Ministro, a proposta de lei que hoje traz à nossa consideração é, nalgumas das suas disposições nucleares, um gesto desgraçado e prepotente que, sob um linguajar modernaço, constitui um dos mais graves ataques à integridade das universidades portuguesas como projecto cultural e científico, contra a sua autonomia, contra a democracia interna da sua gestão, que o Governo, ainda por cima, procura impor a este Parlamento e ao País pela força da sua maioria absoluta. Sr. Ministro, contra este projecto tem a Universidade de Coimbra; contra este projecto tem a Universidade de Lisboa; contra este projecto tem a Universidade Técnica de Lisboa; contra este projecto tem a Universidade Nova de Lisboa, a Universidade de Aveiro, a Universidade do Porto e praticamente a totalidade das associações de estudantes. Contra este projecto tem todos os sindicatos do ensino superior, tem os trabalhadores não docentes da universidade. O Sr. Ministro tem o conjunto das forças vivas da universidade contra os aspectos mais gravosos deste projecto. Assim, pergunto, Sr. Ministro, se V. Ex.ª se tornou politicamente surdo. É que toda a universidade está à espera que lhe seja dito se o senhor tenciona abordar esta questão pela via da negociação ou pela força e o senhor vem aqui comunicar-nos que é pela força! O senhor vem aqui comunicar-nos que não há negociação a não ser no calendário que a maioria se prepara para impor, através de audições atrabiliárias, sem ouvir verdadeiramente os interessados e de uma forma contra a qual já se levantaram milhares de cidadãos em petições assinadas e entregues nesta Assembleia da -República. Pergunto-lhe, Sr. Ministro, se é assim que V. Ex.ª tenciona reformar as universidades, pela força bruta de uma maioria que se impõe, não pela razão mas pela desrazoabilidade da coacção que a maioria dos votos implica neste caso concreto, que, ainda por cima, não corresponde a nenhuma espécie de compromisso eleitoral do Governo. Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, creio que não houve nenhuma pergunta. Ouvi a sua afirmação, violenta e inflamada, aliás, trágica… É difícil aquilo que é inflamado ser certo. Normalmente, é comburente apenas. O que temos perante nós, Sr. Deputado, é a necessidade de ir ao concreto e à substância. Ora, nas palavras do Sr. Deputado não vi nada que me permita responder quanto à substância. Quanto à forma, vi várias inverdades. É que, se há diálogo que se estabeleceu, ao longo de inúmeros meses, com todas essas e muitas outras instituições, com os responsáveis das associações de estudantes, com os responsáveis das instituições, em múltiplas manifestações, incluindo debates públicos, foi sobre as opções desta reforma. É perfeitamente legítimo haver quem esteja a favor ou contra, a favor de umas coisas e contra outras, mas é acerca do concreto daquilo sobre que estamos a favor ou estamos contra que manifestei total disponibilidade para continuar a ouvir e a dialogar, para chegarmos ao máximo possível de consenso. Sempre o 29 DE JUNHO DE 2007 33 disse e repeti-o. Não é por dizer o contrário, Sr. Deputado, que ganha razão nesta matéria. Existem aqueles que estão genuinamente a favor de uma reforma do ensino superior mas não querem esta reforma. Existem aqueles que estão a favor de uma reforma, que querem, no essencial, esta reforma, mas têm discordâncias com alguns pontos da mesma. Existem aqueles que estão contra toda a reforma do ensino superior, não o querem dizer e dizem que estão a favor dela mas contra todas as soluções envolvidas. Ainda não percebi, Sr. Deputado, em que grupo é que V. Ex.ª se coloca.
3BE
1LEAN_LEFT
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo traz hoje à discussão da Assembleia da República uma proposta de lei que institui um regime jurídico das instituições de ensino superior que é, em si mesmo, desnecessário, inadequado, abusivo e aparentemente incoerente. Pelas soluções que comporta, esta proposta de lei será gravemente prejudicial para o ensino superior e para o País, podendo mesmo algumas das suas normas serem inconstitucionais. Mas importa analisar, antes de mais, a forma como o Governo do PS conduziu todo o processo de discussão e elaboração desta proposta de lei e como se prepara para impor a sua aprovação. Pela importância que assume e pelas consequências que pode vir a produzir, uma proposta desta natureza exigia um amplo e aberto debate público anterior à consolidação da proposta final, com todos aqueles que, diariamente, constroem o sistema de ensino superior português. Não foi essa a opção do Governo. Mais uma vez, assistimos a um vergonhoso simulacro de discussão pública em que o Governo não procurou sequer disfarçar a inutilidade a que iria votar as opiniões que fingia querer recolher. Só assim se compreende que tivessem sido solicitados pareceres, com prazos de três dias, sobre uma ante-proposta de lei com quase duas centenas de artigos ou que tivessem sido discutidas com várias entidades versões diferentes da referida proposta. Mesmo em relação à Assembleia da República, são inaceitáveis as condições em que o Governo impôs este debate. O texto final da proposta de lei só foi disponibilizado aos grupos parlamentares há uma semana, apesar de já há muito ter sido anunciada a intenção do Governo de ter todo o processo legislativo concluído na presente sessão legislativa. Não foi respeitada a exigência legal de apreciação pública do diploma prevista na legislação laboral e o Governo tenta, inclusivamente, ignorar um abaixo-assinado contra esta proposta que recolhe já 1300 assinaturas de docentes do ensino superior, continuando a insistir na necessidade de conclusão do processo legislativo num prazo recorde. E percebe-se porquê. Se tivermos em conta a proposta de que se trata e as soluções concretas que apresenta, compreendemos a pressa do Governo e a intenção de não a discutir. Em primeiro lugar, este regime jurídico é desnecessário porque não constitui solução para o principal problema do ensino superior português, que é o do desinvestimento a que tem sido votado por sucessivos governos. Esta realidade não impõe uma nova forma de organização das instituições de ensino superior, antes exige do Governo uma nova política que reconheça a importância do ensino superior como um bem público fundamental para o desenvolvimento do País e para uma sociedade mais justa e democrática. Em segundo lugar, o regime jurídico proposto pelo Governo é inadequado porque insiste numa concepção de rigidez e pré-formatação de soluções organizativas que já se revelou inadequada. A proposta de lei reforça a excessiva regulação já hoje criticada, definindo mesmo novas regras para algumas situações em que era ainda garantida às instituições alguma liberdade de auto-organização. Por outro lado, o regime jurídico proposto pelo Governo é abusivo, na medida em que impõe limitações à capacidade de auto-organização das instituições que vão muito para além do que é aceitável, pondo mesmo em causa a autonomia universitária que a Constituição estabelece. Por último, poder-se-ia dizer que este regime jurídico das instituições de ensino superior é incoerente, uma vez que, ao mesmo tempo que prevê a regulação excessiva de alguns aspectos, deixa um enorme vazio de regulação em relação a outros. Na verdade, a esse vazio de regulação corresponde uma larga margem de discricionariedade da tutela e esse é o objectivo, não assumido, do Governo, o do reforço dos mecanismos de controlo político das instituições de ensino superior e do aumento da sua dependência face à tutela. Só assim se compreende a possibilidade de constituição de uma fundação a partir de unidades orgânicas actualmente existentes, com o único patrocínio do Ministério e sem que as respectivas instituições o possam evitar. Para além de tudo isto, a proposta de lei apresentada pelo Governo é má pelas soluções concretas que apresenta. A manter-se como é proposto, este regime jurídico seria um enorme retrocesso no projecto de qualificação dos portugueses, de modernização da economia e da construção de um Portugal democrático e desenvolvido, sendo, simultaneamente, o mais forte, vasto e demolidor ataque ao sistema público de ensino, num momento em que o sector privado dá mostras de que não está em condições de garantir um ensino de qualidade. Vejamos apenas dois aspectos concretos desta proposta. Em primeiro lugar, o que diz respeito à opção pela sujeição das instituições a um modelo fundacional. Esta opção não esconde a intenção de criar as condições para que a própria lógica de gestão das instituições conduza à sua empresarialização e posterior privatização. O objectivo estratégico de criação de um mercado do ensino superior, altamente rentável e livremente acessível à exploração privada, implica a destruição do sistema público de ensino ou a sua sujeição a essa lógica mercantilista. Esta proposta garante as condições para que, a médio prazo, ambos os caminhos sejam facilmente concretizáveis. Por outro lado, esta proposta atenta frontalmente contra o carácter democrático e participado do sistema de ensino superior previsto na Constituição da República Portuguesa. O pessoal não docente é afastado da participação no conselho geral, a participação dos estudantes é reduzida a níveis inaceitáveis e impõe-se que um terço dos membros desse órgão sejam personalidades estranhas à vida da instituição mas suficientemente próximas da gula do poder económico. O reitor ou presidente da instituição é designado — e não eleito, Sr. Ministro! — pelo conselho geral, depois de passar pelo devido processo de selecção. É caso para perguntar: que medo tem este Governo dos democráticos processos de eleição e de democracia participativa e participada? Será que o que incomoda o Governo no modelo actual é a análise crítica que os processos eleitorais habitualmente propiciam relativamente às políticas governamentais? Seja como for, é indesmentível que estamos perante um gravíssimo ataque à gestão democrática e participada das instituições de ensino superior, que visa retirar-lhes autonomia e colocá-las na dependência dos grandes interesses económicos e do Governo. Por tudo isto, o PCP considera que a presente proposta deve ser sujeita a um verdadeiro e atempado processo de discussão pública, que permita a profundidade de análise que a matéria exige, com a consequente alteração das soluções que estão propostas. … e onde deveria promover-se a diversidade, impõe-se um modelo único, opressor da liberdade de iniciativa das próprias instituições, que vai ao ponto — imagine-se! — de, por exemplo, prever o número de vice-reitores que todas as instituições devem ter e o número de vezes que o conselho geral deve reunir por ano, ou o valor das coimas perante determinadas infracções. A proposta de lei vai, pois, a este detalhe, estabelecendo um modelo único, o que, em nosso entender, nada tem a ver com as recomendações da OCDE ou do Debate Nacional sobre Educação, promovido, conjuntamente, pela Assembleia e pelo Governo e concluído há meia dúzia de meses. O terceiro ponto tem a ver com o seguinte: o PSD não pode rever-se numa proposta que promova dois sistemas distintos dentro do nosso ensino superior, sendo que esses dois sistemas não se geram por iniciativa ou por mérito das instituições mas, sim, por iniciativa, por vontade ou, até, que a lei o permitiria, por 29 DE JUNHO DE 2007 35 capricho do próprio ministro que esteja conjunturalmente em funções. Na nossa óptica, não nos repugna, de modo algum, a promoção da excelência; bem pelo contrário, achamos que o caminho é precisamente esse, o da promoção da excelência. Não nos repugna que haja diversidade de oferta no ensino superior; bem pelo contrário, achamos que é esse o caminho a seguir. Agora, achamos que tal deve existir por iniciativa das instituições, confiando nas comunidades académicas,…
2PCP
0LEFT
Sr. Presidente, muito rapidamente queria deixar o seguinte registo: o Sr. Ministro, durante a discussão, não disse rigorosamente nada sobre as críticas substanciais que foram feitas à proposta de lei, fugiu como o diabo da cruz à explicação da «lei da rolha», que impôs na discussão com as entidades que podiam dar opiniões sobre a matéria que está em discussão e, à saída deste debate, limita-se a repetir exactamente os mesmos chavões com que entrou neste debate. Ora, esta não é uma postura correcta de quem pretende discutir as soluções que apresenta e de, democraticamente, ouvir as críticas que lhe são dirigidas. O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluída a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 148/X, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 140/X — Primeira alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, aprovando o estatuto do aluno dos ensinos básico e secundário. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
2PCP
0LEFT
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O tempo que hoje temos para discutir esta matéria é também ele muito escasso, pelo que vou directo à matéria. O primeiro ponto que o Partido Social Democrata gostaria de aqui evidenciar é o seguinte: para nós, esta reforma do ensino superior é necessária e urgente — reafirmamo-lo hoje sem qualquer hesitação. O actual modelo de organização e de gestão das nossas universidades e dos institutos politécnicos está manifestamente obsoleto. Teve o seu tempo e o seu mérito, mas hoje a realidade com a qual todos nós convivemos mudou radicalmente. Portanto, impõe-se que as nossas instituições de ensino superior estejam adaptadas a estes novos tempos, tendo modelos de organização modernos, promotores da diversidade, da criatividade e, no fundo, da inovação, que, como sabemos, é fundamental no mundo competitivo em que hoje vivemos. Posto isto, considerada esta reforma como necessária e urgente, passamos ao segundo ponto, que é o seguinte: em alguns aspectos, a nosso ver, esta proposta de lei, que o Governo, apoiado pelo Partido Socialista, traz aqui hoje, vai no sentido precisamente inverso daquele que deveria ser o caminho a seguir. Assim, onde deveria promover-se a liberdade, estimula-se a governamentalização do sistema ensino superior; onde deveria haver flexibilidade e criatividade, promove-se a intervenção do Estado; e onde deveria promover-se a diversidade, impõe-se um modelo único, opressor da liberdade de iniciativa das próprias instituições, que vai ao ponto — imagine-se! — de, por exemplo, prever o número de vice-reitores que todas as instituições devem ter e o número de vezes que o conselho geral deve reunir por ano, ou o valor das coimas perante determinadas infracções. A proposta de lei vai, pois, a este detalhe, estabelecendo um modelo único, o que, em nosso entender, nada tem a ver com as recomendações da OCDE ou do Debate Nacional sobre Educação, promovido, conjuntamente, pela Assembleia e pelo Governo e concluído há meia dúzia de meses. O terceiro ponto tem a ver com o seguinte: o PSD não pode rever-se numa proposta que promova dois sistemas distintos dentro do nosso ensino superior, sendo que esses dois sistemas não se geram por iniciativa ou por mérito das instituições mas, sim, por iniciativa, por vontade ou, até, que a lei o permitiria, por capricho do próprio ministro que esteja conjunturalmente em funções. Na nossa óptica, não nos repugna, de modo algum, a promoção da excelência; bem pelo contrário, achamos que o caminho é precisamente esse, o da promoção da excelência. Não nos repugna que haja diversidade de oferta no ensino superior; bem pelo contrário, achamos que é esse o caminho a seguir. Agora, achamos que tal deve existir por iniciativa das instituições, confiando nas comunidades académicas, e nunca por iniciativa estatal, com intervenção directa do ministro da tutela. E o Sr. Ministro sabe que há uma prerrogativa na proposta de lei que permite esta possibilidade. Ora, na nossa óptica, isso não faz qualquer sentido. O quarto ponto que quero sublinhar é este: o PSD tem assumido em todo este processo uma postura extraordinariamente construtiva. Sendo nós um partido da oposição, seria eventualmente mais simples capitalizarmos o descontentamento generalizado que todos nós sentimos no ensino superior e ficarmos por aí. Contudo, desde o início deste processo, temos tido uma atitude diferente. Há mais de um ano, apresentámos um projecto de lei, uma iniciativa nossa para ser discutida nesta Assembleia. Esperámos um ano para agendá-la, precisamente porque achámos que, dentro deste espírito de convergência e de consenso que, julgo, deve presidir a esta reforma, era importante que o Governo também trouxesse a sua iniciativa. Agendámos essa iniciativa há algumas semanas, quando o Governo já tinha aprovado, na generalidade, a sua iniciativa. Esperámos que o Governo concretizasse as suas intenções e a verdade é que, apesar de o nosso projecto de lei ser um projecto de ruptura com o modelo actual, podemos dizer que a postura construtiva do Partido Social Democrata tem também hoje a sua concretização. Na realidade, estamos aqui a dizer publicamente ao Governo que não só estamos disponíveis como tomámos a iniciativa de propor um entendimento nesta matéria, um entendimento que possa convergir com a opinião de muitos agentes educativos e académicos do nosso país, um entendimento que possa abranger as diferentes forças sociais e políticas do nosso país, um entendimento que nos permita a todos concretizar uma lei que possa dar condições de estabilidade, de durabilidade para o futuro do nosso ensino superior. Recordo que a lei que está em vigor e que todos (pelo menos, o Governo e o PSD) aqui hoje nos propomos revogar, é uma lei que foi aprovada, por unanimidade, nesta Casa, há quase 20 anos. Sr. Ministro, não defendemos a unanimidade, como, penso, também não defenderá. Agora, temos uma atitude diferente: na nossa óptica, vale a pena fazer-se todo o esforço para que haja o maior consenso e a maior convergência possíveis. É que só assim se garante que esta lei possa dar condições de estabilidade às nossas instituições, possa ter um prazo de validade minimamente razoável para não criar perturbação dentro das nossas instituições, universidades e politécnicos. Por isso, o PSD apresentou aqui hoje, de uma forma muito clara, uma proposta de entendimento e de calendário que permita à oposição ter as mesmas condições de trabalho que o Governo teve. Recordo que, em 16 de Junho do ano passado, o Sr. Ministro afirmou nesta Câmara que, no prazo de seis meses, apresentaria aqui uma iniciativa. Passados seis meses, não conhecemos qualquer iniciativa, mas conhecemos uma intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, em 21 de Dezembro. Ora, o facto é que foi passados mais seis meses que o Governo apresentou a sua iniciativa. Isto é, o Governo está, desde que tomou posse, há dois anos e meio, a preparar a sua iniciativa. Posto isto, não é legítimo que o Sr. Ministro peça a esta Câmara que, em duas semanas e meia, possa resolver esta matéria. Para terminar, quero referir o seguinte: o PSD apresentou aqui hoje esta proposta muito concreta. No entanto, a maioria socialista já teve oportunidade de nos dizer, nomeadamente em sede de comissão, que tentaria aprovar esta lei até ao final desta sessão legislativa, ou seja, até daqui a alguns dias, pois tal intenção resultava de uma solicitação do Governo. Por outro lado, hoje, pela voz do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, tivemos oportunidade de ouvir que o Governo não se intrometerá naqueles que são os prazos da própria Assembleia da República. Portanto, julgo que estamos hoje em condições de dizer — e dirijo-me ao Governo e à maioria — que o prazo que é apresentado pelo Partido Social Democrata pode ser claramente cumprido. É um prazo curto, para não dizer curtíssimo, bem mais curto do que alguns Deputados do Partido Socialista têm defendido publicamente. É um prazo que nos vai fazer aprovar com pressa uma lei mas que, eventualmente, nos vai impedir de aprovar uma lei precipitada. E esta é a grande questão: Sr. Ministro, temos a mesma pressa que o Governo tem — aliás, comprovámo-lo, ao apresentarmos a nossa iniciativa há mais de um ano, ou seja, com muita antecedência —, mas não queremos uma lei precipitada, que crie instabilidade e que tenha a ameaça permanente de poder vir a ser revogada dentro de meia dúzia de meses ou um pouco mais do que isso, quando eventualmente houver uma mudança quer dentro deste Governo quer com outro governo que venha a sucedê-lo. … é o exemplo mais acabado da intenção mais do que declarada de submeter, por completo, o ensino superior público ao poder económico, às lógicas de mercado e do lucro, ao mesmo tempo que dá mais um passo, de gigante desta feita, no sentido da promoção da desresponsabilização do Estado da nobre e fundamental tarefa de garantir um dos mais importantes direitos, o direito à educação, nos termos em que a nossa Constituição o consagra. O terreno vem sendo preparado há muito tempo, por sucessivos governos, com brutais cortes orçamentais e uma gestão do ensino superior público assente em cativação de receitas e limitações no uso dos saldos de gerência, com a precarização dos vínculos laborais e a recusa em resolver a inconstitucionalidade que é a ausência de subsídio de desemprego para os docentes do superior, apresentando-se depois a solução para o estrangulamento financeiro, provocado pelo próprio Governo, «embrulhada em papel de celofane», seja sob a forma de aumento de comparticipações das famílias em passados e futuros aumentos de propinas, ou cortes na acção social, ou agora com a solução das fundações e dos financiamentos plurianuais. Sob a capa da necessidade de se responsabilizar as universidades e politécnicos, o que se faz, de facto, é apenas desresponsabilizar o Governo numa marcha que só conhece um destino: a privatização do ensino superior e a sua consequente elitização e destruição do sistema de ensino público democrático de Abril, que promova a igualdade de oportunidades, que combata o insucesso e o abandono escolares, que promova a livre investigação e transmissão de conhecimentos, a criação e o pensamento. Primeiro, lançam as universidades e politécnicos para o precipício da falta de meios, da falta de real autonomia que implica a existência dos suficientes meios financeiros para poderem cumprir a sua insubstituível missão, e, depois, oferecem-lhes uma corda a que se agarrarem para não caírem, mas sob a condição de a segurarem pelo pescoço. É, desde logo, reveladora a pouca participação com que contou esta proposta do Governo, da parte quer de representantes das comunidades do ensino superior, o Conselho de Reitores das Universidade Portuguesas (CRUP), o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) e as associações de estudantes (aliás, aproveitamos para saudar os estudantes que se reuniram ontem aqui em frente à Assembleia, onde realizaram uma vigília em protesto contra esta reforma), quer do próprio Conselho Nacional de Educação, deixando estes e todo o País à margem de uma ampla discussão e ponderação que deveria ter antecedido uma proposta como esta, que realiza uma alteração profunda, substituindo quatro diplomas existentes por um normativo que faz tábua rasa da realidade portuguesa, da história e da especificidade não só das instituições mas do próprio País. Claro que o Governo diz que não, que não é verdade — «nós ouvimos essas entidades», diz o Governo —, no que só acreditará quem julgue ser possível ouvir qualquer órgão, de forma séria, para mais órgãos plurais e heterogéneos, como o CRUP ou o CCISP, acerca de um diploma desta dimensão e com esta importância, composto por 180 artigos, em apenas seis dias úteis! Isto não é sério! Esta pressa e esta urgência não são sérias, não beneficiam qualquer reforma. Nesta reforma, o reitor nas universidades e o presidente nos politécnicos deixam de ser eleitos, o que não apenas significa um completo desrespeito pelo princípio da escola democrática e pelo direito constitucional de participação democrática no ensino, como representará, consequentemente, um óbvio retrocesso em termos da legitimidade e representatividade daquele que precisamente deveria e deve ser o representante de toda a instituição, a qual é composta não apenas pelos órgãos de gestão ou pelas suas unidades orgânicas mas, muito mais do que isso, por docentes, estudantes e pessoal não docente, que são pessoas, cidadãs e cidadãos, que constroem saber, conhecimento e inovação não apenas para si e para a comunidade escolar mas para toda a sociedade. Por outro lado, esta proposta de lei, além de representar um ataque sem precedentes à autonomia pedagógica e científica das instituições, apresenta um gravíssimo perigo de originar a fragmentação das instituições do ensino superior através do processo de autonomização ou desagregação de algumas das suas unidades, naturalmente aquelas que, pelo seu potencial de mercado, se mostrarem mais apetecíveis para o capital, deixando todo o resto para as instituições, que, assim, não apenas se quedam amputadas de parte importante de um corpo coerente como terão de suportar, em termos de financiamento, aquelas áreas 29 DE JUNHO DE 2007 37 que, apenas por não serem de imediato vendáveis, passarão a ser tratadas como os «parentes pobres» do sistema, aquelas áreas pouco importantes (certamente assim achará o Governo) ligadas às humanidades e às ciências sociais. O Governo pretende, assim, operar a chamada «venda a retalho» do ensino superior público, operando simultaneamente o seu empobrecimento e o da sociedade e da educação e formação de cidadãos críticos e intervenientes. Esta reforma do Governo implicará, ainda, no imediato, uma obrigatoriedade de reformulação de todas as instituições do ensino superior, que obrigará à substituição de todos os reitores ou presidentes actualmente em exercício, independentemente de se encontrarem em final, a meio ou no princípio do seu mandato, o que representa, só por si, um enorme desrespeito pela autonomia e democracia no ensino superior, pelos mandatários em exercício e pelo seu programa e pelos próprios mandantes, os eleitores do colégio universitário ou politécnico. Mas vai mais além: para além do que prevê para as assembleias estatutárias, em que o reitor estará presente sem necessariamente a dirigir, nem sequer nela ter direito a voto, sem, contudo, deixar de ser responsabilizado pelas suas decisões, acaba com os senados universitários, enquanto órgãos com um poder efectivo na gestão académica, e cria órgãos de direcção e gestão das instituições, como o conselho geral, em que não estão obrigatoriamente presentes representantes de pelo menos um dos três corpos que compõem a comunidade universitária, os não docentes, que só poderão estar presentes à custa de perda de representantes dos discentes, os quais, em conjunto, nunca poderão representar mais do que 20%, enquanto obriga à entrada de empresas e outras entidades com fins estranhos à missão das instituições, procurando instrumentalizá-las ao serviço do mercado e do lucro. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com esta proposta de lei, o Governo opera uma vergonhosa desresponsabilização do ensino superior e prepara a desmantelação do Estado social, agora nesta área, prevendo expressamente a possibilidade de transformação das instituições em fundações de direito privado e a sua futura possível entrega por completo ao poder económico, colocando assim em causa a própria soberania nacional, o desenvolvimento sustentável e o futuro, que dependem, em última instância, das opções que se fizerem na área da educação.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta de lei, que o Governo ousa apresentar à Assembleia da República, é o exemplo mais acabado da intenção mais do que declarada de submeter, por completo, o ensino superior público ao poder económico, às lógicas de mercado e do lucro, ao mesmo tempo que dá mais um passo, de gigante desta feita, no sentido da promoção da desresponsabilização do Estado da nobre e fundamental tarefa de garantir um dos mais importantes direitos, o direito à educação, nos termos em que a nossa Constituição o consagra. O terreno vem sendo preparado há muito tempo, por sucessivos governos, com brutais cortes orçamentais e uma gestão do ensino superior público assente em cativação de receitas e limitações no uso dos saldos de gerência, com a precarização dos vínculos laborais e a recusa em resolver a inconstitucionalidade que é a ausência de subsídio de desemprego para os docentes do superior, apresentando-se depois a solução para o estrangulamento financeiro, provocado pelo próprio Governo, «embrulhada em papel de celofane», seja sob a forma de aumento de comparticipações das famílias em passados e futuros aumentos de propinas, ou cortes na acção social, ou agora com a solução das fundações e dos financiamentos plurianuais. Sob a capa da necessidade de se responsabilizar as universidades e politécnicos, o que se faz, de facto, é apenas desresponsabilizar o Governo numa marcha que só conhece um destino: a privatização do ensino superior e a sua consequente elitização e destruição do sistema de ensino público democrático de Abril, que promova a igualdade de oportunidades, que combata o insucesso e o abandono escolares, que promova a livre investigação e transmissão de conhecimentos, a criação e o pensamento. Primeiro, lançam as universidades e politécnicos para o precipício da falta de meios, da falta de real autonomia que implica a existência dos suficientes meios financeiros para poderem cumprir a sua insubstituível missão, e, depois, oferecem-lhes uma corda a que se agarrarem para não caírem, mas sob a condição de a segurarem pelo pescoço. É, desde logo, reveladora a pouca participação com que contou esta proposta do Governo, da parte quer de representantes das comunidades do ensino superior, o Conselho de Reitores das Universidade Portuguesas (CRUP), o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) e as associações de estudantes (aliás, aproveitamos para saudar os estudantes que se reuniram ontem aqui em frente à Assembleia, onde realizaram uma vigília em protesto contra esta reforma), quer do próprio Conselho Nacional de Educação, deixando estes e todo o País à margem de uma ampla discussão e ponderação que deveria ter antecedido uma proposta como esta, que realiza uma alteração profunda, substituindo quatro diplomas existentes por um normativo que faz tábua rasa da realidade portuguesa, da história e da especificidade não só das instituições mas do próprio País. Claro que o Governo diz que não, que não é verdade — «nós ouvimos essas entidades», diz o Governo —, no que só acreditará quem julgue ser possível ouvir qualquer órgão, de forma séria, para mais órgãos plurais e heterogéneos, como o CRUP ou o CCISP, acerca de um diploma desta dimensão e com esta importância, composto por 180 artigos, em apenas seis dias úteis! Isto não é sério! Esta pressa e esta urgência não são sérias, não beneficiam qualquer reforma. Nesta reforma, o reitor nas universidades e o presidente nos politécnicos deixam de ser eleitos, o que não apenas significa um completo desrespeito pelo princípio da escola democrática e pelo direito constitucional de participação democrática no ensino, como representará, consequentemente, um óbvio retrocesso em termos da legitimidade e representatividade daquele que precisamente deveria e deve ser o representante de toda a instituição, a qual é composta não apenas pelos órgãos de gestão ou pelas suas unidades orgânicas mas, muito mais do que isso, por docentes, estudantes e pessoal não docente, que são pessoas, cidadãs e cidadãos, que constroem saber, conhecimento e inovação não apenas para si e para a comunidade escolar mas para toda a sociedade. Por outro lado, esta proposta de lei, além de representar um ataque sem precedentes à autonomia pedagógica e científica das instituições, apresenta um gravíssimo perigo de originar a fragmentação das instituições do ensino superior através do processo de autonomização ou desagregação de algumas das suas unidades, naturalmente aquelas que, pelo seu potencial de mercado, se mostrarem mais apetecíveis para o capital, deixando todo o resto para as instituições, que, assim, não apenas se quedam amputadas de parte importante de um corpo coerente como terão de suportar, em termos de financiamento, aquelas áreas que, apenas por não serem de imediato vendáveis, passarão a ser tratadas como os «parentes pobres» do sistema, aquelas áreas pouco importantes (certamente assim achará o Governo) ligadas às humanidades e às ciências sociais. O Governo pretende, assim, operar a chamada «venda a retalho» do ensino superior público, operando simultaneamente o seu empobrecimento e o da sociedade e da educação e formação de cidadãos críticos e intervenientes. Esta reforma do Governo implicará, ainda, no imediato, uma obrigatoriedade de reformulação de todas as instituições do ensino superior, que obrigará à substituição de todos os reitores ou presidentes actualmente em exercício, independentemente de se encontrarem em final, a meio ou no princípio do seu mandato, o que representa, só por si, um enorme desrespeito pela autonomia e democracia no ensino superior, pelos mandatários em exercício e pelo seu programa e pelos próprios mandantes, os eleitores do colégio universitário ou politécnico. Mas vai mais além: para além do que prevê para as assembleias estatutárias, em que o reitor estará presente sem necessariamente a dirigir, nem sequer nela ter direito a voto, sem, contudo, deixar de ser responsabilizado pelas suas decisões, acaba com os senados universitários, enquanto órgãos com um poder efectivo na gestão académica, e cria órgãos de direcção e gestão das instituições, como o conselho geral, em que não estão obrigatoriamente presentes representantes de pelo menos um dos três corpos que compõem a comunidade universitária, os não docentes, que só poderão estar presentes à custa de perda de representantes dos discentes, os quais, em conjunto, nunca poderão representar mais do que 20%, enquanto obriga à entrada de empresas e outras entidades com fins estranhos à missão das instituições, procurando instrumentalizá-las ao serviço do mercado e do lucro. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com esta proposta de lei, o Governo opera uma vergonhosa desresponsabilização do ensino superior e prepara a desmantelação do Estado social, agora nesta área, prevendo expressamente a possibilidade de transformação das instituições em fundações de direito privado e a sua futura possível entrega por completo ao poder económico, colocando assim em causa a própria soberania nacional, o desenvolvimento sustentável e o futuro, que dependem, em última instância, das opções que se fizerem na área da educação. Seguir-se-á o habitual rigor procedimental do Parlamento, garantindo que todos possam pronunciar-se e que, dessa forma, o debate, na especialidade, seja o mais qualificado, como a dimensão desta reforma exige. Também não inviabilizaremos a proposta do PSD sobre esta matéria, demonstrando, com clareza, a nossa total abertura a diálogos e consensos. Analisemos, então, as principais inovações desta «revolução virtuosa». Em primeiro lugar, mais eficiência, uma verdadeira mudança de paradigma na governação das instituições: actualmente homogéneos e tradicionais, com órgãos congestionados pela sua dimensão e em que há uma clara desvalorização dos órgãos uninominais, passam, com esta proposta, a uma diversificação dos modelos de governação, simplificação das estruturas organizativas e eficiência e reforço dos órgãos individuais. Mais autonomia: retira da tutela do Ministério das Finanças a microgestão das instituições, consagrando a autonomia de gestão financeira e de gestão do pessoal. Mais participação e maior competitividade: mobiliza a competência externa, abrindo obrigatoriamente universidades e politécnicos aos actores mais dinâmicos da sociedade civil, acabando com um distanciamento pernicioso ao desenvolvimento de ambos. Não está o País farto de ouvir das empresas que as formações superiores não se adequam às suas necessidades? Não se escandaliza o País quando necessita de mão-de-obra qualificada e jovens licenciados se encontram no desemprego por desadequação das suas formações? Pode Portugal melhorar o seu modelo de desenvolvimento se não for capaz de gerar empresas modernas, com elevado índice de especialização e concomitantemente receptoras de mão-de-obra qualificada? Mais transparência: cria um quadro de transparência institucional fundamental à sua credibilização e evolução, nomeadamente com a necessidade de as instituições se responsabilizarem publicamente por matérias tão relevantes como: o grau de realização dos objectivos estabelecidos; a empregabilidade dos seus diplomados; os relatórios de auto-avaliação e avaliação externa; a eficiência da gestão administrativa e financeira ou do grau de internacionalização da instituição, entre outros. Sr.as e Srs. Deputados, como diria Eduardo Lourenço: «não podemos continuar a olhar para oceanos que já não são nossos». Temos de apelar ao que de melhor o País tem, às comunidades mais dinâmicas no interior das instituições de ensino superior, sem constrangimentos nem atavismos. Não podemos ignorar todo o processo de reforma do ensino superior na Europa e no mundo; não podemos sequer imaginar que podemos sobreviver «orgulhosamente sós». Temos de acompanhar as melhores práticas internacionais e nelas enfrentar, com optimismo, a possibilidade de aprofundamento da autonomia das instituições que o modelo fundacional proporciona. A transformação em fundação mantém o carácter público da instituição e dos vínculos à mesma, garantindo-lhe, no entanto, uma gestão mais flexível, mais moderna e mais responsabilizadora, capaz de colocá-las em pé de igualdade com as suas congéneres europeias. Mais diversidade. Temos de fomentar o processo de internacionalização e a capacidade de competir no espaço europeu de ensino superior, criando sinergias entre diferentes instituições, aumentando massa crítica, criando consórcios ou outras formas de associação, trabalho em rede, contrário à tendência «paroquial» das instituições de ensino superior. Ao contrário do que o PSD propõe no seu projecto de lei de autonomia, que promete tudo mudar, mas que cria condições para que tudo fique na mesma, esta não é uma lei desresponsabilizadora para o Estado, já que assume um quadro mínimo organizacional, obrigando a que, de facto, haja mudança em todo o sistema. É que o tempo encarregou-se de dar razão a Miller Guerra, que já nos anos 60 do século passado afirmava que «as instituições universitárias não se auto-reformam». É por isso que devemos contextualizar alguma da contestação a esta importante reforma. Sr.as e Srs. Deputados, não entendem ser relevante que o quadro de referência da qualidade das instituições de ensino superior seja de nível internacional? Pois bem, esta proposta estabelece-o! Não precisa Portugal de reforçar a especialização do sistema binário, dando resposta qualificada à necessidade de aumentar a formação de quadros técnicos? Ora, este diploma reforça-a! Não está já o País farto do estigma que pende sobre as instituições de ensino superior privadas e inerentemente sobre os portugueses nelas formados, por falta de um quadro de exigência similar ao do sistema público? Pois esta lei cria um quadro de exigência comum e com isso extermina esse estigma! São grandes os desafios que esta reforma a todo o País coloca! Saibamos, por Portugal e pelos portugueses, estar à altura dos seus desafios!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discute-se hoje, com esta proposta de lei, uma nova arquitectura para o nosso sistema de ensino superior. Há muito que se exige uma reforma profunda no sector, capaz de responder a novas realidades entretanto emergentes, de que é exemplo paradigmático, em sentido estrito, o Processo de Bolonha e, mais amplamente, todas as questões relacionadas com a competitividade à escala mundial. O espaço europeu em que Portugal se integra não pode manter o conservadorismo que caracteriza as suas instituições de ensino superior, sob pena de se afastar cada vez mais dos patamares de produção do conhecimento de países como os Estados Unidos da América e, inclusive, de se ver ultrapassado pelos países emergentes, como alertava recentemente o Comissário europeu da educação, ao dizer «Dentro de uma década, as universidades europeias podem ser ultrapassadas pelas da China e da Índia». É esta uma das questões centrais a que este diploma pretende responder. Mais do que este ou aquele interesse corporativo, é responsabilidade de todos nós dotar o sistema de ensino superior dos instrumentos necessários para que do seu seio emirja uma verdadeira cultura de excelência, preferencialmente de nível internacional. É nesse sentido que se debatem hoje, nesta Assembleia, as propostas de mudança para o sector, após um prolongado período de debate prévio na sociedade portuguesa, com principal incidência a partir dos trabalhos preparatórios do relatório da OCDE (que já então envolviam as instituições), e que se prolongou após a sua apresentação, continuando nos debates públicos efectuados pelo CNE e no envolvimento das principais instituições representativas do sistema de ensino superior: CRUP, CCISP APESP, sindicatos e associações de estudantes, entre outras, durante o período de elaboração desta proposta de lei. Seguir-se-á o habitual rigor procedimental do Parlamento, garantindo que todos possam pronunciar-se e que, dessa forma, o debate, na especialidade, seja o mais qualificado, como a dimensão desta reforma exige. Também não inviabilizaremos a proposta do PSD sobre esta matéria, demonstrando, com clareza, a nossa total abertura a diálogos e consensos. Analisemos, então, as principais inovações desta «revolução virtuosa». Em primeiro lugar, mais eficiência, uma verdadeira mudança de paradigma na governação das instituições: actualmente homogéneos e tradicionais, com órgãos congestionados pela sua dimensão e em que há uma clara desvalorização dos órgãos uninominais, passam, com esta proposta, a uma diversificação dos modelos de governação, simplificação das estruturas organizativas e eficiência e reforço dos órgãos individuais. Mais autonomia: retira da tutela do Ministério das Finanças a microgestão das instituições, consagrando a autonomia de gestão financeira e de gestão do pessoal. Mais participação e maior competitividade: mobiliza a competência externa, abrindo obrigatoriamente universidades e politécnicos aos actores mais dinâmicos da sociedade civil, acabando com um distanciamento pernicioso ao desenvolvimento de ambos. Não está o País farto de ouvir das empresas que as formações superiores não se adequam às suas necessidades? Não se escandaliza o País quando necessita de mão-de-obra qualificada e jovens licenciados se encontram no desemprego por desadequação das suas formações? Pode Portugal melhorar o seu modelo de desenvolvimento se não for capaz de gerar empresas modernas, com elevado índice de especialização e concomitantemente receptoras de mão-de-obra qualificada? Mais transparência: cria um quadro de transparência institucional fundamental à sua credibilização e evolução, nomeadamente com a necessidade de as instituições se responsabilizarem publicamente por matérias tão relevantes como: o grau de realização dos objectivos estabelecidos; a empregabilidade dos seus diplomados; os relatórios de auto-avaliação e avaliação externa; a eficiência da gestão administrativa e financeira ou do grau de internacionalização da instituição, entre outros. Sr.as e Srs. Deputados, como diria Eduardo Lourenço: «não podemos continuar a olhar para oceanos que já não são nossos». Temos de apelar ao que de melhor o País tem, às comunidades mais dinâmicas no interior das instituições de ensino superior, sem constrangimentos nem atavismos. Não podemos ignorar todo o processo de reforma do ensino superior na Europa e no mundo; não podemos sequer imaginar que podemos sobreviver «orgulhosamente sós». Temos de acompanhar as melhores práticas internacionais e nelas enfrentar, com optimismo, a possibilidade de aprofundamento da autonomia das instituições que o modelo fundacional proporciona. A transformação em fundação mantém o carácter público da instituição e dos vínculos à mesma, garantindo-lhe, no entanto, uma gestão mais flexível, mais moderna e mais responsabilizadora, capaz de colocá-las em pé de igualdade com as suas congéneres europeias. Mais diversidade. Temos de fomentar o processo de internacionalização e a capacidade de competir no espaço europeu de ensino superior, criando sinergias entre diferentes instituições, aumentando massa crítica, criando consórcios ou outras formas de associação, trabalho em rede, contrário à tendência «paroquial» das instituições de ensino superior. Ao contrário do que o PSD propõe no seu projecto de lei de autonomia, que promete tudo mudar, mas que cria condições para que tudo fique na mesma, esta não é uma lei desresponsabilizadora para o Estado, já que assume um quadro mínimo organizacional, obrigando a que, de facto, haja mudança em todo o sistema. É que o tempo encarregou-se de dar razão a Miller Guerra, que já nos anos 60 do século passado afirmava que «as instituições universitárias não se auto-reformam». É por isso que devemos contextualizar alguma da contestação a esta importante reforma. Sr.as e Srs. Deputados, não entendem ser relevante que o quadro de referência da qualidade das instituições de ensino superior seja de nível internacional? Pois bem, esta proposta estabelece-o! Não precisa Portugal de reforçar a especialização do sistema binário, dando resposta qualificada à necessidade de aumentar a formação de quadros técnicos? Ora, este diploma reforça-a! Não está já o País farto do estigma que pende sobre as instituições de ensino superior privadas e inerentemente sobre os portugueses nelas formados, por falta de um quadro de exigência similar ao do sistema público? Pois esta lei cria um quadro de exigência comum e com isso extermina esse estigma! São grandes os desafios que esta reforma a todo o País coloca! Saibamos, por Portugal e pelos portugueses, estar à altura dos seus desafios!
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Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Pretende o Governo criar um regime jurídico das instituições do ensino superior. É uma reforma que, desde há anos, se considerava consensualmente necessária. Precisamente por isso, é lamentável que o Governo e a maioria absoluta do Partido Socialista estejam a usar de tanta precipitação e de tanto atropelo. Mais parece que o Governo, bem consciente da gravíssima asneira que está a fazer, decidiu iniciar uma louca e desenfreada fuga para a frente sem olhar a meios nem a consequências. Esquece-se a dignidade da lei, esquece-se a dignidade do regime jurídico em causa, esquece-se a dignidade do trabalho parlamentar! E o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que dá cobertura a este modo de agir, está a revelar pouco respeito por si próprio e pela dignidade da função dos deputados na Assembleia da República. Só o Governo e a maioria absoluta do Partido Socialista não vêem aquilo que está à vista de toda a gente. Pior ainda, escolheu o Governo a fase de encerramento de ano lectivo e a época de exames finais para aprovar e tornar pública a sua proposta de lei. Bate tudo demasiado errado para ser uma mera coincidência! Esta proposta de lei é má e, por isso, só pode merecer o voto contra do CDS! Este regime jurídico é uma amálgama de contradições: o Governo afirma propor-se promover a autonomia das instituições de ensino superior, mas, na verdade, faz exactamente o contrário. Cria um regime rígido, altamente formatado, que faz tábua rasa da diversidade própria das instituições do ensino superior. Mas pior ainda: promove um estilo dirigista, numa lógica de Governo que quer ser «controleiro» do ensino superior. Vê-se que o «estilo DREN» está a fazer escola neste Governo! Mas, por oposição a isto, concede o Governo a si próprio poderes manifestamente discricionários que, estamos certos, serão usados de forma puramente arbitrária no que respeita a matérias onde se exigia rigor e transparência total, como é o caso da aprovação ou rejeição da criação de fundações públicas com regime de Direito Privado, sem se saber quais os critérios que orientam essa decisão. Da mesma forma, quer o Governo poderes discricionários na nomeação dos curadores destas fundações, sem revelar quais os critérios que vão determinar a aceitação ou a rejeição das propostas apresentadas pelas próprias instituições. Fica tudo sujeito ao livre arbítrio do Governo. Se o objectivo era a autonomia do ensino superior, estamos muito bem esclarecidos!… Não é admissível que unidades orgânicas se possam separar das instituições a que pertencem sem haver debate interno na própria instituição ou, até, que tal possa acontecer por decisão unilateral do Governo, sem consulta da instituição. Do mesmo modo, esta proposta de lei permite que, durante o curtíssimo prazo de seis meses concedido às instituições para adaptação dos seus estatutos, sob pena de eventual encerramento compulsivo, possam, paralelamente, algumas das unidades orgânicas que as compõem negociar com o Governo, em apenas três meses, a sua conversão em fundações. Isto é introduzir um princípio de caos na definição do futuro de cada instituição!! Tudo isto considera o Governo como «natural»…! Esta semana, em declarações à comunicação social, afirmou o Sr. Ministro Mariano Gago que gostaria de «ter o máximo consenso, porque esta é uma lei de natureza estrutural para o ensino superior». E é verdade, Sr. Ministro: conseguiu V. Ex.ª gerar um amplo consenso na sociedade portuguesa sobre esta matéria! Da direita à esquerda, dos reitores aos alunos, dos professores aos sindicatos, do interior ao litoral, de ex-Presidentes da República a constitucionalistas de reconhecido mérito, todos estão de acordo que se trata de uma má lei, de um péssimo regime, de um dano irreparável para o futuro do ensino superior. Só temos a lamentar, Sr. Ministro, que V. Ex.ª não tenha capacidade para perceber que o consenso generalizado que gerou lhe está a exibir um claríssimo «cartão vermelho»!
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Fazer hoje aprovar esta lei é um indicador exemplar da arrogância do Governo. O debate público foi posto «a saldo» e, onde era necessário, pela necessidade da reforma, o diálogo e o consenso com todos os parceiros, o Ministro criou fracturas insanáveis. Não é reformismo, Sr. Ministro, é autoritarismo!! Recusando fazer a reforma pelas raízes, pela lei do financiamento, na assunção de que a autonomia tem servido ao Estado para alijar as suas responsabilidades, o Governo, este ano como em nenhum outro, asfixiou financeiramente as instituições e, vendo-as a estrebuchar, apontou-lhes o dedo: «a culpa é vossa!!». E qual é, então, a «cura», esta «cura milagrosa» que o Governo quer ver aprovada a reboque, afinal, do calendário da Presidência europeia? A «cura» é a formatação do Governo das instituições, todos pela mesma «fita métrica», a fragmentação do sistema e o rebuçado com que se acena de fundações que comprarão a autonomia financeira, hipotecando a autonomia política e organizativa. Governamentalização e privatização convivem perigosamente num diploma que guilhotina a autonomia das universidades, consagrada constitucionalmente e em qualquer país desenvolvido, eixo da sua missão, em nome do lema moderno «competição ou morte». E criam-se, então, condições para os melhores: o que serve para o técnico servirá para quem tiver «unhas» para tocar a «guitarra» da competição moderna. O Sr. Ministro não tem pejo em afirmar que «as fundações são modelos vantajosos para instituições dinâmicas e não para instituições acomodadas, que não têm capacidade de intervenção na sociedade»… É o desprezo a que as instituições de ensino superior se foram habituando. Desprezo que explica a formatação dos governos — o Sr. Ministro não confia nas instituições! —, o esvaziamento da participação na gestão, esfumando o papel de alunos e do pessoal não docente, e a qualidade do reitor, que deixa de ser o representante de uma comunidade cuja soberania é esvaziada neste momento e passa a ser, como um qualquer quadro superior de empresa, escolhido por um comité. Para acicatar os «fracos» o Sr. Ministro acena com garantias que, afinal, podiam ser dadas às universidades e institutos, nomeadamente contratos de financiamento plurianuais, criando, então, um quadro legal obscuro que dá «carta branca» ao Governo para gerar fundações, e para as gerir, e «carta branca» às unidades para cortarem com as universidades. O Governo que acusa as instituições de serem modelos vampíricos e que oculta ao País o peso que o financiamento estatal terá nas fundações é o mesmo que se dispõe a vampirizar fundações que se tornarão reféns dos governos do momento. Não tem qualquer problema nessa estratégia, Sr. Ministro!! Sobre os «cadáveres» que o Sr. Ministro encontrou, que quer enterrar e que são os «cadáveres» da gestão democrática, sobre a demonização da realidade existente, a reforma necessária e urgente é «afogada» no «tanque» de uma lei que não garante os princípios da participação e representação, que não reconhece a liberdade das instituições, mormente nas formas de governo, e que se dispõe a fragmentar o sistema, quando os melhores caminhos do mundo desenvolvido vão no sentido oposto. Sob o lema «competição ou morte», o ensino superior, que passará a ser frequentado por alunosclientes — porque, enfim…, é muito duvidoso que este Governo mantenha os seus compromissos em acção social ou com as propinas! —, passará a assentar numa hierarquia entre instituições de primeira e instituições de segunda. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: «Decapitada» a autonomia consagrada constitucionalmente, ignoradas as recomendações do debate nacional de educação sobre a necessidade e urgência do seu reforço, usadas as recomendações da OCDE conforme o jeito, «decepados», enfim, os compromissos do Estado com o ensino superior público, é o melhor do Estado ao jeito do Partido Socialista: o Estado reduzido aos serviços mínimos!! O Bloco de Esquerda não pactuará com qualquer proposta, com qualquer lei que reduza a autonomia das instituições, que esvazie a participação na gestão das instituições e que abra um caminho cheio de labirintos para a instituição de instituições de ensino superior de «primeira divisão» e de «segunda divisão»!
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O ensino superior português tem sido, nas últimas três décadas, um dos pilares mais estruturantes da democracia portuguesa e tem desempenhado um papel decisivo na construção de um País mais moderno, mais aberto ao mundo e mais preparado para a existência num contexto global, onde o conhecimento e a tecnologia são o mais importante recurso endógeno de cada Estado e de cada povo. Nos últimos 30 anos, o ensino superior português (público, privado e concordatário) tornou-se mais acessível à generalidade dos cidadãos; instalou-se no interior do País; assumiu-se como uma das mais determinantes alavancas do desenvolvimento regional; construiu parcerias com as empresas e envolveu-se com a sociedade, nela intervindo e construindo uma consciência social absolutamente essencial ao seu papel crítico e liderante, na formação das elites e na concretização do direito à produção, disponibilização e utilização do conhecimento e da cultura, por parte de todos os cidadãos. A actual proposta de lei do regime jurídico das instituições de ensino superior, hoje em apreciação neste Plenário, convém referi-lo, é uma das principais peças legislativas de uma reformista e coerente política que tem vindo a ser concretizada com uma racionalidade e uma cadência que, acredito muito sinceramente, têm surpreendido as oposições, que parecem ainda não ter compreendido o desafio que Portugal enfrenta nesta área, nem têm tido a notável e reconhecida capacidade de resposta que as instituições de ensino superior têm manifestado. Muitas têm sido as tentativas de criar inércias neste processo de modernização; muitas têm sido as manobras dilatórias que tentam impedir a dinâmica reformista; muitos têm sido os argumentos que defendem a manutenção da situação actual. Os que nos acusam, hoje, de termos pressa são exactamente os mesmos que nos acusavam, ontem, de sermos lentos nas reformas. Os que nos apontam os perigos da governamentalização são os mesmos que nos acusam de desresponsabilização; os que acusam o Governo de intransigência e autismo são exactamente os mesmos que acusam o Governo de ter elaborado nove versões da mesma proposta de lei durante o período da discussão. Os que nos acusavam, ontem, de ausência de política para o ensino superior são, hoje, os que mais combatem essa mesma política de ensino superior. A oposição — sejamos sinceros — à política de ensino superior resume-se, muitas vezes, a este conjunto de paradoxos e de contradições. Sejamos sérios e responsáveis: o futuro de Portugal impõe-nos esta reforma e o tempo, Sr.as e Srs. Deputados, não é de espera; o tempo é de decisão e de acção e convidamos todos aqueles que querem contribuir com as suas ideias, com as suas propostas para a reforma do ensino superior em Portugal para que se juntem ao Partido Socialista na discussão desta proposta de lei do Governo e assim, em sede de especialidade na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, possamos discutir todas as ideias e contributos. Sr.as e Srs. Deputados, a magnitude do desafio, a ambição das finalidades e o respeito que as instituições de ensino superior portuguesas nos devem merecer pelo trabalho que estão a fazer são circunstâncias que nos devem mobilizar a todos a dar o nosso melhor contributo, na certeza de que estamos a construir um País que continuará a contar e a orgulhar-se das suas universidades e dos seus institutos politécnicos. Sr. Presidente, Srs. Deputados, um quadro de falsidades foi aqui demonstrado. Primeiro, não há governamentalização; há mais autonomia, a maior autonomia de sempre, das instituições de ensino superior! Segundo, a autonomia estende-se a todos os domínios: autonomia financeira, autonomia patrimonial, 42 I SÉRIE — NÚMERO 100 disciplinar e estatutária das instituições! Terceiro, não há qualquer risco de fragmentação, pois esta lei promove a reorganização da rede, a criação de consórcios! Recordo que a lei actual, aprovada pelo PSD, define que compete ao Governo — e assim deve ser — a criação, a extinção de faculdades após, naturalmente, consulta às instituições. É isto, também, que aqui promovemos! Não existe qualquer risco, nem vontade de mercantilização; antes pelo contrário, pela primeira vez, criase uma solução institucional que permite consolidar as instituições universitárias com as instituições privadas sem fins lucrativos, que constituem, hoje em dia, algumas das melhores instituições científicas universitária portuguesas. Registo a concordância do PSD com os objectivos e o diagnóstico da proposta de lei; contudo, não posso aceitar, Sr. Deputado, que tudo fique na mesma. Uma lei que permite que tudo fique na mesma a pretexto da diversidade é precisamente o contrário da diversidade e o contrário da exigência da reforma. Esta lei garante essa diversidade e exige a reforma do sistema. Até hoje, não ouvimos nenhuma proposta concreta. Contudo, essas propostas, certamente, serão debatidas na especialidade e reafirmo a minha total disponibilidade para o diálogo nessa sede, com vista à melhoria desta proposta de lei. Entende o PSD que é urgente esta reforma. E nós também. Um ano e meio de estudos, de debates e de intensa participação foram cumpridos. Há que analisar os últimos pontos em opção e decidir. É urgente fazê-lo com coragem e discernimento! Sr. Presidente, gostaria de concluir o debate, citando Manuel Rocha, em 1962. Ele disse: «(…) o mal tem consistido em não ter havido coragem, em nenhum momento, de adoptar francamente os modelos mais avançados, invocando-se sempre as condições peculiares de País para afinal aceitar a sobrevivência de fórmulas abandonadas». É isso que não queremos, Srs. Deputados!
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A finalizar este debate queremos dizer ao Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e ao Partido Socialista que temos pressa, mas não queremos uma lei precipitada. Queremos fazer uma reforma estruturante do ensino superior, de acordo com os cinco princípios básicos que tive oportunidade de enunciar e que o meu colega Deputado Pedro Duarte também referiu. Definimos aqui, de modo muito claro, um calendário, um calendário curto. Apontamos Outubro como o mês para finalizar este processo legislativo. Pensamos que é a maneira de fazermos este debate de uma forma séria e participada. Por isso, Sr. Ministro, dizemos a V. Ex.ª e à bancada do Partido Socialista que o Partido Social Democrata vai abster-se na votação. É um sinal, Sr. Ministro. É um sinal e uma oportunidade para podermos obter um consenso. Portanto, um sinal e uma oportunidade na expectativa de o rumo ainda se poder alterar. … fugiu como o diabo da cruz à explicação da «lei da rolha», que impôs na discussão com as entidades que podiam dar opiniões sobre a matéria que está em discussão e, à saída deste debate, limita-se a repetir exactamente os mesmos chavões com que entrou neste debate. Ora, esta não é uma postura correcta de quem pretende discutir as soluções que apresenta e de, democraticamente, ouvir as críticas que lhe são dirigidas. O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluída a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 148/X, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 140/X — Primeira alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, aprovando o estatuto do aluno dos ensinos básico e secundário. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 147/X, que hoje discutimos, visa transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/72/CE, do Conselho, de 22 de Julho de 2003, que completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores. A realização do mercado interno implica não só que os obstáculos às trocas comerciais sejam eliminados mas também que as estruturas de produção sejam adaptadas à dimensão comunitária do mercado. Para esse efeito, é essencial que as empresas, sejam elas de que tipo forem, sejam capazes de planear e de reorganizar as suas actividades à escala europeia. Ora, o enquadramento jurídico em que as empresas exercem as actividades na comunidade baseiase principalmente nas legislações nacionais. Esta situação constitui um entrave significativo ao reagrupamento entre sociedades de diferentes Estados-membros. Por esta razão, foram aprovados dois documentos fundamentais: o agrupamento europeu de interesse económico e o regulamento relativo ao estatuto da sociedade europeia. No entanto, estes dois instrumentos não estavam adaptados à especificidade das sociedades cooperativas. A Comunidade Europeia, preocupada em garantir a igualdade das condições de concorrência e em contribuir para o seu desenvolvimento económico, decidiu, então, dotar as cooperativas de instrumentos jurídicos adequados e susceptíveis de facilitar o desenvolvimento ou fusão entre cooperativas existentes pertencentes a diferentes Estados-membros ou através da criação de novas sociedades cooperativas à escala europeia. Nesse sentido, foi aprovado o estatuto jurídico da sociedade cooperativa europeia. Este novo instrumento jurídico veio permitir a criação de cooperativas por pessoas residentes em diferentes Estadosmembros, que podem exercer a sua actividade em todo o espaço europeu, com uma personalidade jurídica, uma regulamentação e uma estrutura únicas. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A sociedade cooperativa europeia é uma iniciativa recente e pioneira na União Europeia, na medida em que é a primeira grande realização normativa de natureza jurídica em matéria cooperativa. Ela surge como resposta a dois problemas fundamentais: o primeiro, o insuficiente desenvolvimento cooperativo no espaço europeu; o segundo, a desvantagem, como já se afirmou, das cooperativas perante as sociedades comerciais no que diz respeito ao quadro jurídico europeu. Por isso, o estatuto da sociedade cooperativa europeia representa, por um lado, a necessidade de estimular a actividade cooperativa no plano europeu, procurando enquadrar formalmente a colaboração entre cooperadores de mais do que um Estado da União Europeia e, por outro, a vontade de dotar as cooperativas de meios idênticos aos que foram postos à disposição das sociedades comerciais, isto é, de não fechar às cooperativas as portas que foram abertas às sociedades comerciais. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Conselho entendeu, face à existência na Europa de cerca de 300 000 cooperativas, que empregam mais de 2,3 milhões de pessoas e fornecem serviços a 83,5 milhões, que era necessário completar o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores. E fê-lo através da Directiva n.º 2003/72/CE, que a proposta de lei que agora analisamos transpõe para o ordenamento jurídico interno. E ainda bem, porque é, de facto, fundamental assegurar que a constituição de uma sociedade cooperativa europeia não conduza à abolição das práticas, e das boas práticas, de envolvimento dos trabalhadores existentes nas cooperativas participantes na sua constituição. Assim, com a transposição desta directiva, ficam criadas as condições necessárias à aplicação de um quadro jurídico uniforme, no âmbito do qual as sociedades cooperativas europeias podem melhorar a governação societária, na medida em que, envolvendo nelas os trabalhadores, podem concorrer para uma representação equilibrada dos seus interesses e para o fomento da responsabilidade social da empresa. Por outro lado, o envolvimento dos trabalhadores é assegurado através da instituição de um regime de informação e consulta, através do conselho de trabalhadores, de procedimentos simplificados de informação e consulta ou da participação dos trabalhadores no órgão de administração ou fiscalização da sociedade cooperativa. Fica, assim, Sr.as e Srs. Deputados, protegido e regulado um dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 147/X vem estabelecer regras sobre o envolvimento dos trabalhadores no procedimento das negociações tendentes a um acordo, bem como os casos e modos de instituição obrigatória de um determinado regime de envolvimento dos trabalhadores no âmbito das disposições e acordos transnacionais aplicáveis em caso de constituição de uma sociedade cooperativa europeia com sede em Portugal. A presente proposta de lei regula igualmente os modos de designação ou eleição dos representantes dos trabalhadores que sejam membros do grupo especial de negociação, do conselho de trabalhadores ou do órgão de administração ou fiscalização da sociedade cooperativa europeia. Assim sendo, as pessoas colectivas participantes, após decidirem constituir uma sociedade cooperativa europeia, deverão adoptar as medidas necessárias à constituição de um grupo especial de negociação, que deverá ser constituído por representantes dos seus trabalhadores com o objectivo de negociar com eles o envolvimento dos trabalhadores na sociedade cooperativa europeia constituída. Sr. Presidente, tentando trazer alguma luz a este assunto — pelos vistos, a mesma luz que nos falta hoje aqui na Sala — deve dizer-se que a Directiva n.º 2003/72/CE, do Conselho, de 22 de Julho de 2003, de cuja transposição a presente proposta de lei se ocupa, completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores, estabelecendo disposições específicas com vista a garantir que a constituição de uma sociedade cooperativa europeia não conduza à abolição ou redução das práticas de envolvimento dos trabalhadores existentes nas cooperativas participantes na sua constituição. Após 10 anos de negociações, os Estados da União Europeia adoptaram, sob a forma de Regulamento, a proposta da Comissão de criação de um estatuto para a sociedade cooperativa europeia. Os futuros cooperadores poderão, assim, operar no mercado interno com uma identidade legal, um conjunto de regras e uma estrutura, podendo vir a ser capazes de expandir e reestruturar as suas operações transfronteiriças sem despenderem custos e tempo que seriam consumidos através da constituição e manutenção de uma rede de subsidiárias. Esta forma legal visa encorajar outras cooperativas a explorar oportunidades transfronteiriças e a aumentar a competitividade europeia. Nos termos do Regulamento n.º 1435/2003, do Conselho, de 22 de Julho de 2003, para a constituição de uma sociedade cooperativa europeia são necessárias, pelo menos, cinco pessoas singulares ou colectivas que tenham residência em pelo menos dois Estados-membros diferentes. As sociedades cooperativas europeias podem ainda ser constituídas por fusões ou transformações de cooperativas que tenham sido constituídas nos termos da legislação de um Estado-membro e que tenham a sua sede e administração central na Comunidade, se, nos casos de fusões, pelo menos duas delas forem reguladas pelo direito de Estados-membros diferentes ou, em caso de transformações, tenham, há pelo menos dois anos, um estabelecimento ou filial regulados pelo direito de outro Estado-membro. O novo estatuto assemelha-se, assim, ao Estatuto da Sociedade Europeia, adoptado em 2001, apesar de, obviamente, apresentar características específicas para as sociedades cooperativas. Esta Directiva destina-se essencialmente a garantir que a constituição de uma sociedade cooperativa europeia, nos termos do Regulamento n.º 1435/2003, do Conselho, de 22 de Julho, não signifique a eliminação nem qualquer redução dos direitos de informação, consulta e participação dos trabalhadores previamente existentes nas entidades jurídicas participantes neste processo de constituição. A Declaração sobre a Identidade Cooperativa, que a Aliança Cooperativa Internacional aprovou no Congresso do Centenário, em 1995, integra o princípio da educação, formação e informação nos seguintes termos: «As cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos representantes eleitos, dos dirigentes e dos trabalhadores, de modo a que possam contribuir eficazmente para o desenvolvimento das suas cooperativas. Elas devem informar o grande público, particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação.» Cada época e cada movimento cooperativo terão de assumir este cuidado na educação, de modo que a forma cooperativa esteja presente no interior de cada cooperador antes de se manifestar, como acção, na empresa cooperativa. Por isso, o CDS considera útil e positiva a transposição da presente directiva. De qualquer forma, não podemos deixar de alertar para algumas imprecisões e desconformidades, que convém corrigir no debate na especialidade. Assim, por exemplo, as noções contidas no artigo 4.º padecem de alguma falta de sequência lógica na respectiva ordenação. Por outro lado, talvez não fosse absolutamente necessário que o órgão de representação dos trabalhadores fosse, desde já, «baptizado» pela lei como «conselho de trabalhadores», isto porque, nos termos da directiva, cabe exclusivamente às partes definir o regime de envolvimento dos trabalhadores. Segundo a directiva, o acordo entre os órgãos competentes das entidades jurídicas participantes e o grupo especial de negociação que estabelece o regime de envolvimento dos trabalhadores está na plena autonomia das partes, embora deva regular obrigatoriamente um conjunto de matérias previstas no n.º 2 do seu artigo 4.º, sendo todavia de salientar que tais matérias devem ser reguladas, mas compete exclusivamente às partes definir como regulá-las. Ora, as disposições da proposta de lei contrariam este princípio, quer por excesso, como no caso da alínea d) do n.º 1 do artigo 16.º, quer por defeito, como é o caso da falta de referência aos recursos materiais e financeiros a atribuir ao órgão de representação, que é uma das matérias a incluir obrigatoriamente no acordo — veja-se a alínea e) do n.º 2 do artigo 4.º da directiva —, mas a regular de acordo com a vontade das partes. Por outro lado ainda, também à luz da directiva, se afigura desnecessário individualizar os vários regimes possíveis de envolvimento dos trabalhadores, sendo suficiente a enumeração genérica das matérias que devem constar obrigatoriamente de qualquer acordo que institua um regime de envolvimento dos trabalhadores. A regulação dos recursos materiais e financeiros a atribuir ao órgão de representação dos trabalhadores, no âmbito de um regime de envolvimento dos trabalhadores instituído por acordo, está na disponibilidade das partes, conforme resulta do n.º 2 do artigo 4.º da directiva. Ora, isto significa que a lei só deve regular esta matéria na ausência de acordo. Importa lembrar que, em legislação recentemente aprovada pelo Governo, no caso de fusão e aquisição apenas existe o dever de informar os trabalhadores, excluindo-os de uma efectiva participação e de negociação dos seus direitos no respectivo processo. No preâmbulo da proposta de lei, o Governo refere que foram ouvidas as organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores, deixando de fora a auscultação das próprias cooperativas, o que nos parece um erro. Em conclusão, estando de acordo com a presente proposta de lei e não abdicando da necessidade de ouvir a opinião do movimento cooperativo português, lamentamos que os direitos que passam a ser consagrados na legislação nacional para as sociedades cooperativas europeias não tenham correspondência para as restantes empresas, em especial para as sociedades anónimas, muito particularmente nos caso de fusão e aquisição. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia Couto Vieira.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 147/X transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 203/72/CE, do Conselho, de 22 de Julho de 2003. Esta directiva e, consequentemente, a presente proposta de lei, completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores. Esta proposta de lei surge na sequência da aprovação do estatutos das sociedades europeias, nomeadamente a sociedade europeia e a sociedade cooperativa europeia. Anexo a estes estatutos, foram aprovadas as respectivas directivas que consagram os direitos dos trabalhadores e a sua representação na constituição destas sociedades. Destaca-se o tratamento equilibrado entre estes dois tipos de sociedades: a anónima e a cooperativa. Temos, no entanto, de fazer uma ressalva: a sociedade cooperativa europeia não corresponde ao estatuto jurídico que as cooperativas portuguesas seguem no cumprimento dos princípios cooperativos internacionalmente reconhecidos e não postos em causa na Aliança Cooperativa Internacional (ACI). Isto não significa que o Partido Comunista Português discorde da relevância que é dada ao trabalhador da cooperativa, não como cooperativista, mas como trabalhador por conta de outrem, bem pelo contrário, concordamos e valorizamos o facto de nestas sociedades cooperativas europeias se envolverem os trabalhadores nos vários níveis de administração. Na verdade, esta proposta de lei consagra — e muito bem — o dever de informação aos trabalhadores, o dever de negociação com estes, o princípio da boa-fé negocial, a duração das negociações, os direitos do conselho de trabalhadores e, entre outros, o direito de participar nas decisões da sociedade cooperativa. Este aspecto paralelo ao estatuto da sociedade europeia coloca na ordem do dia um debate, que o próprio movimento cooperativo deverá desenvolver, que diz respeito ao modelo de governo das cooperativas e ao aprofundamento da democracia destas organizações económicas democráticas. É, no entanto, curioso que, no momento em que por toda a União Europeia e muito particularmente em Portugal se atacam os direitos dos trabalhadores, a liberdade sindical e as organizações representativas de trabalhadores, se consagre, por obrigação, um conjunto de direitos de representação dos trabalhadores que vai ao ponto de serem representados nos órgãos de administração e fiscais, direito este a que os trabalhadores não acedem nas cooperativas portuguesas e muito menos nas sociedades anónimas portuguesas. Assim, esta proposta de lei é reveladora das contradições do Governo. Se para as sociedades cooperativas europeias — e bem — se estabelece um conjunto significativo de direitos, quanto aos direitos de participação dos trabalhadores nas empresas de âmbito nacional, o Governo ataca os seus direitos. Para isso basta ver os ataques que os sindicatos estão a sofrer na limitação do crédito de horas a que os trabalhadores têm direito para a actividade sindical. Importa lembrar que, em legislação recentemente aprovada pelo Governo, no caso de fusão e aquisição apenas existe o dever de informar os trabalhadores, excluindo-os de uma efectiva participação e de negociação dos seus direitos no respectivo processo. No preâmbulo da proposta de lei, o Governo refere que foram ouvidas as organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores, deixando de fora a auscultação das próprias cooperativas, o que nos parece um erro. Em conclusão, estando de acordo com a presente proposta de lei e não abdicando da necessidade de ouvir a opinião do movimento cooperativo português, lamentamos que os direitos que passam a ser consagrados na legislação nacional para as sociedades cooperativas europeias não tenham correspondência para as restantes empresas, em especial para as sociedades anónimas, muito particularmente nos caso de fusão e aquisição. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia Couto Vieira.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A informação, consulta e participação dos trabalhadores nas empresas de dimensão comunitária constitui um princípio basilar inscrito na Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores. É exactamente a aplicação deste princípio respeitante aos trabalhadores de sociedades cooperativas europeias que hoje aqui debatemos. A União Europeia, preocupada em garantir a igualdade das condições da concorrência e em contribuir para o seu desenvolvimento, decidiu dotar as cooperativas de instrumentos jurídicos adequados e susceptíveis de facilitar o desenvolvimento das suas actividades transnacionais através da colaboração ou fusão entre cooperativas existentes em diferentes Estados-membros ou através da criação de novas sociedades cooperativas à escala europeia. Surgiu a figura da sociedade cooperativa europeia como resposta a dois problemas: insuficiente desenvolvimento cooperativo no espaço europeu e desvantagem das cooperativas perante as sociedades comerciais, no que diz respeito ao quadro jurídico europeu. Na verdade, a presente proposta de lei procede à transposição para a ordem jurídica interna da Directiva n.º 2003/72/CE, que contempla o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores, estabelecendo disposições específicas, com o objectivo de garantir que a constituição de uma sociedade cooperativa europeia não se traduza na abolição das práticas de envolvimento dos trabalhadores existentes nas cooperativas participantes na sua constituição. O envolvimento dos trabalhadores nas actividades da sociedade cooperativa europeia pode, sem prejuízo da autonomia das partes, ser assegurado através da instituição de um conselho de trabalhadores, de um ou mais procedimentos de informação e consulta, ou de um regime de participação dos trabalhadores. O conselho, confrontado com a existência na Europa de cerca de 300 000 cooperativas, que empregam mais de 2 milhões de pessoas e fornecem serviços a quase 84 milhões, entendeu que estava na altura de completar o estatuto da sociedade europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores, o que faz através desta directiva e que a presente proposta de lei transpõe para o nosso ordenamento jurídico. Esta proposta de lei consagra ainda um regime contra-ordenacional relativo à violação das disposições ao regime do envolvimento dos trabalhadores nas actividades da sociedade cooperativa europeia. Esta directiva traduz-se igualmente num importante avanço ao nível da construção de uma Europa mais social, mais solidária e mais atenta aos direitos dos trabalhadores. Com efeito, numa altura em que se debate a futura constituição europeia, em que nos confrontamos com a globalização e mundialização da economia, é cada vez mais importante a participação e a intervenção dos trabalhadores na vida da empresa, designadamente quanto às questões das deslocalizações, da introdução de novas tecnologias, etc. A iniciativa do Governo pretende atribuir aos trabalhadores portugueses um meio, que a União Europeia facultou a todos os trabalhadores, como forma de participarem na vida das cooperativas. A proposta de lei em debate consagra soluções e mecanismos que visam permitir aos trabalhadores de várias cooperativas que se encontram distribuídas por vários Estados-membros a possibilidade de se fazerem ouvir e de participarem aos mais vários níveis na vida da empresa e que, até agora, se encontravam completamente desprotegidos e em situação de desigualdade face a muitos outros trabalhadores, dado que, ao nível nacional, não existiam mecanismos legais que lhes permitissem obter informações e dialogar sobre actos praticados pela direcção central situada num outro país. Por isso, é enorme a expectativa dos trabalhadores portugueses e das suas organizações representativas quanto à aprovação da proposta de lei em discussão. Pelos motivos expostos, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista votará favoravelmente a proposta de lei n.º 147/X, convicto de que as soluções ali contempladas vão ao encontro dos legítimos interesses dos trabalhadores portugueses e europeus, a quem caberá a responsabilidade e o desafio de utilizar este novo instrumento jurídico, ao serviço do diálogo social nacional e europeu, que, não temos dúvidas, saberão vencer.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa, relativa ao exercício do direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima, chega a esta Casa com nove anos de atraso. E, no entanto, vem tarde mas não tem muito acerto. De facto, nos últimos tempos, e no que se refere aos direitos associativos das forças de segurança, incluindo polícias e militares, o Governo tem tido um irresistível impulso de restringir e controlar tudo o que pode — e, às vezes, até o que não pode. É assim que, a pretexto de regulamentações de direitos já consagrados, o Governo vem, no fundo, reduzir ou quase anular esse direito. Falamos, por exemplo, do direito de associação. Mais uma vez, esta proposta de lei não é excepção. Para além de regular alguns aspectos do direito associativo da Polícia Marítima, o Governo vem restringi-lo, e restringe-o de forma quase insuportável, fazendo com que, em certos aspectos, ele praticamente deixe de existir — ou fique subordinado às chefias hierárquicas. Veja-se, por exemplo, quanto à constituição de associações pelo pessoal da Polícia Marítima. Dizia a Lei de 1998 que «o pessoal da Polícia Marítima (…) tem direito a constituir associações profissionais (…) nos termos da Constituição e da presente lei». Ora, não pode, por isso, esta proposta de lei vir dizer que as associações só podem exercer os seus direitos se comunicarem ao Ministro da Defesa Nacional os seus estatutos e a identidade dos seus dirigentes. Note-se que o direito de associação pode ser regulado, sim, mas é um direito do pessoal da Polícia Marítima, não é exercido sob a direcção do Ministério da Defesa Nacional nem pode do Ministério depender! Aliás, pode até perguntar-se por que é que o Ministério da Defesa Nacional insiste em ter na sua posse a identidade dos dirigentes associativos. Poderia fazer sentido que fossem comunicados pelas associações os membros que vão exercer certos direitos, por exemplo, os que vão participar em certas reuniões junto do Ministério, mas já não faz sentido que lhes sejam comunicadas as identidades dos órgãos dirigentes, porque não há nisso qualquer justificação plausível — o Ministério da Defesa Nacional não tem nem deve ter qualquer função de supervisão ou controlo dos dirigentes associativos. Para além deste aspecto, que é fundamental para nós, também há outros problemas. Veja-se, por exemplo, que o pessoal da Polícia Marítima não pode afixar documentos relativos à vida da associação sem primeiro entregar ao comandante local uma cópia; os dirigentes associativos necessitam de autorização para ir a reuniões, mas essa autorização pode vir a ser-lhes negada depois, bastando que o comandante alegue «necessidades de serviço» — que até podem ser posteriores ao pedido! Além disso, a pretexto do direito de associação, regula-se ainda o direito de reunião, quando este devia estar fora do âmbito desta lei. Vem ainda esta proposta regular minuciosamente o processo eleitoral para o Conselho da Polícia Marítima. Contudo, tendo o pessoal da Polícia Marítima direito a três membros para um total de nove, muito se estranha que seja necessário regular com tanta minúcia esta matéria. Aliás, pode até estranhar-se que seja a própria Polícia Marítima a organizar e coordenar este processo. Para concluir, entendemos que este estatuto do dirigente associativo não respeita as legítimas expectativas do pessoal da Polícia Marítima. Mais: a pretexto de regular esse direito, vem restringi-lo e colocá-lo sob o controlo directo das chefias, criando perigosas obrigações. Esta lei vem tarde e não contribui para o eficaz exercício dos direitos associativos já consagrados. Só nos resta, portanto, votar contra.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste momento em que tenho o gosto de, pela primeira vez, usar da palavra sobre um tema conexo com os assuntos da Defesa Nacional, é com um especial prazer que me debruço sobre um diploma de iniciativa governamental que vem culminar um longo processo legislativo, de mais de nove anos. Foi, na verdade, há três legislaturas que esta Assembleia produziu a Lei n.º 53/98, que estabelece o regime de exercício de direitos do pessoal da Polícia Marítima. Remeteu-se, então, para diploma próprio a regulamentação do exercício do direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima. Ora, sendo a Polícia Marítima a entidade que garante e fiscaliza o cumprimento da lei nas áreas de jurisdição do Sistema de Autoridade Marítima, é uma força policial armada e uniformizada, hierarquicamente subordinada em todos os níveis da sua estrutura organizativa. Para além das suas atribuições próprias em situações de normalidade institucional, competem-lhe, em situações de excepção, as atribuições resultantes da legislação sobre defesa nacional e sobre o estado de sítio e o estado de emergência. Por tudo isso, impende sobre o seu pessoal, além dos direitos e deveres dos funcionários e agentes da Administração Pública, um condicionamento especial, restritivo dos direitos de expressão, de manifestação, de reunião e de petição, que a Lei n.º 53/98 tipifica. Esperámos três legislaturas. Quatro governos depois, o Executivo presidido por José Sócrates produziu a proposta de lei n.º 146/X, ora sob escrutínio parlamentar. Visa ela regular o exercício do direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima, em serviço efectivo. Esta proposta de lei, ora sub judice, estabelece no Capítulo I o princípio da exclusividade da inscrição, isto é, veda ao pessoal da Polícia Marítima a pertença a mais do que uma associação profissional e regula a constituição e o regime das associações profissionais. O Capítulo II ocupa-se da representação das associações profissionais, no Conselho da referida Polícia e junto do órgão de comando regional da Polícia Marítima. No Capítulo III, estabelece-se o princípio geral do não prejuízo nem benefício do pessoal da Polícia Marítima em virtude do exercício do direito de associação. No Capítulo IV, trata-se das eleições dos representantes das associações profissionais para o Conselho da Polícia Marítima, que podem decorrer em instalações da própria Polícia. Por fim, o Capítulo V inclui as disposições finais e transitórias, relativas ao primeiro processo eleitoral, e estabelece que a contagem de prazos é efectuada em obediência à regra da continuidade prevista na lei civil. O cumprimento deste dever legiferante do Governo veio, na verdade, colmatar um hiato temporal na regulamentação de um direito cujo exercício deverá contribuir para um mais preenchido desempenho do pessoal da Polícia Marítima. Este diploma foi visto e aprovado em Conselho de Ministros a 10 de Maio passado. Tendo em conta que a regulamentação nele enunciada foi precedida de um longo processo de auscultação das associações do pessoal da Polícia Marítima, tenho a consciência de poder concluir, com segurança, que o Governo cumpriu o que tinha a cumprir, nos termos adequados e com a diligência e a temporização adequadas. E regozijo-me por este processo legislativo ter tido início e conclusão numa legislatura e com um Governo de orientação socialista. Por isso, Sr. Presidente, é-me grato anunciar que o Grupo Parlamentar do PS votará a seu favor — e creio, também, que todos os outros grupos parlamentares que se preocupam com uma correcta estatuição e delimitação dos direitos e deveres dos servidores do Estado na área da defesa nacional o farão também. Afinal, trata-se de melhor construir o Estado de direito democrático em Portugal.
0PS
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Polícia Marítima integra, actualmente, a estrutura operacional da Autoridade Marítima Nacional, nos termos do Decreto-Lei n.º 44/2002, de 2 de Março. Trata-se de uma força policial armada e uniformizada, dotada de competência especializada nas áreas e nas matérias legalmente atribuídas ao Sistema da Autoridade Marítima, sendo composta por militares da Marinha e agentes militarizados. É conhecida a evolução histórica desta força policial armada, bem como a controvérsia jurídicoconstitucional acerca das suas natureza e funções. Não cabe, porém, no âmbito desta curta intervenção alongar-me sobre tais aspectos da realidade. Gostaria, no entanto, de salientar que, em 1995, operou-se a alteração da natureza das funções da Polícia Marítima, que estava integrada nas Forças Armadas, passando esta a constituir uma força de segurança, muito embora organicamente dependente do Ministério da Defesa Nacional, o que veio a acentuar o hibridismo desta solução e reforçar a sua complexidade. Face a este novo normativo, o pessoal abrangido pelo diploma deixou de receber a qualificação de «militarizado», continuando, embora, sujeito ao regime que abrange os militares e agentes militarizados dos quadros permanentes e contratados em serviço efectivo nas Forças Armadas. O pessoal da Polícia Marítima deixou, assim, de estar integrado nas Forças Armadas, muito embora se encontre na dependência do Ministério da Defesa Nacional — e daí a presença aqui do Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional para apresentar a proposta de lei. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta, hoje, à Assembleia da República, a proposta de lei n.º 146/X, que visa regular o exercício do direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima. O associativismo na Polícia Marítima existe há mais de uma década. Como é do conhecimento de VV. Ex.as, o associativismo socioprofissional nas forças de segurança, bem como nas Forças Armadas, é um fenómeno relativamente recente em Portugal. Esta questão foi alvo, ao longo de vários anos, de abundante e acalorada discussão, dentro e fora do Parlamento, e o seu reconhecimento foi avançando gradualmente, no respeito dos princípios constitucionais da necessidade e da proporcionalidade, em face das funções estatutariamente consagradas para as forças de segurança. Porém, na década de 90, a consagração legal de associações socioprofissionais nas forças de segurança afigurava-se como uma inevitabilidade decorrente da realidade sociopolítica existente e, também, da prática instituída na generalidade dos países membros da então Comunidade Europeia. A proposta de lei n.º 146/X, ora em discussão, surge, agora, por imperativo constitucional, como o diploma regulamentador do disposto na Lei n.º 53/98, de 18 de Agosto, que estabeleceu o regime de exercício de direitos do pessoal da Polícia Marítima em serviço efectivo e consagrou o direito à constituição de associações profissionais de âmbito nacional. Este regime, consagrado em 1998, é integrado por um conjunto de direitos e de restrições ao seu exercício, o que é expressamente admitido pela Constituição, no seu artigo 270.º. Sr.as e Srs. Deputados: Porque a proposta de lei n.º 146/X visa dar cumprimento ao disposto numa lei anterior da Assembleia da República e porque o faz em termos que se nos afiguram, formal e substancialmente, correctos, o PSD vai votá-la favoravelmente, tal como fez anteriormente em relação à lei habilitante.
4PSD
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos hoje perante um facto raro nesta Assembleia que é o de discutirmos a Polícia Marítima. E faz todo o sentido discutila, mesmo do ponto de vista do seu enquadramento institucional, porquanto, sendo uma força de segurança, e como tal definida, não é uma força de segurança que esteja sob a tutela do ministério que tutela as demais forças de segurança. É, portanto, uma situação especial estar sob a tutela do Ministério da Defesa Nacional e, mais, sob a direcção hierárquica directa do Chefe de Estado-Maior da Armada, o que é insólito porquanto a própria Guarda Nacional Republicana, que também tem, nos termos legais, uma natureza militar, não está sob tutela do Ministério da Defesa Nacional — está sob tutela do Ministério da Administração Interna e não está sob a dependência hierárquica do Chefe de Estado-Maior do Exército. Um dia, valeria a pena discutirmos com cuidado qual a lógica do enquadramento institucional da Polícia Marítima, porque não é isso que está hoje, aqui, em discussão. O que está hoje, aqui, em discussão é uma proposta de lei do Governo, que eu diria que é, sobretudo, uma lei eleitoral para a eleição dos representantes do pessoal da Polícia Marítima nos órgãos em que esta força de segurança tem representação. Não vem mal ao mundo que se estabeleça esta lei eleitoral, que é, de facto, extraordinariamente minuciosa, mas é um facto a registar que esta matéria seja regulada, porque, de facto, há muitos anos que está por regulamentar o exercício de direitos associativos por parte do pessoal da Polícia Marítima. Mas o simples facto de esta regulamentação ser finalmente proposta pelo Governo é um facto que importa registar. Agora, eu diria que há nesta proposta de lei dois aspectos que não podem deixar de merecer o nosso reparo e a nossa crítica contundente. Um deles diz respeito à possibilidade de, a todo o momento, o comando poder interromper as dispensas que são concedidas para a participação em actividades associativas. E criticamos esta posição porquê? Porque essas dispensas têm de ser superiormente autorizadas, nos termos da proposta de lei, o que já é discutível, mas têm de ser autorizadas, com prazos fixados. Ora, não faz qualquer sentido que, depois de terem sido autorizadas — o que significa, desde logo, que não há inconveniência para o serviço —, elas possam ser interrompidas, mesmo durante o seu decurso. Isto cria uma discricionariedade total e uma insegurança por parte dos dirigentes associativos quanto ao exercício das suas funções associativas. Depois, há um outro aspecto que não podemos deixar sem reparo, que é a reprodução, também nesta proposta de lei, da malfadada expressão da «coesão e disciplina» no seio da Polícia Marítima. Porquê? Porque esta disposição, que existe relativamente às associações militares em geral, tem servido propósitos de inviabilização prática do exercício de direitos associativos por parte dos militares. Porquê? Porque, ao permitirse que o comando possa, discricionariamente, invocar a «coesão e disciplina» das Forças Armadas para proibir a actividade das associações… É isso que tem vindo a acontecer. Esta disposição tem vindo a ser invocada de uma forma absolutamente abusiva. Eu até diria que é da mais duvidosa constitucionalidade que uma lei possa regular o exercício do direito de associação com base numa expressão tão vaga e indeterminada como é a «coesão e disciplina das Forças Armadas». Nós temos consciência dos efeitos nefastos que esta formulação está a ter em matéria de direitos associativos dos militares e, portanto, não podemos aceitar que igual formulação seja introduzida nesta proposta de lei, porque poderá criar, precisamente, os mesmos efeitos um dia em que a Polícia Marítima se veja na contingência de ter de discordar do Governo e de ter de manifestar uma posição contrária àquela que é a política do Governo.
2PCP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Polícia Marítima faz parte da estrutura do sistema de autoridade marítima e este, por sua vez — e bem! —, depende directamente do Ministro da Defesa Nacional. Como corpo de polícia armada, com especiais responsabilidades na área de jurisdição do sistema de autoridade marítima, cabe à Polícia Marítima zelar pela regularidade das actividades marítimas e pela segurança e direitos dos cidadãos. A Lei n.º 53/98, de 18 de Agosto, veio definir os princípios e as bases gerais do regime de exercício de direitos do pessoal militarizado da Polícia Marítima, subtraindo-os à égide do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, que estabelecia um conjunto de restrições inadequadas e desnecessárias, tendo em conta a sua natureza de corpo autónomo em relação às Forças Armadas. Foi no artigo 5.º da Lei n.º 53/98 que ficou consagrado, para o pessoal da Polícia Marítima em serviço efectivo, o direito a constituir associações profissionais de âmbito nacional para promoção dos correspondentes interesses. Apesar de ter sido consagrado na Lei n.º 53/98 um conjunto significativo de direitos destas associações profissionais, tais como os direitos a defender os interesses estatutários, sociais e deontológicos dos seus associados, o direito a tomar parte na definição do estatuto profissional e nas condições de exercício da actividade policial, incluindo as condições de trabalho e o sistema retributivo, e o direito de apresentar candidaturas para o Conselho da Polícia Marítima, só para mencionar alguns, por regulamentar ficou, nessa ocasião, o exercício do direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima, que foi remetido para diploma próprio. É dessa regulamentação que a proposta de lei em debate se ocupa, regulamentando, assim, as condições de funcionamento das associações profissionais e as regras processuais conducentes à determinação do nível de representatividade das associações, no que toca à eleição dos seus representantes no Conselho da Polícia Marítima. O CDS-PP está genericamente de acordo com a proposta de lei em debate, mas gostaria de assinalar alguns pormenores que poderão vir a constituir pontos de fricção entre dirigentes associativos e chefias militares. Apenas dois exemplos, porque o tempo é curto: o primeiro diz respeito ao exercício do direito de reunião. De acordo com o artigo 10.º, as associações podem promover reuniões no local de trabalho, contanto que, nos termos da alínea c) do n.º 1, o dia, a hora e o local da reunião sejam fixados com a antecedência de cinco dias relativamente à data pretendida, entre o comandante regional e a direcção da associação profissional ou um seu representante, tendo em conta as necessidades e conveniências do serviço e a disponibilidade das instalações. Não está expressamente consignado no preceito, mas presume-se que a fixação do dia, hora e local seja por acorda entre o comandante regional e a direcção da associação profissional. Ora, no entender do CDSPP, deveria ser acrescentado tal inciso à disposição em causa, o que permitiria dispensar a alusão às condicionantes necessidades e conveniências do serviço e disponibilidade das instalações, pois, se a fixação é por acordo, obviamente que todos estes factores foram ponderados. E elimina-se, assim, um ponto de fricção. O segundo exemplo diz respeito ao direito de afixação de documentos relativos às actividades estatutária das associações profissionais, quer sejam textos, convocatórias, comunicações ou quaisquer outros documentos, prevendo o artigo 12.º, n.º 3, que deve ser previamente entregue ao comandante local uma cópia do documento a afixar. Consideramos que esta disposição constitui uma autorização encapotada, uma espécie de censura prévia, não admissível em face da lei que se visa regulamentar. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A questão da inserção da Polícia Marítima no âmbito da autoridade marítima é uma questão que não está aqui hoje em debate, mas gostava de aproveitar a oportunidade para responder ao Sr. Deputado António Filipe, dizendo-lhe que, se temos um sistema de autoridade marítima, precisamos de ter um instrumento para o exercício dessa mesma autoridade ou, então, temos de mudar todo o sistema de autoridade marítima. Portanto, tendo nós a autoridade marítima da forma como está organizada, precisamos de ter um instrumento para o seu exercício e parece-nos que o melhor instrumento é a Polícia Marítima — aliás, como tem vindo a ser demonstrado ao longo dos anos. Neste caso concreto, com esta iniciativa, queremos regular direitos e não restringi-los. O que é restringido é o que já estava na lei de 1998, portanto, não vamos mais longe do que está na norma habilitante, ao abrigo da qual, agora, estamos a legislar. De facto, estamos a tentar colmatar uma lacuna grave que existia na Polícia Marítima, pelo facto de os seus representantes não poderem participar nas reuniões do Conselho da Polícia Marítima — que, aliás, nunca reuniu até agora — nem estarem representados junto dos comandos regionais. Gostava de terminar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dizendo que é este o espírito que anima o Ministério da Defesa Nacional quando faz esta proposta e o conceito de «coesão e disciplina» que está também mencionado neste diploma parece-nos um conceito essencial para o desempenho não só da Polícia Marítima mas também das Forças Armadas. Não creio que seja uma expressão vaga e indeterminada. Quem já tiver participado em operações sabe qual é o valor da «coesão e disciplina» a nível operacional.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A importância de se legislar sobre esta matéria é óbvia: para muitos efeitos, os perfis de ADN praticamente relegaram a tradicional impressão digital para a Idade da Pedra. E basta estar atento ao fascínio causado, em tantos, por séries televisivas como o CSI ou a todo o envolvimento mediático quanto às amostras recolhidas na investigação do desaparecimento de Madeleine McCann para perceber do que falo. Mas tenhamos todos consciência de que, para além das preocupações em matéria de investigação criminal — identificação de pessoas ou outras —, é de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos ou da sua limitação que se trata aqui ou que se trata quando se criam bases de dados de ADN. É, por isso, um justo equilíbrio que se deve encontrar entre a salvaguarda desses direitos fundamentais e o mais que se pretende acautelar, porque se, por um lado, temos a Constituição, consagrando direitos como o direito à integridade pessoal, à identidade pessoal, à reserva da intimidade, à dignidade humana e, inclusive, uma presunção de inocência até ao trânsito em julgado de decisões judiciais, em contraponto, há que garantir, igualmente, melhores condições de eficácia na investigação criminal, a busca da verdade nessa investigação, a maior certeza possível na valoração das provas e muito mais. E convém até ter presente que muita da legislação portuguesa vigente foi pensada e inspirada em tempos em que falar de ADN seria falar de uma realidade muito distante, quando não quase de ficção científica, tempos em que, por exemplo, fluidos corporais colhidos no local dos crimes eram desprezados pela impossibilidade científica de, à época, os valorar como provas credíveis. Só que, entretanto, as técnicas de recolha e identificação, com base em amostras cada vez mais pequenas e mesmo em fragmentos antes tidos como irrelevantes, evoluíram tremendamente e a… Sr. Presidente, inscrevi-me para uma intervenção e não para pedir esclarecimentos. Sr. Presidente, com franqueza, não vejo como transformar uma intervenção, evidente, pelo seu conteúdo, num pedido de esclarecimentos…, pelo que, se o Sr. Presidente assim preferir, posso ficar por aqui e, depois, retomar ou concluo agora… É como o Sr. Presidente entender melhor. Muito bem, Sr. Presidente. Então, fico por aqui ou concluo a intervenção? Não estava a fazer uma pergunta, Sr. Presidente. Muito bem, Sr. Presidente, então, será uma intervenção em duas prestações: fico-me, agora, pela primeira e, depois, continuarei.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, de forma breve, as questões que quero colocar-lhe são muito simples. Assim, gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse a bancada do Bloco de Esquerda e, também, toda a Assembleia sobre quais os artigos da proposta de lei que tratam do ficheiro provisório dos arguidos, qual a forma de tratamento desses ficheiros e quando é que são destruídos.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, a pretexto da segurança e da desburocratização, vai-se facilitando a centralização de informação pessoal até aos dados mais profundos de cada pessoa. Podemos lembrar-nos, por exemplo, de propostas que foram feitas, e da sua concretização, como a da videovigilância e a do cartão único do cidadão. Hoje, a pretexto do combate ao crime, da identificação de corpos, é dado mais um passo, com esta proposta de criação de uma base de dados de ADN para fins de identificação civil voluntária e de investigação criminal obrigatória. Tudo isto parecem fins muito válidos, muito razoáveis e, socialmente, muito justos, mas, Sr. Ministro, a formação de um caminho que permita o controlo do indivíduo em variadas e profundas dimensões pode ser uma tendência perigosa e ultrapassar a garantia de direitos relevantíssimos. Por isso, nesta matéria, a cautela é absolutamente determinante. Quero, então, fazer cinco perguntas muito concretas ao Sr. Ministro. Porquê, a dada altura, a limitação da comunicação de dados ao titular, àquele que tem as suas características de ADN na base de dados? Por que é que não lhe pode ser dada a informação total, em caso de prejuízo da segurança do Estado? Por que é que a lista de marcadores de ADN que irão ser utilizados é definida por mera portaria? Por que é que as polícias vão poder consultar as futuras bases de dados de perfis de ADN sem necessidade de autorização prévia de uma entidade judicial? Porquê os três anos de prisão? Qual foi o critério para os três anos de prisão, quando o Governo falava de crimes bastante graves para que as pessoas pudessem ser objecto de inclusão nessa base dados de ADN? Por último, Sr. Ministro, a título de curiosidade e de tantas argumentações que o Governo tem trazido à Assembleia da República, quanto custará ao Estado a constituição e a manutenção de uma base de dados de ADN? Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, em relação à questão dos ficheiros provisórios, a lei é clara, no sentido de que, dizendo eles respeito a arguidos, com o arquivamento dos processos ou com a sua condenação a pena inferior a três anos de prisão, os seus elementos serão destruídos; se se registar condenação a partir do limiar de três anos de prisão, que está previsto na lei, os dados serão incorporados no ficheiro respeitante às pessoas condenadas, de harmonia com as decisões proferidas, nos termos previstos na lei, por magistrados judiciais. É esta a solução que está, claramente, exposta em relação aos arguidos. Está, claramente, expresso na lei e, se houver alguma dúvida, V. Ex.ª poderá apresentar uma proposta de reformulação, para mais expressa e fácil leitura e compreensão por quem não tenha tido acesso à interpretação do regime anteriormente estabelecido. Em segundo lugar, as limitações que estão consagradas em relação à possibilidade de certos dados serem transmitidos a certas pessoas que deles sejam titulares são um elemento que está contemplado em toda a legislação sobre segurança interna, nos vários países da Europa, porque, evidentemente, o Estado de direito não pode fornecer, a todas as pessoas,… Não é a todas as pessoas, é aos titulares! … todos os elementos que elas, em cada momento, solicitem. Portanto, essa solução não tem qualquer originalidade portuguesa. A Sr.ª Deputada encontrá-la-á em vários Direitos, em vários regimes legais aplicáveis a bases de dados. Gostaria também de dizer que a previsão da portaria tem a ver com o facto de uma decisão do Conselho de Ministros da União Europeia ter criado uma comissão que se encontra a trabalhar nessa matéria e que apresentará uma proposta no sentido da uniformização de bases deste tipo à escala europeia. Será, portanto, no âmbito desses trabalhos — que foram iniciados, como disse, por uma decisão de 2003 — e dos resultados que serão propostos que haverá esta consagração por portaria. Finalmente, em relação às autoridades de polícia criminal, deve dizer-se que, em toda a Europa, é este o sistema que prevalece, para não falar daqueles sistemas que, realmente, são perigosos para os direitos individuais, onde as polícias têm acesso directo a esta base de dados. Estes sistemas, realmente, não são louváveis nem devem ser reproduzidos, mas a possibilidade de as autoridades de polícia judiciária terem acesso mediante um despacho fundamentado do Presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, que guarda a base de dados, parece ser a solução mais indicada. Nós precisamos de instrumentos para tornar a investigação mais eficiente e devemos seguir as boas práticas europeias nesta matéria.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta que o Governo nos traz aqui, hoje, é uma proposta que transcende, diria eu, a importância que têm, habitualmente, os debates parlamentares, numa época em que o Governo se caracteriza por um grande frenesim legislativo, trazendo aqui muita coisa diferente e nem toda da mesma importância desta. Devo dizer que a filosofia do diploma, no essencial, demonstra preocupações de equilíbrio, embora isto não signifique que o tenha atingido, mas, como filosofia inicial, demonstra preocupações de equilíbrio. Sucede, porém, que, ao fazê-lo, entre os valores que, no fundo, estão ligados à identificação civil mas, especialmente, à identificação ou à investigação criminal e os valores dos direitos dos cidadãos, por vezes, a lei parece-me ir longe demais ou parece-me, em particular, e ao PSD, estar redigida de uma forma que dá espaço para o exercício do abuso, no contexto deste instrumento de biotecnologia, que corre o risco de se transformar naquilo que pode ser um gravoso instrumento de «biopolítica». Portanto, esse é o ponto onde, digamos assim, temos de parar. E isto acontece logo quando o Governo começa por dizer, com uma certa ligeireza, no preâmbulo, dando o mote sobre a forma como encarou esta matéria, que se trata, no fundo, da «impressão digital genética» — aliás, corroborando algo que é comum em manuais que tratam de questões genéticas a respeito do ADN. Ora, o que sucede é que a impressão digital, sendo um instrumento de identificação até, em muitos aspectos, mais eficaz do que os marcadores de ADN — como acontece, por exemplo, no caso dos gémeos —, não tem, de modo nenhum, o gravame dos marcadores de ADN ou do perfil de ADN, porque este abre a porta para um conjunto de conhecimentos e de informação que é muito mais gravoso. Penso que é bastante significativo que o Governo abra o preâmbulo deste diploma com essa tentativa de identificação entre a velha impressão digital e os marcadores de ADN, pois implica que encara com a mesma ligeireza o ADN e a impressão digital. E isto é visível em vários aspectos do diploma. Diria, essencialmente, sobre este ponto que há aqui riscos sérios, há riscos em matéria de gémeos, há riscos em matéria de contaminação de ADN, seja na recolha de vestígios nas cenas dos crimes, seja pela degradação desses vestígios, seja pela recolha parcial, seja até pela mistura que pode haver de vestígios de ADN. Por outro lado, sabemos também — e este é um ponto que é muito importante, e é-o para as nossas polícias, que lutam com falta de meios e com uma grande pressão, cada vez maior, na sua investigação, que fique claro — que o ADN também é falível, não tem o dom da infalibilidade. E isto é muito importante porque, nomeadamente com a publicidade a que agora estará sujeito o processo penal, é muito relevante ter em atenção o aspecto da falibilidade dos próprios testes feitos no âmbito dos marcadores e dos perfis de ADN. Corremos o risco — isso, aliás, vinha até num dos pareceres, julgo que no do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, mas se não nesse no da Comissão Nacional de Protecção de Dados — da diabolização pública das pessoas, por exemplo, de uma certa raça porque de repente se descobre que é uma pessoa da raça x ou da raça y, mas não se sabe mais do que isso… Portanto, há aqui alguns perigos. Por outro lado, também há uma certa porta para a universalização, porque todas as experiências estrangeiras a que se refere o Sr. Ministro, todas elas!, demonstram que quando se começa por abrir a porta num determinado sector tem sempre havido uma maior expansão da utilização dos perfis de ADN neste campo. Também por aí, por causa deste risco de universalização, ficamos numa situação em que pode ocorrer — chamo a atenção para isto — uma inversão da presunção de inocência. De repente, são 10 milhões os portugueses que são suspeitos porque são todos susceptíveis de estar numa base de dados. Portanto, aquilo que eu queria deixar claro é que há aqui um certo paradoxo: ao mesmo tempo que estamos a usar uma descoberta científica que veio demonstrar a individualidade irredutível de cada pessoa, estamos a utilizá-la para anular a privacidade, a identidade e também, portanto, a individualidade dessa pessoa. Há aqui um risco paradoxal, pelo que eu gostaria de deixar três ou quatro preocupações para que o Sr. Ministro respondesse a cada uma delas. A primeira é uma questão que já foi levantada em comissão pela Deputada Helena Pinto, mas que acho que não fica resolvida com a resposta que foi dada, e que é a dos menores. É que as regras que tínhamos para os pais decidirem coisas sobre os menores dizem respeito a aspectos da vida que não têm que ver com este património exclusivamente pessoal! Por exemplo, pode um pai decidir que os filhos vão aderir voluntariamente ao ficheiro de identificação civil? Pode um filho, durante 18 anos (sim, porque admito que ele ao fim de 18 anos queira revogar), ter o seu ADN exposto? Até porque é natural que muitos pais o façam — alarmados, como estão, por exemplo, pelos problemas do rapto e do tráfico de crianças, que tenham a preocupação de inscrever os filhos nesse ficheiro! Mas isto é admissível? Ou é admissível nos termos tradicionais? Poderá dizer-se: «remetemos para as regras gerais do Direito Civil». Devo dizer que essas regras, mesmo hoje, à luz dos conhecimentos científicos existentes, são regras que me parecem já desadequadas. Mas neste particular estamos a falar de um bilhete de identidade pessoal de que até agora não havia qualquer paralelo, portanto, nessa medida, e com estas características, não sei se as regras do Direito Civil actual são suficientes para que os pais representem os filhos nesta matéria. Segunda preocupação: para mim, continua por clarificar a questão dos arguidos, e não só no aspecto do ficheiro provisório, onde acho que se pode ser mais claro, porque o Sr. Ministro no seu discurso foi claro, mas no texto da lei não há clareza… Portanto, vamos clarificar o texto da lei. Mas digo-lhe mais, Sr. Ministro: não está explicado se um arguido a quem seja imposto pelo juiz um exame deste tipo terá de ser sujeito, ou não, a coacção física no caso de recusa obstinada em prestá-lo. Esta é uma questão. Será que podemos obrigá-lo, isto é, extrair dele, arrancar-lhe, três cabelos para fazermos o teste ou será que ele se pode recusar incorrendo, porventura, num crime de desobediência ou numa certa valoração da prova? Esta questão não está esclarecida. Porventura, estará nos artigos do Código de Processo Penal, mas mesmo aqui julgo que esta questão é mais gravosa e há, aliás, até jurisprudência constitucional nesse sentido. Ainda outra questão: quanto aos condenados que já estão no ficheiro com pena de mais de três anos — e eu aceito este princípio —, o acesso a esse ficheiro tem de ser dado por um juiz ou de execução de penas ou de instrução criminal (por um magistrado judicial) e não pode ser dado em caso algum dado pelo Presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal!! É porque aqui o que se pretende é que uma polícia, que é um órgão executivo, tenha alguém que está na dependência do Ministro da Justiça, que é Presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, a autorizar que seja utilizado o ADN de um condenado! Ora, isto significa que é o executivo sozinho, todo ele, que vai dar acesso a este ficheiro! E nesse plano não vale a pena apelar para as experiências comparadas, porque nesta matéria temos tradições que são únicas e as nossas é que estão bem e as comparadas é que estão mal! Acho que aqui temos de ter algum cuidado. Também chamaria a atenção para o artigo 19.º em que se diz que a divulgação dos resultados é feita ao juiz de instrução, aos órgãos de polícia criminal e ao magistrado. Acho que ela devia ser feita só ao juiz de instrução e este, depois, é que faria o ofício às restantes entidades, porque aqui a divulgação da informação é um factor fundamental! Não é por acaso que a Constituição fala numa autodeterminação informacional a respeito da informática, sim, mas também a respeito da Genética. É porque aqui a autorização não é apenas fazer o exame, a autorização tem de ser para a divulgação, porque na própria prestação da informação está um valor fundamental. Finalmente, Sr. Ministro, também acho que seria de bom tom, embora não seja para mim a questão essencial aqui, dar-nos uma ideia de qual é o orçamento que está previsto para esta matéria, porque nos pareceres dos Conselhos que se vieram pronunciar se considerou que o custo poderia ser excessivo e o Sr. Ministro disse, aqui, que se poderiam alargar de forma enorme os custos e que essa seria uma das razões para só se pôr os condenados com penas a partir de três. No entanto, nos arquivos de identificação civil o universo é de 10 milhões de potenciais utilizadores. Terminaria, Sr. Presidente, com uma frase retirada do Measure for Measure, de William Shakespeare, segundo acto, segunda cena, uma frase de Isabella, que bem retrata os cuidados que aqui temos de ter: «Oh, é excelente ter a força de um gigante, mas é tirânico, é bárbaro usá-la como um gigante». Creio que é este o cuidado que temos de ter aqui.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O bem-estar das pessoas e o respeito pelos seus direitos, assim como a segurança e o progresso da sociedade, são sempre objectivos centrais da formulação da decisão política, da investigação científica e técnica e do progresso que delas decorre. Esta iniciativa do Governo procura a compatibilização destes objectivos centrais em nome de um benefício que é colectivo. Ela procura ainda, de uma forma patente, compatibilizar os correspondentes riscos que essa utilização acarreta para o indivíduo, na medida em que pode representar, de facto, uma potencial fonte de ofensa aos direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente aos direitos à privacidade, à liberdade e à autodeterminação informativa. Deveria dizer, desde logo, que a primeira tradução ética desta preocupação se verifica exactamente neste esforço de legislar nesta matéria em que se pretende aproveitar os avanços da genética forense em benefício da segurança de todos, garantindo as liberdades e os direitos. Trata-se, portanto, de compatibilizar direitos fundamentais com questões de segurança, de confiança e de paz, que reflectem uma densidade de tal forma grande que se traduzem num debate permanente e diverso. Citarei só dois exemplos muito claros da complexidade do debate em apreço, referindo-me aos casos dos Estados Unidos da América e da Alemanha. Os Estados Unidos da América, que têm múltiplas bases de dados, e questionáveis, onde cada indivíduo que entra no seu território tem de deixar registada de forma digitalizada a sua impressão digital, não consentem um bilhete de identidade, que é um dado completamente assente e de forma incondicionada entre nós. Gostava também de referir o caso da Alemanha, que detém bases de dados desde há alguns anos a esta parte, e que iniciou, neste momento, uma discussão densíssima acerca do recurso à utilização da impressão digital, matéria que não questionamos de forma alguma e que é, de modo substantivo, referida no parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida como uma prova à qual se deve recorrer de forma sistemática. Eu diria, então, que esta iniciativa legislativa procura estabelecer um equilíbrio aceitável entre a necessidade de tratamento de dados genéticos — reflexo da utilidade de perícias criminalísticas genéticas — e a protecção do indivíduo. Essas perícias são úteis porque, contendo os perfis genéticos e constituindo bases de dados (os tais «biobancos»), contêm amostras biológicas que são inegáveis e contribuem, por isso, para uma melhor e mais eficaz justiça penal, assim como, em caso de catástrofe, como é referido na lei, para um tratamento mais digno das vítimas. Esta mesma proposta é explícita quanto ao tipo de informação genética a tratar, garantindo sempre o direito à dignidade e à privacidade do titular dos dados e definindo claramente o conteúdo e a finalidade das bases de dados. Acrescentaria que só é possível proteger aquilo que se conhece, aquilo que é conhecido. E esta iniciativa assenta exactamente num pressuposto de protecção: protege porque identifica e porque torna simultaneamente transparente o objectivo, a forma, o procedimento e o fim. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos como são considerados sensíveis os dados genéticos exactamente por tratarem de matéria que se refere a características singulares, a dados pessoais e que, por isso, a eles deve corresponder um nível máximo de protecção, restringindo-se ao excepcional as circunstâncias em que é permitido o tratamento daqueles dados, limitando-se as respectivas condições de acesso e de tratamento. Nesse sentido, nesta mesma proposta de lei só é permitido o tratamento do ADN não codificante, que, permitindo a identificação de forma indirecta de uma pessoa em particular, oferece um menor risco de violação do direito à privacidade da pessoa a que se refere. Também gostaria de dizer que a proposta de lei que agora estamos a discutir, não obstante a sempre constante necessidade de melhoramentos em sede de especialidade (tal como acontece com todas as iniciativas legislativas), é uma lei enformada pelo princípio da proporcionalidade, que pondera e reflecte um compromisso que assegura um nível de segurança adequado em relação aos riscos que o tratamento de dados assume. Espelho deste cuidado é o facto de ter sido precedida por um longo e alargado debate especializado sobre a matéria, cuidado esse também reflectido na incorporação de grande parte dos pareceres da Comissão Nacional de Protecção de Dados e do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Mas a proposta de lei é também exigente na qualidade: o tratamento de dados genéticos tem de processarse de forma transparente, com respeito pelos direitos, liberdades e garantias do seu titular (está expresso); os dados têm de ser obtidos de forma leal, com respeito pela autodeterminação informativa da pessoa; e os dados genéticos objecto de tratamento automatizado têm de ser adequados, pertinentes e todo o sistema terá de respeitar o princípio da proporcionalidade. Nesta matéria, a Assembleia da República tem um papel fundamental, quer enquanto órgão de soberania dotado de poderes de fiscalização nos termos constitucionais quer enquanto órgão que designa o previsto Conselho de Fiscalização, a quem incumbe o controlo da base de dados, zelando pelo cumprimento dos princípios atrás enunciados. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dúvidas quanto ao mérito têm-se sempre; incertezas quanto aos benefícios são sempre razoáveis. Na verdade, a maior vulnerabilidade dos cidadãos face ao medo e ao terror das actividades criminosas transnacionais, a necessidade de os poderes públicos apresentarem resultados no combate à criminalidade não pode significar uma automática e progressiva diminuição dos direitos fundamentais. Mas, por outro lado, sabemos que os dados pessoais genéticos são provas muito importantes na perseguição criminal numa sociedade em que se assiste a uma progressiva complexidade dos métodos do crime e em que a identificação de criminosos, a exclusão dos inocentes, bem como a interligação entre diversas condutas criminosas, são dissuasoras da prática de novas infracções. A presente iniciativa legislativa, tal como já referi anteriormente, traduz já, do ponto de vista ético, a preocupação de proteger, porque incorpora as garantias dos direitos e liberdades em articulação com os progressos científicos, por isso ela reflecte um compromisso que não se basta com soluções fáceis e lineares, reflecte a perspectiva democrática do debate e do compromisso, que permite aproveitar em benefício da sociedade aquilo que a técnica e a ciência vêm trazendo, com a garantia do cumprimento dos direitos fundamentais, para que se possa, apesar de tudo, no dizer de Karl Popper, «prosseguir no desconhecido, no incerto, no inseguro»
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há pouco eu falava da evidente utilidade da questão que hoje debatemos em diversas áreas — investigação criminal, identificação de delinquentes e de suspeitos, identificação de cadáveres, de corpos decompostos ou mutilados, investigação da paternidade, etc. Enfim, a questão que aqui tratamos é relevante para uma panóplia de matérias, mas tenhamos consciência de que este é, também, um terreno que envolve grandes riscos, pelo que só através de grandes restrições legais que delimitem a utilização das bases de dados de ADN é possível deter esse risco evidente e impedir que se ultrapassem barreiras éticas e jurídicas óbvias. Deste ponto de vista, ao contrário do que dizia a Sr.ª Deputada do PS, a lei não é exigente e, seguramente, a proposta de lei que apreciamos não presta todas as garantias. Desde logo, porque nela referem-se «amostras-referência» de voluntários, de condenados e de familiares, «amostras-problema» e amostras para controlo e segurança de técnicos, em que nuns casos é determinante o consentimento, noutros casos não é determinante (nem sequer é pedido) o consentimento — refiro-me às hipóteses de condenação por crime a que corresponda pena de prisão igual ou superior a 3 anos. Prevêem-se sanções para a violação do dever de segredo e de normas relativas a dados pessoais, mas não se prevêem outras. Vamos, então, ao que falta, Sr. Ministro. Desde logo, as sanções previstas podem ser muito reduzidas e, nesse caso, elas não são dissuasoras quando a lei for violada. Por outro lado, se é certo que a proposta prevê um regime sancionatório para a violação do dever de segredo e de normas relativas a dados pessoais, a verdade é que ela nada diz em relação à mais grave das violações possíveis: a utilização das amostras existentes no «biobanco» para fins diferentes dos que estão previstos no artigo 32.º O artigo 32.º refere apenas «a realização de análises e contraanálises necessárias às finalidades de identificação civil e de investigação criminal». E se assim não for? E se essa amostra que está no «biobanco» for utilizada para um fim científico, ou outros que aqui não estamos sequer a acautelar? Não está prevista qualquer sanção, Sr. Ministro, e será, porventura, a mais grave das violações! Acresce que a lei pode vir a ser alterada e, recolhidas as amostras, o cidadão fica, necessariamente, à mercê do Estado para o futuro. Fica à mercê do Estado e, inclusivamente, da evolução do pensamento legislativo e do futuro que o Estado queira dar às amostras que guarda. A lei muda com o tempo necessariamente, mas o mesmo não se diga das amostras recolhidas, que, alterada a lei, podem vir a ser usadas futuramente para um fim que agora a lei quer acautelar, ou para outros fins que a lei nem sequer pondera. Por último, como se lê no artigo 21.º, esta proposta de lei «não prejudica as obrigações assumidas pelo Estado português em matéria de cooperação internacional (…)». Ora, o regime jurídico de bases de dados de ADN não está padronizado ao nível da União Europeia (muito menos ao nível dos países fora da União Europeia), por isso não há como garantir o destino final dado pelas amostras que o Estado português fornece a um outro Estado. E, Sr. Ministro, esta nem sequer é uma preocupação académica! Mesmo em países de insuspeitas preocupações em matérias de direitos, liberdades e garantias, como é o caso, por exemplo, da Inglaterra — e falo de Inglaterra por saber que é um dos exemplos citados na exposição de motivos da proposta de lei —, têm ocorrido imensos protestos de cidadãos, da comunidade científica e, inclusive, de políticos, alguns deles ligados ao actual poder executivo, pela forma como as bases de dados estão a ser utilizadas, neste caso, muito para além do propósito inicial. Dou-lhe alguns exemplos, Sr. Ministro. Há protestos por existirem hoje amostras de ADN de menores isentos de responsabilidade criminal que estão armazenadas em bases de dados (não era um pressuposto na altura em que a lei foi discutida); protestos porque — e cito palavras de um político com funções parlamentares — «colher dados de pessoas que nem sequer foram acusadas de um crime, como aí sucede, implica que o princípio fundamental pelo qual se é inocente até que se prove o contrário está cada vez mais posto em causa». Sr. Ministro, é evidente que se for prestada informação acerca de um cidadão português, posteriormente inocentado pelos tribunais ingleses, nada garante que essa amostra seja destruída, como seria em Portugal com o cancelamento do seu registo criminal, precisamente porque em Inglaterra o arquivo perdura para além da decisão judicial. E, sobre isto, a nossa lei também não acautela coisa alguma! Protestos, ainda, pelo facto de esta base de dados em Inglaterra (que tem cerca de 4 milhões de informações de ADN) conter, como reconheceu o próprio ministério do interior, cerca de 550 000 dados falsos ou incorrectos. Nesta matéria, a ciência também falha. Sr. Ministro, estes são apenas alguns aspectos daquilo que a lei não acautela, nem pode acautelar — desde logo, no que transcende a nossa própria soberania. Por não poder dar respostas, e porque a lei não dá garantias, o Sr. Ministro também compreenderá, certamente, a ponderação que fazemos quando apresentarmos o nosso sentido de voto.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será o ADN a impressão digital do futuro? Residirá aqui a solução para a eficácia no combate à criminalidade? Somos absolutamente a favor da exploração das janelas de oportunidade que significam os avanços da ciência, incluindo a Genética, mas esta bancada parlamentar não alimentará as ilusões que tendem a «endeusar» as possibilidades do ADN como a solução mágica para a eficácia da investigação criminal — a vida é um pouco mais, um pouquinho mais!, complicada do que uma série televisiva… A proposta de lei que o Governo apresenta inspira-nos as maiores reservas e mesmo perplexidades, pois trata uma matéria da maior sensibilidade sem acautelar questões fundamentais e com diversas incoerências. A proposta de lei possibilita a recolha de amostras a arguidos quer por sua vontade quer por despacho de um juiz, mas não acautela qualquer dessas situações. E o Sr. Ministro trouxe-nos aqui, hoje, a novidade do tal «ficheiro provisório», que é um ficheiro que fica num limbo e que não está expresso nem garantido na lei. É preciso saber quanto tempo os arguidos lá vão estar, quando se destroem essas amostras, sobretudo no caso de as pessoas serem inocentadas, porque a lei é confusa e baralha, em diversos artigos, os arguidos com os voluntários, situação que não pode ocorrer. Outra questão fundamental prende-se com a interconexão dos dados de todos os ficheiros. Ou seja, quem forneceu o seu ADN voluntariamente (ainda não se percebeu bem o que é isto do «voluntariamente») para um ficheiro, cuja finalidade é exclusiva para fins civis, torna-se automaticamente «suspeito» quando for realizada uma comparação com amostras recolhidas no local de um presumível crime, quer a nível nacional quer internacional. A Sr.ª Helena Pinto (BE): — A lei prevê a necessidade do consentimento informado para essa interconexão, dirão os senhores! Contudo, o que questionamos é que seja, por princípio, permitida essa possibilidade, que pode colocar em causa os direitos fundamentais dos cidadãos. Não existe, de facto, uma separação objectiva entre o registo para efeitos civis e o registo para efeitos de investigação criminal. O parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados é cristalino sobre esta matéria! Como compreender que não seja necessária a intervenção de um juiz para ter acesso à informação constante da base de dados, contrariamente ao que acontece, por paralelo, com as escutas telefónicas?! A proposta de lei diz que os marcadores de ADN a utilizar serão apenas não codificantes, ou seja, que não possibilitam mais informação do que a necessária à identificação das pessoas, mas não divulga a lista desses marcadores, que têm de ser do conhecimento público, e nem sequer acautela da necessária prudência em relação aos avanços da ciência. Os marcadores, que hoje são considerados não codificantes, amanhã podem passar a ser. Esta é uma preocupação expressa no relatório do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Este Conselho, aliás, também alerta para a necessidade de acautelar e salvaguardar os direitos de menores, como o Sr. Deputado Paulo Rangel já aqui referiu. Ao Sr. Ministro, que respondeu a esta questão na 1.ª Comissão, eu gostaria de dizer que não se trata aqui de quem tutela através da lei geral esses menores. Será correcto, numa matéria como esta, permitir a permanência de menores nos diversos ficheiros porque quem os tutela (e não são só os pais) num dado momento decide? Não deveria aqui o Estado, enquanto protector, garantir que só em situações muito bem explicadas e justificadas tal seria permitido? Por manifesta falta de tempo, é impossível enunciar muitos outros aspectos desta proposta de lei que ficam por esclarecer. Gostaria ainda de referir dois exemplos europeus, onde a evolução deste tipo de legislação tem vindo a colocar em causa direitos e garantias dos cidadãos e cidadãs. Em Inglaterra, qualquer polícia pode recolher amostras de ADN, sem consentimento do próprio e sem autorização de um juiz. Qualquer polícia de giro! Em França, a base de dados foi criada para a identificação de crimes sexuais e hoje até os crimes de furtos e roubos simples lá estão incluídos. Termino já, Sr. Presidente. Em suma: não está em causa a necessidade de os órgãos de polícia criminal se modernizarem e terem acesso às técnicas de investigação, de modo a combaterem a criminalidade, não está em causa a necessidade de meios, esses, sim, bem urgentes e permanentemente atrasados ou mesmo adiados pelo Governo e pelo Ministério da Justiça; está em causa, sim, a garantia absoluta de que os fins que se pretendem alcançar sê-lo-ão sem colocar em causa ou restringir os direitos constitucionalmente garantidos. O ADN pode ser a impressão digital do próximo futuro — é, praticamente, um dado adquirido —, mas o seu efeito mais perverso seria permitir que a própria impressão digital abrisse a porta para a anulação da identidade e da liberdade de cada um e de cada uma.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Justiça começou a sua intervenção referindo o Direito Comparado, dizendo que vários países europeus legislaram sobre a criação de bases de dados de ADN. Ora, eu quero dizer ao Sr. Ministro que é um dado que importa registar, mas não, necessariamente, seguir. Não é pelo facto de outros países terem legislado de uma determinada forma que nós devemos fazer o mesmo e, sobretudo, isso não atesta a bondade dessas medidas legislativas. O Sr. António Filipe (PCP): — É sabido, inclusivamente, que essa legislação não é pacífica, designadamente em França, país em que mais se tem legislado sobre esta matéria, mas onde a contestação a essa legislação é também maior. Importa, a este respeito, ter na devida atenção o excelente parecer com que a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) nos habilitou a todos — Governo e Assembleia da República. E eu vou permitir-me até citar mesmo alguns pontos do parecer da CNPD, designadamente quando se diz: «(…) os riscos para a privacidade…» — da criação deste tipo de base de dados — «… são, porventura, os mais profundos que podem ser concebidos.(…). Os desafios colocados pela inovação tecnológica e pela aplicação dessa inovação à informação e identidades genéticas revestem, ainda, alguns contornos de aventura da humanidade, com um horizonte de riscos ainda não previsíveis nem, portanto, controláveis». E continua a Comissão: «Na verdade, a massificação do tratamento de dados pessoais em todos os sectores da vida social em que os cidadãos se vêem, inelutavelmente, envolvidos, com a consequente concentração da informação que lhes diz respeito, cria uma zona em que existe um efectivo conhecimento da informação total e de todos os dados pessoais dos indivíduos. Os receios situam-se não apenas nos acessos indevidos ou nos conhecimentos indevidos, ‘mas nas potencialidades de comunicação inter-institucional ou inter-sectorial, a nível nacional ou mesmo internacional, que as técnicas informáticas propiciam’». Ora, é preciso dizer, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que, no que se refere à cooperação internacional, o artigo 21.º da proposta de lei suscita as maiores apreensões, na medida em que prevê que «O disposto na presente lei…» — ou seja, as garantias previstas na presente lei — «… não prejudica as obrigações assumidas pelo Estado português em matéria de cooperação internacional (…)». Ou seja, é possível transmitir dados inseridos na base de dados de ADN portuguesa a autoridades de outros países que não têm, nem de perto nem de longe, as garantias previstas pela proposta de lei para a lei portuguesa. De boas intenções está esta proposta de lei rodeada. Diz, aliás, a CNPD que «(…) o conjunto de tratamentos de dados pessoais que simultaneamente acontecem, conduzindo a uma concentração total da informação do cidadão, acontece pelas melhores, mais positivas e virtuosas razões, desde a prevenção da segurança, a eficiência dos recursos, a efectividade das medidas e a eficácia dos resultados, mas não deixa de produzir um efectivo controlo dos cidadãos por parte dos poderes democraticamente legitimados ou meramente fácticos». Portanto, é caso para dizer que «de boas intenções está o Inferno cheio». Importa ter em conta o princípio da precaução. Deve atentar-se que existem riscos ainda não previsíveis na sua definição nem controláveis que advêm da adopção de tecnologias e conhecimentos científicos de aquisição recente e que a rapidez da evolução tecnológica e científica depressa retirará a «cegueira» ao ADN não codificante, de forma a que este revele outro tipo de informação sobre o seu titular. Importava ter em conta estes reparos que são feitos pela CNPD e o Governo, na proposta de lei, manifestamente, não os teve em conta. Importa ainda referir algo muito importante. É que a investigação científica no domínio da informação genética não está a cargo nem de entidades públicas nem de universidades, está a cargo de empresas privadas, geralmente laboratórios multinacionais. E estas entidades, como a CNPD bem salienta, não prosseguirão apenas o seu trabalho de investigação para obter informação relevante a partir do ADN não codificante, mas tentarão utilizar para efeitos de identificação de qualquer parte do ADN. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para efeitos de investigação criminal, não temos dúvidas de que, em alguns casos, o recurso ao ADN se mostra proporcionado à finalidade da investigação criminal, mas essa proporcionalidade não pode ser vista em abstracto, tem de ser aferida em concreto, caso a caso, perante cada indivíduo, nas circunstâncias concretas. Compartilhamos a visão da CNPD, segundo a qual o tratamento do dado pessoal genético para efeitos de investigação criminal deve ter lugar apenas nos casos em que esse meio de prova se mostra relevante e adequado a demonstrar a autoria dos crimes que se visam investigar. O tratamento do dado pessoal ADN só deve ter lugar se for estritamente necessário, absolutamente indispensável, para a investigação e instrução criminal em causa. Ora, não é esse o caminho que a proposta de lei segue. O caminho da proposta de lei, como se vê pelo artigo 3.º, é construir uma base de dados de forma faseada e gradualmente. Sabemos qual é a primeira fase, que é a dos condenados a penas de prisão superiores a 3 anos, a dos arguidos em processos criminais e a de alguns voluntários que se ofereçam para constar da base de dados para efeitos de identificação civil. Esta é a primeira fase, mas o Governo não nos diz quais são as próximas e nós sabemos qual tem sido a evolução em França, pois aí começou para os autores de crimes sexuais e agora já vai nos autores de qualquer tipo de crime, seja ele qual for, seja a bagatela penal menos relevante. A questão com a qual termino, Sr. Presidente, tem a ver com o acesso em concreto. Compartilhamos a visão já aqui expressa por vários Srs. Deputados de que não é possível que o acesso concreto à base de dados de ADN possa ser decidido por uma autoridade não judicial, como é previsto na proposta de lei, em que é um director-geral que decide sobre o acesso em concreto ao ADN de cada cidadão que conste da base de dados. Isto para nós não aceitável e pensamos que, no mínimo, e, obviamente, sem prejuízo de outras críticas que fizemos a este diploma, o acesso em concreto à base de dados deveria ser decidido por uma autoridade judicial. Nós não nos satisfazemos com o conselho de fiscalização que o Governo aqui propõe, até porque noutras matérias conhecemos bem a experiência negativa desses ditos conselhos de fiscalização.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: É apenas para referir ao Sr. Ministro que, ainda há pouco, coloquei um conjunto de questões, contudo não perguntei se eram soluções inovadoras aquelas para que aponta a proposta de lei mas, sim, porque é que eram aquelas as soluções adoptadas. Relativamente à limitação da comunicação de dados ao titular ou à portaria, o Sr. Ministro acabou por referir exclusivamente que eram soluções inovadoras ou, enfim, encontradas ao nível da União Europeia, o que, evidentemente, não é suficiente para percebermos a razão de ser destas propostas. Para além disso, e relativamente à desnecessidade de autorização de uma entidade judicial para consulta da base de dados por entidades policiais, o Sr. Ministro acabou por referir também que a celeridade deste ponto deve sobrepor-se à garantia de direitos. Ora, nós, Os Verdes, não podemos aceitar esta concepção. Entendemos, Sr. Ministro, que há necessidade de uma argumentação mais convincente, tendo em conta a nossa concepção da garantia de direitos, para que uma proposta desta natureza possa convencer-nos relativamente a esta matéria. Talvez convenha repetir as duas perguntas que ficaram sem resposta, se, entretanto, o Sr. Ministro quiser ouvir, para, depois, poder responder-nos, coisa que ainda há pouco não fez. Porquê uma base de dados de ADN para condenados a 3 ou mais anos de prisão? Porquê este limite? Qual é a argumentação para encontrar este limite? E uma questão lateral, de que importa ter conhecimento, devido aos argumentos que o Governo utiliza debate após debate: quanto custa ao Estado a constituição e a manutenção de uma base de dados de ADN? O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, convido o Sr. Deputado José Lello, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração a dirigir-nos algumas palavras sobre o Relatório da Conta de Gerência da Assembleia da República respeitante a 2006, que votaremos de seguida.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, queria começar por lhe dizer que, na nossa opinião, esta é uma proposta de lei mal elaborada, confusa na linguagem jurídica, que poderá violar direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e que, a ser aprovada nos exactos termos em que está redigida, deverá ser inconstitucional. Deixo-lhe, aqui, dois exemplos e duas questões. Sr. Ministro, a Polícia Judiciária actua, por definição de função, muitas vezes colidindo com direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e, no nosso Estado de direito democrático, a sua instrumentalização, governamentalização ou partidarização seria, por isso, imoral, uma perversão do regime democrático. Por isso mesmo, na Lei Orgânica da Polícia Judiciária ainda em vigor, tudo quanto tinha que ver com a forma como a Polícia Judiciária poderia interferir com os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos era aqui discutido, decidido e votado e, depois, apreciado pelo Sr. Presidente da República. Aqui se discutiu e decidiu, a propósito dessa lei, quem investiga o quê, quem aplica coimas, quem intercepta comunicações, quem detém ou captura cidadãos, ou seja, tudo aquilo que, no âmbito da actuação da Polícia Judiciária, colide, naturalmente, com direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. No entanto, percebe-se agora, desta nova lei orgânica, que grande parte disto será decidido, depois, por portaria do Governo. Sr. Ministro, significa isto que é o Governo que vai agora decidir quem vai fazer o quê e a quem na Polícia Judiciária. Já não o Parlamento, muito menos possibilitando a avaliação pelo Sr. Presidente da República, mas o Governo! Pergunto, Sr. Ministro, se não percebe que isto é profundamente inconstitucional; se o Governo não percebe que se trata de matéria de reserva da competência legislativa da Assembleia da República, como, por exemplo, legislar sobre as forças de segurança — e recordo, a propósito, que há pouco tempo o Sr. Ministro defendia que ainda terá muito de falar no plano de coordenação das forças de segurança; se o Governo não percebe que não pode decidir, por si só, sobre competências que colidem com direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; se o Governo não entende que a Polícia Judiciária não é uma polícia sua, não é uma polícia do Governo, mas uma polícia nacional, ao serviço dos cidadãos e para sua defesa; se o Governo não percebe que não é um ministro socialista que, num Estado de direito democrático como é o nosso, pode decidir sobre quem vai interceptar comunicações, quem vai ver pessoas, quem vai realizar buscas, quem vai aplicar coimas, quem vai investigar o quê. Não pode, Sr. Ministro! Simplesmente, não pode! E choca perceber, pois não faz sentido, como é possível, no artigo 22.º, n.º 2, cometer para portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça as competências das unidades da Polícia Judiciária. Não pode, Sr. Ministro da Justiça! Como também não pode ser o Governo, por portaria, a decidir sobre as competências das unidades territoriais nacionais! Não pode! Isso tem de ser discutido, decidido e votado aqui e, depois, apreciado pelo Sr. Presidente da República! Não pode ser o Governo a decidi-lo por portaria, sabendo antecipadamente que, por portaria, a apreciação parlamentar não será possível e que, por portaria, posteriormente o Sr. Presidente da República também não pode fazer a avaliação, que faz, obviamente, de uma lei saída da Assembleia da República. Por isso, pergunto-lhe, Sr. Ministro, se o Governo não tem a exacta noção do que está em causa, quando prevê esta possibilidade de, por portaria, decidir sobre questões que colidem com direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos. Uma coisa lhe garanto, Sr. Ministro da Justiça: não me parece, a menos que os Deputados socialistas também se demitam muito da sua função, que a Assembleia da República esteja disposta a prescindir de uma sua competência constitucional fundamental.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, como todos sabemos, a Polícia Judiciária assume um papel fundamental e de destaque no sistema de investigação, prevenção e combate à criminalidade no nosso país. Daí que qualquer alteração legislativa na orgânica dessa força mereça a maior atenção, cuidado e ponderação. A proposta de lei que o Governo nos traz, infelizmente, suscita algumas reservas e dúvidas graves, porquanto vem criar aquilo que o Sr. Ministro classificou, salvo erro, de flexibilidade e de adaptabilidade e que, na realidade, é uma «deslegalização», ou seja, a criação de vazios legais na Lei Orgânica da Polícia Judiciária. E fá-lo, como já aqui foi dito, remetendo um conjunto de situações para um acto posterior, designadamente por via de portaria. Gostaríamos de saber, Sr. Ministro, muito claramente, o que justifica esta situação: por que é que partimos de uma situação em que tínhamos uma Lei Orgânica da Polícia Judiciária, onde estava decidido um conjunto de situações — e não falamos apenas de alguma abertura ou fecho de departamentos nem da delimitação territorial mas da própria atribuição de competências de investigação — para outra em que isso passa a ser definido por portaria, deixando de o estar no diploma base orgânico, que é a Lei Orgânica da Polícia Judiciária? Mas não é só isso, Sr. Ministro da Justiça. Estamos hoje, aqui, a discutir a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, mas há um outro conjunto de situações que vão estar ausentes deste debate, porque foi remetido para posterior discussão a propósito da Lei da Organização da Investigação Criminal. Aliás, o próprio diploma, nos seus artigos 2.º, n.º 2, e 5.º, n.º 1, remete para essa Lei de Organização de Investigação Criminal, que ainda não sabemos o que nos vai trazer. Por outro lado, Sr. Ministro, a realidade é que, desde há ano e meio, desde o início de 2006, os trabalhadores da Polícia Judiciária vivem na insegurança de não saber o que vai acontecer, designadamente aos departamentos centrais que diziam respeito à corrupção e criminalidade económica ou ao combate ao tráfico de estupefacientes. Sabemos que esta proposta opera uma alteração, que nos parece que não é apenas semântica: onde se lia «direcções centrais», passa a ler-se «unidades nacionais»; onde se lia «directorias», passa a ler-se «unidades territoriais»; onde se lia «departamentos de investigação criminal», passa a ler-se «unidades regionais», «unidades locais»; onde se lia «departamentos sectoriais», passa a ler-se «unidades de apoio à investigação», etc. O que falta perceber, pois não está claro neste diploma, é em que termos é que esta mudança semântica vai corresponder à mudança da orgânica e à mudança das prioridades dentro da Polícia Judiciária, porque há quem receie que esta passagem de competências de uma Direcção Central de Investigação ao Tráfico de Estupefacientes para uma unidade corresponda também a uma mudança de paradigma na investigação, ou seja, não só corresponda à passagem de competências da PJ para a PSP e GNR, no âmbito da investigação do tráfico de estupefacientes, mas, mais grave do que isso, signifique, aparentemente, um desvio da prioridade do grande tráfico, do grande crime com ligações ao branqueamento de capitais, à alta corrupção e às redes mundiais de droga, para o combate mais reforçado no médio e no pequeno tráficos. Gostava que o Sr. Ministro nos esclarecesse, antes de começarmos propriamente o debate. Na verdade, o Sr. Deputado está a confundir a repartição interna de determinadas tarefas e responsabilidades com o processo de afectação de competências à Polícia Judiciária. Como sabe, actualmente, essa actuação é definida por uma lei, que é a Lei da Organização da Investigação Criminal, e é essa lei, e não qualquer portaria, que continuará a estabelecer essa atribuição de competências. Aliás, é inimaginável que qualquer jurista conceba que são portarias que atribuem competências desta natureza a polícias, porque, com isso, corre o risco de reprovar no 1.º ano do curso de Direito. Portanto, está equivocado nesta matéria. Consulte a Lei da Organização da Investigação Criminal, consulte os artigos 2.º e 5.º desta proposta e verá que é a lei e esta Assembleia que continuarão a delimitar essas competências. Do que aqui se trata é de uma repartição interna, sendo que a organização já está capacitada, nos termos da lei, para essa redistribuição poder ser feita de seguida. O problema com que lutam hoje os estatutos das organizações policiais à escala europeia é o de uma excessiva rigidez para a adaptação a novos fenómenos criminais. É o que se passa, nomeadamente, no campo da Europol, como referi há pouco, e quem conhece esse dossier não pode deixar de ser sensível aos custos da rigidez. Nós quisemos, justamente, propiciar uma maior eficiência e, por isso, esta solução parece a mais indicada — não viola, aliás, nenhuma baliza, nenhum parâmetro e nenhum direito de natureza constitucional. No que se refere às competências processuais, elas estão expressamente previstas neste diploma. Portanto, quer num caso quer noutro, V. Ex.ª tem a lei a lidar directamente com estas matérias. Sr. Deputado Madeira Lopes, as prioridades de política criminal não vão mudar — aliás, estão definidas por lei da Assembleia da República. Também não está prevista a apresentação de qualquer iniciativa que modifique a repartição de papéis neste domínio entre as diversas forças de segurança.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei em discussão tem por desiderato, diz o Governo, actualizar e adequar a estrutura orgânica da Polícia Judiciária às novas características da criminalidade, apostando na sua especificidade funcional. Mas fá-lo, deve dizer-se desde já, sob o signo da incerteza e da indefinição. E explicarei porquê. Para aumentar a operacionalidade e a especialização da Polícia Judiciária, o Governo preconiza um modelo em que extingue as actuais direcções centrais, substituindo-as pelas unidades nacionais de combate ao terrorismo, à corrupção e ao tráfico de estupefacientes. Estas, em relação àquelas, perdem, para além da designação, competências no combate à criminalidade mais genérica — agora cometidas às chamadas «unidades territoriais». O objectivo será, refere o Governo, promover uma reorganização estrutural dos serviços, tendo em conta a necessidade de racionalização dos recursos, no sentido da obtenção de maior eficiência e eficácia nas actividades desenvolvidas. Além das três unidades nacionais já referidas, são criadas as unidades territoriais, as unidades regionais, as unidades locais, as unidades de apoio à investigação e as unidades de suporte. Ora, cumpre, a este respeito, anotar que esta proposta de lei orgânica, ao remeter a forma como isso se implementa para portarias posteriores, nem cuida de garantir a articulação e a coordenação dessas novas unidades nem demonstra que essa eficácia não vai claudicar face aos critérios economicistas em que, inegavelmente, também assenta. Ou seja, da análise do articulado da proposta de lei em apreço não é possível confirmar integralmente a leitura do Governo, porque as competências das unidades da Polícia Judiciária, a sede e a área geográfica da respectiva intervenção e a correspondente organização em áreas, sectores ou núcleos não estão definidas neste texto, mas são antes remetidas para posterior regulamentação. Além destas, há um conjunto vasto de matérias sobre as quais a proposta de lei não se pronuncia, remetendo o respectivo regime para outras leis ou para posterior regulamentação. Desde logo, as competências da Polícia Judiciária em matéria de investigação criminal são remetidas para a Lei de Organização da Investigação Criminal. Com efeito, segundo o disposto no artigo 5.º, n.º 1, da proposta de lei, «As competências da PJ respeitantes à investigação criminal são as definidas na Lei de Organização da Investigação Criminal». Ora, esta remissão — e, Sr. Ministro, isto é que é importante, também relativamente ao que já disse aqui, hoje — será certamente para a anunciada nova lei de organização da investigação criminal, que o Governo prometeu apresentar a esta Assembleia em Setembro próximo, uma vez que, quando a proposta de lei n.º 143/X se quer reportar à Lei de Organização da Investigação Criminal actualmente em vigor, designa-a expressamente por Lei n.º 21/2000. Isso traduz-se, Sr. Ministro, num total desconhecimento do legislador parlamentar acerca daquelas que serão as competências da Polícia Judiciária em matéria de investigação criminal — esta é a nossa posição e isso tem de ficar clarificado no decurso deste processo legislativo. Não será despiciendo referir, a este propósito, que o actual artigo 5.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária elenca expressamente a competência reservada da PJ em matéria de investigação criminal, situação essa que deixa de existir com esta proposta de lei. E, já agora, Sr. Ministro, devemos igualmente referir que, ao contrário do que estabelece a Lei de Organização da Investigação Criminal em vigor, no seu artigo 2.º, n.º 5, a proposta de lei não salvaguarda a autonomia técnica e táctica da Polícia Judiciária na execução do seu papel de coadjuvação das autoridades judiciárias, uma vez que, no seu articulado, apenas se refere à autonomia técnica. Por outro lado ainda, a competência da Polícia Judiciária para assegurar o funcionamento dos Gabinetes da Interpol e Europol, para efeitos da sua própria missão e para partilha de informação, é tecida, segundo esta proposta de lei, no quadro definido pela Lei de Segurança Interna. Acontece que, atendendo a que a actual Lei de Segurança Interna não contém nenhuma referência aos Gabinetes Interpol e Europol, a menção feita no artigo 5.º, n.º 2, desta proposta de lei, só pode querer reportar-se à nova lei de segurança interna, cujo teor esta Assembleia ainda ignora em absoluto. Também em relação a esta última está prometida a sua apresentação para Setembro próximo. Adensam-se, por isso, as dúvidas fundadas, que já tínhamos manifestado aquando da apresentação do PRACE, de integração destes gabinetes de cooperação no Gabinete Coordenador de Segurança, sob tutela da Presidência do Conselho de Ministros. No que concerne ao sistema de informações, estabelece-se que a Polícia Judiciária dispõe de um sistema de informação criminal de âmbito nacional, o qual se articula e terá adequada interoperacionalidade com os demais sistemas de informação criminal, mas, também nesta sede, «a regular em diploma próprio». Ficamos, assim, sem saber como e quem cumprirá este preceito. Outra questão que se coloca, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, é de ordem sistémica e tem a ver com a própria designação desta proposta de lei. Esta proposta visa aprovar a orgânica da Polícia Judiciária, mas a verdade é que, se vier a ser aprovada tal como foi apresentada pelo Governo, não substitui a lei anterior, cujos preceitos, em grande número, permanecem em vigor. Ou seja, a nova lei orgânica da Polícia Judiciária coexistirá com a lei anterior, passando a haver, assim, duas leis orgânicas da Polícia Judiciária: uma, esta, a que regula determinada matéria relacionada com a estrutura, os órgãos e os serviços da Polícia Judiciária, e outra, a que está actualmente em vigor, que regula o estatuto e as carreiras do pessoal da Polícia Judiciária. É, de facto, uma grande confusão que esta Assembleia, no decurso do processo legislativo, também deve resolver. Uma palavra, ainda, sobre o Sistema Integrado de Segurança Interna (SISI), cujas implicações ao nível da Polícia Judiciária também nos merecem sérias reservas. A criação de um conselho superior de investigação criminal, presidido pelo Primeiro-Ministro, do qual façam parte os Ministros da Justiça e da Administração Interna, o Procurador-Geral da República e os responsáveis máximos de todos os órgãos de polícia criminal e a criação de um núcleo central do SISI, coordenado por um secretário-geral, também dependente do Primeiro-Ministro, composto pelas instituições que representam o essencial da actividade de segurança e da investigação criminal, entre as quais se integra, naturalmente, a Polícia Judiciária, indiciam uma intromissão do poder politico na actividade investigatória, o que, tal como já denunciámos várias vezes, jamais obterá o nosso apoio. Por isso e em conclusão, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD pugnará, neste processo legislativo, pela clarificação destas questões. Vemos com apreensão as incertezas e as indefinições desta proposta de lei. A Polícia Judiciária, todos o sabemos, é um pilar e um instrumento fundamental da investigação criminal levada a cabo pelas autoridades judiciárias. O excesso e a incerteza da regulamentação condicionam as investigações e dificultam injustificadamente o seu sucesso e o sucesso das políticas de prevenção e de combate ao crime. Todos devemos evitar que este diploma se constitua como um factor de instabilidade no trabalho meritório e prestigiado dos nossos investigadores. Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, termino dizendo que a reforma da organização da Polícia Judiciária contará connosco, mas apenas se houver uma demonstração cabal de que o seu resultado será o acréscimo da eficácia do trabalho da Polícia Judiciária, a salvaguarda do seu prestígio e, acima de tudo, a garantia de que a investigação criminal, em Portugal, não será instrumentalizada, não será politizada e não será governamentalizada. … isto é, o que, no futuro, haveriam de ser as futuras unidades territoriais regionais da Polícia Judiciária (PJ), tal como acontece na actual Lei Orgânica da Polícia Judiciária que, ao que parece, o Sr. Ministro também não leu. É que, se o Sr. Ministro tivesse lido, perceberia que esta lá, e foi apreciado aqui, o que não consta desta proposta de lei mas que só poderá ser estabelecido por portaria. Ora, é isso que o Governo não pode fazer, Sr. Ministro, e, se tentar fazê-lo, vai ter tremendos problemas porque a Constituição não o consente. Percebo a razão de ser de o Governo tentar fazê-lo agora. A razão de ser, entre outras, está nesta notícia de jornal, cuja cópia tenho aqui, datada de 29 de Março de 2006, intitulada «Sócrates adia sine die decisão sobre conflito entre Costa e Costa». Nesta notícia diziase que «o plenário do Conselho Superior de Segurança, a que preside o Primeiro-Ministro, deveria ter aprovado ontem o novo Plano de Coordenação das Forças de Segurança». Mais adiante, dizia que «a oposição da Polícia Judiciária ao novo Plano de Coordenação das Forças de Segurança tem provocado, dentro do Governo, um clima de tensão política entre Alberto Costa, Ministro da Justiça, e António Costa, Ministro da Administração Interna», porque — e isto é que importa, não é a trica governamental — «a Judiciária e o Ministério da Justiça defendem que a prevalência do ‘princípio da manutenção da ordem pública’, defendida por António Costa, pode pôr em causa direitos, liberdades e garantias», e por aí fora. Ora, perante um conflito latente, o Governo decidiu como? Relegando para portaria a matéria que, depois, o Parlamento não poderá apreciar. Mas não poderá fazê-lo, Sr. Ministro da Justiça, e cá estaremos para fazer essa reivindicação no momento certo. Mas há mais, Sr. Ministro da Justiça. É que, em matéria de direitos, liberdades e garantias, temos de ser muito cuidadosos, porque os cidadãos não podem estar sujeitos ao arbítrio da decisão dos políticos e, nos termos da lei, a direcção da investigação criminal pertence ao Ministério Público, na fase de inquérito, e ao juiz de instrução criminal, na fase instrutória. Ora, quem lê a proposta de lei, nomeadamente o seu artigo 12.º, quase fica na dúvida! Atrevia-me a perguntar ao Sr. Ministro se, porventura, hoje em dia, não ocorrerão averiguações da Polícia Judiciária prévias ao inquérito (e, por isso, sem qualquer controlo do Ministério Público), sob a forma de «N. I.», isto é, «números informáticos», ou sob a forma de «O.D.», isto é, «ocorrências diversas». O Sr. Ministro dir-nos-á, se souber. Quanto a tentativas ilegítimas de governamentalização da Polícia Judiciária, a gestão do Sistema Integrado de Informação Criminal poderá perder-se para o Secretário-Geral do Sistema Integrado de Segurança Interna. Ora, este está fora da alçada da esfera judicial, é nomeado pelo Governo e equiparado a Secretário de Estado, pelo que aquele último órgão passará a poder aceder a números de telefone sob escuta por parte da Polícia Judiciária, saber o nome de cidadãos sob investigação criminal, sejam empresários, banqueiros, políticos também, e tantos outros. A este propósito, refira-se que, salvo melhor opinião — e dir-me-á, se eu estiver enganado —, a proposta de lei nem sequer determina quem vai gerir o Sistema Integrado de Investigação Criminal. Era bom sabê-lo. Seja como for, parece evidente o risco de, na base de esta proposta de lei vir a ser aprovada, o Governo — e sublinho que é o Governo e não o Ministério Público! — poder vir a ter acesso a factos de inquéritoscrime sob segredo de justiça, designadamente a números de telefone sob escuta. O Orador: — Pretende-se, ainda, cometer à Polícia Judiciária, que, desta forma, o PS quer governamentalizada, poderes que, em muitos momentos, escapam ao impulso judiciário de quem tem competência na fase de inquérito e de instrução, que, reafirmo, é o Ministério Público e não o juiz de instrução criminal. A Polícia Judiciária não tem autonomia na investigação criminal em Portugal e, no dia em que a tiver, aí, é o sistema, é o regime democrático que estará a ser pervertido. Nos termos do nosso Código de Processo Penal, a Polícia Judiciária poderá realizar, mediante prévio despacho de delegação do Ministério Público, os actos de investigação não excepcionados, nomeadamente no artigo 270.º do Código de Processo Penal, mesmo na versão e na redacção que hoje foi aprovada em sede de 1.ª Comissão, como, por exemplo, no caso de buscas ou apreensões. Só que, Sr. Ministro, agora, por aplicação do artigo 12.º da proposta de lei, pretende-se permitir que, mais do que diligenciar o que o Ministério Público delegue, a Polícia Judiciária determine e ordene actos de investigação. E vou demonstrá-lo. Actualmente, o Ministério Público pode delegar na PJ as revistas e as buscas, nos casos específicos previstos no artigo 174.º, n.º 4, alíneas a), b), e c), do Código de Processo Penal: terrorismo, crimes particularmente violentos e, também, quando os visados consintam de forma documentada ou aquando de flagrante delito a que corresponda pena de prisão — são estes os casos e mais nenhuns. Só que, agora, nos termos do artigo 12.º da proposta de lei, a Polícia Judiciária poderá ordenar — não é diligenciar o que o Ministério Público determine! — buscas, apreensões, excepto as realizadas em escritório de advogado, de médico, em estabelecimento bancário ou hospitalar. Pergunto, então: onde é que ficam as garantias dos cidadãos? E onde está a segurança jurídica que lhes é devida? É que, repito, não se trata de diligenciar o que o Ministério Público determine, trata-se de ordenar e, porventura, depois, comunicar ao Ministério Público. Chamo a atenção ao Sr. Ministro de que, mesmo quanto aos casos previstos na alínea a) do artigo 174.º do Código de Processo Penal, que, depois, implicam que a diligência efectuada seja remetida ao juiz de instrução criminal para proceder à validação, são residuais perante o que, agora, a Polícia Judiciária poderá passar a fazer. Sr. Ministro, repito: vivemos num Estado que é de direito e que é democrático! A Polícia Judiciária não pode ser governamentalizada, instrumentalizada, partidarizada, seja para que fins for.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, devo dizer-lhe que quem ficou decepcionado fui eu, com a resposta que há pouco deu às questões que lhe coloquei. É que, no mínimo, deverá ter sido o Sr. Ministro da Justiça quem não leu a Lei de Organização da Investigação Criminal, porque, se o tivesse feito, verificaria que nem no artigo 2.º, nem no artigo 5.º, nem em nenhum outro — e tenho aqui, comigo, o texto da lei — se especificam competências daquilo que, obviamente, não existia à data, isto é, o que, no futuro, haveriam de ser as futuras unidades territoriais regionais da Polícia Judiciária (PJ), tal como acontece na actual Lei Orgânica da Polícia Judiciária que, ao que parece, o Sr. Ministro também não leu. É que, se o Sr. Ministro tivesse lido, perceberia que esta lá, e foi apreciado aqui, o que não consta desta proposta de lei mas que só poderá ser estabelecido por portaria. Ora, é isso que o Governo não pode fazer, Sr. Ministro, e, se tentar fazê-lo, vai ter tremendos problemas porque a Constituição não o consente. Percebo a razão de ser de o Governo tentar fazê-lo agora. A razão de ser, entre outras, está nesta notícia de jornal, cuja cópia tenho aqui, datada de 29 de Março de 2006, intitulada «Sócrates adia sine die decisão sobre conflito entre Costa e Costa». Nesta notícia diziase que «o plenário do Conselho Superior de Segurança, a que preside o Primeiro-Ministro, deveria ter aprovado ontem o novo Plano de Coordenação das Forças de Segurança». Mais adiante, dizia que «a oposição da Polícia Judiciária ao novo Plano de Coordenação das Forças de Segurança tem provocado, dentro do Governo, um clima de tensão política entre Alberto Costa, Ministro da Justiça, e António Costa, Ministro da Administração Interna», porque — e isto é que importa, não é a trica governamental — «a Judiciária e o Ministério da Justiça defendem que a prevalência do ‘princípio da manutenção da ordem pública’, defendida por António Costa, pode pôr em causa direitos, liberdades e garantias», e por aí fora. Ora, perante um conflito latente, o Governo decidiu como? Relegando para portaria a matéria que, depois, o Parlamento não poderá apreciar. Mas não poderá fazê-lo, Sr. Ministro da Justiça, e cá estaremos para fazer essa reivindicação no momento certo. Mas há mais, Sr. Ministro da Justiça. É que, em matéria de direitos, liberdades e garantias, temos de ser muito cuidadosos, porque os cidadãos não podem estar sujeitos ao arbítrio da decisão dos políticos e, nos termos da lei, a direcção da investigação criminal pertence ao Ministério Público, na fase de inquérito, e ao juiz de instrução criminal, na fase instrutória. Ora, quem lê a proposta de lei, nomeadamente o seu artigo 12.º, quase fica na dúvida! Atrevia-me a perguntar ao Sr. Ministro se, porventura, hoje em dia, não ocorrerão averiguações da Polícia Judiciária prévias ao inquérito (e, por isso, sem qualquer controlo do Ministério Público), sob a forma de «N. I.», isto é, «números informáticos», ou sob a forma de «O.D.», isto é, «ocorrências diversas». O Sr. Ministro dir-nos-á, se souber. Quanto a tentativas ilegítimas de governamentalização da Polícia Judiciária, a gestão do Sistema Integrado de Informação Criminal poderá perder-se para o Secretário-Geral do Sistema Integrado de Segurança Interna. Ora, este está fora da alçada da esfera judicial, é nomeado pelo Governo e equiparado a Secretário de Estado, pelo que aquele último órgão passará a poder aceder a números de telefone sob escuta por parte da Polícia Judiciária, saber o nome de cidadãos sob investigação criminal, sejam empresários, banqueiros, políticos também, e tantos outros. A este propósito, refira-se que, salvo melhor opinião — e dir-me-á, se eu estiver enganado —, a proposta de lei nem sequer determina quem vai gerir o Sistema Integrado de Investigação Criminal. Era bom sabê-lo. Seja como for, parece evidente o risco de, na base de esta proposta de lei vir a ser aprovada, o Governo — e sublinho que é o Governo e não o Ministério Público! — poder vir a ter acesso a factos de inquéritoscrime sob segredo de justiça, designadamente a números de telefone sob escuta. O Orador: — Pretende-se, ainda, cometer à Polícia Judiciária, que, desta forma, o PS quer governamentalizada, poderes que, em muitos momentos, escapam ao impulso judiciário de quem tem competência na fase de inquérito e de instrução, que, reafirmo, é o Ministério Público e não o juiz de instrução criminal. A Polícia Judiciária não tem autonomia na investigação criminal em Portugal e, no dia em que a tiver, aí, é o sistema, é o regime democrático que estará a ser pervertido. Nos termos do nosso Código de Processo Penal, a Polícia Judiciária poderá realizar, mediante prévio despacho de delegação do Ministério Público, os actos de investigação não excepcionados, nomeadamente no artigo 270.º do Código de Processo Penal, mesmo na versão e na redacção que hoje foi aprovada em sede de 1.ª Comissão, como, por exemplo, no caso de buscas ou apreensões. Só que, Sr. Ministro, agora, por aplicação do artigo 12.º da proposta de lei, pretende-se permitir que, mais do que diligenciar o que o Ministério Público delegue, a Polícia Judiciária determine e ordene actos de investigação. E vou demonstrá-lo. Actualmente, o Ministério Público pode delegar na PJ as revistas e as buscas, nos casos específicos previstos no artigo 174.º, n.º 4, alíneas a), b), e c), do Código de Processo Penal: terrorismo, crimes particularmente violentos e, também, quando os visados consintam de forma documentada ou aquando de flagrante delito a que corresponda pena de prisão — são estes os casos e mais nenhuns. Só que, agora, nos termos do artigo 12.º da proposta de lei, a Polícia Judiciária poderá ordenar — não é diligenciar o que o Ministério Público determine! — buscas, apreensões, excepto as realizadas em escritório de advogado, de médico, em estabelecimento bancário ou hospitalar. Pergunto, então: onde é que ficam as garantias dos cidadãos? E onde está a segurança jurídica que lhes é devida? É que, repito, não se trata de diligenciar o que o Ministério Público determine, trata-se de ordenar e, porventura, depois, comunicar ao Ministério Público. Chamo a atenção ao Sr. Ministro de que, mesmo quanto aos casos previstos na alínea a) do artigo 174.º do Código de Processo Penal, que, depois, implicam que a diligência efectuada seja remetida ao juiz de instrução criminal para proceder à validação, são residuais perante o que, agora, a Polícia Judiciária poderá passar a fazer. Sr. Ministro, repito: vivemos num Estado que é de direito e que é democrático! A Polícia Judiciária não pode ser governamentalizada, instrumentalizada, partidarizada, seja para que fins for. Concluo, dizendo, Sr. Ministro, que, para o que mais importa e perante o que está em causa, o CDS não pode calar-se. A Polícia Judiciária não é uma polícia de um partido, ainda que, porventura, muitos partidos gostassem de tê-la ao seu dispor — é uma tentação que a democracia não consente —, não é uma polícia de nenhum governo, não é sequer uma polícia de nenhum regime e a nenhum partido se pode permitir essa tentação. No que nos toca, aqui, no Parlamento, enquanto Deputados que somos da República, se o Governo persistir nesta redacção, não deixaremos de, no momento próprio, chamar a atenção para uma flagrante violação da nossa Constituição através da qual são postos em questão direitos, liberdades e garantias de cidadãos que são portugueses. Essa é uma incumbência que cabe, também, ao Ministro da Justiça, a quem, para além do mais, caberá não permitir que alguma vez tal possa acontecer no nosso país. Em segundo lugar, o Bloco de Esquerda encara com grande preocupação o que está previsto quanto ao sistema de informação criminal. Trata-se de uma matéria da mais alta sensibilidade, pois consiste no conjunto de informações com incidência nos direitos, liberdades e garantias com relevância para a investigação criminal. Prevê-se que a PJ disponha de um sistema de informação criminal de âmbito nacional, o que faz sentido. No entanto, prevê-se também que ele se articule com os demais sistemas de informação criminal legalmente previstos, sem se clarificar qual será a entidade que vai tutelar e coordenar o sistema integrado que daqui resultaria. Não se sabe se vai ser uma entidade de polícia criminal ou uma entidade governamental. Dada a sensibilidade da informação contida neste sistema de registo, estas diferenças não são de somenos. A razão é simples: não está fechada a possibilidade de este sistema de informação criminal vir a ser tutelado pelo Sistema Integrado de Segurança Interna, o qual responde perante um só secretário-geral, o qual reporta directamente ao Primeiro-Ministro. Ou seja, para além de se correr o risco de desviar a informação criminal do seu papel essencial, que é o de ser utilizado pelos órgãos de polícia criminal para fins de coordenação de investigação, ainda o colocaríamos sob a tutela governamental, com os riscos inerentes que escuso de comentar. De facto, o Ministro Rui Pereira referiu aqui, na Assembleia, em Junho, que se iria «alargar a estrutura coordenadora, que hoje apenas compreende os responsáveis pelos três principais órgãos de polícia criminal (GNR, PSP e PJ), clarificar as competências das várias polícias e garantir a partilha de informações entre elas segundo princípios de necessidade e competência». Dada a orientação geral com que tem sido desenhada pelo Governo a organização das forças de segurança, tememos bem que esta «estrutura coordenadora» possa ter poderes efectivos que não só condicionem a autonomia da Polícia Judiciária como, em si mesmos, não tenham mecanismos de fiscalização garantidores da privacidade e dos direitos dos cidadãos contra o abuso de «estruturas» de poderes tão largos quanto indefinidos. Por último, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Preocupa-nos também o visível desaceleramento legal e administrativo no combate à criminalidade económica, já constatável no Relatório de Segurança Interna, de 2006, apesar do seu agravamento aí constatado. A criminalidade económica e financeira é um dos tipos de criminalidade mais especializados e com maior expressão económica, o que, aliás, é reconhecido no referido relatório. Apesar disso, a estratégia do Governo para as forças de segurança parece apostar cada vez mais no congelamento das vagas para efectivos, ao abrigo do PRACE, tal como, mais uma vez, se refere nesta proposta de lei. Assim, a nossa questão é esta: que medidas estão previstas especificamente para o combate à criminalidade económica e financeira? Já que não se vislumbram alterações quanto à definição dos crimes económicos e financeiros, será que existirá, pelo menos, um esforço no sentido de um aumento de investigação destes crimes? De acordo com a proposta presente, não nos parece. A presente proposta de lei de orgânica da PJ diz pouco e deixa adivinhar muito. Em ambos os casos, no que diz e no que sugere, contém elementos muito preocupantes, razão pela qual não a podemos acompanhar com o nosso voto.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É um dado inequívoco que a criminalidade mudou. As transformações sociais, políticas e económicas alteraram praticamente todos os paradigmas anteriores de combate a todas as formas de ilícitos criminais. As fronteiras tradicionais há muito que foram ultrapassadas nos seus limites, em face do carácter transnacional da criminalidade. Constituem exemplos evidentes o terrorismo, a corrupção, o branqueamento de capitais e o tráfico de estupefacientes, que representam, actualmente, fenómenos de extrema complexidade e de contornos e ramificações internacionais. Em face desta realidade, urge promover alterações estruturais e orgânicas no âmbito da Polícia Judiciária, procurando aumentar a operacionalidade e a especialização desta Polícia, e, bem assim, estabelecer uma organização adequada à actualidade e aos fenómenos criminais referidos. Neste sentido, o Governo apresentou nesta Câmara a proposta de lei n.º 143/X, ora em discussão, que aprova a orgânica da Polícia Judiciária. Nesta sede, propõe-se a criação de unidades nacionais, tendo como especial missão o combate à criminalidade organizada e que vêm substituir as anteriores direcções centrais, concentrando, assim, naquelas unidades o combate ao terrorismo, à corrupção e ao tráfico de estupefacientes. Esta reestruturação visa corresponder as actuais características da criminalidade e à natureza socialmente gravosa daqueles ilícitos, que reclamam, naturalmente, uma resposta e uma intervenção adequadas do ponto de vista da operacionalidade. Ainda de acordo com esta lógica de reorganização estrutural dos serviços, e tendo em conta a reconhecida necessidade de racionalização dos recursos no sentido da obtenção de maior eficiência e eficácia nas actividades desenvolvidas, criam-se unidades com novas designações e âmbitos de actuação diferentes. Procede-se, assim, ao alargamento das competências das unidades territoriais ora criadas relativamente àquelas que estavam cometidas às anteriores directorias, em função da transferência de responsabilidade do combate a algumas áreas mais genéricas da criminalidade que recaem sobre estas novas unidades. Já os departamentos de investigação criminal dão lugar a unidades regionais e locais, na dependência hierárquica e sob a coordenação das unidades territoriais, com características fundamentalmente operacionais, aligeirando as respectivas estruturas internas e procurando ganhos ao nível da eficiência das actividades de investigação. São ainda propostas outras alterações na orgânica desta Polícia, designadamente no que respeita às instituições de formação de funcionários, sem esquecer a componente de cooperação internacional. Deste modo, e no quadro das orientações definidas pelo PRACE e dos objectivos do Programa do Governo no tocante à modernização administrativa e à melhoria da qualidade dos serviços públicos, é de sublinhar o esforço de racionalização estrutural, sobretudo progredindo em matéria de modelos organizacionais dos serviços que integram a respectiva estrutura. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Polícia Judiciária é a polícia a que o Estado de direito democrático confia o combate a criminalidade organizada, amplamente complexa e violenta. É uma polícia de reconhecido prestígio, quer pelos portugueses, quer internacionalmente, com créditos firmados nos sucessivos e impressivos resultados alcançados em áreas muito relevantes. É incontestada a capacidade, dedicação e competência do seu pessoal de investigação que tem sido corolário do alto nível de eficácia com que a Polícia Judiciária tem servido Portugal e a Europa. Estamos, pois, certos que a Polícia Judiciária, agora chamada a responder a este novo quadro de mudança, o fará com o profissionalismo e a proficiência com que tem executado a sua missão. É assim, no quadro da resposta que pelo lado da administração central do Estado importa dar a todo este quadro de mudança, que temos vindo a aprovar um conjunto de instrumentos legislativos, entre os quais se contam a Lei-Quadro da Política Criminal e a proposta de lei em apreço, que são evidências do empenho da administração central no intenso processo de modernização e reforma, procurando, por um lado, estabelecer garantias de eficácia e coerência entre as prioridades e objectivos a prosseguir pelos órgãos de polícia criminal e, por outro, partilhar objectivos comuns de racionalização, eficiência, controlo externo e prestação de contas. As potencialidades do novo quadro de cooperação e instrumentos europeus de novo alcance no domínio da identificação de ameaças, são agora amplamente aproveitadas, daqui decorre a necessidade de um recurso crescente à qualificação e à modernização científica e tecnológica no âmbito da investigação criminal, onde se inscrevem, também, os trabalhos em curso com vista à constituição de uma base de dados genéticos. Implica igualmente a intensificação da cooperação europeia e internacional, a fim de assegurar as condições necessárias para o combate à grande criminalidade transfronteiriça. Na verdade, a busca de eficácia e eficiência na actuação da Polícia Judiciária não se esgota na proposta ora em apreço. Para além dela, há o reconhecimento da necessidade de afectação de meios humanos e materiais à Polícia Judiciária, no sentido de esta poder dar resposta efectiva às solicitações que lhe são colocadas. Deste modo, não posso deixar de referir a admissão de 190 novos elementos, representando uma renovação de mais de 10% do total dos efectivos existentes. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em suma, a presente proposta vem responder às mudanças de paradigma verificadas, operando uma real adaptação orgânica e estrutural, capaz de extrair as necessárias consequências da alteração do conceito que foi legalmente consagrado há anos e que era, ao tempo, condizente com a realidade. É, portanto, em cumprimento deste vasto e exigente «caderno de encargos», que visa o aprofundamento da vocação judiciária, o reforço do empenhamento europeu e internacional, o desenvolvimento de boas práticas em quadros institucionais complexos e a adaptação activa não só ao contexto legal resultante da revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal como, sobretudo, ao novo modelo de definição da política criminal, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista saúda e aprova a proposta de lei em apreço, contando naturalmente com todos os que dão o seu melhor na Polícia Judiciária, em todos os postos e que já provaram que reúnem a energia, a competência e a experiência para viabilizarem, com sucesso, estas mudanças. …ainda bem que se mantém na Polícia Judiciária, tendo em conta o papel que a Polícia Judiciária tem a este nível e o estatuto que lhe é reconhecido, do ponto de vista internacional, enquanto interlocutor do Estado português para o combate à criminalidade transnacional e altamente organizada. Portanto, nesse sentido é bom que fique claro que a Polícia Judiciária não se verá privada dos gabinete da Europol e Interpol em benefício de qualquer outra entidade, designadamente ligada ao poder político. Quero ainda referir dois aspectos relativos a esta proposta de lei. Gostaria de chamar a atenção para uma incongruência, em termos sistemáticos, que faz com que passemos a ter não uma mas duas leis orgânicas da Polícia Judiciária. Existe uma lei orgânica, que está neste momento em vigor, e o Governo apresenta agora uma proposta de lei para uma orgânica da Polícia Judiciária; simplesmente, da lei orgânica anterior, o Governo mantém em vigor 106 artigos. Portanto, dos 179 artigos do diploma, 106 artigos vão permanecer em vigor, pelo que vamos ter uma espécie de «lei orgânica A» e «lei orgânica B», ficando em vigor, repito, 106 artigos da anterior, e agora soma-se uma nova lei orgânica. Assim, creio que vai criar-se aqui uma confusão sistemática, que era perfeitamente dispensável, mas é isto que vai efectivamente acontecer, o que não é bom em termos da unidade da ordem jurídica portuguesa. Agora, passo a referir a nossa maior preocupação a propósito desta proposta de lei, que diz respeito ao respectivo artigo 8.º. Este artigo refere-se ao sistema de informação criminal e diz que a Polícia Judiciária dispõe de um sistema de informação criminal de âmbito nacional — o que tem toda a lógica — e que o sistema referido articula-se e terá a adequada interoperabilidade pelos mais sistemas de informação criminal legalmente previstos. Ora, o que acontece é que, há alguns anos atrás, no tempo em que o recém eleito Presidente da Câmara Municipal de Lisboa era Ministro da Justiça, foi criado no papel o chamado Sistema Integrado de Informação Criminal, o SIIC, e era suposto que esse sistema integrado pudesse servir as várias forças policiais, pudesse haver uma troca de informação fluida e ágil entre elas, entre a Polícia Judiciária, a PSP, a GNR e o SEF. Ora, o que acontece é que esse SIIC ficou no papel, não foi criado e nunca mais se falou dele. Entretanto, o Dr. António Costa deixou de ser Ministro da Justiça, passou para outro cargo ministerial, a pasta da justiça foi ocupada por outro titular, houve outros governos pelo meio e nunca mais se falou do Sistema Integrado de Informação Criminal. Ficámos sem saber se ele foi definitivamente abandonado, mas a avaliar pelo conteúdo deste artigo 8.º parece ter sido. E o que se diz aqui é que haverá uma articulação e uma adequada interoperabilidade com os demais sistemas de informação criminal, pelo que, segundo julgámos perceber quando do anúncio da reestruturação das forças de segurança, quem assegurará esta interoperabilidade e esta articulação será, porventura, o Secretário-Geral do Sistema Integrado de Segurança Interna. Ou seja, a troca de informação entre as várias polícias deixa de estar sedeada ao nível das polícias, passa a estar sedeada ao nível do poder político e passa a ser comandada por um titular de um órgão do poder político que reporta directamente ao Primeiro-Ministro. Sr. Ministro da Justiça, isto cria um grave precedente. O facto de a informação criminal passar a ser controlada, em última análise, por alguém que é de nomeação governamental e que funciona sob a dependência directa do Primeiro-Ministro cria um grave precedente em matéria de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e coloca o poder político em condições de poder ter acesso a toda a informação criminal, o que, efectivamente, é algo com o que o poder político não deve poder interferir, é algo a que não pode ter acesso, sob pena de estarmos a comprometer de uma forma decisiva e muito grave a isenção do funcionamento das autoridades de investigação criminal. Portanto, este artigo 8.º suscita-nos as maiores preocupações e faz com que, só por si, seja suficiente para que não possamos dar o nosso apoio a esta proposta de lei que o Governo aqui nos apresenta.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governos, Sr.as e Srs. Deputados: Não é preciso gastar muito tempo para enaltecer a importância que tem a Polícia Judiciária para o combate à criminalidade e para o Estado de direito democrático. Daí que, do nosso ponto de vista, é um dever do poder político, desta Assembleia e do Governo, dotar a Polícia Judiciária com os instrumentos legais mais adequados ao cumprimento da sua missão, e especificamente é dever do Governo garantir à Polícia Judiciária as condições adequadas, em termos dos respectivos meios humanos e materiais, para poder cumprir eficazmente as suas funções e combater a criminalidade altamente organizada, a criminalidade mais complexa e sofisticada, o que é a missão fundamental da Polícia Judiciária. É também fundamental para o cumprimento dessa missão, a bem do Estado de direito democrático, que a Polícia Judiciária tenha também as garantias de desgovernamentalização, de independência e de isenção no exercício da sua actividade. Posto estas considerações, há alguns aspectos desta proposta de lei que gostaria de referir, quer para exprimir preocupações, quer para registar alguns aspectos que, do nosso ponto de vista, devem ser registados. Em primeiro lugar, quero salientar que, porventura por lapso, o Governo omitiu na proposta de lei, no seu artigo 3.º, uma referência à autonomia táctica da Polícia Judiciária. Admitimos que possa ter sido um lapso da proposta de lei, na medida em que a autonomia táctica é fundamental para o bom funcionamento da Polícia Judiciária e para o cumprimento das suas funções. Portanto, confiamos que haja da parte do Governo e da maioria disponibilidade para corrigir, na especialidade, a ausência desta expressão no n.º 2 do artigo 3.º e que juntamente com a autonomia técnica, que está aqui consagrada, esteja também a autonomia táctica, como, do nosso ponto de vista — e creio que isso é consensual —, deverá estar. Quero salientar ainda, e aqui registar positivamente, que no artigo 5.º se refere explicitamente que «compete à Polícia Judiciária assegurar o funcionamento dos gabinetes da Interpol e Europol para os efeitos da sua própria missão e para partilha de informação, no quadro definido pela Lei de Segurança Interna». É bom que isto fique claro de uma vez por todas, porque nos recordamos, e não foi há muito tempo, que no âmbito deste Governo foi anunciado que a Polícia Judiciária ia ser privada destes dois gabinetes e que iriam passar para uma estrutura sob a dependência directa do Primeiro-Ministro. Ainda bem que isso não aconteceu, ainda bem que se mantém na Polícia Judiciária, tendo em conta o papel que a Polícia Judiciária tem a este nível e o estatuto que lhe é reconhecido, do ponto de vista internacional, enquanto interlocutor do Estado português para o combate à criminalidade transnacional e altamente organizada. Portanto, nesse sentido é bom que fique claro que a Polícia Judiciária não se verá privada dos gabinete da Europol e Interpol em benefício de qualquer outra entidade, designadamente ligada ao poder político. Quero ainda referir dois aspectos relativos a esta proposta de lei. Gostaria de chamar a atenção para uma incongruência, em termos sistemáticos, que faz com que passemos a ter não uma mas duas leis orgânicas da Polícia Judiciária. Existe uma lei orgânica, que está neste momento em vigor, e o Governo apresenta agora uma proposta de lei para uma orgânica da Polícia Judiciária; simplesmente, da lei orgânica anterior, o Governo mantém em vigor 106 artigos. Portanto, dos 179 artigos do diploma, 106 artigos vão permanecer em vigor, pelo que vamos ter uma espécie de «lei orgânica A» e «lei orgânica B», ficando em vigor, repito, 106 artigos da anterior, e agora soma-se uma nova lei orgânica. Assim, creio que vai criar-se aqui uma confusão sistemática, que era perfeitamente dispensável, mas é isto que vai efectivamente acontecer, o que não é bom em termos da unidade da ordem jurídica portuguesa. Agora, passo a referir a nossa maior preocupação a propósito desta proposta de lei, que diz respeito ao respectivo artigo 8.º. Este artigo refere-se ao sistema de informação criminal e diz que a Polícia Judiciária dispõe de um sistema de informação criminal de âmbito nacional — o que tem toda a lógica — e que o sistema referido articula-se e terá a adequada interoperabilidade pelos mais sistemas de informação criminal legalmente previstos. Ora, o que acontece é que, há alguns anos atrás, no tempo em que o recém eleito Presidente da Câmara Municipal de Lisboa era Ministro da Justiça, foi criado no papel o chamado Sistema Integrado de Informação Criminal, o SIIC, e era suposto que esse sistema integrado pudesse servir as várias forças policiais, pudesse haver uma troca de informação fluida e ágil entre elas, entre a Polícia Judiciária, a PSP, a GNR e o SEF. Ora, o que acontece é que esse SIIC ficou no papel, não foi criado e nunca mais se falou dele. Entretanto, o Dr. António Costa deixou de ser Ministro da Justiça, passou para outro cargo ministerial, a pasta da justiça foi ocupada por outro titular, houve outros governos pelo meio e nunca mais se falou do Sistema Integrado de Informação Criminal. Ficámos sem saber se ele foi definitivamente abandonado, mas a avaliar pelo conteúdo deste artigo 8.º parece ter sido. E o que se diz aqui é que haverá uma articulação e uma adequada interoperabilidade com os demais sistemas de informação criminal, pelo que, segundo julgámos perceber quando do anúncio da reestruturação das forças de segurança, quem assegurará esta interoperabilidade e esta articulação será, porventura, o Secretário-Geral do Sistema Integrado de Segurança Interna. Ou seja, a troca de informação entre as várias polícias deixa de estar sedeada ao nível das polícias, passa a estar sedeada ao nível do poder político e passa a ser comandada por um titular de um órgão do poder político que reporta directamente ao Primeiro-Ministro. Sr. Ministro da Justiça, isto cria um grave precedente. O facto de a informação criminal passar a ser controlada, em última análise, por alguém que é de nomeação governamental e que funciona sob a dependência directa do Primeiro-Ministro cria um grave precedente em matéria de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e coloca o poder político em condições de poder ter acesso a toda a informação criminal, o que, efectivamente, é algo com o que o poder político não deve poder interferir, é algo a que não pode ter acesso, sob pena de estarmos a comprometer de uma forma decisiva e muito grave a isenção do funcionamento das autoridades de investigação criminal. Portanto, este artigo 8.º suscita-nos as maiores preocupações e faz com que, só por si, seja suficiente para que não possamos dar o nosso apoio a esta proposta de lei que o Governo aqui nos apresenta. Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as diversas contribuições e críticas que foram apresentadas e quero também garantir ao Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo que continuaremos a viver em democracia e com as liberdades respeitadas. Esta não é uma lei «liberticida» e concluirá certamente que dela não vão advir todos aqueles inconvenientes que lhe apontou à nascença. Gostaria de dizer que esta lei se compreende num quadro de renovação, no plano da modernização administrativa do Estado, ela faz corpo com outras mudanças que ocorreram em paralelo, bem como num quadro de renovação da área da segurança interna e da investigação criminal. É verdade, como alguns Srs. Deputados aqui notaram, que há aspectos que têm de ser precisados noutra legislação, mas esta Assembleia vai ter toda a oportunidade para discutir, para questionar e até para apresentar alternativas em relação às soluções que aqui vão ser apresentadas nesses domínios, nomeadamente no domínio da informação, a que se referiu o Sr. Deputado António Filipe, que apontou, e bem, uma evolução, que hoje é consensual, no sentido de um sistema integrado de todas as polícias de vocação nacional para um sistema com autonomias relativas, ligadas por interoperabilidade. Esse outro conceito dá mais garantias, quer de eficácia, quer dos direitos dos cidadãos, e ele vai aqui ser trazido. Não vai ser um sistema com um controlo político, a Assembleia terá ocasião de debruçar-se sobre os vários instrumentos pensados para assegurar a protecção e fidedignidade desse sistema e, portanto, não me parece adequado exarar à partida um juízo «liberticida» sobre uma proposta que visa, em primeiro lugar, assegurar direitos, liberdades e garantias e prover às necessidades da luta contra o crime. Gostaria ainda de acrescentar que a referência feita à nossa falta de ênfase no combate a determinados tipos de crime é particularmente injusta. Na realidade, nos dois anos que vão decorridos, através de toda a sorte de instrumentos, de protocolos, de actuação conjunta com outros ministérios, de admissão de novos elementos, provámos que a luta contra a criminalidade económica e financeira é realmente uma prioridade, tem tido resultados muitíssimo significativos e vai continuar a ter. Já que aqui foram mencionados os 150 novos agentes que estão neste momento a fazer provas, devo dizer já destinámos metade desses agentes à luta contra a criminalidade económica e financeira. Podemos repetir palavras sobre as liberdades que são ou ficam ameaçadas – são palavras! –, mas temos de reconhecer os esforços que foram feitos neste domínio e os novos instrumentos que foram postos no terreno. Também não devemos exaltar aspectos como o de estar ainda em vigor uma parte de uma lei anterior, isso é o que existe em todo o universo legislativo. O facto de continuarem a vigorar aspectos e partes de leis e de haver revogações parciais é o que existe! Entendemos que os aspectos estatutários constantes da anterior legislação não deviam ser agora revogados e, portanto, do ponto de vista da teoria legislativa e jurídica, isto não tem qualquer problema. Não façamos uma espécie de fantasia política em torno de debates políticos que exigem opções políticas e temas políticos. Em relação à autonomia táctica, ela continua consagrada na Lei da Organização e da Investigação Criminal, ou seja, não «faleceu» nem «faleceria» mesmo que a lei tivesse as mesmas palavras que constam desta proposta. Queria, sobretudo, desafiar esta Assembleia para que exerça o seu potencial e as suas prerrogativas em relação aos grandes instrumentos de reforma da organização da investigação criminal da segurança interna, que, evidentemente, têm de ser afinados com um elevado sentido democrático e um elevado sentido parlamentar. Compreendo bem as observações sobre certos preceitos cujo sentido precisa de outros diplomas para poderem ser concretizados. Pois é isso que vai requerer o trabalho de todos, porque é importante que estas leis tenham um forte apoio parlamentar. Quando falamos das polícias num Estado democrático precisamos de um forte apoio parlamentar. Por esta razão, estamos receptivos a melhorar disposições e a consagrar novas garantias, de maneira a que as leis que daqui saiam sobre polícia, sobre segurança e sobre investigação criminal tenham, realmente, um elevado padrão democrático e possam obter um forte apoio dentro desta Assembleia.
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, vou colocar duas questões sucintas. Da intervenção da Sr.ª Ministra, que pouco apresentou do diploma, ficou bem claro que o Governo entende que esta proposta de lei resulta também das conclusões do Grupo de Trabalho — Violência nas Escolas, da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, conclusões que, felizmente, o Grupo Parlamentar do PCP não subscreveu mas que deram origem a tão infeliz documento! Vou, então, colocar duas questões muito concretas para também possibilitar respostas concretas. Uma das questões que muito enfatiza este documento é a divisão das medidas em correctivas e punitivas. Sr.ª Ministra, como é possível entender as medidas correctivas? Um estudante que deixa de ter acesso às actividades extracurriculares, como, por exemplo, poder participar no grupo de teatro ou ir à biblioteca, é uma medida correctiva? Em que medida, Sr.ª Ministra? Uma outra pergunta, sucinta, que gostaria de colocar respeita à disciplina em meio escolar, ou seja, o número de alunos por turma. Está o Governo disponível para repensar o número máximo de alunos por turma e garantir o seu cumprimento ou verifica-se, mais uma vez, que só age no plano do autoritarismo, como demonstra este documento?
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, todas as iniciativas que reforcem a autoridade na sala de aula e promovam o respeito que deve existir nas escolas são positivas. Por isso, as alterações ao Estatuto do Aluno do Ensino Básico e Secundário são genericamente positivas e um contributo para esse efeito. Como a Sr.ª Ministra referiu, a Assembleia da República criou um grupo de trabalho, que, ao longo de meses, estudou e reflectiu sobre o aumento da violência nas escolas. Desse trabalho surgiu um conjunto de propostas que, atacando quer a montante quer no espaço escolar, são contributos decisivos para combater o flagelo da violência e da indisciplina na escola. Quero dizer, de uma forma clara, que as propostas que hoje discutimos, apesar do contributo positivo que dão neste desiderato, não reflectem, de forma alguma, o trabalho que foi feito. Daí que a primeira questão que gostava de colocar é a de saber até que ponto vai a disponibilidade do Governo para incorporar na sua acção as propostas que o grupo de trabalho produziu na Comissão de Educação, Ciência e Cultura. Sr.ª Ministra, nós, apesar de considerarmos que estas alterações são um contributo positivo, que ainda poderá e deverá ser reforçado em sede de especialidade, entendemos que o problema da indisciplina e da violência não se resolve por decreto. É na escola que os jovens consolidam a sua personalidade e, nesse processo, é fundamental o exemplo que os responsáveis dão à comunidade educativa. Neste particular, permita-me que lhe diga que a sua actuação tem sido sistematicamente a de um mau exemplo para os jovens e para a comunidade educativa em geral, desde logo, o exemplo que deu, e continua a dar, em relação à repetição dos exames de Física e de Química do 12.º ano. Como era previsível, o Tribunal Constitucional veio confirmar o que tantos especialistas já tinham afirmado: Sr.ª Ministra, a sua decisão foi ilegal e discriminou negativamente milhares de jovens. Ao longo de um ano, a Sr.ª Ministra recusou-se a fazer o mínimo que se exigia neste caso, que era pedir desculpa aos jovens e às famílias que foram objectivamente prejudicados pela sua decisão. Conhecida a decisão do Tribunal Constitucional, a Sr.ª Ministra veio dizer que fazia tudo de igual forma. Ou seja, em vez de, finalmente, num acto de humildade democrática, que se saudaria, pedir desculpa pelo erro e pela ilegalidade cometida, a Sr.ª Ministra mantém-se no alto da sua arrogância, dando um péssimo exemplo aos jovens, à comunidade educativa e ao País, promovendo a tese de que as decisões dos tribunais e da justiça portuguesa não são para cumprir nem para levar a sério. S.ª Ministra, outro mau exemplo que teve oportunidade de dar ao País foi o que sucedeu com a Associação de Professores de Matemática, que, por manifestar uma opinião diferente da tese oficial, foi imediatamente excluída da Comissão de Acompanhamento do Plano de Matemática. Ou seja, hoje em dia, é proibido discordar. E que dizer do exemplo dado pela DREN? A protecção dada à Sr.ª Directora regional é um verdadeiro escândalo. Manter em funções uma directora que, nos seus serviços, promove a delação, que promove perseguições políticas aos seus subordinados, que incentiva o delito de opinião, que conta anedotas em jantares oficiais e que insulta repetidamente presidentes de câmara em reuniões formais é o pior exemplo que se pode dar e em nada contribui para a formação democrática dos jovens e muito menos contribui para a necessária estabilidade nas escolas. … a importância que a questão da disciplina na escola tem para o CDS e a distância que, lamentavelmente, cada vez mais nos separa da sua política. Sr.ª Ministra, nós acreditamos numa escola com mérito, o que significa, do nosso ponto de vista, exames no final de cada ciclo escolar, ou seja, nos 4.º, 6.º, 9.º e 12.º anos. Não creio que a senhora acredite nisso, porque isso para uma pessoa de esquerda — e bastante de esquerda —, como respeitavelmente a Sr.ª Ministra é, implica aceitar o princípio de que o exame distingue as pessoas, as que estudam e as que não estudam, as que passam e as que chumbam, e isso é difícil para uma pessoa com os seus pressupostos teóricos. Nós acreditamos numa escola com autoridade. A Sr.ª Ministra e a maioria já deram exemplos de alguma negligência quando professores na escola e, às vezes, na sala de aula foram agredidos. Eu compreendo: é, mais uma vez, um problema ideológico. Nós não temos o mito igualitário, que funda muitas posições de esquerda: não achamos que na sala de aula o professor e o aluno estão na mesma situação, um ensina e o outro aprende. É preciso restabelecer o respeito pelos professores! Nós acreditamos numa escola segura. A Sr.ª Ministra, que dizia, há tempos, que não havia problemas de violência na escola portuguesa, finalmente, anunciou videovigilância. Bem-vinda ao clube, Sr.ª Ministra! Afinal, há problemas de segurança nas escolas. Há uns anos, quando propusemos isso, chamaram-nos fascistas. Veja bem o que lhe vão chamar agora, Sr.ª Ministra!?… Nós acreditamos na liberdade de escolha, ou seja, na possibilidade de os pais escolherem a escola dos seus filhos, e acreditamos na disciplina. Chegado aqui, Sr.ª Ministra, tenho duas perguntas para lhe fazer.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra da Educação, sou eu próprio a fazer-lhe a primeira pergunta do CDS para sublinhar dois pontos: a importância que a questão da disciplina na escola tem para o CDS e a distância que, lamentavelmente, cada vez mais nos separa da sua política. Sr.ª Ministra, nós acreditamos numa escola com mérito, o que significa, do nosso ponto de vista, exames no final de cada ciclo escolar, ou seja, nos 4.º, 6.º, 9.º e 12.º anos. Não creio que a senhora acredite nisso, porque isso para uma pessoa de esquerda — e bastante de esquerda —, como respeitavelmente a Sr.ª Ministra é, implica aceitar o princípio de que o exame distingue as pessoas, as que estudam e as que não estudam, as que passam e as que chumbam, e isso é difícil para uma pessoa com os seus pressupostos teóricos. Nós acreditamos numa escola com autoridade. A Sr.ª Ministra e a maioria já deram exemplos de alguma negligência quando professores na escola e, às vezes, na sala de aula foram agredidos. Eu compreendo: é, mais uma vez, um problema ideológico. Nós não temos o mito igualitário, que funda muitas posições de esquerda: não achamos que na sala de aula o professor e o aluno estão na mesma situação, um ensina e o outro aprende. É preciso restabelecer o respeito pelos professores! Nós acreditamos numa escola segura. A Sr.ª Ministra, que dizia, há tempos, que não havia problemas de violência na escola portuguesa, finalmente, anunciou videovigilância. Bem-vinda ao clube, Sr.ª Ministra! Afinal, há problemas de segurança nas escolas. Há uns anos, quando propusemos isso, chamaram-nos fascistas. Veja bem o que lhe vão chamar agora, Sr.ª Ministra!?… Nós acreditamos na liberdade de escolha, ou seja, na possibilidade de os pais escolherem a escola dos seus filhos, e acreditamos na disciplina. Chegado aqui, Sr.ª Ministra, tenho duas perguntas para lhe fazer. A primeira é a de saber se está disponível para alterar o artigo 22.º da vossa proposta de lei. O actual sistema, que, de resto, não considero perfeito, indica que, quando um aluno dá mais de metade das faltas injustificadas, acontece um aviso à sua família; na proposta de lei, este aviso passa a ser quando o aluno dá um terço das faltas injustificadas — e neste ponto estou de acordo. Mas, Sr.ª Ministra, actualmente, salvo uma decisão excepcional do conselho pedagógico, o aluno que supera as faltas injustificadas não pode passar de ano ou fica, como diz o «eduquês», retido, ou seja, em linguagem normal, não passa. O sistema que a Sr.ª Ministra propõe é diferente: a um aluno que exceda o total das faltas injustificadas é-lhe dada a possibilidade de uma prova de equivalência e, mesmo que não tenha aprovação nessa prova de equivalência, pode transitar de ano. Ou seja, a assiduidade deixa de ser um valor e pode acontecer esta coisa extraordinária, que é passar de ano sem assiduidade e sem aprovação. Isto nós não consideramos aceitável! Termino já, Sr. Presidente. Em segundo lugar, Sr.ª Ministra, e para terminar, no ano passado houve erros nos exames de História e de Física e Química; este ano houve erros nos exames de História e de Física e Química. A Sr.ª Ministra acha que é preciso fazer alguma coisa do ponto de vista do sistema de controlo da qualidade científica e pedagógica dos exames? Sim ou não? Sr.ª Ministra, vai abrir um processo de averiguações aos responsáveis por erros objectivos em exames nacionais? Sim ou não? Ou os processos no seu Ministério são reservados a quem tenha uma opinião sobre o Primeiro-Ministro?! Sr. Presidente, em relação à pergunta colocada pelo Sr. Deputado do PCP, gostava de dizer que, de facto, a aplicação das medidas previstas no Estatuto tem de referir-se a casos concretos, mas admito a possibilidade de inibição de frequência de espaço ou de participação em determinada actividade perante comportamentos que o justifiquem, ou seja, comportamentos reincidentes de perturbação ou de destruição de espaços. O Sr. Deputado falou nas bibliotecas. Imagine um caso extremo de perturbação ou de destruição do espaço das bibliotecas. Esse comportamento pode dar lugar à aplicação de uma medida correctiva durante um período de tempo limitado, por isso o aluno pode ser inibido da frequência desse espaço ou dessa actividade mediante a avaliação do conselho executivo e da escola. Sobre as questões levantadas pelo Sr. Deputado Emídio Guerreiro, registo e valorizo o acordo em relação à generalidade da proposta de lei. De resto, registo também a sua dificuldade em pronunciar-se sobre os temas da ordem do dia e em relação aos pontos que resolveu agendar, por sua iniciativa, e que estão fora da ordem do dia foi tudo falsidades. Sobre as questões levantadas pelo Sr. Deputado Paulo Portas, gostava que o PSD e o CDS se pronunciassem ou, pelos menos, se interrogassem sobre a necessidade de estarmos hoje a rever uma lei, aprovada justamente pelo PSD e pelo CDS há tão pouco tempo, porque ela não responde às 52 I SÉRIE — NÚMERO 100 necessidades das escolas e dos professores.
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Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra? Para um protesto, Sr. Presidente. Sr. Presidente, faço este protesto, porque a Sr.ª Ministra, respondendo ao meu pedido de esclarecimento ou não respondendo, disse, pura e simplesmente, que eu havia dito um conjunto de falsidades. Assim, gostava de saber se é falso o facto de que a decisão do Tribunal Constitucional tenha sido aquela que referi. Gostava de saber onde está a falsidade no que disse, quando afirmei, e volto a afirmar, que a Sr.ª Directora Regional de Educação do Norte persegue politicamente as pessoas, que a Sr.ª Directora Regional conta anedotas em jantares públicos, que a Sr.ª Directora Regional insultou presidentes de câmara em reuniões formais. Gostaria de saber onde estão, de facto, as falsidades. É que, se há aqui alguma falsidade, a Sr.ª Ministra é que tem de o demonstrar!
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Sr. Presidente, considerando a sua interpretação benigna do protesto, vou defender a honra da minha bancada, em face daquilo que a Sr.ª Ministra declarou sobre a posição do CDS. Sr. Presidente, quero apenas recordar à Sr.ª Ministra que se existem exames nacionais no 9.º ano, em boa medida, isso se deve à influência do CDS. Se há matéria onde a coerência do CDS é inquestionável, programa atrás de programa, é na defesa de exames nacionais no final de cada ciclo escolar. Pode a Sr.ª Ministra não estar de acordo, como, manifestamente, não está, e, tendo uma posição maioritária, a maioria impõe a sua posição, o que não pode é considerar que as posições dos outros são não diferentes da sua mas «incompetentes». Em segundo lugar, Sr.ª Ministra, registamos, para efeitos actuais e futuros, esse seu conceito, invocando a expressão que usei mas diminuindo-a a metade, de «erro objectivo», presumindo eu que o outro erro detectado será subjectivo. Sr.ª Ministra, apenas lhe digo o seguinte: se há responsabilidade do Ministério da Educação, seja ele ocupado por quem for, é a de produzir exames cientificamente indiscutíveis, do ponto de vista da sua qualificação, independentemente de terem 1 ou 1000 perguntas. E o que lhe perguntei foi se usa os seus critérios de exigência, tantas vezes proclamados para dentro do Ministério, relativamente ao sistema de produção dos exames e também dos erros detectados. Não fiquei com a certeza de que V. Ex.ª vá apurar alguma responsabilidade e tenho pena de não ter ficado com essa certeza, seja sobre uma pergunta, sobre duas ou sobre cinco. Finalmente, o que nos distingue, Sr.ª Ministra, não é uma atitude condescendente ou repressiva, como a Sr.ª Ministra quis invocar. Não, Sr. Ministro, é uma coisa muito simples: é que, no fundo, para o vosso Governo, é possível faltar injustificadamente, ultrapassar o limite de faltas injustificadas, ignorar o aviso prévio, ir a uma prova de equivalência, falhar a aprovação e passar de ano. É isto que não é aceitável, Sr.ª Ministra, se quer dar uma mensagem de rigor ao País e à formação nas escolas! Isto não é aceiEsta é, de facto, uma divergência, Sr.ª Ministra! Quanto a estudar a possibilidade de aferir melhor o que seja esse conceito de «falta injustificada», já não está tudo errado naquilo que aqui disse. Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, não considero que tenha ofendido a honra da bancada do CDS-PP, pelo que reafirmo o que disse: os senhores, quando estavam no Governo, não aplicaram aquilo que agora defendem, não conseguiram fazer exames em todos os ciclos de ensino, a todas as disciplinas, como agora defendem. Aliás, devo lembrar que os exames foram introduzidos em Portugal, em 1995/96, por um governo do Partido Socialista. Em relação às outras questões que o Sr. Deputado suscitou, fazemos um esforço diário, quotidiano, para melhorar não apenas a nossa actividade em matéria de exames mas toda a actividade do Ministério da Educação. É isto que lhe garanto! Gostava, pois, de saber, Sr.ª Ministra, se considera que a instabilidade gerada nas escolas, este ano, é um contributo do seu Ministério para o combate à incivilidade e à indisciplina. Por outro lado, gostava também de saber se considera que a desprotecção de milhares de crianças com necessidades educativas especiais foi uma aposta sua nesse sentido, se considera que a forma prepotente como tem tratado os professores é uma estratégia de combate à incivilidade e à indisciplina e se considera que escolas desprotegidas, em termos de técnicos, de psicólogos, de assistentes sociais – e posso dar-lhe alguns exemplos –, são uma forma de prevenir e de combater a dita incivilidade e indisciplina que tanto a parece preocupar, agora, no final deste ano. Gostaria ainda de lhe perguntar se o preço a pagar pela celeridade de processos e de procedimentos, com os quais toda a gente estará, naturalmente, de acordo, é o reforço do poder sancionatório de presidentes de conselhos executivos, com carta branca para suspensão até 10 dias, é a desprotecção perigosa do 56 I SÉRIE — NÚMERO 100 direito de defesa dos alunos, é a desprotecção dos direitos dos encarregados de educação — as suas obrigações são reforçadas mas os seus direitos continuam, por conta do Partido Socialista, claramente desprotegidos — e, finalmente, é ignorar o papel fundamental de um conselho de turma na avaliação destas situações e de directores de turma, que são, como a Sr.ª Ministra bem sabe, «paus para toda a obra», prevenindo e acompanhando mas não tendo, efectivamente, nenhuma capacidade de decisão, o que, aliás, acompanha a pontuação miserável que lhes deu no último concurso para professores titulares e essa sua enorme dificuldade em assumir que este cargo é fundamental na vida das escolas.
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, a senhora não gostava do relatório desenvolvido no âmbito da actividade da Comissão de Educação e passou a gostar. Penso que talvez o tenha lido e, por isso, saberá que parte das suas conclusões se dirigem ao campo da prevenção. Ora, é exactamente sobre o campo da prevenção que lhe quero colocar algumas questões. Quero perguntar-lhe se considera que combater a incivilidade e a indisciplina nas escolas, tal como começa a proposta que aqui traz hoje, assenta na instabilidade que gerou, Sr.ª Ministra. Não sei se me está ouvir… Gostava, pois, de saber, Sr.ª Ministra, se considera que a instabilidade gerada nas escolas, este ano, é um contributo do seu Ministério para o combate à incivilidade e à indisciplina. Por outro lado, gostava também de saber se considera que a desprotecção de milhares de crianças com necessidades educativas especiais foi uma aposta sua nesse sentido, se considera que a forma prepotente como tem tratado os professores é uma estratégia de combate à incivilidade e à indisciplina e se considera que escolas desprotegidas, em termos de técnicos, de psicólogos, de assistentes sociais – e posso dar-lhe alguns exemplos –, são uma forma de prevenir e de combater a dita incivilidade e indisciplina que tanto a parece preocupar, agora, no final deste ano. Gostaria ainda de lhe perguntar se o preço a pagar pela celeridade de processos e de procedimentos, com os quais toda a gente estará, naturalmente, de acordo, é o reforço do poder sancionatório de presidentes de conselhos executivos, com carta branca para suspensão até 10 dias, é a desprotecção perigosa do direito de defesa dos alunos, é a desprotecção dos direitos dos encarregados de educação — as suas obrigações são reforçadas mas os seus direitos continuam, por conta do Partido Socialista, claramente desprotegidos — e, finalmente, é ignorar o papel fundamental de um conselho de turma na avaliação destas situações e de directores de turma, que são, como a Sr.ª Ministra bem sabe, «paus para toda a obra», prevenindo e acompanhando mas não tendo, efectivamente, nenhuma capacidade de decisão, o que, aliás, acompanha a pontuação miserável que lhes deu no último concurso para professores titulares e essa sua enorme dificuldade em assumir que este cargo é fundamental na vida das escolas. Em face desta decisão, V. Ex.ª disse o seguinte: «Não me arrependo rigorosamente nada! Voltava a tomar esta decisão». Sr.ª Ministra,… Leio, leio! Tenho-o aqui! Sr.ª Ministra, gostava de lhe recordar o seguinte: os tribunais são órgãos de soberania. Por isso, gostava que me esclarecesse como é que V. Ex.ª pretende falar aos alunos do ensino básico e secundário sobre disciplina, respeito pela instituição escola e pelos professores se V. Ex.ª dá um tão grande exemplo de desrespeito por um órgão de soberania. Sabe, Sr.ª Ministra, há uma coisa que toda a gente percebe: o exemplo tem de vir de cima! Já agora, que nos acusa de estarmos sempre a falar da vertente da punição, gostava que nos esclarecesse, em concreto, mas em concreto, como é que pretende promover o papel de participação dos pais e das famílias na vertente da prevenção nas escolas. Por outro lado, gostava também que nos dissesse, porque o Estatuto não é claro sobre esta matéria, ou seja, dá-a a entender mas, de facto, não a prevê expressamente, se a comparência do aluno sem material, na aula, implica ou não uma falta, como sanção.
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, já aqui foi referido que o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional a decisão de V. Ex.ª no sentido de ordenar a repetição dos exames de Química e Física, realizados na 1.ª fase do ano passado. Em face desta decisão, V. Ex.ª disse o seguinte: «Não me arrependo rigorosamente nada! Voltava a tomar esta decisão». Sr.ª Ministra,… Leio, leio! Tenho-o aqui! Sr.ª Ministra, gostava de lhe recordar o seguinte: os tribunais são órgãos de soberania. Por isso, gostava que me esclarecesse como é que V. Ex.ª pretende falar aos alunos do ensino básico e secundário sobre disciplina, respeito pela instituição escola e pelos professores se V. Ex.ª dá um tão grande exemplo de desrespeito por um órgão de soberania. Sabe, Sr.ª Ministra, há uma coisa que toda a gente percebe: o exemplo tem de vir de cima! Já agora, que nos acusa de estarmos sempre a falar da vertente da punição, gostava que nos esclarecesse, em concreto, mas em concreto, como é que pretende promover o papel de participação dos pais e das famílias na vertente da prevenção nas escolas. Por outro lado, gostava também que nos dissesse, porque o Estatuto não é claro sobre esta matéria, ou seja, dá-a a entender mas, de facto, não a prevê expressamente, se a comparência do aluno sem material, na aula, implica ou não uma falta, como sanção.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, a sociedade portuguesa tem vindo a sofrer profundas transformações nos últimos anos. Do isolamento de uma sociedade tradicional, profundamente conservadora, passámos a um país de acolhimento, com fronteiras abertas à União Europeia e aos desafios da globalização. Somos, cada vez mais, um país multicultural. Perdeu-se, em grande medida, o papel socializador da família, onde os mais novos aprendiam as normas básicas da civilidade, convivência e conduta. Os quatro pilares proféticos do relatório Delors para a educação no século XXI — aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser — encontram-se reféns das feridas de conflitualidade, indisciplina, agressividade e violência, comprometedoras de uma saudável relação pedagógica e da formação em democracia de cidadãos cultos, solidários e críticos. É consensual na opinião pública que o clima que se vive em muitas das nossas escolas precisa de urgente intervenção. Não é possível ignorar as notícias de episódios de incivilidade crescente e preocupante, de violência inter pares, bullying, de agressividade contra professores e pessoal não docente que têm efeitos nefastos na socialização, na rotina escolar e que perturbam a atmosfera de tranquilidade que o processo educativo exige. E se o estatuto do aluno é, no essencial, uma carta de direitos e deveres, porque estamos a falar de crianças e jovens e do dever de custódia do Estado para com eles, é especial a obrigação que a sociedade tem de chamar os diversos actores à pedra, distribuindo responsabilidades ao Estado, à família, à escola, à comunidade envolvente e aos alunos, salvaguardando o respectivo nível etário. Em educação nunca será de mais investir, até porque no futuro colheremos os seus frutos. Igualmente preocupante é o índice elevado de absentismo nas nossas escolas. A experiência e a investigação dizem — veja-se o relatório do projecto AGIS — que o absentismo é apenas um dos degraus descendentes a caminho do insucesso e do abandono escolares, podendo potenciar percursos de marginalidade, exclusão e delinquência. Sr.ª Ministra, os contributos recebidos de diversas entidades apontam, entre outros aspectos, para a necessidade de se rever as práticas em uso até agora sobre limites de faltas, faltas injustificadas e justificadas, o seu controlo, o tempo e o modo da informação à família. As novas tecnologias, já em uso e algumas escolas, bem como a cooperação de outros elementos e instituições, à semelhança de outros países – a Inglaterra, por exemplo –, podem colaborar, em rede, com a escola na resolução do problema. Qual a perspectiva do Governo sobre esta matéria? Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, finalmente, quem não acredita na escola é V. Ex.ª, e registo-o, porque não considera que as escolas tenham a competência e a capacidade para avaliar a situação de cada caso de indisciplina e aplicar as medidas adequadas. Mas só posso registar a nossa divergência; sobre isso não há nenhum esclarecimento a fazer. Em qualquer caso, considero que é abusivo fazer afirmações do tipo «a Sr.ª Ministra não gostava e agora passou a gostar». Não sei em que factos se baseia para fazer afirmações abusivas. De resto, é também abusivo considerar que este ano se viveu um clima de instabilidade nas escolas, porque aquilo que posso dizer-lhe é que as nossas escolas públicas registaram um aumento de 45 000 alunos, de 500 novos cursos profissionais, um Plano de Acção para a Matemática, um enriquecimento curricular em todas as escolas. Isto passou-se de uma forma tranquila, as aulas de substituição foram generalizadas em todas as escolas e tivemos, de facto, a indisciplina a baixar em todas elas. E a minha preocupação não é nova, tenho-a desde o primeiro dia que cheguei ao Governo. Por isso as aulas de substituição deram um contributo para criar maior tranquilidade nas escolas. Sr. Deputado José Paulo Carvalho, penso que nos deu aqui um excelente exemplo de uma das razões por que devemos alterar esta lei. Refiro-me à pergunta sobre se a comparência do aluno à aula sem material deve ou não ser objecto de uma falta. É justamente o tipo de situação que a lei não deve prever mas que a escola deve conseguir resolver. Tem de ser a escola e o professor, em sala de aula, que avaliam se o aluno tem ou não condições para, apesar de tudo, assistir à aula. Portanto, é um exemplo de como devemos ter menos intervenção do Estado e mais respeito pela autonomia e competência dos professores e das escolas para decidir. Sobre a questão do Tribunal Constitucional, sugiro-lhe que leia as minhas declarações completas e que leia também as decisões desse Tribunal. Compreenderá, se ler essas duas peças, as minhas declarações. Em qualquer caso, gostava de sublinhar de novo, à parte da dimensão jurídica, considerando a dimensão política — e é sempre disso que estou a falar —, que com a minha decisão foi possível resolver a situa58 I SÉRIE — NÚMERO 100 ção de 5000 alunos que estavam impedidos de aceder ao ensino superior. E, portanto, este problema ficou resolvido.
0PS
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo propõe-nos hoje que aprovemos a proposta de lei que altera o Estatuto do Aluno do Ensino Não Superior. Certamente que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, nesta como noutras matérias, irá manifestar o seu habitual e incondicional apoio às propostas do Governo, mesmo quando elas são de todo absurdas ou quando agravam o problema que supostamente deveriam resolver. Os problemas que esta proposta de lei deveria resolver, segundo o seu próprio preâmbulo e conteúdo, são os problemas da incivilidade e da indisciplina nas escolas. Aí está o primeiro resultado da campanha mediática que generaliza a ideia de uma escola violenta e de um ambiente permanentemente hostil, mesmo que isso choque frontalmente com a realidade. Com a ajuda da comunicação social sensacionalista e dos Grupos Parlamentares do PS, do PSD, do CDS-PP e do BE, que apresentaram juntos conclusões sobre o trabalho da Comissão de Educação, sob a forma de projecto de resolução, que dá início a esta deriva autoritária como forma não de resolver o problema mas, sim, de o esconder, o Governo vem agora anunciar-se como empenhado defensor de um ambiente escolar são e disciplinado. No entanto, esta alteração ao Estatuto do Aluno do Ensino Não Superior, que passa agora a chamar-se Estatuto do Aluno do Ensino Básico e Secundário, mais não representa senão o agravamento das medidas de repressão e punição dos estudantes, culpabilizando-os, em última análise, por todas as incapacidades do sistema educativo. Sendo certo que a escola, não existindo isolada da sociedade, não pode deixar de reflectir o ambiente que a rodeia e que esse ambiente social é crescentemente marcado pela degradação das condições de vida dos portugueses, pela acentuação do individualismo e do culto da violência, pela promoção da agressividade como forma de resolução de conflitos e pela manifesta incapacidade do Estado para fazer face à degradação das condições de trabalhos e de estudo na escola pública, o Governo decide agir apenas sobre os sintomas da crise, ignorando as suas causas e escamoteando as suas próprias responsabilidades no seu agravamento. Se o Governo estivesse efectivamente empenhado na procura de soluções para os problemas que afectam as escolas dos ensinos básico e secundário certamente proporia a esta Assembleia que aprovasse uma proposta de lei que assumisse as responsabilidades do Estado perante a escola pública, principalmente no seu financiamento, garantindo a presença quer de técnicos especializados quer de pessoal docente e não docente, o ensino em turmas mais reduzidas, o investimento em espaços e equipamentos adequados ao ensino, seguros e onde a frequência escolar possa ser cada vez mais gratificante e não um sacrifício. Estivesse o Governo verdadeiramente empenhado e agiria de forma directa sobre causas, ao invés de, pela via do regresso ao autoritarismo e a medidas securitárias, agir apenas perante as consequências mais visíveis. O que o Governo se propõe na realidade fazer é criar o quadro legal que coloque nos conselhos executivos, professores e estudantes, toda a responsabilidade de um problema cuja solução deve ser a intervenção vasta e multifacetada no plano político e social. Demitindo-se disso o Estado, resta às escolas procurar os métodos mais expeditos para se livrarem dos estudantes inconvenientes, agravando o elitismo galopante que vai afectando o sistema educativo. O Governo apresenta-nos a separação formal entre medidas correctivas e medidas punitivas, aparentemente, reforçando a preponderância das primeiras, diz-se. Mas quando atentamos às medidas correctivas que o Governo propõe verificamos que entre elas e as medidas punitivas não existe absolutamente nenhuma distinção, sendo que as primeiras não se destinam a corrigir nada mas, sim, a punir. É fácil compreender se olharmos, por exemplo, para as medidas correctivas propostas, que estabelecem a possibilidade de impedimento de acesso a actividades extracurriculares e a equipamentos escolares. Está bem visto, pois claro! Se o aluno desrespeitar o regulamento escolar fica sem acesso à mediateca, à biblioteca, ao computador com internet ou, então, deixa de poder participar — quem sabe? — no clube de poesia ou no clube de teatro. Medidas correctivas, pois, está visto… O Governo apresenta-nos aquilo que mais parece um código de conduta moralista, com uma componente burocrática e formalista acentuada. O Governo pretende criar a escola asséptica, mesmo que isso signifique acentuar as injustiças sociais e a violência fora da escola. Porque se a escola exclui aqueles que sentem mais dificuldades em se lhe adaptarem ela deixa de ter a capacidade de agir sobre a sociedade, passando a estar isolada dela. É inaceitável o papel subalterno atribuído ao conselho disciplinar de turma, colocando o presidente do conselho executivo na figura do director, que concentra todos os poderes disciplinares, fazendo lembrar os tempos do reitor de liceu, que concentrava nas suas mãos o poder de julgar e de punir. O Governo assume como resposta a um problema social com expressão escolar o reforço da via autoritária, remetendo para os regulamentos escolares a definição de um conjunto muito significativo de regras que condicionarão em cada escola a aplicação do diploma. A proposta de lei do Governo remete para um documento que desconhece, e que cabe a cada escola aprovar, a definição da aplicação da lei, mas estabelece claramente as penas e as medidas correctivas — como lhe chama — que podem ser aplicas e perante quais casos. Acresce o facto de os regulamentos internos estarem muitas vezes repletos de ilegalidades e de inconstitucionalidades, sem que sobre eles o Governo sequer se pronuncie, submetendo centenas de estudantes a normas completamente antidemocráticas, autoritárias e contrárias à lei. Atribuir a esses regulamentos o poder de estabelecer a aplicabilidade das sanções predefinidas, previstas nesta lei, é permitir que o autoritarismo latente em muitas escolas adquira cobertura de lei. Ao mesmo tempo, e no extremo oposto, é impedir que a escola possa ter soluções distintas e mais adequadas a cada caso, estabelecendo desde já as sanções. É curioso, no entanto, verificar que, mesmo em relação ao trabalho da Comissão Parlamentar de Educação, o Governo prefere ignorar a maioria das conclusões, passando a actuar somente sobre aquelas que lhe interessam. O Grupo Parlamentar do PCP desafia o Governo a chamar a si as suas responsabilidades e a investir na educação, no plano humano e no plano material, capacitando a escola pública dos meios para fazer frente aos problemas com que se vai cruzando; a dignificar a carreira do professor e a muni-lo dos instrumentos pedagógicos e de apoio necessários ao cumprimento da sua missão, incluindo também a resolução dos problemas da indisciplina, que o PCP não subestima. Os professores e os estudantes, as famílias, podem contar com o contributo do PCP para ajudar na resolução do problema da indisciplina, da incivilidade e mesmo da violência escolar, mas na perspectiva da sua erradicação, nunca entendendo um jovem estudante como um intratável e irrecuperável criminoso, incluindo em vez de excluir. Nessa linha política de humanismo, o PCP apresentou um projecto de resolução nesta Assembleia. Ao contrário, o Governo recusa-se sistematicamente a reconhecer a realidade e, para não destoar da sua linha política, também aqui se disfarça de «esquerda moderna» e se revela um exímio intérprete do papel da mais reaccionária e velha direita. A velha direita travestida de moderna esquerda.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a discutir a proposta de lei do Governo sobre o estatuto do aluno e podemos, e devemos, interrogar-nos sobre o porquê do aparecimento desta proposta após quase dois anos e meio de Governo socialista. A resposta, que todos sabemos, corresponde, infelizmente, a uma verdade que todos sentimos: há hoje menos segurança, menos disciplina, há hoje mais violência e mais indisciplina nas escolas portuguesas. Esta causa, que é exterior à escola, tem efeitos claros no interior da mesma. Será possível, com famílias mais pobres, mais disfuncionais, mais desajustadas e mais excluídas, não ter comunidades mais violentas? Será que com o desemprego a atingir centenas de milhares de agregados familiares e com o sustento mínimo a faltar em tantas casas, o desespero não descambe em comportamentos tantas vezes reprováveis? Será que esta crise de valores culturais que gera miséria e violência na família, em casa, na rua, na comunidade e na sociedade em geral, que é o espaço onde as crianças e jovens crescem e constroem a sua personalidade, não tem consequências dramáticas a nível psicológico, afectando a construção da sua personalidade? É evidente que sim! Casas onde vivem crianças sem meios, sem valores mínimos de crescimento e convivência, com pais ou encarregados de educação sem valores para transmitir geram crianças psicologicamente problemáticas. Tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, numa relação de causa e efeito, se reflecte no seu comportamento na hora de entrar para a escola. Não vale a pena «enterrar a cabeça na areia», não adianta atirar para o lado: o País está mais violento, o País está menos seguro, e essa é uma das causas de termos também hoje uma escola menos segura, uma escola mais indisciplinada. E dois anos e meio deste Governo levam-nos a responsabilizá-lo por este estado de coisas, que tem que ver com políticas erradas, e por uma governação que a nível social vai criando cada vez mais guetos, principalmente nos subúrbios das nossas maiores cidades. Perante este estado social de muitas comunidades, com reflexos evidentes no ambiente escolar, criando dificuldades a profissionais, docentes e não docentes, empenhados nos projectos educativos das suas escolas, que fez o Governo, mais concretamente o Ministério da Educação, nestes dois anos e meio? E entramos no segundo motivo gerador de instabilidade na escola. A troco da implementação de medidas pontuais, algumas delas positivas, o Governo elegeu como causa dos males da escola os professores. O Governo, em vez de motivar e acarinhar uma classe que é fundamental ao êxito do processo educativo e que era essencial manter mobilizada e motivada para minimizar as dificuldades evidentes que hoje se deparam à escola, hostilizou-a. O Governo e o Ministério da Educação optaram, para justificar medidas mais impopulares que tomaram, por eleger os professores como os «bodes expiatórios». E fê-lo de forma desastrada, premeditada e pública! Este ataque generalizado só podia ter como consequência a sua perda de autoridade nas salas de aula e nas escolas. Daí ao insulto e à indisciplina dentro e fora da escola e ao agravar permanente das situações comportamentais foi um passo curto. O Governo, com esta atitude infeliz, deu força à indisciplina e à violência. É, pois, neste contexto que aparece agora a proposta de lei n.º 140/X, apresentada pelo Governo, que só se justifica por políticas sociais incorrectas e por políticas de cariz administrativo absolutamente infelizes quer na sua abordagem quer nos métodos utilizados. Esta proposta de lei é, pois, um remendo e nunca será um remédio! É alicerçado no excelente trabalho da Comissão de Educação e na audição sobre violência escolar, de que o Ministério da Educação se alheou mas de que andou a reboque, que o PSD votará favoravelmente, na generalidade, esta proposta de lei, na esperança de que, na especialidade, ela possa ser melhorada e que a maioria e o Governo terão essa abertura. Reafirmamos, contudo, que esta lei não é remédio para a violência que grassa nalgumas escolas localizadas principalmente nas áreas urbanas e suburbanas do nosso país nem para o acentuar geral de problemas de indisciplina. O Governo convence-se de que decretando o fim de um fenómeno pela simples alteração de alguns artigos do estatuto do aluno, como nos propõe, resolve todos os problemas. Nada mais errado! O problema não se resolve com alterações avulsas, de cariz mais ou menos securitário. Não podemos esquecer que o objectivo último de qualquer projecto educativo são os alunos. Daí que, na temática que hoje abordamos, o Estado, mais do que impor normas securitárias, deve assumir a missão de integração de todos os alunos, nomeadamente reforçando os serviços de orientação e de apoio psicológico. Sr. Presidente, Srs. Deputados: É na base que o problema tem de ser atacado, e o Estado nada poderá sem apoiar uma parceria alargada onde o poder local, as instituições da rede social, a rede pública descentralizada da segurança social e do emprego e as comissões de protecção de crianças e jovens terão um papel basilar. É aqui, na raiz, que as causas motivadoras de violência têm que ser combatidas. A participação efectiva da comunidade envolvente nas actividades da escola e na própria gestão da escola permitirá uma melhor identificação dos problemas e, seguramente, soluções mais adequadas. Entende o PSD que nesta interacção ampla e partilhada no órgão da escola onde existe maior democracia participativa, como é a assembleia de escola, poderão existir outras soluções para a resolução dos problemas de gestão das escolas, ciente de que a escola exige profissionais preparados, que sejam capazes do exercício da gestão, da autonomia, da autoridade e da responsabilização de todos os agentes que nela participam — alunos, docentes, não docentes, pais e encarregados de educação. É uma proposta que fazemos em coerência com as posições que sempre assumimos, nomeadamente através do nosso projecto de lei sobre a gestão das escolas dos ensinos básico e secundário e dos programas Mais Sucesso e Mais Inclusão, que mais não visavam do que criar respostas integradas para as necessidades da escola, para as necessidades dos jovens. Estas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Educação, são reformas importantes que só podem concretizar-se mobilizando a comunidade educativa. E é isto que a Sr.ª Ministra tem sido incapaz de fazer, ou seja, congregar e mobilizar toda a comunidade escolar. Essa foi uma pequena referência que a Sr.ª Ministra se esqueceu de fazer. Mas é também uma escola em que existe disciplina e esta é, com certeza, uma matéria extraordinariamente importante. Sobre a proposta de lei que aqui estamos a discutir, deixa o CDS-PP o seu «caderno de encargos», as suas ideias, desde já, desde o primeiro momento de discussão. Consideramos que há matérias que ainda hoje estão incluídas neste Estatuto e que podem ser remetidas para o regulamento interno da escola. Consideramos que é essencial uma ideia de mais responsabilidade para os pais em trabalho comunitário na escola e, muitas vezes, nas actividades que são atribuídas no âmbito de um processo de natureza disciplinar. Consideramos essencial mudar aquilo que está determinado nos artigos 26.º e 27.º, no sentido de as normas serem mais simples e de, com alguma probabilidade, remeterem algumas das suas matérias para o regulamento interno das escolas. Consideramos essencial que se estabeleça um princípio de contratos dos pais com as escolas, que podem ser assinados com as escolas que têm autonomia e no início do ano lectivo, para que os pais assumam a sua responsabilidade também na assiduidade dos filhos na actividade escolar — assim acontece, por exemplo, no sistema inglês. Propomos, evidentemente, a revogação daquilo que nos foi proposto quanto ao artigo 22.º e às provas para os alunos que têm faltas injustificadas. Deixamos, desde já, muito claro, ao Governo, à maioria do Partido Socialista, as nossas ideias fundamentais, porque aquilo que queremos é muito simples: é uma escola mais organizada, uma escola com mais valores e, evidentemente, uma escola onde reine a disciplina. O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
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Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Para que fica muito claro, a escola que o CDS defende é uma escola onde há autonomia, onde existe a ideia de prémio ao mérito, ao trabalho, em que aí os exames têm um papel. E deixe-me, desde já, fazer-lhe uma pequeníssima correcção, Sr.ª Ministra: não tivesse sido o governo em que participou o CDS-PP e, a esta altura, apenas tínhamos exames no 12.º ano. Essa foi uma pequena referência que a Sr.ª Ministra se esqueceu de fazer. Mas é também uma escola em que existe disciplina e esta é, com certeza, uma matéria extraordinariamente importante. Sobre a proposta de lei que aqui estamos a discutir, deixa o CDS-PP o seu «caderno de encargos», as suas ideias, desde já, desde o primeiro momento de discussão. Consideramos que há matérias que ainda hoje estão incluídas neste Estatuto e que podem ser remetidas para o regulamento interno da escola. Consideramos que é essencial uma ideia de mais responsabilidade para os pais em trabalho comunitário na escola e, muitas vezes, nas actividades que são atribuídas no âmbito de um processo de natureza disciplinar. Consideramos essencial mudar aquilo que está determinado nos artigos 26.º e 27.º, no sentido de as normas serem mais simples e de, com alguma probabilidade, remeterem algumas das suas matérias para o regulamento interno das escolas. Consideramos essencial que se estabeleça um princípio de contratos dos pais com as escolas, que podem ser assinados com as escolas que têm autonomia e no início do ano lectivo, para que os pais assumam a sua responsabilidade também na assiduidade dos filhos na actividade escolar — assim acontece, por exemplo, no sistema inglês. Propomos, evidentemente, a revogação daquilo que nos foi proposto quanto ao artigo 22.º e às provas para os alunos que têm faltas injustificadas. Deixamos, desde já, muito claro, ao Governo, à maioria do Partido Socialista, as nossas ideias fundamentais, porque aquilo que queremos é muito simples: é uma escola mais organizada, uma escola com mais valores e, evidentemente, uma escola onde reine a disciplina. O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra da Educação: O frenesim com que o Ministério quer fazer passar as alterações ao Estatuto do Aluno, indo muito mais longe do que foi o PSD, merece ser entendido. O silêncio que, mais uma vez, protegeu o Governo em medidas que são de fundo e o desprezo pelo debate com os pares merece ser entendido. Tem o Ministério estudos que comprovem as limitações do quadro legal criado pela Lei n.º 30/2002? Não tem! Tem números reveladores de que a indisciplina nas escolas está descontrolada e a ganhar proporções dramáticas? Não tem! Está em condições de assumir a fatia da indisciplina que cabe à falta de condições nas escolas, nomeadamente o elevado número de alunos por turma? Não está! Então, estas alterações feitas à pressa servem para quê? São uma espécie de «bodo aos pobres» em final de ano lectivo, uma espécie de «baile de finalistas». A autoridade dos professores, Sr.ª Ministra, não se valoriza por decreto. Anunciando simplificar procedimentos, apertar o controlo da assiduidade e co-responsabilizar todos os adultos pela controlo da indisciplina, as propostas em debate resvalam sorrateiramente para terrenos movediços e para o reforço acriterioso do poder e das medidas sancionatórias. E, assim, ao abrigo destas alterações, os direitos dos alunos e dos seus encarregados de educação encontram-se perigosamente desprotegidos. Vejamos: na aplicação da suspensão até 10 dias os pais são ouvidos «quando possível»; para efeitos do direito de defesa, o aluno tem dois dias úteis — que sentido é que isto faz? — para alegar por escrito o que for conveniente. Por outro lado, o que aqui pesa realmente é as «mãos soltas» de presidentes de conselhos executivos e o que aqui se decide é que as penas de suspensão e de transferência passam a ser aplicadas a crianças com idades inferiores a 10 anos; é que os conselhos de turma deixam de ter de ser ouvidos; é que as faltas resultantes da suspensão podem ainda implicar a reprovação do aluno — dupla penalização (e tudo isto dependente das escolas); é que a transferência de escola deixa de estar protegida, como se encontra no quadro legal em vigor; e é que os directores de turma, agentes de eleição em todas as dimensões relacionais da escola, alunos, conselhos executivos, turma, família, fazem tudo para prevenir e acompanhar a sanção mas não têm, de facto, qualquer capacidade de decisão. A verdade, Sr.ª Ministra, é que, tal como o último concurso para professor titular demonstrou, este Ministério recusa reconhecer a direcção de turma como o pilar na vida das escolas. Se o Governo estivesse preocupado com os direitos das famílias salvaguardaria, por exemplo, os direitos dos pais e das mães a poderem acompanhar a vida escolar dos seus filhos. Se a prevenção fosse mais forte do que a punição, reconhecer-se-ia que, sem psicólogos, sem animadores, sem assistentes sociais, a escola não tem as condições que merece e deve ter para prevenir e enfrentar os problemas. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra: Num ano em que as medidas deste Ministério da Educação fizeram pela qualidade e tranquilidade da vida nas escolas muito pouco, a política é, então, de prevenção zero e sanção máxima.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os fenómenos sociais são cada vez mais complexos nas sociedades modernas e o seu reflexo nos comportamentos e atitudes dos alunos, seja na relação com os professores, com os outros discentes ou com os restantes membros da comunidade educativa, é uma realidade no quotidiano da vida escolar. À escola são atribuídas uma multiplicidade de tarefas. Para além da transmissão de conhecimentos e da aquisição de competências — o saber e o saber fazer —, a escola contribui, de igual modo, para o desenvolvimento global das crianças e jovens em áreas transversais de competências pessoais, sociais e humanas — o saber ser. Este é um direito fundamental consignado na Constituição da República Portuguesa, que atribui à escola «o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, da compreensão mútua, da solidariedade e da responsabilidade». A heterogeneidade da sociedade e a massificação do ensino trouxeram uma nova realidade às escolas. O desequilíbrio que se tem vindo a acentuar entre direitos e deveres degradam o clima de convivência escolar, perturbam a ordem e a tranquilidade das aulas, desvalorizam a escola como espaço de transmissão de saberes e são factores de insucesso escolar. A lei actualmente em vigor já não responde ao essencial do seu propósito: contribuir para melhorar o ambiente escolar, combater os efeitos nocivos da indisciplina e do absentismo e manter a autoridade do professor. Esta mudança é reclamada pelos professores, esperada pelos pais e necessária para os alunos. A proposta de lei apresentada pelo Governo, independentemente dos argumentos e de todos os pareceres e análises aqui trazidos, revela, mais uma vez, uma marca incontornável do PS. Esta proposta de lei é concisa, reforça a autoridade dos professores e a autonomia dos conselhos executivos, simplifica os procedimentos nos processos de índole disciplinar, reduz o tempo entre a ocorrência e a decisão, logo, aumenta a eficiência das medidas aplicadas e a responsabilidade de todos os intervenientes. Sr.as e Srs. Deputados, os valores, a cultura de escola e o padrão de relacionamento interpessoal que esta promove têm um papel preponderante na aprendizagem dos jovens, para que se tornem cidadãos livres, responsáveis e autónomos. Assim, o reconhecimento da liderança do professor e o reforço da sua autoridade são factores essenciais para fortalecer a confiança na sua acção. E é evidente que essa confiança não vem por decreto, mas, se ela é possível, se confiamos ao professor as aulas, o ensinar as nossas crianças, também com certeza que lhe confiamos, com igual pertinência, a construção de cidadãos mais livres e mais solidários. Por outro lado, o regulamento interno tem de ser um referencial claro, seguro e adequado à comunidade escolar, onde todos se possam rever. Nesse sentido, é imprescindível a participação de todos os intervenientes da comunidade escolar e é nessa regra de convivência escolar que todos têm de se vincular aos princípios que eles próprios vão definir no exercício permanente de cidadania. A descentralização é, portanto, o caminho da construção da autonomia da escola. Esta é a estratégia definida pelo Partido Socialista. A simplificação dos procedimentos formais na aplicação das medidas de índole disciplinar presentes na proposta de lei não só ajuda a combater uma cultura instalada de impunidade como atribui maior responsabilidade a todos os intervenientes no processo educativo, a par do aumento da capacidade de decisão disciplinar dos conselhos executivos. A desburocratização vem permitir ganhar eficiência e libertar os professores para o essencial da sua missão: os alunos. A escola não pode estar sozinha no processo de educação e formação das crianças e jovens e é hoje consensual que a primeira responsabilidade educativa é da família. A cooperação entre esta e a escola tem de ser uma realidade afirmada dia-a-dia na construção do percurso educativo das novas gerações. Este é o caminho da valorização do papel da escola na nossa sociedade. Os saberes e as aprendizagens são fundamentais ao desenvolvimento pessoal e social e constituem-se como factores essenciais para a inclusão social e para se ser um cidadão de corpo inteiro. Aumentar os níveis de escolaridade da população portuguesa e, ao mesmo tempo, reduzir o absentismo e o abandono escolar é uma das apostas mais ambiciosas do programa do Partido Socialista. É, portanto, necessário prevenir o incumprimento do dever de frequência da escola, através da responsabilização das famílias no acompanhamento dos seus educandos, de modo a garantir o direito à educação consagrado na Constituição. Sr.as e Srs. Deputados, porque há novas realidades que não podem ser ignoradas e exigem novas respostas e novas abordagens, nomeadamente na área da prevenção, o trabalho em rede é fundamental, não só com o apoio de todos os recursos existentes na escola como também das várias entidades e instituições da comunidade, como a autarquia, os serviços sociais, a comissão de protecção de crianças e jovens, entre outros. A acção preventiva, ao ser articulada e sustentada nos vários parceiros sociais, é mais abrangente e pode garantir uma intervenção nos factores que, estando fora da escola, se reflectem nela e comprometem não só o futuro dos nossos jovens mas o futuro de todos nós, o futuro do nosso país. É em nome desse futuro que o PS quer a melhor escola para todos. É em nome desse futuro que queremos uma escola à altura dos desafios dos novos tempos. Naturalmente, é necessário reforçar o papel do professor, dando-lhe meios e condições para trabalhar, respeitando-o e à escola, na certeza, porém, de que os alunos não são menos merecedores de respeito não só enquanto principiais destinatários do processo educativo, não só enquanto crianças e jovens em formação de personalidade e em pleno processo de socialização e educação, não só enquanto pessoas em crescimento com as suas especificidades muito próprias, mas, essencialmente, enquanto titulares do direito à educação, a frequentar a escola, a aprender, mas também do direito a exprimir livremente o seu pensamento, a defender as suas ideias e, até, ao protesto e à reivindicação dos seus direitos, naturalmente num clima de mútuo respeito entre todos os actores da comunidade escolar, pois a todos é devido igualmente respeito. Em todo este processo, o papel do professor é fundamental, intervindo de um modo pedagógico em relação às situações de indisciplina dentro da sala de aula, mas sem dispensar o papel do director de turma e do conselho de turma. Não se pode concordar, no entanto, com o paradigma de empurrar para o professor, em exclusivo, a responsabilidade pela indisciplina existente ou a incapacidade para melhorar o âmbito educativo, mormente quando a este se pede um número de tarefas cada vez maior e quando, muitas vezes, estas nada têm de pedagógico. Da mesma forma, é desejável que os pais sejam estimulados no papel de acompanhamento dos seus filhos no seu percurso escolar, a participar na escola. As associações de pais e os encarregados de educação que nelas participam devem gozar de condições essenciais para o fazer, o que, infelizmente, hoje não acontece na sua plenitude. Infelizmente, a proposta de lei que o Governo hoje nos traz não responde ao que é essencial, ou seja, a realidade socioeconómica, agravada pelas políticas anti-sociais deste Governo e pela recusa em dotar as 29 DE JUNHO DE 2007 65 escolas das condições fundamentais para responder à sua missão. Em vez disso, o Governo limita-se a «muscular» sanções, a agilizar processos punitivos, a diminuir a participação e a transparência dos processos decisórios e a diminuir o legítimo direito de defesa dos visados. Uma escola não é, nunca será, não deve ser um tribunal nem os professores polícias ou oficiais de justiça. Recusamos confundir os mecanismos de assiduidade com os de aproveitamento escolar e não concordamos com o modelo de afastamento do director de turma do conselho de turma das actuais competências. Escandaloso, porém, é que, no conjunto de medidas sancionatórias, se opera uma separação, não conseguida, entre as medidas ditas «correctivas», entre as quais se inclui a inibição do acesso a actividades extracurriculares — como se estas não fossem um factor importantíssimo de motivação para uma vivência saudável na escola e para auxiliar à integração e prevenir problemas! —, e as medidas disciplinares ditas «duras». A realidade é que este Governo não aprendeu a lição através dos muitos sinais que tem vindo a ter, inclusivamente, através de um projecto de resolução que, apesar do Partido Ecologista «Os Verdes», não concordando na sua totalidade, não o ter assinado, continha outras vias que este Ministério da Educação se recusou a prosseguir. Naturalmente que o Partido Ecologista «Os Verdes» não se revê no diploma do Governo. Consideramos que o Governo vai por um mau caminho e toma como prioridade aquilo que não é prioridade, deixando por fazer aquilo que seria fundamental. Nesse sentido, esta proposta de lei não merece a nossa concordância.
0PS
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Partido Ecologista «Os Verdes» não embarca nos processos daqueles que gostariam de fazer da indisciplina e da violência escolar uma marca indelével de todo o universo escolar educativo em Portugal. Não quero dizer com isto que neguemos — penso que ninguém nega — a existência de situações de indisciplina dentro das escolas e, até, das salas de aula, tal como se sabe que existem também, infelizmente, situações ou episódios de violência dentro das escolas que afectam o seu dia-a-dia, que prejudicam a sua missão fundamental, que atingem os elementos de toda a comunidade escolar, alunos e professores, mas também funcionários, técnicos e, por vezes, pais. Com efeito, a escola reflecte todo o universo social em que se insere e para dentro dela é transportado o que de melhor, mas também o que de pior existe fora dela. É normal — e os professores sabem-no melhor do que ninguém — que os problemas individuais dos alunos, as dificuldades socioeconómicas de integração ou de exclusão de que padecem os mesmos e as suas famílias sejam uma condicionante real do processo educativo, em primeiro lugar e sobretudo para os próprios, mas também para os seus colegas, para o funcionamento das turmas e da escola, que muitas vezes não está, de facto, em condições de dar resposta à realidade e à multiplicidade e heterogeneidade de situações, quantas vezes por falta, sem dúvida, de meios materiais, mas, mais importante, porventura, de pessoal docente e não docente, de psicólogos, de técnicos de apoio social, entre turmas com excesso de alunos e professores com excesso de turmas. A redução do número de professores operada por este Governo nas escolas portuguesas e da qual o mesmo se orgulha e apregoa como um sinal de sucesso da sua política educativa — redução essa que atingiu, inclusivamente, os próprios professores de apoio educativo —, o encerramento de escolas e concentração de alunos em escolas e turmas de acolhimento muitas vezes sem condições, a obrigatoriedade de permanência dos alunos na escola por excesso de tempo e nem sempre ocupados nas melhores condições físicas e pedagógicas, a falta de respeito que este Ministério da Educação tem demonstrado pelos professores, desautorizando-os em primeira linha, naturalmente não vem ajudar a situação nem contribuir para reduzir os casos de indisciplina, que todos desejaríamos debelar. Naturalmente, é necessário reforçar o papel do professor, dando-lhe meios e condições para trabalhar, respeitando-o e à escola, na certeza, porém, de que os alunos não são menos merecedores de respeito não só enquanto principiais destinatários do processo educativo, não só enquanto crianças e jovens em formação de personalidade e em pleno processo de socialização e educação, não só enquanto pessoas em crescimento com as suas especificidades muito próprias, mas, essencialmente, enquanto titulares do direito à educação, a frequentar a escola, a aprender, mas também do direito a exprimir livremente o seu pensamento, a defender as suas ideias e, até, ao protesto e à reivindicação dos seus direitos, naturalmente num clima de mútuo respeito entre todos os actores da comunidade escolar, pois a todos é devido igualmente respeito. Em todo este processo, o papel do professor é fundamental, intervindo de um modo pedagógico em relação às situações de indisciplina dentro da sala de aula, mas sem dispensar o papel do director de turma e do conselho de turma. Não se pode concordar, no entanto, com o paradigma de empurrar para o professor, em exclusivo, a responsabilidade pela indisciplina existente ou a incapacidade para melhorar o âmbito educativo, mormente quando a este se pede um número de tarefas cada vez maior e quando, muitas vezes, estas nada têm de pedagógico. Da mesma forma, é desejável que os pais sejam estimulados no papel de acompanhamento dos seus filhos no seu percurso escolar, a participar na escola. As associações de pais e os encarregados de educação que nelas participam devem gozar de condições essenciais para o fazer, o que, infelizmente, hoje não acontece na sua plenitude. Infelizmente, a proposta de lei que o Governo hoje nos traz não responde ao que é essencial, ou seja, a realidade socioeconómica, agravada pelas políticas anti-sociais deste Governo e pela recusa em dotar as escolas das condições fundamentais para responder à sua missão. Em vez disso, o Governo limita-se a «muscular» sanções, a agilizar processos punitivos, a diminuir a participação e a transparência dos processos decisórios e a diminuir o legítimo direito de defesa dos visados. Uma escola não é, nunca será, não deve ser um tribunal nem os professores polícias ou oficiais de justiça. Recusamos confundir os mecanismos de assiduidade com os de aproveitamento escolar e não concordamos com o modelo de afastamento do director de turma do conselho de turma das actuais competências. Escandaloso, porém, é que, no conjunto de medidas sancionatórias, se opera uma separação, não conseguida, entre as medidas ditas «correctivas», entre as quais se inclui a inibição do acesso a actividades extracurriculares — como se estas não fossem um factor importantíssimo de motivação para uma vivência saudável na escola e para auxiliar à integração e prevenir problemas! —, e as medidas disciplinares ditas «duras». A realidade é que este Governo não aprendeu a lição através dos muitos sinais que tem vindo a ter, inclusivamente, através de um projecto de resolução que, apesar do Partido Ecologista «Os Verdes», não concordando na sua totalidade, não o ter assinado, continha outras vias que este Ministério da Educação se recusou a prosseguir. Naturalmente que o Partido Ecologista «Os Verdes» não se revê no diploma do Governo. Consideramos que o Governo vai por um mau caminho e toma como prioridade aquilo que não é prioridade, deixando por fazer aquilo que seria fundamental. Nesse sentido, esta proposta de lei não merece a nossa concordância. … e promovendo, com isso, verdadeiramente, uma melhoria da contribuição para o processo educativo de todos os alunos envolvidos. Neste sentido, estamos abertos a que a proposta possa ser objecto de melhorias em sede do trabalho de especialidade, sendo certo, naturalmente, que respeitando os princípios que acabei de enunciar e que a Sr.ª Ministra explicitou na intervenção inicial deste debate. É isso que esperamos.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com este pedido de autorização legislativa, o Governo pretende alterar dos actuais 60 para 65 anos os limites da idade de exercício de funções dos pilotos comandantes e co-pilotos. O Governo sustenta a sua proposta de lei em estudos feitos por vários países e em recomendações de organizações internacionais responsáveis pela aviação civil, designadamente a ICAO. No entanto, a ICAO, Organização da Aviação Civil Internacional, ao permitir que os pilotos possam trabalhar até aos 65 anos, impõe duas condições: médicas, que passam por exames médicos adicionais aos pilotos situados na faixa etária entre os 60 e os 65 anos, e operacionais, exigindo que o piloto que atinja os 60 anos só possa voar integrado em tripulações múltiplas e desde que o outro piloto tenha idade inferior a 60 anos. Percebe-se o alcance destes cuidados, tendo em conta os riscos que podem decorrer para a segurança dos passageiros e aeronaves, se surgir qualquer situação que condicione a plenitude das capacidades físicas, técnicas e psíquicas dos pilotos. Refira-se que, formalmente, aquelas exigências da ICAO estão reflectidas no projecto de decreto-lei que o Governo anexa ao seu pedido de autorização legislativa. Também registamos a criação de uma comissão de acompanhamento — composta por representantes das principais entidades do sector — para acompanhar e avaliar o impacto do alargamento do limite de idade dos pilotos abrangidos pelo referido diploma, esperando-se que essa comissão cumpra, de facto, a sua missão e não fique apenas pelo papel. Mas falta uma peça fundamental que reputamos do maior interesse para podermos avaliar devidamente esta iniciativa do Governo. Referimo-nos às respostas que, no quadro do regime geral da segurança social, vão ser dadas, ou não, a estes profissionais nesta nova situação. Importa saber, por exemplo, se razões ponderosas os obrigarem a cessar a sua actividade antes dos 65 anos, se vão beneficiar da sua pensão normal ou se, pelo contrário, vão ser penalizados e em que termos. É que, se o regime geral da segurança social for aplicado de forma simplista a estes profissionais, a necessidade de evitar pesadas penalizações na pensão pode levar a prolongar a actividade em condições de risco para a segurança. E o factor segurança, como sabemos, é o bem mais precioso do transporte aéreo. Por isso, Sr. Presidente, é necessário que o Governo tenha sensibilidade para este problema e que, em diálogo construtivo com os representantes dos pilotos — Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil e Associação Portuguesa de Pilotos de Linha Aérea —, encontre os termos adequados e justos para o diploma que tem de regular as condições de acesso à pensão de invalidez e de velhice dos pilotos comandantes e copilotos. O PSD vai dar o seu apoio a esta proposta do Governo, mas esperamos, como referi, que o diploma complementar respeitante à segurança social não seja afectado pelos tiques de autoritarismo que têm caracterizado o Governo e que, pelo contrário, seja participado pelas organizações dos pilotos e seja conduzido com bom senso e sentido de responsabilidade. Está em causa um problema de segurança do transporte aéreo, está em causa o respeito 50 I SÉRIE — NÚMERO 103 pela saúde e a própria dignidade destes profissionais, mas está também em causa a seriedade e a honestidade política na forma como o Governo conduz este processo. O Governo pretende justificar esta medida com «alterações sociais importantes» — e lá vem essa espécie de imposto sobre o aumento da esperança média de vida. Mas nem uma palavra se diz quanto às profundas mudanças verificadas na aviação civil: mais horas de voo com menos tempo de repouso, a maiores altitudes, com maior exposição a maiores radiações, mais variações climatéricas, de pressão atmosférica, com baixos níveis de oxigenação. O Governo chega ao ponto de afirmar que o desgaste fisiológico da idade é pouco nítido, porque é compensado pelo treino e pela experiência acumulada! E invoca estudos que, supostamente, demonstram não existir qualquer diferença entre o risco de acidente em pilotos entre os 60 e os 65 anos e os outros grupos etários. Aqui, voltamos à velha história dos estudos que servem objectivos. Note-se que o Governo ignorou o estudo internacional da Flight Safety Foundation, que concluiu ocorrer entre os 55 e os 65 anos a morte de 60% dos pilotos. Não venha o Governo falar em esperança de vida, e muito menos nos exames médicos semestrais, porque isso já hoje acontece para os pilotos a partir dos 40 anos! É a própria IFALPA (Federação Internacional das Associações de Pilotos de Linha Aérea) que afirma que a partir das 10 000 horas de voo está adquirido o nível máximo de desempenho do piloto. Sabemos que o Governo se baseou num estudo do Instituto Nacional de Aviação Civil, que apresenta uma base de incidência de 7060 pilotos portugueses. Mas nem que se juntassem todos os pilotos de linha aérea desde os primórdios da aviação civil em Portugal se teria um número destes! Isto é o resultado de juntar todos os processos médicos de forma indiscriminada, misturando o que é incomparável e confundindo causas e realidades. Não é sério trabalhar numa base destas.
4PSD
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nestes 3 minutos que temos para intervir, começamos por considerar lamentável que esta medida que o Governo pretende adoptar, do aumento da idade limite para as funções de piloto de linha aérea, esteja a ser tratada desta maneira, com uma simples autorização legislativa, com um debate «relâmpago», passando o processo a grande velocidade para o sossego dos gabinetes ministeriais. Estamos perante uma opção injusta e perigosa, que decorre de um processo, no mínimo, pouco transparente e de uma fundamentação técnica, no mínimo, de duvidosa credibilidade. Esta proposta do Governo diz respeito à «permissão» para um piloto de linha aérea poder exercer a sua profissão depois dos 60 anos. Mas o que não foi dito é que o Governo tem na calha uma outra proposta, que visa instaurar a «obrigação» de exercer funções, aumentando a idade de reforma destes pilotos. Essa proposta está em preparação, embora tenha sido convenientemente deixada para depois, e ainda não deu entrada na Assembleia! Está em causa um problema de segurança do transporte aéreo, está em causa o respeito pela saúde e a própria dignidade destes profissionais, mas está também em causa a seriedade e a honestidade política na forma como o Governo conduz este processo. O Governo pretende justificar esta medida com «alterações sociais importantes» — e lá vem essa espécie de imposto sobre o aumento da esperança média de vida. Mas nem uma palavra se diz quanto às profundas mudanças verificadas na aviação civil: mais horas de voo com menos tempo de repouso, a maiores altitudes, com maior exposição a maiores radiações, mais variações climatéricas, de pressão atmosférica, com baixos níveis de oxigenação. O Governo chega ao ponto de afirmar que o desgaste fisiológico da idade é pouco nítido, porque é compensado pelo treino e pela experiência acumulada! E invoca estudos que, supostamente, demonstram não existir qualquer diferença entre o risco de acidente em pilotos entre os 60 e os 65 anos e os outros grupos etários. Aqui, voltamos à velha história dos estudos que servem objectivos. Note-se que o Governo ignorou o estudo internacional da Flight Safety Foundation, que concluiu ocorrer entre os 55 e os 65 anos a morte de 60% dos pilotos. Não venha o Governo falar em esperança de vida, e muito menos nos exames médicos semestrais, porque isso já hoje acontece para os pilotos a partir dos 40 anos! É a própria IFALPA (Federação Internacional das Associações de Pilotos de Linha Aérea) que afirma que a partir das 10 000 horas de voo está adquirido o nível máximo de desempenho do piloto. Sabemos que o Governo se baseou num estudo do Instituto Nacional de Aviação Civil, que apresenta uma base de incidência de 7060 pilotos portugueses. Mas nem que se juntassem todos os pilotos de linha aérea desde os primórdios da aviação civil em Portugal se teria um número destes! Isto é o resultado de juntar todos os processos médicos de forma indiscriminada, misturando o que é incomparável e confundindo causas e realidades. Não é sério trabalhar numa base destas. Como também não é sério apresentar esta medida como uma «inevitabilidade» face ao que vem das organizações internacionais. Até porque o Estado português teve uma palavra a dizer neste debate, no quadro da ICAO. E, embora as estruturas representativas dos pilotos tenham questionado expressamente o Governo, desde Abril de 2005 sobre o seu posicionamento neste processo, a resposta nunca foi dada. Pois bem, o resultado está à vista. O verdadeiro cerne do problema é a opção deste Governo em servir os interesses dos grupos económicos, custe o que custar. E se, nesse caso, isso significa colocar um piloto de linha aérea com 65 anos a transportar passageiros, então é por aí que vai o Governo e a maioria que o suporta. São opções arbitrárias e irresponsáveis, que merecem a nossa oposição, a nossa condenação e o nosso voto contra.
2PCP
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo dirige-se, hoje, à Câmara para, através desta proposta de lei n.º 139/X, lhe ser concedida uma autorização para legislar sobre a fixação do limite máximo da idade para o exercício das funções dos pilotos e dos co-pilotos de aeronaves dos voos ditos comerciais. Diga-se, em abono da verdade, que esta matéria está regulamentada num tratado internacional subscrito pelo Estado português, a Convenção sobre a Aviação Civil Internacional, que, no caso de Portugal, foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 36 158, de 17 de Fevereiro de 1947, e ratificada em 28 de Abril de 1948, em que os Estados-contratantes se obrigaram a aplicar uniformemente as regras e procedimentos internacionais relativos às aeronaves, ao pessoal, às rotas e aos serviços de apoio à navegação aérea que sejam adoptados pela Organização da Aviação Civil Internacional, na forma de anexos a esta Convenção. Portugal, desde então, estabeleceu, como limite, a idade dos 60 anos para o exercício das funções de piloto comandante de uma aeronave, operando em serviços aéreos internacionais regulares ou em operações de transporte aéreo não regular remunerados, recomendando o mesmo limite para os co-pilotos. Como é óbvio, vários factores determinavam este limite que tinha subjacente o conceito de que existiria um risco acrescido de incapacitação súbita em voo para o grupo etário a partir dos 60 anos, o que determinaria uma maior possibilidade de acidente. A lógica, obviamente, era sempre a da segurança dos próprios e a dos passageiros. Sucede, porém, que desde essa altura ocorreram alterações sociais muito importantes, assistindo-se a um desenvolvimento tecnológico que induziu um aumento de qualidade na prestação de cuidados de saúde às populações e, consequentemente, um aumento da esperança de vida e, objectivamente, também um aumento das condições para o exercício de funções profissionais, a partir dessa data. E isso mesmo levou as Joint Aviation Authorities (JAA) — um organismo associado à Conferência Europeia de Aviação Civil e que integra as autoridades nacionais de aviação civil dos Estados europeus, subscritoras dos convénios relativos à elaboração, adopção e aplicação das normas técnicas comuns — a sugerirem e a legislarem no sentido de os pilotos, quer na situação de comandante, quer na situação co-piloto, poderem voar em voos comerciais até aos 65 anos de idade, desde que seja em operações de tripulação múltipla e nenhum outro membro da tripulação de voo (o comandante ou o co-piloto) tenha atingido a idade dos 60 anos. Reconheceu-se que esta regra, adoptada no domínio da harmonização europeia dos standards das licenças de pilotos de linha aérea, teve subjacente à sua adopção uma análise e conclusões detalhadas acerca dos riscos de acidente nesta faixa etária, critérios médicos, físicos e psicológicos, que, naturalmente, permitiram concluir pela inexistência de qualquer risco acrescido para a segurança de voo. Recentemente, também o Conselho da OACI produziu uma alteração que segue a mesma linha de orientação, já preconizada por essas JAA, isto é, o alargamento da idade dos pilotos comerciais que operam em aeronaves de dois pilotos, em mais cinco anos, ou seja, até aos 65 anos de idade. Por isso mesmo, viabilizaremos também esta proposta de lei, chamando, no entanto, a atenção do Governo, quer na comissão de acompanhamento, quer de motu proprio, para um problema que se pode colocar, que é exactamente o de os pilotos que, a partir dos 60 anos, não se sintam, por vontade própria, não sintam que têm condições de continuar a exercer as suas funções profissionais. Concluo de imediato, Sr. Presidente. O que acontecerá a estes pilotos? Ser-lhes-á aplicado o novo regime da segurança social, que é altamente penalizador para quem pretenda a reforma antecipada, ou será criado um regime específico para estes profissionais, solução que o CDS preconiza e preferia ver consagrada? Esta questão fica sem resposta, o que é pena, porque é uma questão muito importante e determinante neste debate. Tudo isto fundamenta o Decreto-Lei n.º 392/90, que fixa em 60 anos a idade da reforma dos pilotos. Em nosso entender, nada se alterou. Acresce que, no estado actual da investigação médica, não se pode afirmar que o aumento do limite de idade, consagrado na proposta, permite manter os níveis de segurança actuais. Mais uma vez, o Governo, a coberto de normas internacionais — e diga-se, Sr. Secretário de Estado, 52 I SÉRIE — NÚMERO 103 que a Emenda 167 da Convenção de Chicago é apenas uma recomendação e, portanto, não obriga à transposição para a legislação portuguesa —, arranja argumento para penalizar aqueles que trabalham toda uma vida, destacando-se, nesta matéria, o aumento da idade de reforma. Assim sendo, duas questões se colocam, a primeira das quais tem a ver com o seguinte: segundo o Governo, o aumento da idade de reforma de 60 para 65 anos não traz problemas. Então, por que tem o legislador necessidade de garantir que só um membro da tripulação tenha mais de 60 anos?
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta-nos a proposta de lei n.º 139/X, que tem como objectivo o pedido de autorização para legislar sobre a fixação do limite máximo de idade para o exercício de funções dos pilotos, comandantes e co-pilotos de aeronaves operadas em serviços de transporte público comercial de passageiros, carga ou correio. Um dos motivos desta proposta é o de flexibilizar a regra do limite de 60 anos de idade para o exercício da profissão, permitindo que, de acordo com a Emenda 167 da ICAO ao Anexo I à Convenção de Chicago, a profissão possa ser exercida até ao limite de 65 anos. Diz o Governo que um dos factores que suporta esta proposta é o de que o avanço e desenvolvimento tecnológico induziu um aumento de qualidade na prestação de cuidados de saúde e um aumento da esperança de vida. Dizemos nós: o aumento da esperança de vida não afasta o processo natural de envelhecimento nem o atenua, é simplesmente uma decorrência de determinado padrão de nível de saúde. A profissão de piloto é uma profissão de extrema exigência e de desgaste rápido. O Centro da Performance Humana, no seu parecer sobre medicina aeronáutica e sobre a saúde dos tripulantes de cabine, considera a actividade profissional condicionada por diversas formas de stress e, no seu conjunto, deve ser encarada como um trabalho em situação extrema. Já em tempos a Direcção-Geral de Operações de Voo da TAP considerava que esta profissão era desgastante, salientando as condições muito particulares que promovem um desgaste evidente, designadamente a atmosfera artificial, com reduzidas percentagens de oxigénio, microvibrações de voo, mudanças repentinas e frequentes de fusos horários. Tudo isto fundamenta o Decreto-Lei n.º 392/90, que fixa em 60 anos a idade da reforma dos pilotos. Em nosso entender, nada se alterou. Acresce que, no estado actual da investigação médica, não se pode afirmar que o aumento do limite de idade, consagrado na proposta, permite manter os níveis de segurança actuais. Mais uma vez, o Governo, a coberto de normas internacionais — e diga-se, Sr. Secretário de Estado, que a Emenda 167 da Convenção de Chicago é apenas uma recomendação e, portanto, não obriga à transposição para a legislação portuguesa —, arranja argumento para penalizar aqueles que trabalham toda uma vida, destacando-se, nesta matéria, o aumento da idade de reforma. Assim sendo, duas questões se colocam, a primeira das quais tem a ver com o seguinte: segundo o Governo, o aumento da idade de reforma de 60 para 65 anos não traz problemas. Então, por que tem o legislador necessidade de garantir que só um membro da tripulação tenha mais de 60 anos? Há ou não perigo para a segurança de voo?! Segunda pergunta: o Governo pode garantir aqui, nesta Assembleia, que a idade de reforma dos pilotos se mantém nos 60 anos e não irá sofrer alterações nos próximos anos? É que Os Verdes não poderão viabilizar esta proposta. … — é o prémio da modernidade com que este Governo tem brindado todos os trabalhadores, até para suprir as tais discriminações negativas que, de facto, são uma nova filosofia que o Sr. Secretário de Estado aqui trouxe —, estaremos contra esta filosofia e esta proposta de lei.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei traduz, mais uma vez, uma lógica com a qual o Bloco de Esquerda não está de acordo: se se vive mais tempo, o prémio será sempre o de trabalhar mais tempo. O Sr. Secretário de Estado disse aqui que esta proposta visava suprir uma discriminação negativa dos pilotos portugueses relativamente aos demais e, por isso mesmo, há que lhes dar um prémio, há que não os discriminar negativamente e, portanto, obrigá-los a trabalhar mais. Mas, Sr. Secretário de Estado, é a própria exposição de motivos desta proposta de lei que estabelece o seguinte: «De qualquer modo, em Portugal, o principal problema para a avaliação do risco de acidente em pilotos de linha aérea entre os 60 e 65 anos tem sido a falta de dados sobre a saúde destes após os 60 anos, idade a partir da qual a maioria deixa de fazer exames médicos para efeitos de certificação médica». Ora, impunha-se que esta alteração também tivesse isto em conta, ou seja, os outros países fizeram os seus estudos, Portugal tem este défice, continua a não querer fazer os estudos mas impõe já a medida e fará os estudos a posteriori. Não se entende esta pressa do Governo em querer impor sempre aquilo que é pior para as pessoas! Por outro lado, coloca-se uma outra questão que os próprios pilotos têm vindo a constatar e que, segundo eles, foi consensualizada com o Governo: esta alteração poderia ser gradual, isto é, acompanhada dos estudos e gradual. Ora, o que temos aqui é uma proposta onde se cria já a obrigatoriedade, o que suscita, objectivamente, problemas. E há problemas, nomeadamente, em relação à questão da segurança social e aos estudos que se prendem com a questão das horas de voo que os pilotos, em Portugal, também ultrapassam em muito, com tudo o que de negativo daí advém. Portanto, no que diz respeito ao Bloco de Esquerda, consideramos que tinha de ter havido muito mais cautelas. Consideramos que esta proposta de lei tinha de ter sido antecedida de estudos, tinha de ter sido melhor negociada com os representantes dos visados e não ter havido, primeiro, uma proposta e, a seguir, o acompanhamento. Ora, os estudos não existem. Por essa razão, e porque estamos contra a lógica de que sempre serão premiadas as pessoas que vivem mais trabalhando mais — é o prémio da modernidade com que este Governo tem brindado todos os trabalhadores, até para suprir as tais discriminações negativas que, de facto, são uma nova filosofia que o Sr. Secretário de Estado aqui trouxe —, estaremos contra esta filosofia e esta proposta de lei.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Através da proposta de lei n.º 139/X, o Governo solicita à Assembleia da República autorização para legislar sobre uma medida instrumental que consubstancia uma resposta a uma necessidade premente, no âmbito da igualdade de oportunidades aos trabalhadores de uma mesma profissão, no quadro da União Europeia. De facto, face à harmonização europeia dos standards das licenças de pilotos de linha aérea, segundo os quais os pilotos podem voar, em voo comercial, até aos 65 anos de idade, desde que em operações de tripulação múltipla e que nenhum outro membro da tripulação tenha atingido os 60 anos, o regime jurídico português, que previa a idade de 60 anos como limite para o exercício da actividade do piloto, passou a ficar desajustado. Impunha-se, assim, introduzir as alterações necessárias no ordenamento jurídico português, em ordem a uniformizá-lo com as normas internacionais, uma vez que tal desajustamento constituía uma situação de desigualdade que importa corrigir. O Governo e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não ignoram, antes pelo contrário reconhecem, as condições inerentes ao desempenho das funções de piloto e o desgaste físico e psíquico que lhes está associado. Mas, perante a garantia de que essas condições não oferecem risco acrescido, não se justifica que se mantenha para os pilotos portugueses um regime de exercício profissional diferente do contexto europeu. Por isso se compreende que o Governo queira fixar os 65 anos como limite de idade para o exercício das funções de comandante e de co-piloto das aeronaves operadas em serviços de transporte público comercial, assegurando, contudo, e bem, no nosso entendimento, que o exercício das aludidas funções, a partir dos 60 anos e até aos 65 anos, seja tutelado pela garantia da verificação das condições de saúde e de segurança necessárias. Tal garantia, conforme à Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), está prevista no projecto de diploma em discussão e consubstancia-se na condição de certificação médica dos pilotos comandantes e co-pilotos, para efeitos de manutenção ou emissão da respectiva licença, e no duplo condicionalismo de só poderem exercer as suas funções como membros de uma tripulação múltipla e como único membro da tripulação técnica de voo que tenha atingido os 60 anos de idade. Trata-se, assim, de um regime legal de exercício profissional justo, equilibrado e adequado aos vários interesses em presença. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista felicita o Governo pela iniciativa legislativa, na convicção de que, com a introdução das aludidas regras já adoptadas pela maioria dos países, fica assegurado aos pilotos portugueses um direito que lhes estava vedado, que os discriminava face aos pilotos de outros países e que corresponde a uma justa e legítima expectativa de muitos pilotos portugueses.
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Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, a convergência do regime da Caixa Geral de Aposentações com o regime geral da segurança social foi iniciado em 1993 com a aplicação das regras de cálculo das pensões do regime geral aos subscritores inscritos na CGA a partir de 1 de Setembro daquele ano. Na altura, o Sr. Secretário de Estado não devia estar em Portugal, porque, se estivesse, seguramente, recordar-se-ia de que o Partido Socialista votou con tra. O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Exactamente! Sempre que o governo do Partido Social Democrata adoptava qualquer medida no sentido de imprimir uma política de maior rigor nas políticas sociais, o Partido Socialista assumia de imediato um discurso demagógico e irresponsável, atitude que o Sr. Secretário de Estado agora criticou na sua intervenção. De resto, a questão que gostaríamos de colocar aqui ao Sr. Secretário de Estado não é sobre os vários artigos constantes desta proposta de lei. Percebemos que o regime geral da segurança social e o regime da Caixa Geral de Aposentações precisam de adaptações, sempre defendemos, de forma responsável, políticas que garantissem o direito às prestações sociais dos nossos concidadãos e, por isso, não somos insensíveis às iniciativas que o Governo socialista ou qualquer outro adopte, independentemente de terem ou não a nossa assinatura. Sr. Secretário de Estado, gostava de lhe colocar uma pergunta apenas respeitante à aposentação antecipada, referida no artigo 2.º da proposta de lei. O n.º 2 deste artigo 2.º vem alterar a penalização de 4,5% anuais para 0,5% mensais, ou seja, 6% anuais, entre a data do requerimento da aposentação e a idade dos 65 anos. Pergunto, Sr. Secretário de Estado, se assume ou não com clareza, se considera ou não, que estamos perante uma alteração duplamente penalizadora, já que não só aumenta de 4,5% para 6% a taxa anual de redução como, ainda, aumenta para os 65 anos a idade de referência, que, como sabe, até agora, é progressiva, pelo Anexo I da Lei n.º 60/2005, da autoria da maioria a que V. Ex.ª pertence. Em segundo lugar, o n.º 3 deste artigo 2.º diminui de 18 meses — actualmente em vigor — para, apenas, 12 meses o número de meses de antecipação a considerar na determinação da taxa global de redução da pensão. Pergunto — e assim termino — se considera ou não que estamos em presença de mais uma dura penalização para os trabalhadores da função pública. Nós não somos como alguns que, quando estão na oposição, são a voz das corporações, são absolutamente contra a convergência dos regimes e, depois, chegam ao governo e a convergência já é um valor sacrossanto, já é um grande valor de justiça social. Nós não somos daqueles que, quando estão na oposição e se quer mexer nos regimes, nomeadamente no regime da segurança social do sector público, é tudo inconstitucional, é bloqueios para todo o lado, nada se pode fazer… Em relação a isso, estamos muito à vontade, porque temos a mesma postura no governo e na oposição. 23 DE JUNHO DE 2007 19 O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!
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Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, quero apenas, muito rapidamente, assinalar a relevância desta medida. A exemplo do que já foi feito para o regime geral da segurança social, agora também se criam regras mais justas para a Caixa Geral de Aposentações. É, porventura, a medida mais relevante e que fará mais história da autoria deste Governo, porque garante a sustentabilidade dos regimes de protecção social e a justiça intergeracional. O sistema que temos tido até hoje é absolutamente impensável. Receber-se pensões não em função daquilo que se descontou mas em função dos últimos descontos, sejam eles mais ou menos alargados, não faz qualquer sentido, não obedece a qualquer racionalidade. Por outro lado também, ter um valor fixo para recebimento, independentemente de se saber se a expectativa é a de que esse recebimento seja feito durante 5, 10 ou 20 anos, era outra irracionalidade do sistema. Portanto, faz-se justiça, racionaliza-se e garante-se sustentabilidade. Se, porventura, algum defeito a proposta de lei tem é, em meu entender, por ficar aquém daquilo que se devia fazer, em nome das novas gerações. Mas entendo também que é um grande esforço e é um razoável compromisso intergeracional. Nós não somos como alguns que, quando estão na oposição, são a voz das corporações, são absolutamente contra a convergência dos regimes e, depois, chegam ao governo e a convergência já é um valor sacrossanto, já é um grande valor de justiça social. Nós não somos daqueles que, quando estão na oposição e se quer mexer nos regimes, nomeadamente no regime da segurança social do sector público, é tudo inconstitucional, é bloqueios para todo o lado, nada se pode fazer… Em relação a isso, estamos muito à vontade, porque temos a mesma postura no governo e na oposição. 23 DE JUNHO DE 2007 19 O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!
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Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, falo-lhe muito à vontade, porque faço parte de um partido que sempre apoiou a convergência do regime público ao regime privado. Nós não somos como alguns que, quando estão na oposição, são a voz das corporações, são absolutamente contra a convergência dos regimes e, depois, chegam ao governo e a convergência já é um valor sacrossanto, já é um grande valor de justiça social. Nós não somos daqueles que, quando estão na oposição e se quer mexer nos regimes, nomeadamente no regime da segurança social do sector público, é tudo inconstitucional, é bloqueios para todo o lado, nada se pode fazer… Em relação a isso, estamos muito à vontade, porque temos a mesma postura no governo e na oposição. Por isso mesmo, Sr. Secretário de Estado, muito estranho o discurso que V. Ex.ª aqui vem fazer, que, em algumas partes, mais faz lembrar um jovem façanhudo do PCTP/MRPP!… Estejam calmos, Srs. Deputado do Partido Socialista! Sabem que há uma coisa muito forte que me une à bancada do Partido Socialista? São as críticas ao actual Governo! Nisso estamos muito à vontade! Pensamos exactamente o mesmo, Srs. Deputados do Partido Socialista! Mas, como eu estava a dizer, Sr. Secretário de Estado, não percebo como é que V. Ex.ª vem aqui gritar contra a insensibilidade social do anterior governo, «berrar» contra a política do anterior governo, dizendo que era uma política pusilânime que põe em causa as pensões de reforma, como se estivesse, eventualmente, num comício do PCTP/MRPP em 1975, e, depois, traz aqui medidas que são de uma enorme insensibilidade social! É mentira! O Sr. Secretário de Estado e, também, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares acham justo que as pensões mais baixas — e relembro que na Caixa Geral de Aposentações há pensões muito baixas, de gente que entrou para o regime com 15, 16 ou 17 anos, que teve longuíssimas carreiras contributivas de salários muito baixos, que têm hoje pensões que estão muito abaixo do salário mínimo nacional —, em anos de fraco crescimento económico, como têm sido os últimos, possam ter um aumento, única e exclusivamente, igual ao crescimento do índice de preços ao consumidor?! Acham justo que não haja uma recuperação destas pensões, que são muito baixas e muito afectadas?! Acham justo que tenha havido o desligamento, a rotura, da paridade entre estas pensões e o salário mínimo nacional?! Acha isto justo?! Isto não quebra a sua consciência social?! Isto não faz com que esse jovem façanhudo do PCTP/MRRP se incomode?! Isto a mim, que sou um jovem conservador, de centrodireita mas com sensibilidade social, incomoda muito e choca muito a minha consciência social. Choca-me muito que seja o Partido Socialista que esteja a tomar medidas com estas! Sr. Presidente, começando por responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Arménio Santos, devo dizer que fico surpreendido com a facilidade com que o Sr. Deputado faz referência ao facto de sempre ter estado de acordo com a convergência e, depois, votar contra. Votou contra em 2005… Enfim, tem votado contra todas as medidas que o Governo tem apresentado no sentido da convergência. 20 I SÉRIE — NÚMERO 98 O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Os senhores é que votaram contra!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta neste debate uma proposta de lei de grande impacto na vida das pessoas. Trata-se de uma proposta que tem como objectivo a convergência e a harmonização do regime da Caixa Geral de Aposentações com o regime geral da segurança social, designadamente no que diz respeito às condições de aposentação e ao cálculo de pensões. Este diploma introduz o factor de sustentabilidade, que passa a ser considerado no cálculo das pensões dos subscritores ou pensionistas que entraram no sistema antes de 31 de Agosto de 1993. Significa isto que, a partir da aprovação deste diploma, todos os subscritores da Caixa Geral de Aposentações, independentemente da data da sua inscrição, serão abrangidos pela alteração do regime. Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado está a abandonar o debate. Peço-lhe que tome providências. Não tenho condições para continuar a minha intervenção sem estar presente o Governo. O Sr. Secretário de Estado já tinha demonstrado alguma baralhação na forma como respondeu às perguntas. O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares saiu da bancada e o Sr. Secretário de Estado entrou ainda em maior baralhação. Mas, enfim, já está reposta a normalidade. Dizia eu que significa isto que, a partir da aprovação deste diploma, todos os subscritores da Caixa Geral de Aposentações, independentemente da data da sua inscrição, serão abrangidos pela alteração do regime. Significa que estas pessoas serão afectadas, nas suas legítimas expectativas, quanto à aposentação antecipada e também quanto ao valor das suas pensões. Assim, as pensões a pagar, no futuro, pela Caixa Geral de Aposentações serão ponderadas e influenciadas pela evolução da esperança média de vida da população, atenuando o impacto financeiro provocado pelo desequilíbrio que se tem vindo a verificar na evolução da população activa face à população beneficiária do sistema. Esta convergência do sistema de pensões do sector público com o sector privado é um propósito há muito defendido pelo PSD. Aliás, importa realçar aqui que foi PSD que o concretizou, quando, em 1993, com o governo do Professor Cavaco Silva, determinou a aplicação do regime geral da segurança social a todos os subscritores da Caixa Geral de Aposentações, inscritos após aquela data. Só com uma diferença, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: naquela altura, a alteração feita não colidia com nenhum direito adquirido porque apenas se aplicava a futuros subscritores. Apesar disso — e é bom aqui recordar —, o Partido Socialista votou contra na altura, porque entendia que o diploma era «fortemente lesivo para o interesse dos trabalhadores» Também em 2004, quando o Governo do Dr. Durão Barroso apresentou uma alteração ao Estatuto de Aposentação dos Funcionários Públicos, que previa uma penalização das reformas de 4,5% ao ano, o PS também votou contra, invocando a «sangria da qualificação à custa dos aposentados com menos de 60 anos de idade.» Como é diferente a atitude do PS quando está no Governo e quando está na oposição. Como é gritante a falta de seriedade política nos argumentos políticos que os socialistas esgrimem. Antes, o PS, na oposição, chumbava as iniciativas do PSD classificando-as como «muito gravosas para os trabalhadores e geradoras de enormes injustiças sociais». Hoje, o PS, no Governo, aumenta a idade de reforma dos funcionários para os 65 anos; hoje, o PS, no Governo, aumenta a penalização das aposentações precoces de 4,5% ao ano para 0,5% ao mês. E justifica estas medidas — pasme-se! — com os mesmos argumentos que antes utilizava para se opor às iniciativas do PSD: a justiça e a equidade social. É mais um exemplo, Sr.as e Srs. Deputados, de como o mesmo argumento pode servir interesses tão diversos. Hipocritamente, o PS muda de opinião consoante está no Governo ou consoante está na oposição. Sr.as e Srs. Deputados, o PSD tem outra atitude: assume-se como oposição responsável, não tem esta atitude de «bota-abaixo» que tem o PS quando está na oposição. Mantemos, hoje, as convicções e os objectivos políticos que nortearam a nossa acção política quando fomos governo. Na nossa opinião, a convergência e a uniformização dos regimes, que sempre defendemos, tem uma dupla importância: em primeiro lugar, contribui para a sustentabilidade do sistema, fazendo depender o valor das pensões dos fenómenos demográficos e do crescimento da economia; em segundo lugar, introduz o princípio da igualdade de tratamento de todos os portugueses na idade da reforma — somos coerentes e apoiamos este princípio. Mas a verdade — e é importante lembrar, pois temos memória — é que o PS, estando no Governo nove anos, nos últimos 12, ignorou a evidente degradação financeira da Caixa Geral de Aposentações. Na actual legislatura — é também bom aqui lembrar —, não tomou a iniciativa de continuar o caminho iniciado pelo PSD em 1993. Importa lembrar também que, durante a campanha eleitoral de 2005, o PS já tinha perfeita consciência do problema da sustentabilidade do sistema, mas o Primeiro-Ministro, José Sócrates, furtou-se sempre a discutir os problemas da segurança social e nunca admitiu, ao contrário do PSD, a necessidade do aumento da idade da reforma. Portanto, foi uma atitude pouco séria que procurou enganar as pessoas na ânsia de lhes arrancar alguns votos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos que esta alteração legislativa coloca em causa expectativas criadas ao longo de anos e frustra expectativas; mas importa dizer, com verdade e com honestidade política, que as alterações das condições económicas e financeiras do País têm uma consequência directa e inultrapassável nos regimes de protecção social. Não seria justo que o custo do reequilíbrio do sistema social não fosse partilhado pelo sector público, que até hoje usufruiu de um regime mais favorável. É, pois, em nome da coerência e da seriedade políticas, que faz falta ao PS quando está na oposição; é em nome da responsabilidade, que nos distingue da conduta política errática do PS, que o PSD não se opõe a esta iniciativa legislativa, entendendo-a como indispensável para assegurar a sustentabilidade do sistema de segurança social. Ao contrário de outros, designadamente do Partido Socialista, e do tom politiqueiro que, hoje, aqui o Sr. Secretário de Estado utilizou neste debate, não hipotecamos a seriedade de propósitos em nome de eventuais vantagens políticas de momento. Este é um assunto extremamente sério e é com a seriedade de sempre que o abordamos. É nesta medida que apoiamos esta convergência que, hoje, é defendida aqui. O Governo, e isto é certo, aumenta mais uma vez as penalizações das reformas antecipadas. Se em finais de 2005 a penalização por cada ano de antecipação era de 4,5%, o Governo vem agora «dar o dito por não dito» e aumentar para 6% a penalização por cada ano de reforma antecipada. A pergunta que se deve colocar é: onde é que pára aquele Partido Socialista que, com todas as forças que tinha, quando o Governo PSD/CDS-PP propôs uma penalização de 4,5%, por cada ano antecipado de reforma, protestava? O Governo dito socialista introduz também aqui, na Caixa Geral de Aposentações, o malfadado «factor de sustentabilidade», que não tem outro fim que não o de diminuir o montante das pensões dos portugueses. Como refere Eugénio Rosa, em diversos estudos, este «factor de sustentabilidade» deveria chamar-se, sim, «factor de diminuição das pensões», uma vez que tem como consequência e único objectivo reduzir esse montante. Este «factor de sustentabilidade» faz um aproveitamento indecoroso da evolução da esperança média de vida para reduzir a reforma dos portugueses. É a própria OCDE que refere que as pensões em Portugal vão sofrer, em média, uma diminuição de 40% do seu valor e que Portugal fez a reforma mais agressiva. Esta organização refere que a reforma portuguesa é a mais profunda dos países da União Europeia. Isto é, no ataque às expectativas, no ataque aos direitos dos trabalhadores, este Governo, dito socialista, está no primeiro lugar. O verdadeiro rosto do neoliberalismo e o pupilo mais disciplinado da agenda do Banco Mundial chamase José Sócrates. 24 I SÉRIE — NÚMERO 98 Este Governo, dito socialista, ultrapassa pela direita não só o PSD mas também um conjunto significativo de partidos da direita europeia. Estes são alguns dos aspectos mais gravosos de um diploma construído para reduzir os encargos do Estado com as pensões dos seus próprios trabalhadores. É uma espécie de julgamento em proveito próprio. O Governo altera as regras para beneficiar a sua estratégia neoliberal de suposto combate ao défice, para mais uma vez tomar medidas que penalizam quem trabalha.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Não passaram mais de dois anos para o Governo piorar aquilo que já estava mal. Em Outubro de 2005, o Governo, através da proposta de lei n.º 38/X, aumentou a idade legal de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, passando dos 60 para os 65 anos de idade, ainda que de uma forma gradual. Nessa altura, evocava o Governo que era uma questão de equidade. O Governo dizia que visava estabelecer mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social. Acontece que, em Novembro de 2006, com a nova Lei de Bases da Segurança Social, o Governo aumenta a idade real da reforma dos trabalhadores do sector privado. Agora, volta a evocar a mesma necessidade de convergência para voltar a aumentar a idade real de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública. Em menos de dois anos, os trabalhadores da Administração Pública viram a idade da reforma aumentar dos 60 para os 65 anos, para agora terem que trabalhar para além dos 65 anos para terem uma reforma completa. Isto é, à conta da ideia da suposta convergência dos regimes e da suposta sustentabilidade financeira do sistema, o Governo foi aumentando a idade da reforma de todos os trabalhadores. Assim, por muito que fale de convergência das pensões, de equidade, de justiça, a verdade é que o objectivo inicial do Governo era o de aumentar a idade real de reforma de todos os portugueses e diminuir o montante das suas pensões. Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Analisemos a proposta do Governo e as consequência que acarreta para os trabalhadores da Administração Pública. A pressa do Governo é tanta em aumentar a idade da reforma e diminuir as pensões que o Governo faz remissões para um decreto-lei que não existe, deixando espaços em branco no presente diploma. E não estamos a falar de aspectos pontuais mas de matérias tão importantes como as fórmulas de cálculo das pensões. É inadmissível que o Governo apresente uma proposta de lei que não permite aos grupos parlamentares conhecerem os verdadeiros impactos que esta vai ter nas reformas dos trabalhadores da Administração Pública. O Governo, e isto é certo, aumenta mais uma vez as penalizações das reformas antecipadas. Se em finais de 2005 a penalização por cada ano de antecipação era de 4,5%, o Governo vem agora «dar o dito por não dito» e aumentar para 6% a penalização por cada ano de reforma antecipada. A pergunta que se deve colocar é: onde é que pára aquele Partido Socialista que, com todas as forças que tinha, quando o Governo PSD/CDS-PP propôs uma penalização de 4,5%, por cada ano antecipado de reforma, protestava? O Governo dito socialista introduz também aqui, na Caixa Geral de Aposentações, o malfadado «factor de sustentabilidade», que não tem outro fim que não o de diminuir o montante das pensões dos portugueses. Como refere Eugénio Rosa, em diversos estudos, este «factor de sustentabilidade» deveria chamar-se, sim, «factor de diminuição das pensões», uma vez que tem como consequência e único objectivo reduzir esse montante. Este «factor de sustentabilidade» faz um aproveitamento indecoroso da evolução da esperança média de vida para reduzir a reforma dos portugueses. É a própria OCDE que refere que as pensões em Portugal vão sofrer, em média, uma diminuição de 40% do seu valor e que Portugal fez a reforma mais agressiva. Esta organização refere que a reforma portuguesa é a mais profunda dos países da União Europeia. Isto é, no ataque às expectativas, no ataque aos direitos dos trabalhadores, este Governo, dito socialista, está no primeiro lugar. O verdadeiro rosto do neoliberalismo e o pupilo mais disciplinado da agenda do Banco Mundial chamase José Sócrates. Este Governo, dito socialista, ultrapassa pela direita não só o PSD mas também um conjunto significativo de partidos da direita europeia. Estes são alguns dos aspectos mais gravosos de um diploma construído para reduzir os encargos do Estado com as pensões dos seus próprios trabalhadores. É uma espécie de julgamento em proveito próprio. O Governo altera as regras para beneficiar a sua estratégia neoliberal de suposto combate ao défice, para mais uma vez tomar medidas que penalizam quem trabalha. Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto à fundamentação destas propostas, o Governo diz que é uma questão de convergência. Ora, pelo acima exposto fica bem claro que tal não é verdade. Bem pelo contrário, este regime, em alguns aspectos, é mais gravoso do que o previsto na segurança social. O Governo refere o problema da sustentabilidade do sistema, diz que estas medidas visam essa sustentabilidade, mas esquece-se de dizer que é o próprio Governo que não cumpre para com a Caixa Geral de Aposentações. Os desequilíbrios da Caixa Geral de Aposentações, que o Governo não quantifica na presente proposta, não «caíram do céu». O Governo esquece-se e não contabiliza os 23,75% de todos os vencimentos da Administração Pública que não entrega à Caixa Geral de Aposentações. Já referimos no passado que, a preços de 2005, o Estado deve a esta Caixa Geral de Aposentações um montante aproximado de 9000 milhões de euros. O Governo não pode, ou pelo menos não devia, utilizar o argumento da sustentabilidade financeira do sistema quando são sucessivos governos, sejam eles PS, PSD, com ou sem o CDS-PP, os culpados pela situação a que chegamos. Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Este Governo altera, várias vezes e num curto espaço de tempo, as regras de aposentação de milhares e milhares de trabalhadores, criando assim um sentimento de incerteza e instabilidade quanto ao futuro. O Governo, alterando como altera as regras de atribuição das pensões, põe em causa as legítimas expectativas que estes trabalhadores criaram ao longo de uma vasta carreira de contribuições para a Caixa Geral de Aposentações. Assim, se dúvidas existem quanto à constitucionalidade das alterações produzidas no sistema de aposentação levadas a cabo pela Lei n.º 60/2005, este diploma, ao alterar novamente as regras, adensa as dúvidas quanto à constitucionalidade dessa lei e da presente proposta de lei. O Governo, no respeito pelo princípio da boa fé e da confiança jurídica e tendo em conta às legítimas expectativas criadas pelos trabalhadores após décadas de descontos para a Caixa Geral de Aposentações, não pode alterar desta forma as regras e impor aumentos na idade de aposentação e novas fórmulas de cálculo das pensões que reduzem o seu montante. O Governo, com esta proposta de lei, desfere um novo e rude golpe nos direitos e interesses dos trabalhadores da Administração Pública e importa nesta altura dizer que, tal como na segurança social, outro caminho é possível. Em vez de optar por penalizar sistematicamente os trabalhadores, o Governo, se tivesse uma réstia de política de esquerda, podia e devia diversificar as receitas da segurança social, encontrar as formas de financiamento das pensões que não passassem pela penalização dos trabalhadores e assumir as suas próprias responsabilidades no que à aposentação dos trabalhadores da Administração Pública diz respeito. Infelizmente, este Governo já provou por demasiadas vezes que, para impor a sua agenda neoliberal, para privatizar e destruir a Administração Pública, para cumprir a sua obsessão com o défice, não hesita um segundo: enche o peito de ar, diz-se detentor de toda a coragem do mundo e avança, qual rolo compressor, contra os trabalhadores, destruindo-lhe os direitos e as legítimas expectativas. Pena é que o Governo, face aos interesses dos grandes grupos financeiros, face aos maestros da agenda neoliberal, face à União Europeia, não tenha nem a vontade nem a mínima coragem para defender os interesses de milhões de portugueses. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
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Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Ao iniciar a discussão da proposta de lei n.º 136/X, que adapta o regime da Caixa Geral de Aposentações ao regime de segurança social em matéria de aposentação, gostaria de me dirigir em particular às Sr.as e Srs. Deputados do PS que são funcionárias e funcionários públicos e deixar-lhe uma simples questão. Como se sentem quando são confrontados com os seus companheiros de trabalho, sabendo que muitos deles contribuíram para a vossa eleição como Deputados da Nação na expectativa de que, convosco no Parlamento e no Governo, teriam um futuro melhor? Como se sentem quando ouvem e vêem colegas duma vida inteira de trabalho dizerem que «daqui a quatro anos receberei pouco mais de 400 euros?» Como se sentem quando vêem aquele casal de funcionários para quem os dois subsídios de refeição eram fundamentais para pagar o quarto do filho que estuda fora da terra? Como se sentem quando têm colegas que trabalharam já 40 anos mas que lhes falta idade para se poderem aposentar e que terão que trabalhar mais 10 anos, porque a vida os empurrou para o trabalho aos 14 anos de idade? Como se sentem, Sr.as e Srs. Deputados, quando sabem que milhares de funcionários operários e auxiliares recebem no fim da carreira cerca de 650 € e viram definitivamente os escalões congelados? Como se sentem quando sabem que existem muitas e muitos jovens qualificados, investigadores, professores, enfermeiros, psicólogos, arquitectos, a falsos recibos verdes há anos e anos? Só podem sentir vergonha! Vergonha de um governo que, de uma forma autista e arrogante, vai de «convergência em convergência» de «adaptação em adaptação», nivelando salários, pensões e direitos tudo por baixo. Tudo abaixo da média europeia, tudo mais abaixo do que os governos das direitas conseguiram fazer. Vergonha de um Governo que nos empurra cada vez mais e mais para o «primeiro lugar dos piores». Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: São os relatórios da OCDE que confirmam o que afinal já se sabia. Em matéria de segurança social, Portugal é o país da Europa onde as pensões vão baixar mais e na OCDE apenas o México terá queda semelhante, ou seja, as pensões vão baixar, para o futuro, para os jovens de hoje, cerca de 40%, isto em consequência das novas regras de cálculo e da introdução do factor sustentabilidade. Considera o mesmo relatório que é «a reforma mais agressiva entre os vários países europeus», onde os «pobres perdem mais»… É a melhor! É melhor para os ricos, Sr. Secretário de Estado! Dizia eu que este relatório considera que esta é reforma mais agressiva, onde os pobres perdem mais, uma vez que é para os que receberão pensões líquidas correspondentes a metade do salário médio – que em 2005, como bem sabem os Srs. Deputados e o Governo, era de 645 € – que a redução é mais significativa e se situa nos 23,1%. É isto o que diz o relatório da OCDE. Em 2005, o Governo fez aprovar uma lei que fazia a convergência das pensões da função pública com as do regime geral de segurança social por uma questão de «equidade e justiça social», dizia o Sr. Primeiro-Ministro, sustentando que o que se pretendia era igualizar, e fez com isso a sua campanha demagógica dos privilegiados. Passado um ano e meio, Sr. Secretário de Estado, a solução que era milagrosa deixou de o ser, porque, entretanto, o Governo alterou para pior o regime geral de segurança social e agora vem dizer que é preciso adaptar de novo os regimes e penaliza outra vez os funcionários públicos. Este malabarismo com que o Governo presenteia todas e todos os portugueses, inventando fórmulas labirínticas de factores e mais factores, parcelas e mais parcelas, visa esconder a sua real incapacidade de dar respostas claras que garantam uma vida digna no final de uma vida de trabalho. O que o Governo não quer fazer é uma verdadeira reforma da segurança social que garanta a sua sustentabilidade financeira, que responda às pensões de miséria e que seja verdadeiramente universal e solidária. O Governo não quer tocar nas mais-valias das empresas, nos fabulosos lucros da banca, no chamar à responsabilidade e à solidariedade nacional. O Governo prefere penalizar os mesmos, os do costume, obrigando-os a descontar mais, a trabalhar mais tempo e, no final, a receber menos pensão. Portugal transforma-se, assim, com este Governo, num país de «mínimos garantidos», onde o Estado social, Sr.as e Srs. Deputados, é já, na opinião do Bloco de Esquerda, um Estado de desgraça. Estamos contra este conceito de que se se vive mais tempo tem que se trabalhar mais, estamos contra que se mudem as regras dos contratos de trabalho que o Governo fez com funcionários públicos a meio dos mesmos sem o seu consentimento e, por isso, votaremos contra esta proposta de lei. A resposta aos funcionários, o dar a cara, caberá aos Srs. Deputados do Partido Socialista aqui presentes. Naturalmente, eles terão perguntas para lhes fazer. Fiel a este princípio, o CDS sempre foi favorável à convergência dos regimes da seguran23 DE JUNHO DE 2007 27 ça social dos trabalhadores do sector público com o dos do sector privado nas matérias em que, de facto, é possível haver uma convergência. Foi assim em 1993, mas foi assim especialmente em 2004, com a aprovação da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, de um executivo do qual o CDS se orgulhou de fazer parte. Para nós, é justo e faz sentido que as regras sejam iguais no público e no privado; é justo e faz sentido que as regras relativas à idade de reforma, aos tempos de permanência e à sustentabilidade dos sistemas sejam iguais, criando mecanismos de salvaguarda, obviamente, para que a transição entre o actual regime do sector público e o regime do sector privado não seja muito brusca. Mas o que não faz sentido, nem sequer tem autoridade política e moral para tal, é que um Governo que votou contra uma penalização de 4,5% ao ano para os trabalhadores que querem pedir a pensão antecipada venha hoje propor que essa penalização passe para 6%.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O sistema de protecção social permanente, integral e universal é sem sombra de dúvidas uma das grandes vitórias do século XX e, sobretudo na Europa, com o nosso modelo social, ocupa uma especialíssima relevância. O sistema de segurança social é especialmente importante em períodos em que as pessoas passam por maiores carências e vulnerabilidades, como a doença, a invalidez, o desemprego, a velhice ou a pobreza extrema, e é um património indispensável da nossa civilização e da nossa forma de encarar o mundo. Mas é também por isso que o grande paradoxo da segurança social é exactamente este: quanto maior for a complexidade e a exigência do sistema de segurança social maiores são os riscos para a sua sustentabilidade, nomeadamente no longo prazo. O actual sistema de segurança social foi concebido num momento e num enquadramento económico, social e, acima de tudo, demográfico totalmente distintos do momento que hoje vivemos. Dos 20 trabalhadores activos para cada reformado, passámos para uma média 1,4 trabalhadores activos para cada reformado, com uma tendência constante para que haja um agravamento. Não vamos hoje falar da inacção do Estado nas políticas demográficas e de crescimento económico e social de que tanto precisávamos, mas, obviamente, elas têm uma ligação «umbilical» com a sustentabilidade do sistema de segurança social. Contudo, para nós e penso que para todos, a verdade é que, sendo o sistema de segurança social universal, é importante que este seja, sobretudo, socialmente justo, que trate de forma igual o que pode ser tratado de forma igual e trate de forma diferente o que é desigual e não é igualitário. Isto é, é essencial que o sistema de segurança social possa dar mais a quem menos tem, possa apoiar mais quem mais precisa. Fiel a este princípio, o CDS sempre foi favorável à convergência dos regimes da segurança social dos trabalhadores do sector público com o dos do sector privado nas matérias em que, de facto, é possível haver uma convergência. Foi assim em 1993, mas foi assim especialmente em 2004, com a aprovação da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, de um executivo do qual o CDS se orgulhou de fazer parte. Para nós, é justo e faz sentido que as regras sejam iguais no público e no privado; é justo e faz sentido que as regras relativas à idade de reforma, aos tempos de permanência e à sustentabilidade dos sistemas sejam iguais, criando mecanismos de salvaguarda, obviamente, para que a transição entre o actual regime do sector público e o regime do sector privado não seja muito brusca. Mas o que não faz sentido, nem sequer tem autoridade política e moral para tal, é que um Governo que votou contra uma penalização de 4,5% ao ano para os trabalhadores que querem pedir a pensão antecipada venha hoje propor que essa penalização passe para 6%. É uma questão legitimidade, de autoridade política, que o Governo do Partido Socialista não tem pelo comportamento irresponsável que teve na oposição! Por isso, estamos aqui muito à-vontade. Não somos como aqueles que quando estão na oposição dizem uma coisa e quando chegam ao governo fazem exactamente o seu contrário. E é exactamente com essa autoridade que acusamos este Governo, mesmo assim, de ser um Governo de insensibilidade social, que já tinha sido demonstrada na Lei de Bases da Segurança Social, ao penalizar as pensões mais baixas, pensões muito abaixo do salário mínimo nacional, com um decréscimo do seu poder de compra, nomeadamente nos anos de mais fraco crescimento económico. Acham justo que uma pensão mais baixa seja penalizada num ano em que o crescimento económico é inferior a 2%, muitas vezes sabendo nós que o aumento dos transportes e dos medicamentos é superior à inflação? Isto custa-vos a ouvir! Acham justo que um pensionista que recebe uma pensão inferior ao salário mínimo nacional seja penalizado desta forma? Isto é uma tremenda injustiça e uma tremenda insensibilidade social. Quando o CDS estava no governo, o que propusemos foi a paridade entre o salário mínimo nacional e as pensões mais baixas, obviamente líquidas de taxa social única. O que os senhores propõem é, de facto, uma continuação da penalização das pensões mais baixas, das pensões das pessoas mais pobres, das que menos têm e que não possuem outras formas de rendimento. Esta é a sensibilidade social do Partido Socialista. É muito diferente da sensibilidade social dos democratas-cristãos, que para estas pessoas têm sempre uma palavra muito especial, para estas pessoas têm sempre um incentivo, para estas pessoas têm sempre o auxílio do Estado. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Dar sustentabilidade ao sistema de protecção social, respondendo aos desafios que a evolução da realidade demográfica, social e económica coloca, e assegurar a todos uma mais garantida e eficaz protecção social, sem perder de vista o objectivo de introduzir no sistema níveis de maior justiça social – e vinco bem, justiça social – e equidade no tratamento prestado aos trabalhadores foi objectivo plasmado e enunciado em diversas leis ao longo de mais de duas décadas mas que só agora, com este Governo, se cumpre cabalmente. Não posso e não quero aqui, neste momento, deixar de lembrar que a primeira lei de bases da segurança social já o previa e que a partir daí esta foi uma preocupação sempre presente. Mas é em 2005, com o actual Governo, que se procede à eliminação dos regimes especiais e se determina a inscrição dos funcionários e agentes admitidos a partir de Janeiro de 2006 na segurança social, bem como a alteração das condições de aposentação e da fórmula de cálculo. Entre as intenções e a realidade existe um passo muitas vezes difícil de concretizar e nesta matéria assim aconteceu. Diversos governos reconheceram a necessidade de garantir uma protecção social mais eficaz e a sustentabilidade financeira da Caixa Geral de Aposentações, bem como de construir um quadro de maior justiça e equidade social entre os trabalhadores, mas só a coragem e a determinação reformista deste Governo conseguiu que se ultrapassasse a barreira da intencionalidade e se promovesse a mais profunda reforma do sistema de segurança social das duas últimas décadas, em coerência com os princípios que sempre defendemos e com o compromisso corajoso que assumimos com os cidadãos e as cidadãs deste país. Ou seja, garantir a sustentabilidade e a harmonização do sistema público de protecção social de forma a reforçar a confiança daqueles que neste momento dele beneficiam e zelando pela salvaguarda e protecção das gerações futuras, num quadro de maior justiça, equidade e solidariedade social. Como afirmei, esta proposta constitui um passo final no sentido da convergência entre o regime de protecção social dos trabalhadores da Administração Pública e o regime geral de segurança social, que nos remete para a estabilização progressiva – vinco bem – das suas regras, bem como da partilha dos conceitos inovadores introduzidos na nova Lei de Bases da Segurança Social, objecto de amplo consenso em sede de concertação social. Uma convergência que não é cega, antes tem sido realizada de modo gradual e sem rupturas, através da conjugação de diversas medidas com períodos de transição, e garantindo a manutenção dos direitos dos beneficiários. Sustentabilidade, equidade e progressividade são, aliás, três características-chave desta reforma, ao contrário do que muitos persistem em querer fazer acreditar. Mas uma mentira dita muitas vezes não se transforma numa verdade. Diante de qualquer problema há sempre diversas formas de actuar: a daqueles que ficam a clamar por aquilo que deveria ter sido feito e não foi realizado; a daqueles que passam a vida inteira a clamar pela mudança e quando ela chega persistem em querer que tudo se mantenha na mesma; e a daqueles que, ao invés de se resignarem à fatalidade, optam por actuar com determinação e coragem. É nestes últimos que nos revemos e é por isso que saudamos e acolhemos favoravelmente a iniciativa legislativa em debate, na qual vemos cumprido o compromisso de criar condições para que não só as actuais trabalhadores e beneficiários mas também as novas gerações tenham garantido o direito inalienável a uma reforma digna.
0PS
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: Realmente, durante anos, naqueles anos que se seguiram ao 25 de Abril, o regime de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública não mereceu nenhuma alteração ou se houve alguma, nos primeiros anos, foi no sentido de beneficiar os trabalhadores. No entanto, nos últimos 14 anos, este regime tem sofrido constantes e fortes ataques, perspectivandose um futuro negro para os mais de 500 000 trabalhadores da função pública, que foram tornados por este Governo «bodes expiatórios» de uma crise e que viram apelidados os seus direitos adquiridos, conquistados ao longo de muitos anos, de privilégios, mudando as regras a meio do jogo. Com a publicação da mais recente alteração, a Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, veio este Governo pôr em causa os direitos adquiridos dos trabalhadores inscritos na Caixa Geral de Aposentações, estabelecendo pretensos mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social no que respeita às condições de aposentação e ao cálculo de pensões. Passados 18 meses, estamos novamente a discutir uma nova proposta de lei que visa alterar ainda para pior as condições, já por si muito graves, que entraram em vigor em Janeiro de 2006. Com esta proposta, o Governo vem mais uma vez criar uma profunda instabilidade e insegurança nos trabalhadores de função pública, um sector que tem uma responsabilidade acrescida pelos muitos serviços importantes e fundamentais que presta a toda a população no cumprimento das necessidades fundamentais do Estado e dos cidadãos e na prossecução do interesse público. Com esta proposta de lei, o Governo não só está a reduzir o valor da pensão de aposentação mas também a introduzir penalizações por aposentação antecipada muito mais gravosas do que as estabelecidas na Lei n.º 60/2005. Com esta proposta de lei, altera-se a fórmula de cálculo da pensão de aposentação, que consta do artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, a qual passa a ser influenciada pela aplicação de um factor de sustentabilidade que mais não é do que um factor de redução da pensão. Mas, em relação à sustentabilidade da segurança social, o que não espanta é que nem o Governo nem o PS queiram falar do facto de não cumprirem as suas obrigações em relação às transferências para a segurança social. O que o Governo também não quer dizer é que se há redução das comparticipações da segurança social isto deve-se ao facto de o valor médio dos salários se ter vindo a reduzir ao longo dos anos, valor esse com base no qual são feitos os descontos para a segurança social não só a nível dos trabalhadores mas das próprias empresas. A reboque do argumento do aumento da esperança de vida, que de conquista social e civilizacional é convertido em factor de penalização, e no momento em que as desigualdades se avolumam, designadamente no nosso país, o que o Governo sugere é alterar o regime de penalização da aposentação antecipada, em muitos casos com uma dupla penalização para os trabalhadores, em função do momento da aposentação, aumentando esta penalização de 4,5% para 6% ao ano. O Governo vai definir as regras a que, futuramente, ficará subordinado o regime de actualização das pensões, o que significará o seu congelamento acima de um determinado limite. Pode o Governo vir com os mais variados argumentos de convergência entre o regime da Caixa Geral de Aposentações e o regime da segurança social, pode argumentar com equidade, mas, na verdade, o que esta proposta traduz é apenas mais um golpe que visa obrigar os trabalhadores da função pública a exercerem funções para além dos 65 anos e a completarem mais de 40 anos de serviço, chegando até, em muitos casos, aos 48 anos. Como já dissemos em tempos, o Governo obriga a descontar durante muito mais anos, fazendo com que estes trabalhadores vejam cada vez mais reduzido o seu tempo de reforma. Por isso, para Os Verdes, não se pode, de facto, falar de verdadeira convergência, porque do universo total dos trabalhadores da Administração Pública atingidos, muitos, cerca de 80%, vão ficar com um regime mais desfavorável do que aquele que vigora para o próprio sector privado. De facto, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, a realidade é que este Partido Socialista de socialista tem cada vez menos ou já quase nada. As críticas no sentido de que o Partido Socialista quando está na oposição faz uma coisa e quando está no Governo faz outra são, de facto, aplicáveis, e também podem aplicar-se a outras forças partidárias, como o Partido Social Democrata. Porém, sem dúvida, não contarão com Os Verdes para realizar este tipo de políticas e, por isso, votaremos contra a proposta de lei em apreciação. «Rosa» é que não foi, com certeza!
5PEV
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Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: São bem conhecidas desta Câmara as alterações profundas que o sistema de justiça militar tem vindo a sofrer ao longo da última década. Com efeito, a quarta revisão da nossa lei fundamental, ocorrida em 1997, ao proceder à extinção dos tribunais militares em tempo de paz, obrigou a introduzir na ordem jurídica portuguesa modificações de variada índole em ordem a dar seguimento às opções então assumidas. Isso verificou-se, desde logo, no que diz respeito às novas competências atribuídas aos tribunais civis, que passaram a ser os depositários dos poderes anteriormente cometidos à jurisdição militar, mas teve igualmente consequências em matéria de justiça militar, conduzindo à aprovação, em 2003, de um Código actualizado e adaptado às novas realidades. De todo esse conjunto de legislação, ficou, porém, ausente a revisão, que há muito se impõe tenha lugar, do Regulamento de Disciplina Militar. O Regulamento em vigor é, como sabemos, um documento já datado, elaborado que foi em 1977, antes mesmo da adopção do texto original da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas. Essa simples constatação bastaria, por si só, para explicar a necessidade da sua revisão. Mas, se a isso juntarmos as consequências ao nível militar das alterações entretanto ocorridas no plano da justiça administrativa, com especial destaque para a existência de um novo código de processo nos tribunais administrativos, então compreender-se-á ainda melhor a premência de actuar neste domínio. O Governo anunciou recentemente a intenção de promover a revisão do Regulamento de Disciplina Militar. É, não receamos dizê-lo aqui, uma declaração importante, uma declaração que, pelo que já foi dito, não pode contudo ficar-se pelo domínio das intenções. O Governo tem, por isso, de agir e de o fazer com a rapidez e o bom senso que a seriedade do problema requerem. Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Enquanto se aguarda pela concretização do anúncio de revisão do Regulamento de Disciplina Militar, o Governo traz à nossa apreciação uma proposta de lei que visa «desde já estabelecer uma adequada articulação entre as normas disciplinares específicas das Forças Armadas e as regras gerais de protecção dos cidadãos contra actos da Administração Pública». É, pois, sobre o sentido geral dessa proposta, mais do que sobre os normativos concretos que a compõem, que hoje somos chamados a pronunciar-nos. Ora, a disciplina militar, todos o sabemos, constitui um pilar estruturante da organização e do funcionamento de quaisquer Forças Armadas. Sem ela, as Forças Armadas não poderiam cumprir as amplas missões que a Constituição lhes atribui; sem ela, as Forças Armadas não poderiam assumir o papel de trave-mestra da independência nacional; sem ela, as Forças Armadas não poderiam assegurar o escrupuloso cumprimento das leis pelas quais se regem; sem ela, no limite, as Forças Armadas deixariam de existir. A disciplina militar não pode, porém, ser vista, em si mesma, como um valor absoluto e, como tal, escapando à aplicação dos mecanismos de controlo da legalidade dos actos a ela atinentes. De facto, ninguém ignora que o desempenho de funções nas Forças Armadas envolve, para aqueles que integram as suas fileiras, limitações ao exercício de alguns direitos fundamentais. Foi sempre assim, continua a ser assim — como se pode confirmar pela leitura de artigos da nossa Lei Fundamental, tais como os artigos 27.º ou o 270.º— e, no futuro, não poderá nunca deixar de ser assim. Mas, para além desses constrangimentos — ditados, insista-se, pela própria natureza da instituição militar e das funções que lhe cabe desempenhar —, os que nela prestam serviço são cidadãos como todos os outros, cidadãos que, por isso mesmo, devem ter acesso a meios de protecção dos seus direitos fundamentais. Dessa conjugação de factores decorre que nos encontramos colocados perante um problema delicado, um problema que é possível resumir da seguinte forma: como se pode conciliar a garantia da coesão das Forças Armadas — o que exige o respeito e a valorização da disciplina militar — com o direito que deve caber aos militares de agir, jurídica e contenciosamente, para fazer valer a razão que entendem assistirlhes? Dito de outro modo, esta é uma daquelas situações em que se torna indispensável encontrar caminhos adequados a salvaguardar, por um lado, e a conciliar, por outro, direitos e interesses constitucionalmente protegidos e potencialmente conflituantes; uma situação em que, de resto, por expressa imposição da nossa Lei Fundamental, a preservação de uns não pode nunca fazer-se à custa da pura e simples supressão dos outros. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Do ponto de vista do PSD, a proposta aponta no sentido certo e consagra uma solução equilibrada e proporcional; uma solução que, assumindo contornos particulares, respeita plenamente o referido princípio da compatibilização; uma solução que arranca da constatação de que os actos praticados no domínio da disciplina militar não são actos administrativos comuns, não podendo estar sujeitos a idêntico regime de impugnação; uma solução adequada à garantia da especificidade do estatuto que as Forças Armadas apresentam; uma solução que assegura, em condições equilibradas, o acesso ao direito de recurso por parte dos militares visados por medidas disciplinares; uma solução, enfim, que se apresenta como proporcionada merecendo, por isso mesmo, o nosso apoio genérico. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, ao longo do processo de elaboração da proposta de lei n.º 135/X, o Governo, reconhecendo a relevância e a delicadeza do tema em análise, teve o cuidado de procurar o consenso do Partido Social-Democrata. Esse consenso foi conseguido, facto pelo qual nos congratulamos. Como partido responsável que é, o Partido Social-Democrata deu uma vez mais mostras de que está sempre disponível para ajudar na procura de soluções politicamente abrangentes em todas aquelas matérias que, como sucede com as Forças Armadas, devem ser vistas como questões de regime. Infelizmente, nem sempre o Governo e o Partido Socialista têm sido capazes de demonstrar idêntico sentido de Estado, como sucedeu, em momento recente, com a revisão da Lei de Defesa Nacional. Mas não será essa inconstância do Partido Socialista que determinará mudanças no nosso comportamento, porque nestas matérias, como em todas as outras questões, o Partido Social-Democrata guia-se apenas e só pela prossecução do interesse nacional e porque estamos convictos de que a nossa atitude ponderada e construtiva é precisamente a que melhor contribui para a defesa e a realização desse mesmo interesse nacional.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Suponho que não suscitarei o desacordo de ninguém se afirmar que o respeito pela disciplina e pela hierarquia são as pedras angulares do funcionamento das Forças Armadas. O Regulamento de Disciplina Militar (RDM) estabelece o conceito de disciplina militar como «o laço moral que liga os diversos graus da hierarquia militar», nascido «da dedicação pelo dever» e que «consiste na estrita e pontual observância das leis e dos regulamentos militares». Obtém-se pela «convicção da missão a cumprir», e mantém-se através do «prestígio que nasce dos princípios de justiça empregados, do respeito pelos direitos, do cumprimento dos deveres, do saber, da correcção de proceder e da estima recíproca». A própria Constituição da República se refere à comunidade militar como uma «instituição nacional», que só poderá cumprir integralmente a missão que constitucionalmente lhe é atribuída — que consiste na defesa da independência nacional, da unidade do Estado e da integridade do território — se lhe forem garantidos os meios indispensáveis. Um desses meios é, de acordo com o Regulamento, a disciplina, sem a qual, salienta o RDM, «não haverá Forças Armadas». Vêm estas afirmações a propósito da proposta de lei que hoje discutimos na generalidade, e que visa criar um regime especial para os processos relativos a actos administrativos de aplicação de sanções disciplinares previstas no RDM. Com efeito, a proposta de lei n.º 135/X preconiza a criação de um regime específico para o recurso, em matéria de disciplina militar, sem, no entanto, vedar aos militares o acesso às vias gerais de impugnação dos actos administrativos, nem a qualquer dos meios processuais gerais, inclusivamente os cautelares. Esta lei especial vai no sentido de eliminar o automatismo da suspensão dos actos administrativos e criar critérios definidos para a possibilidade de suspensão, introduzindo assim um regime especial que cria requisitos próprios para o decretamento da suspensão de actos disciplinares praticados ao abrigo do RDM, e prevê ainda a possibilidade de instaurar a figura de juízes e assessores militares nos tribunais centrais administrativos, matéria esta que deverá ser alvo de proposta de lei autónoma. O CDS-PP está genericamente de acordo com esta proposta de lei e com as suas motivações, e considera-a, inclusivamente, necessária para dar cabal cumprimento ao desígnio do legislador constitucional, que, na revisão de 1997, consagrou a obrigação de extinção dos tribunais militares em tempo de paz. Entendemos, de resto, que não faria sentido ter-se procedido à adaptação da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e do Código de Justiça Militar às prescrições constitucionais — o que fizemos em 2003 — e não nos encarregarmos de fazer o aggiornamento do Regulamento de Disciplina Militar, matéria que é, como se sabe, da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República. Dir-me-ão que não é disso que a proposta de lei trata — e direi que têm razão! —, mas a exposição de motivos compromete o Governo nesse objectivo quando afirma — e cito — «(…) Torna-se, assim, patente a necessidade de revisão do próprio Regulamento de Disciplina Militar, a promover pelo Governo no prazo de 90 dias a partir da entrada em vigor da presente lei (…)». Pela nossa parte, gostaríamos que esse compromisso passasse para o articulado da lei, através da reformulação do artigo 7.º da proposta, pelo que ficaria mais claro. Para essa altura reservaremos a ponderação sobre outra matéria da proposta de lei que nos causa algumas dúvidas. Refiro-me à norma que prevê que os casos de disciplina militar vão passar a ser tratados por tribunais administrativos superiores, onde serão colocados juízes e assessores militares. Até agora estes processos eram tratados por tribunais administrativos comuns, de primeira instância. A nossa hesitação prende-se com o facto de o tribunal central administrativo poder conhecer de facto e de direito, ao passo que o Supremo Tribunal Administrativo apenas conhece de matéria de direito. Ou seja, se aos tribunais centrais administrativos competir julgar em primeira instância, como vem previsto na proposta do Governo, os recursos jurisdicionais limitar-se-ão à matéria de direito, de acordo com a lei. Sabemos que o Sr. Ministro da Defesa justificou a escolha dos tribunais superiores para o tratamento destes casos de disciplina militar por considerar que eles envolvem, muitas vezes, questões de garantia de direitos e da liberdade individual. Ora, é precisamente por essa razão, acrescentamos nós, que a reapreciação da matéria de facto pode ser determinante. E, assim sendo, de duas uma: ou se consagra, neste regime especial, que o recurso jurisdicional permite sempre a reapreciação da matéria de facto ou não se altera a regra da competência prevista na lei em vigor — e, neste caso, temos um problema! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já em tempos tivemos oportunidade de referir, noutro debate, que bem faria o Governo se, em vez de procurar impedir os tribunais de defender a legalidade democrática, se preocupasse em clarificar os limites do poder disciplinar, assim como os direitos das associações e dos dirigentes associativos. É de referir que, quando proferimos tais afirmações, o Sr. Ministro tinha feito declarações que iam no sentido de que o Governo estaria a ponderar alterar o Regulamento de Disciplina Militar de forma a evitar que os tribunais civis interferissem em matéria de disciplina militar. Graças a Deus, mudou de opinião! Como todos sabemos, estas declarações foram proferidas na sequência de uma decisão judicial do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que mandou suspender as penas de prisão de natureza disciplinar aplicadas aos dirigentes associativos militares que participaram no denominado «passeio do descontentamento», na sequência de uma providência cautelar pelos mesmos interposta junto daquele tribunal. Ao abrigo das disposições processuais aplicáveis a todo e qualquer cidadão, e atenta a motivação dos recursos apresentados, o tribunal entendeu que as eventuais penas de prisão não deveriam ser de aplicação imediata. Já o Tribunal Administrativo de Círculo de Almada, contrariamente ao que havia decidido o seu congénere de Sintra, não suspendeu a eficácia da pena de prisão disciplinar aplicada, considerando que, «se um conjunto de profissionais se junta num mesmo local, por estarem insatisfeitos com decisões políticas, fazendo disso prévia publicidade, chamando os jornalistas e levando esse descontentamento ao conhecimento da população, é a todos os títulos evidente que estamos perante uma manifestação. É da natureza das coisas…» — são ainda as palavras do juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Almada que citamos — «… que a simples existência de uma manifestação de militares põe em causa a disciplina castrense». Portanto, a mesma situação em dois tribunais foram objecto de decisões totalmente opostas. Por nós, consideramos — já atrás o referi — que o respeito pela disciplina e pela hierarquia são as pedras angulares do funcionamento das Forças Armadas. Este é um aspecto da questão. O outro lado da questão é este: não nos parece sensato que um militar possa ser sujeito a uma pena de prisão por mera decisão hierárquica, em tempo de paz e fora de qualquer actividade operacional no âmbito do desempenho das suas funções como dirigente associativo. Por esta e por outras razões já mencionadas, impõe-se igualmente a rápida revisão do Regulamento de Disciplina Militar, para a qual o CDS-PP promete dar empenhada contribuição. Não gostaria de terminar sem referir o facto de S. Ex.ª o Presidente da República — que por inerência é também Comandante Supremo das Forças Armadas — ter considerado que esta iniciativa legislativa respeita os direitos, liberdades e garantias consagrados na Constituição da República Portuguesa e dá resposta ao que as Forças Armadas consideram ser necessário para o exercício das suas funções. Da mesma forma, deliberou o Conselho Superior de Defesa Nacional, que emitiu parecer favorável a esta proposta. O CDS-PP considera, de facto, que nestas matérias é muito importante o consenso alargado dos órgãos de soberania, bem como o consenso entre as várias forças políticas, pois que se trata de matéria do estatuto legal e disciplinar das Forças Armadas, e estas são o garante último do Estado de direito democrático. Neste sentido, votaremos favoravelmente a proposta de lei do Governo.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta a esta Câmara a proposta de lei n.º 135/X, relativa ao regime de recurso dos actos administrativos que consubstanciem a aplicação de sanções disciplinares previstas no Regulamento de Disciplina Militar. Como o exaustivo e douto relatório, apresentado e aprovado na Comissão de Defesa Nacional e elaborado pelo Sr. Deputado José de Matos Correia, muito bem anota, estão cumpridos os preceitos legais e regimentais que suportam a apresentação desta iniciativa legislativa. Com a presente proposta de lei pretende estabelecer-se, como se refere na exposição de motivos, «uma adequada articulação entre os normativos disciplinares e específicos das Forças Armadas — cuja especificidade, convirá sublinhar, tem assento constitucional — e as regras gerais de protecção dos cidadãos contra actos da Administração Pública». O acto que aplica as regras de disciplina militar não é um acto administrativo como outro qualquer, tem características peculiares que importa ter em conta. A disciplina militar é uma das referências mais significativas da condição militar e elemento fundamental da sua cultura. Ela é um pilar em que assenta a instituição militar. É esta matriz da instituição militar que a Constituição acolhe, valoriza e nos obriga a uma análise ponderada e à construção de um equilíbrio entre dois valores fundamentais: por um lado, o valor da disciplina militar; por outro, os direitos, liberdades e garantias e o emergente direito que aos cidadãos militares assiste de recurso aos tribunais. Como o Sr. Ministro da Defesa Nacional aqui salientou, no passado dia 18 de Maio, o objectivo do presente diploma prende-se com a necessidade de salvaguardar a disciplina militar — fundamental para o funcionamento das Forças Armadas e da democracia —, compatibilizando-a com o valor dos direitos, liberdades e garantias, em particular o valor do acesso à justiça por parte dos militares. Com a proposta que hoje apreciamos ficará assegurado todo o acesso dos militares à justiça, estabelecendo-se uma modulação particular quando se trate de actos que impõem sanções ao abrigo do Regulamento de Disciplina Militar. Deste tipo de actos administrativos cabe recurso, em primeira instância, para a secção do contencioso administrativo de cada tribunal central administrativo. No que às providências cautelares tange estabelece-se o princípio de que, apenas, poderão ser decretadas quando haja fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado e seja evidente a procedência da pretensão, por se tratar: de acto manifestamente ilegal, de aplicação de norma já anteriormente anulada, de acto idêntico a outro anulado, declarado nulo ou inexistente. Assim, como o diploma estabelece no seu articulado, só preenchendo estes critérios e ouvida a entidade recorrida será possível decretar a suspensão da eficácia deste tipo de actos. As normas relativas às providências cautelares não limitam nem retiram direitos aos cidadãos que optaram pela vida militar e assumiram os direitos e deveres relativos a esta condição. A reacção contra actos ilegais por parte da Administração sofreu uma rápida e profunda evolução. Com a aprovação, pela Assembleia da República, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aqui aprovado em 19 de Fevereiro de 2002, e do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, em 22 de Fevereiro, e com a previsão de entrada em vigor para 1 de Janeiro de 2004, posteriormente adiada, cumpriu-se um imperativo constitucional de assegurar uma tutela jurisdicional efectiva na defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos nas suas relações com a Administração, incluindo também o alargamento do tipo de providências cautelares. Estes diplomas foram o culminar de um longo e penoso caminho que os cidadãos percorreram para defender os seus direitos na sua relação com a Administração — e com eles, naturalmente, os agentes judiciários. Recordo, aqui, os difíceis condicionalismos de actuação para os interessados mas também para os agentes judiciários. A única providência cautelar prevista até 1985 era a suspensão de eficácia do acto administrativo. Ao cidadão lesado, para obter a reposição da justiça, não bastava diligência e saber; era necessário, muitas vezes, acreditar na «conjunção dos astros»…! A Administração não detinha, apenas, o privilégio de execução prévia; era a entidade soberana, omnipotente que pairava sobre os cidadãos e a quem estes deviam cegamente obedecer. O novo regime de processo nos tribunais administrativos veio alargar horizontes, alterar critérios e estabelecer um novo paradigma: a partir daqui, administrandos e administrados situam-se em plano de igualdade e as respectivas decisões são sempre sindicáveis. O alargamento do tipo de providências e das bases em que assentam as respectivas decisões não implicam que estas devam ser sempre automaticamente decretadas. Existem diferentes critérios legais, mesmo para as providências cautelares relativas a outros actos, no artigo 120.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos que limitam e condicionam o decretamento automático das mesmas. Desde o inovador critério de ponderação dos interesses — públicos e privados — até ao fumus boni juris ou ao periculum in mora, tudo são limites que devem ser ponderados pelo juiz que analisa o pedido e tem de decidir. Infelizmente, nem sempre as nossas decisões judiciais são exemplo e espelho de uma adequada e ponderada aplicação da lei — daí a expressão caricatural de alguns dos nossos analistas quanto «ao governo pelos tribunais»… Nesta linha de análise, o que se pretende, com a discussão e a aprovação da presente proposta de lei, é uma adequada e ponderada interpretação da lei no que aos actos administrativos que aplicam sanções aos militares se refere, facultando, naturalmente, ao cidadão militar a sua indiscutível faculdade de recurso aos tribunais para reagir a uma decisão que considera ilegal, sem esquecer que (em contraponto) se perfila um valor também constitucionalmente consagrado: a disciplina militar, base essencial da instituição militar e elemento fundamental da cultura militar e do Estado democrático! O Grupo Parlamentar do Partido Socialista dará, nestas condições, o seu voto favorável à presente proposta de lei.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Defesa Nacional veio dizer que o Governo traz uma resposta pronta para um problema que terá sido colocado à disciplina militar por via de alterações legislativas recentes em matéria de tribunais administrativos e de justiça militar, mas eu queria dizer que o Sr. Ministro está enganado porque, efectivamente, o recurso de decisões punitivas em matéria de disciplinar militar para os tribunais administrativos faz-se desde 1985, quando foi aprovada a Lei de Processo dos Tribunais Administrativos e Fiscais, em Julho desse ano. Portanto, a existir o problema, ele existe há 22 anos!… Aliás, em 1988, até há jurisprudência constitucional sobre esta matéria, reconhecendo as competências dos tribunais administrativos para se pronunciarem sobre esta matéria. Assim, o que acontece é que há 22 anos que se recorre de actos punitivos de disciplina militar para os tribunais administrativos. Em 1997, a revisão constitucional determinou a extinção dos tribunais militares em tempos de paz. A reforma do contencioso administrativo, por seu turno, foi feita por um governo do Partido Socialista, em Fevereiro de 2002, ou seja, há cinco anos e meio, e a reforma da justiça militar foi feita em 2004. Agora, em 2007, o Governo percebeu que havia um problema de compatibilização entre estas várias disposições legais. A razão para esta súbita descoberta é simples, Sr. Ministro: na verdade, não há qualquer incompatibilidade!! O que há é um falso problema que o Governo criou única e exclusivamente a partir do momento em que decidiu instrumentalizar a disciplina militar para fins estritamente políticos! Esta é que é a nova questão que existe agora e que não existia!! O que o Governo propõe é que, mesmo que seja requerida a suspensão da eficácia de um acto administrativo, não haja suspensão da execução desse acto, ou seja, não haja proibição automática de execução do acto. O Governo pretende impor limites à capacidade de intervenção dos tribunais administrativos na adopção de providências cautelares; pretende afastar estas matérias da jurisdição dos tribunais administrativos de primeira instância; e permite a introdução de juízes militares e de assessores militares do Ministério Público nos tribunais administrativos, como se estes fossem tribunais criminais, aqueles para os quais a reforma da justiça militar introduziu esta regra. O que o Governo propõe vem contrariar princípios basilares que presidiram à reforma do contencioso administrativo feita, lembro mais uma vez, por um governo do Partido Socialista! É o caso do princípio da unificação do sistema de impugnação dos actos administrativos e da regra de que todos os actos administrativos devem passar pelos tribunais administrativos de primeira instância. Esta lei vem criar um precedente grave e vem introduzir uma gravíssima distorção no sistema de garantia que os cidadãos podem exercer perante os tribunais administrativos. Por outro lado, esta iniciativa vem violar o princípio da tutela jurisdicional efectiva, que está consagrado inequivocamente no artigo 20.º da Constituição, ao tornar inócua a intervenção dos tribunais em matéria de providências cautelares. O que isto significa é que o Governo não quer aceitar sujeitar-se à jurisdição dos tribunais administrativos, ou seja, se as decisões dos tribunais não convêm ao Governo acaba-se com as decisões dos tribunais e passa a decidir o Governo. Os tribunais são impedidos de intervir em determinadas matérias. O Governo vem dizer que há um problema com a disciplina militar, que os actos de disciplina militar não são actos administrativos como os outros, mas, Sr. Ministro, os tribunais sabem disso! Julga que um juiz de um tribunal administrativo que seja chamado a decidir sobre uma matéria destas não sabe que está a tratar de matéria disciplinar e de matéria militar?! Os juízes não são néscios, Sr. Ministro!! Sabem muito bem do que estão a tratar, sabem o que é a instituição militar e sabem, evidentemente, que o seu dever é o de salvaguardar os direitos fundamentais dos cidadãos em qualquer circunstância, sejam eles civis ou militares! O problema do Governo não é com a disciplina militar. Na verdade, o que o Governo quer é, pela mão da hierarquia militar, instrumentalizar a disciplina para fins que lhe são estranhos. O Governo não quer impor a disciplina. O que o Governo quer é proibir o exercício de direitos associativos, usando o arsenal punitivo da disciplina militar como arma de punição política para quem conteste as suas decisões políticas. E para tal, Sr. Ministro, o Governo parece não recuar perante nada!! Numa das última reuniões em que o Sr. Ministro compareceu perante a Comissão de Defesa Nacional, perguntei-lhe directamente se tinha sido por ordem do Ministério da Defesa que alguém tinha sido encarregado de fotografar os participantes no chamado «passeio do descontentamento», por forma a que essas fotografias pudessem ser utilizadas na instrução de processos disciplinares. O Sr. Ministro, lembro-me perfeitamente, fez um ar incrédulo perante esta pergunta, estranhando-a, e negou peremptoriamente. Nós sabemos que as reuniões da Comissão de Defesa Nacional não são públicas, mas estão aqui muitos Srs. Deputados que não me deixam mentir e que se lembram de ouvir o Sr. Ministro afirmar que o Ministério da Defesa Nacional não tirava fotografias, ponto final! Pois bem, Sr. Ministro, eu tenho provas documentais de que V. Ex.ª ou ignorava o que o seu Ministério andava a fazer ou que faltou à verdade perante a Comissão. Tenho aqui uma cópia de um ofício que, fazendo parte de um processo disciplinar concluído com a punição do militar através de detenção disciplinar, foi acompanhado por um CD com fotografias utilizadas no processo disciplinar que conduziu a essa punição. Este ofício, que tem como assunto o «Visionamento de fotos enviadas à Força Aérea pelo Ministério da Defesa Nacional» diz o seguinte: «As fotos em epígrafe foram enviadas através do grupo WISE para todos os comandos funcionais e unidades da Força Aérea. Depois de analisadas pelos mesmos, foram identificados os seguintes militares em efectividade de serviço». A seguir a isto, vem uma lista dos militares identificados com base nessas fotografias. Ou seja, o Ministério da Defesa Nacional enviou fotografias à Força Aérea para que os fotografados fossem identificados, tendo as fotografias sido enviadas pelo tal grupo WISE. Pelos lesados foi, aliás, apresentada uma queixa-crime contra o Ministério da Defesa Nacional, porque, de facto, este procedimento configura um ilícito criminal. Ora, eu não gostaria que o Sr. Ministro saísse daqui sem nos explicar o que é o grupo WISE. Será que existe alguma polícia secreta dentro do Ministério da Defesa Nacional? Será que o Ministério tem um departamento que se dedica a acções delatórias através da prática de ilícitos criminais ou será que isto é um outsorcing do Ministério da Defesa Nacional que se dedica a actos delatórios? Gostaria que o Sr. Ministro da Defesa, tendo em conta a gravidade que entendemos que este documento encerra, não saísse daqui sem nos explicar cabalmente o que é que o seu Ministério tem vindo a fazer nesta matéria e sem nos dar uma explicação cabal sobre o conteúdo deste ofício, que reputamos de extrema gravidade.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje, aqui, discutimos pretende, alegadamente, conjugar a disciplina militar com a protecção dos direitos, liberdades e garantias dos militares no que se refere ao recurso de decisões disciplinares. Entre outros aspectos, esta proposta de lei estabelece um mecanismo especial da suspensão de eficácia dos actos que aplicam a disciplina militar, introduz «critérios especiais de decisão» de providências cautelares relativas à disciplina militar, bem como quanto ao decretamento provisório dessas providências, e prevê a intervenção de juízes e assessores militares junto dos tribunais que julguem decisões de disciplina militar. Sendo tão pequena na sua extensão, a proposta é enorme quanto à gravidade dos atentados que anuncia. Passemos, pois, a enunciá-los. Em primeiro lugar, a alegada conjugação da disciplina militar com a protecção dos direitos, liberdades e garantias deve ser ponderada — se é que deve sequer ser ponderada — com o maior cuidado. Tendo as sanções disciplinares previstas no obsoleto Regulamento de Disciplina Militar uma natureza bastante particular e hoje controversa, a restrição do acesso à justiça é sempre inaceitável! Penas como as de repreensão ou repreensão agravada, detenção, proibição de saída ou prisão disciplinar são irreversíveis nos seus efeitos. São irreversíveis, também, no dano pessoal que causam à reputação do militar a partir do momento em que são aplicadas. Assim, não se compreende como, de acordo com esta proposta de lei, a mera ameaça de uma situação de facto consumado não é suficiente para poder suspender os actos em causa quando deles se recorre. De facto, há que perguntar que efeitos tem a anulação de uma repreensão agravada, se o militar foi já repreendido. E de que vale anular uma pena de detenção quando o militar já foi obrigado a cumpri-la e privado da sua liberdade? Faz algum sentido ou acautela algum direito em termos efectivos? Já bastavam as situações de todos conhecidas e já publicitadas em que é a própria instituição militar que se recusa a cumprir as ordens judiciais, com isso invalidando completamente a sua eficácia! Tenha-se presente, a título de exemplo, a recente suspensão da pena de detenção de um sargento da Marinha que não foi acatada pela instituição, tendo o militar ficado ilegalmente detido por cinco dias, ao arrepio das regras do Estado de direito. Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados: O que esta proposta de lei faz é dar cobertura legal a práticas ilegais que têm vindo até agora a ser regra em matéria disciplinar nas instituições militares, mas nem isso faz da prepotência e do abuso comportamentos legítimos ou aceitáveis. Se não existe efectiva tutela dos direitos fundamentais, todos esses direitos estão potencialmente afectados — é essa a situação criada por esta proposta de lei!! Reparem VV. Ex.as: de acordo com a proposta do Governo, para que uma providência cautelar em matéria disciplinar possa ser decretada, não basta o perigo de criação de uma situação de facto consumado. É necessário ainda que o acto seja manifestamente ilegal, ou seja, para além de não se bastar com a ilegalidade — visto que essa ilegalidade tem de ser manifesta —, é preciso que o acto em causa aplique uma norma já anteriormente anulada e que o acto seja materialmente idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo. Para além disso, de todos estes requisitos, tem ainda de ser «evidente» a pretensão…! Esta suposta evidência levanta, só por si, vários problemas. Desde logo, o absurdo de não bastar uma ameaça de facto consumado para se poder recorrer. Depois, não se segue o regime geral administrativo, cuja lei, em caso de ameaça de facto consumado, apenas exige que «não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão» ou que «seja provável que a pretensão venha a ser julgada procedente». O regime proposto pelo Governo exige, ao contrário, que essa pretensão tenha de ser «evidente», dando a entender que tem de ser uma ilegalidade tão grande que salte à vista de toda a gente, sem contestação possível… Há que dizer, contudo, que não duvidamos de que possam existir ilegalidades destas. O problema fundamental é este: qual a necessidade de tantos requisitos tão apertados, de tantos conceitos vagos e indeterminados? Tudo isto para uma simples providência cautelar?! Não está sequer em causa ajuizar do valor final da decisão disciplinar… Pretende-se apenas salvaguardar, através de uma medida cautelar, a possibilidade e o direito constitucionalmente garantido de o militar recorrer dessa decisão, caso entenda fazê-lo. Para além disso, passa também a não ser possível decretar a providência cautelar sem ser ouvida a entidade militar. Note-se que a lei geral já define em que casos as entidades requeridas devem ou não ser ouvidas. De acordo com o regime geral, se o juiz assim entender, pode não ouvir essa entidade no processo relativo à providência cautelar. E isto porque a providência cautelar é um meio provisório por natureza, não é uma medida definitiva. Porquê, então, a excepção para a disciplina e as autoridades militares? Mas há mais: a proposta não prevê um prazo para que as autoridades militares se pronunciem em tempo útil, falando apenas em «meio expedito». Ora, já tivemos casos, como referimos, em que uma entidade militar se furta ao cumprimento de intimações judiciais para obstar ao seu efeito útil. Não havendo um prazo claramente definido, esta prática tenderá a generalizar-se! E, como vimos, nem o perigo do facto consumado serve para abrir qualquer excepção. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei é, sem sombra de dúvidas, um grave ataque aos direitos e garantias dos cidadãos militares, sendo totalmente legítimo levantar as mais sérias dúvidas quanto à sua constitucionalidade. É porque as sanções disciplinares afectam a honra e a dignidade das pessoas em causa. Assim sendo, é duvidoso que ainda possa subsistir um verdadeiro acesso ao direito e à justiça se o conteúdo desse direito tiver sido previamente invalidado e se o efeito do acto disciplinar já estiver consumado. Em suma, para nós, nenhuma necessidade de disciplina pode ser tão forte que justifique restrições deste cariz a direitos fundamentais. Esta proposta de lei, que é a «relíquia» de um certo militarismo serôdio, acaba por ser mais um episódio na escalada persecutória contra as associações de militares. Obviamente, votaremos contra ela!! Significa isto que é necessário clarificar essas regras. Mas não é esta a razão fundamental. A razão fundamental é aquela que já referi e que tem a ver com a evolução da ordem jurídica, da sociedade portuguesa e das próprias Forças Armadas, porque há uma alteração fundamental. É isto que justifica a necessidade desta proposta de lei. A segunda questão que gostaria de abordar, e que foi levantada nas intervenções de vários Srs. Deputados, nomeadamente os Srs. Deputados João Rebelo, Campos Ferreira e Alberto Antunes, tem a ver com o regulamento de disciplina militar. O preâmbulo di-lo e eu gostaria de o reafirmar. Os trabalhos para a revisão do regulamento de disciplina militar estão bastante adiantados, é necessário proceder às consultas devidas, é necessário encontrar nesta matéria, porque também é uma questão de Estado, um maior consenso possível, mas o Governo, no cumprimento da lei, apresentará a esta Assembleia, no prazo previsto, a proposta de revisão do regulamento de disciplina militar, que, volto a frisar, é absolutamente indispensá14 I SÉRIE — NÚMERO 98 vel pelas alterações que têm vindo a ocorrer na sociedade portuguesa de há 30 anos a esta parte. O regulamento é de 1977 e até hoje muita coisa mudou na sociedade portuguesa bem como nas Forças Armadas, desde logo a natureza do recrutamento, que passou de serviço militar obrigatório para serviço profissionalizado, o que não deixa de ter implicações nessa matéria.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, o Relatório de Orientação da Política Orçamental é um documento de boas intenções, mas, valha a verdade, Sr. Ministro, nada mais do que isso, porque, até agora, tem pouca aderência à realidade e as intenções para o futuro valem o que valem. Dizem os senhores que vão reduzir o défice essencialmente através da redução da despesa pública no PIB, mas a verdade é que a experiência passada permite-nos desconfiar deste objectivo. Repare-se: em 2006, o défice desceu de 6% para 3,9%, 2,1 pontos percentuais do PIB, dos quais 0,8% se devem à receita, 0,7% à despesa corrente primária e 0,6% à despesa de capital. Ou seja, é a receita destas três parcelas aquela que maior peso tem. Ora, isto contraria o que o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro aqui disseram no debate mensal sobre o tema, isto é, que a redução do défice tinha sido conseguida em três quartos — pelo menos — pelo lado da despesa. Por falar em despesa, Sr. Ministro, gostava que comentasse uma notícia de ontem, que nos dá conta de que a Estradas de Portugal vai sair do perímetro do défice e, portanto, não vai contar para as contas públicas nos próximos anos. Isto cheira a desorçamentação clara, Sr. Ministro! E é o inverso do que os senhores defenderam em 2005. Ontem, o Primeiro-Ministro referiu: «Vamos reduzir o ISP e criar uma taxa que representa uma contribuição rodoviária de valor equivalente». Pergunto-lhe, Sr. Ministro: isto é suficiente para garantir que 50% dos custos da Estradas de Portugal vão ser financiados com receitas próprias? É que só assim é que esta empresa pode passar — parece que vai passar — para fora do perímetro das administrações públicas. Recordo que os senhores, em 2005, foram contra este tipo de operação, disseram que se tratava de uma desorçamentação, por isso voltaram a colocá-la no perímetro das administrações públicas. E agora, como é que é?! Gostava que nos esclarecesse, porque tudo isto parece ser extremamente nebuloso, nada claro, nada transparente. O Sr. Ministro também referiu que, este ano, o défice público vai ser reduzido para 3,3% do PIB. Mas porque é que não é reduzido para 3%? Se o senhor previa um défice de 4,6% no ano passado e ele atingiu 3,9%, porque é que agora não prevê um défice de 3% visto que antes previa que ele seria de 3,7%? Há aqui qualquer número que me escapa… Com certeza, deve ser falha minha. Sr. Ministro, com um défice de 3,3%, o senhor tinha margem de manobra mais do que suficiente para ter aceite a nossa proposta de redução de impostos já para este ano, o que, como sabe, não se aplicaria a todo o ano. Porque é que não o fez? Tal seria essencial para relançar a nossa economia. Foi pena que o Sr. Ministro não tivesse estado presente no colóquio que a Assembleia da República organizou na passada terça-feira sobre fiscalidade e competitividade. Sabe porquê? Porque ficou claro para toda a gente — excepto para o PS e para o Governo, representado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais — que Portugal tem um défice claro de competitividade global e, também, de competitividade fiscal. Tenho pena, repito, que o Sr. Ministro não tenha estado presente nesse colóquio, mas o Sr. Secretário de Estado certamente poderá fazer-lhe chegar um resumo. Era importante mudar a política orçamental, a política fiscal errada que este Governo tem vindo a prosseguir, porque tal ajudaria a relançar a economia. E sabe porquê, Sr. Ministro? Porque em 2006 tivemos o pior crescimento da União Europeia,… Vou terminar em breve, Sr. Presidente. Em 2007 teremos o pior crescimento e, pior ainda, no primeiro trimestre de 2007 tivemos o pior crescimento da União Europeia, , ou seja, 2%, quando a União Europeia cresceu mais de 3%, Sr. Ministro. É certo, e ainda bem, que as exportações estão com dinamismo, mas mesmo essas regrediram um pouco. E o investimento? O investimento continua desaparecido. Sabe porquê? Porque não há condições para os empresários investirem, não há condições para os investidores virem para Portugal. Sr. Ministro, gostava que nos esclarecesse sobre todos estes assuntos. Mas eu queria centrar as minhas questões fundamentalmente na matéria dos impostos. Para que fique muito claro, também estamos satisfeitos com o facto de haver mais declarações de IRS entregues este ano, ficamos satisfeitos pela utilização genérica da Internet, que, de ano para ano, 16 DE JUNHO DE 2007 11 vai subindo e nos coloca, no plano internacional, em níveis bastante satisfatórios. No entanto, Sr. Ministro, o senhor não é propriamente um alto funcionário da Administração Pública, o senhor é um responsável de natureza política. Portanto, o discurso sobre impostos não pode ficar apenas por estas matérias. Nesse sentido, quero colocar-lhe um conjunto de perguntas claras e concretas. Sr. Ministro, todos concordamos que o plano fiscal é um dos elementos importantes para a competitividade da nossa economia. Muito se fala em relação à concorrência entre os sistemas de natureza fiscal. Pois, neste momento, temos desde logo um imposto (o IRS) complicado de aplicar, cheio de benefícios, com inúmeros escalões. O Sr. Ministro está disponível para estudar uma proposta séria de reforma do IRS, de forma a que ele se torne um imposto mais claro, mas simples, com menos escalões, com taxas mais baixas, para que assim possamos caminhar para aqueles que são os padrões dos restantes parceiros europeus? Esta é a primeira questão sobre impostos que lhe queria colocar. A segunda questão tem a ver com o seguinte: um dos elementos essenciais para a competitividade fiscal é o da política para investigação e desenvolvimento. Quais são os planos que tem em relação a essa matéria? O que pretende trazer de novidades? É que o plano que neste momento existe ainda é um plano de natureza insatisfatória, ainda não alcançámos os patamares internacionais quanto a esta matéria. O que pretende modificar quanto a essa legislação? Em terceiro lugar, um dos impostos que mais faz sofrer hoje em dia os consumidores portugueses é, de facto, o ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos). Ontem foi anunciado aquilo que foi apresentado como uma mera consignação de receitas, o que, como princípio, não é errado. Contudo, temo que, ao ouvir o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares dizer que não é uma mera consignação de receitas, estejamos perante uma nova taxa que vai sobrecarregar os portugueses
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª terminou a sua intervenção de há pouco dizendo que o País precisava de trabalho, de trabalho e mais trabalho para cumprir os seus objectivos. Concordo consigo, e por isso mesmo vou colocar-lhe um conjunto de questões concretas que considero que lhe podem dar algum trabalho a responder, mas que são respostas importantíssimas para o futuro do nosso país. Desde logo, começo por fazer um enquadramento genérico, que considero importante. É que a intervenção do Sr. Ministro durou cerca de 16 minutos e sobre as Grandes Opções do Plano disse zero, o que até considero compreensível na medida em que, felizmente, já não vivemos uma economia planificada e, portanto, escusamos de ter discussões estéreis e devemos ir àquilo que verdadeiramente interessa. Aliás, nesse sentido, peço ao Sr. Ministro que exerça alguma influência sobre alguns dos seus colegas de Governo e também sobre a sua bancada parlamentar para que deixemos de ter uma obrigação constitucional que não tem qualquer sentido nos dias de hoje. Mas eu queria centrar as minhas questões fundamentalmente na matéria dos impostos. Para que fique muito claro, também estamos satisfeitos com o facto de haver mais declarações de IRS entregues este ano, ficamos satisfeitos pela utilização genérica da Internet, que, de ano para ano, vai subindo e nos coloca, no plano internacional, em níveis bastante satisfatórios. No entanto, Sr. Ministro, o senhor não é propriamente um alto funcionário da Administração Pública, o senhor é um responsável de natureza política. Portanto, o discurso sobre impostos não pode ficar apenas por estas matérias. Nesse sentido, quero colocar-lhe um conjunto de perguntas claras e concretas. Sr. Ministro, todos concordamos que o plano fiscal é um dos elementos importantes para a competitividade da nossa economia. Muito se fala em relação à concorrência entre os sistemas de natureza fiscal. Pois, neste momento, temos desde logo um imposto (o IRS) complicado de aplicar, cheio de benefícios, com inúmeros escalões. O Sr. Ministro está disponível para estudar uma proposta séria de reforma do IRS, de forma a que ele se torne um imposto mais claro, mas simples, com menos escalões, com taxas mais baixas, para que assim possamos caminhar para aqueles que são os padrões dos restantes parceiros europeus? Esta é a primeira questão sobre impostos que lhe queria colocar. A segunda questão tem a ver com o seguinte: um dos elementos essenciais para a competitividade fiscal é o da política para investigação e desenvolvimento. Quais são os planos que tem em relação a essa matéria? O que pretende trazer de novidades? É que o plano que neste momento existe ainda é um plano de natureza insatisfatória, ainda não alcançámos os patamares internacionais quanto a esta matéria. O que pretende modificar quanto a essa legislação? Em terceiro lugar, um dos impostos que mais faz sofrer hoje em dia os consumidores portugueses é, de facto, o ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos). Ontem foi anunciado aquilo que foi apresentado como uma mera consignação de receitas, o que, como princípio, não é errado. Contudo, temo que, ao ouvir o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares dizer que não é uma mera consignação de receitas, estejamos perante uma nova taxa que vai sobrecarregar os portugueses Sr. Presidente, vou terminando esta minha intervenção. Sr. Ministro, gostaria de saber se nos vamos ficar pela mera consignação ou se estamos a criar um patamar para, no futuro, ainda termos uma maior carga tributária sobre os portugueses. E essa carga tributária é, com toda a certeza, extraordinariamente preocupante Sr. Ministro, estas são três questões concretas para as quais os portugueses precisam de ter resposta e pela qual nós ansiamos. Gostava de perceber o que os senhores pretendem fazer relativamente ao PIDDAC este ano. Recentemente, foi divulgada uma cativação suplementar de 10% de muitas das verbas do 12 I SÉRIE — NÚMERO 95 PIDDAC para este ano. Sabemos que o PIDDAC já estava ao nível das verbas previstas em 1997 e, portanto, a questão que se coloca é evidente: onde é que o Governo pretende chegar com mais estes cortes no PIDDAC? A que níveis de não investimento pretende chegar? Pretende paralisar completamente o investimento público no País? Pretende paralisar o País só para cumprir o défice orçamental? Sr. Ministro, gostaria ainda de lhe colocar uma questão relativamente à recente decisão de subida das taxas de juro pelo Banco Central Europeu. Quem ouviu o Sr. Ministro ou o Governador do Banco de Portugal ficou convencido de que os senhores nada tinham a ver com esta matéria. Ora, na minha opinião, perdoem-me que diga, isso é só meia verdade. Em primeiro lugar, porque o Sr. Governador do Banco de Portugal participa directamente nestas decisões,…
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, quer nas GOP quer no relatório de orientação da política orçamental os senhores prevêem uma taxa de desemprego, para 2007, de 7,5%. Sr. Ministro, não quero discutir se os desempregados são 470 000 (o número virtual oficial) ou se são cerca de 600 000. Nem sequer quero discutir o novo fenómeno migratório que faz com que, neste momento, cerca de 100 000 portugueses estejam a trabalhar em Espanha ou que muitos milhares entrem naquilo a que se costuma designar como os novos campos de escravatura da União Europeia, sem que o Governo «mexa uma palha» para evitar esses campos de escravatura. Fiquemo-nos pelos 7,5% que os senhores propõem para o desemprego este ano. A questão que lhe coloco é a seguinte: sabendo que no primeiro trimestre os números oficiais do INE (Instituto Nacional de Estatística), confirmam a existência de 8,4% de desemprego, gostaria que me explicasse, a mim e ao País, como é possível prever para este ano uma taxa de desemprego de 7,5%. Que espécie de milagre é que os senhores esperam que aconteça daqui até ao fim do ano para fazer baixar a taxa de desemprego de 8,4% para uma média anual de 7,5%. Gostaria ainda de lhe colocar uma outra questão. Todos sabemos que os senhores são capazes de «vender a alma ao diabo» para cumprir o défice orçamental — já deram provas suficientes disso. Agora até se aprestam para introduzir «novos truques» de desorçamentação, exactamente os mesmos truques de desorçamentação que criticaram ao Dr. Durão Barroso e ao Dr. Santana Lopes! Gostava de perceber o que os senhores pretendem fazer relativamente ao PIDDAC este ano. Recentemente, foi divulgada uma cativação suplementar de 10% de muitas das verbas do PIDDAC para este ano. Sabemos que o PIDDAC já estava ao nível das verbas previstas em 1997 e, portanto, a questão que se coloca é evidente: onde é que o Governo pretende chegar com mais estes cortes no PIDDAC? A que níveis de não investimento pretende chegar? Pretende paralisar completamente o investimento público no País? Pretende paralisar o País só para cumprir o défice orçamental? Sr. Ministro, gostaria ainda de lhe colocar uma questão relativamente à recente decisão de subida das taxas de juro pelo Banco Central Europeu. Quem ouviu o Sr. Ministro ou o Governador do Banco de Portugal ficou convencido de que os senhores nada tinham a ver com esta matéria. Ora, na minha opinião, perdoem-me que diga, isso é só meia verdade. Em primeiro lugar, porque o Sr. Governador do Banco de Portugal participa directamente nestas decisões, portanto é responsável. Em segundo lugar, porque o senhor e o Governo também são politicamente responsáveis. Por que razão o Sr. Ministro não propõe a revisão do estatuto do Banco Central Europeu? Porque é que não chega ao ECOFIN e diz: «Não, o Banco Central Europeu, em vez de se preocupar apenas com a inflação deve preocupar-se também com o crescimento económico e com o emprego»? Por que razão o senhor, que assume daqui a uns dias a presidência do ECOFIN, não coloca esta matéria tão sensível e prejudicial para Portugal e para os portugueses na agenda da Presidência portuguesa? E agora querem vir aqui dar lições de consolidação orçamental a um Governo que está a dar provas de que é capaz de reduzir o défice e de reduzir o peso da despesa no PIB! Quanto à receita, Sr. Deputado, certamente não descuramos a frente da receita combatendo a fraude e a evasão fiscais e dando maior eficiência à nossa administração tributária. Assim, alargamos a base de muitos contribuintes que têm estado à sombra da legalidade fiscal, que se têm evadido do cumprimento de obrigações fiscais onerando os contribuintes cumpridores. Com efeito, queremos acabar com esta injustiça fiscal melhorando o nosso sistema de combate à fraude e à evasão fiscais e a eficiência da administração tributária. Ganhámos receita com isso? Claro que sim, e ainda bem! O Sr. Deputado Miguel Frasquilho, a exemplo do que fizeram outros Deputados, referiuse à questão da Estradas de Portugal. De facto, esta empresa vai ser transformada numa sociedade 16 DE JUNHO DE 2007 13 anónima com capitais privados, vai ser privatizada, e é neste contexto de privatização que faz sentido um modelo de gestão e de financiamento claro e transparente. Deste modo, os utentes da rede rodoviária nacional pagarão uma taxa referente ao uso dessas estradas,…
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Mas esse é o seu trabalho, Sr. Deputado Victor Baptista! Nunca o vi fazê-lo, é certo, mas é seu! Não o fazem, contudo, Sr. Ministro… Parece ser coisa difícil!… Em todo o caso, num relatório elaborado por um Deputado do PSD sobre estas matérias, a oitava conclusão reconhece que a consolidação orçamental tem sido conseguida também através da redução de despesa corrente em 0,6%. É curioso, mas há pelo menos um Deputado do PSD que reconhece este facto. Sr. Ministro, vou fazer-lhe uma pergunta, mas gostaria de enquadrar esta pergunta numa perspectiva ainda relacionada com o âmbito deste colóquio. Considera ou não V. Ex.ª que Portugal, do ponto de vista da fiscalidade, é um país competitivo? Por outro lado, há ainda neste domínio matérias em que o Governo pode e deve intervir rapidamente para melhorar esta competitividade? Pergunto-lho porque, contrariando o que aqui foi dito, a despesa pública passou de 47,4% do PIB, em 2005, para 46,1% em 2006. Por seu turno, na Zona Euro a despesa indexada ao PIB passou de 47,5% para 47,4%, ou seja, uma redução média de 0,1% na Zona Euro para uma redução de 1,3% em Portugal. Isto significa que, neste indicador da despesa indexada do PIB, estamos abaixo da média da Zona Euro, que tem, como disse, um valor de 47,4%, enquanto Portugal tem 46,1%. Quanto às receitas, estas cresceram, de 2005 para 2006 e na Zona Euro, 0,7%, representando 45,8% do PIB, quando em Portugal representam 41,8% do PIB. Por fim, diria que este argumento da carga fiscal nacional é uma «montagem», visto que, em Portugal, está abaixo da média da Zona Euro. Termino, Sr. Ministro, dizendo que a questão do investimento é obviamente importante. A pergunta que lhe faço procura saber se se trata apenas do investimento público ou se haverá investimento público em parceria com o sector privado. Sr. Presidente, Sr. Ministro, ouvi a sua resposta sobre a Estradas de Portugal e fiquei com duas dúvidas que não foram esclarecidas e que se relacionam com a desorçamentação. O que quero saber é se o que vai acontecer representa ou não uma situação de desorçamentação. Por outro lado, face ao que o Sr. Ministro disse, o que parece que vai acontecer é que o Governo, directa ou indirectamente, vai lançar portagens sobre todas as auto-estradas. Como tal, queria que me dissesse se vai ou não haver lançamento de portagens sobre as auto-estradas de Portugal, porque, com esse quadro que o Sr. Ministro traçou, parece que vão acabar as SCUT e que vai haver portagens mesmo nessas auto-estradas. O Deputado Victor Baptista veio dizer que Portugal é um país cuja competitividade fiscal não se põe em causa, o que não é verdade, como o Sr. Ministro concordará. Poderão dizer que é, por razões de consolidação orçamental, mas a verdade é que essa competitividade fiscal não existe. E, se tiver dúvidas, pode aceder às actas da tal reunião que houve na Sala do Senado, promovida pela Comissão de Orçamento e Finanças, e ler o que disse o Dr. Basílio Horta, Presidente da API (Agência Portuguesa para o Investimento). O Dr. Basílio Horta levantou muitas questões em relação à inexistência de competitividade fiscal portuguesa. Em relação a outra matéria, tanto no relatório como nas Grandes Opções do Plano, o Governo reconhece o fraco desempenho do investimento, que deveria ser um dos principais factores para a nossa recuperação económica. Temos dito que, realmente, o investimento – público ou privado – tem sido um dos «calcanhares de Aquiles» deste Governo, nomeadamente em relação ao investimento privado, fazem-se grandes anúncios e, depois, os investimentos não se concretizam. Portanto, concordamos com o que está no relatório: o investimento é um «calcanhar de Aquiles» deste Governo. A pergunta que faço é a seguinte: como as previsões de crescimento do investimento também não são muito grandes, portanto, o Governo é moderado nessas previsões, o que é que vai acontecer ao crescimento económico se o investimento não crescer, se, na prática, não se concretizarem todos os investimentos que foram anunciados? Sobre o desemprego, Sr. Ministro, há pelo menos, três estatísticas do primeiro trimestre que VV. Ex.as omitem nestes documentos: as da inflação, que são superiores às previstas para o ano, as do desemprego, que, no primeiro trimestre, atingiu 8,4%, e as do crescimento económico, que é 0,1 ponto percentual menor do que a previsão para todo o ano. Estes documentos não falam destes dados concretos do primeiro trimestre, mas eles são estes! Por isso, a pergunta que se coloca é esta: o Governo vai rever estes documentos, nomeadamente em relação ao desemprego? É que o desemprego atinge 8,4% no primeiro trimestre, o que está claramente acima da previsão para todo o ano que é de 7,5%! Portanto, o Governo tem de dizer como é que vai resolver este problema. Sr. Ministro, vou terminar, colocando uma questão muito concreta em relação ao que se passou com a Região Autónoma da Madeira, em que houve retenção de verbas. Há uma decisão judicial, embora seja uma providência cautelar, e aquilo que se espera que aconteça é que o Governo a cumpra, porque o Governo e o Estado devem ser pessoas de bem e cumprir as decisões judiciais. Mas chegaram notícias de que essas verbas ainda não foram disponibilizadas para a Região Autónoma da Madeira ou de que só uma parte o foi. Ora, havendo dotações orçamentais que são necessárias e sendo o Estado uma pessoa de bem, ele deve cumprir a decisão. Portanto, a questão que deixo é esta: o Governo vai ou não cumprir integralmente a decisão judicial?
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Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, as Grandes Opções do Plano para 2008 são a continuação de não de uma mas de um vasto conjunto de estratégias de desenvolvimento para o País, durante a Legislatura de 2005 a 2009, que se pretende seja de verdadeira viragem para que Portugal e os portugueses voltem a acreditar. É, pois, por este motivo, que, particularmente em 2008, se impõe ao Governo que, com coerência, com o rigor de um quadro de finanças públicas que tem vindo a consolidar-se e com o reforço da coesão social e territorial, reforce a sua trajectória de acção, assente numa forte estratégia de desenvolvimento e modernização do País, uma trajectória que seja inequivocamente marcada por indicadores de aumento de confiança, baseada numa forte aposta no conhecimento, na tecnologia, na inovação e na qualificação dos portugueses. É certo observar no momento actual uma recuperação gradual do crescimento económico, essencialmente assente no dinamismo das nossas exportações, sinal evidente da capacidade e da vontade dos nossos agentes económicos para ultrapassar as dificuldades resultantes das conjunturas económicas. Mas se, por um lado, tem sido extremamente importante a atitude dos nossos agentes económicos face às vicissitudes dos contextos económicos nacional e internacional, parece ser de realçar muito positivamente a importância das políticas do Governo em matéria de criação de emprego, de prevenção e combate ao desemprego e de melhoria das condições dos trabalhadores. Conseguir obter um crescimento sustentado da economia nacional afigura-se, no contexto actual, como um dos desígnios centrais do Governo. Para que tal aconteça torna-se necessário conseguir mobilizar para esta causa a iniciativa privada, dinamizando o investimento empresarial, promovendo a inovação, a qualificação e, sobretudo, a crescente internalização das nossas empresas. É nesta perspectiva que as PME (pequenas e médias empresas) poderão constituir importantes pólos de desenvolvimento, não só à escala nacional mas também regional, principalmente nas regiões do interior, onde é mais difícil a captação de investimento estruturante. Importa, pois, desenvolver neste campo uma verdadeira dinamização do investimento empresarial focalizando os incentivos essencialmente no estímulo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico, à modernização empresarial e ao apoio à captação de investimento, em suma, ao reforço da competitividade do nosso tecido empresarial. Torna-se, portanto, fundamental manter e reforçar a execução das medidas já em curso e lançar novas medidas complementares. Por tudo isto, e sabendo da preocupação e da sensibilidade do Governo em relação a estas matérias, gostaria que o Sr. Ministro nos expusesse melhor quais serão as medidas para atrair investimento estruturante para o território português, nomeadamente para o interior. Sr. Deputado, temos já investimentos em curso. O caso do IKEA, por exemplo, está já em curso e vamos ver esses investimentos a dinamizarem a actividade económica nacional. O Sr. Deputado não se apresse a ser arauto da desgraça porque pode ficar mal, ao fim do dia, com o anúncio de tanta desgraça… Gostaria de dizer que estou preocupado com o desemprego. Temos, obviamente, de ter políticas que criem emprego, mas há uma diferença muito grande entre este Governo e aquele que os senhores apoiaram ou de que fizeram parte… Durante os dois governos do PSD/CDS-PP houve 37 400 trabalhadores que perderam o emprego. Foram para o desemprego mais 177 000 pessoas, Sr. Deputado! E, nós, nestes dois anos de Governo, criámos mais de 41 000 novos empregos.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, voltarei brevemente nesta intervenção a referir duas questões. A primeira é a do endividamento. O Sr. Ministro deu-nos a pior resposta possível, a de que nada tem a ver com o endividamento. É claro que o Sr. Ministro não decide se uma família compra ou não uma casa — eu não o vou acusar disso —, mas é da esfera do Governo saber se o aumento do endividamento arrasta, por exemplo, um aumento da dívida da banca portuguesa à banca estrangeira com o significativo acréscimo de prémios de risco e, portanto, o diferencial das taxas de juro que se produzem em Portugal em relação a outros países. Dito isto, Sr. Ministro, nas suas intervenções levantou-se uma questão que exige esclarecimento. O Sr. Ministro veio falar-nos da privatização da Estradas de Portugal. Deixe-me chamar-lhe a atenção para o facto de que no Programa do Governo não consta a privatização da Estradas de Portugal e que nas Grandes Opções do Plano, de que estamos a tratar agora, que prevêem por quatro anos a política geral que o Governo quer conduzir, não se fala da privatização da Estradas de Portugal. No entanto, o Governo decidiu ontem uma concessão por 100 anos (!!) à futura empresa sociedade anónima… É o que está decidido, quer dar a uma sociedade anónima… Bom, mas, então, é o Governo que tem de desmenti-lo, porque, lamento, mas está em todas as gazetas de hoje de manhã que o modelo que o Governo propõe é o de que a sociedade anónima que, com grande fanfarra, o Ministro anunciou que será a próxima empresa privatizada, terá por 100 anos a concessão das estradas de Portugal…, poderá subconcessioná-las. Gostava de saber que empresa é esta, com capitais privados até um montante que não se sabe qual é, que pode ter em exclusivo a gestão das estradas por um período que vai ser determinado, que pode subconcessionar essas estradas e é financiada por uma taxa garantida e paga por todos os automobilistas e pelos contribuintes. Pelos automobilistas, pois, muito bem! Repare: o que é que o senhor está a garantir à iniciativa privada? Está a garantir que ela tem uma renda que lhe assegura uma rentabilidade acima de qualquer circunstância da sua actividade comercial e que, portanto, pode fazer a rentabilidade desses capitais protegida por esta taxa que lhe é atribuída. Uma parte dos impostos é concessionada a uma empresa por este período que o Sr. Ministro diz que não será de 100 anos (já veremos quanto tempo é que é), apesar de isto não estar estabelecido em nenhuma outra regra. Sr. Ministro, creio que esta é a novidade deste debate: o Governo toma uma decisão que não está no seu Programa; compromete, certamente por mais do que quatro anos, uma medida que não está nas Grandes Opções do Plano; e assegura a alguns capitais — que ainda não sabemos quais são, mas a Brisa já aparece nos jornais a dizer que está interessada, ou seja, o Grupo Mello já está a anunciar o seu interesse… — um negócio que é financiado por uma taxa atribuída a esta nova empresa. Isto diz tudo sobre a forma como o Governo quer agir economicamente!! O Governo quer garantir que haja capitais que, sem qualquer risco, repito, sem qualquer risco, possam ter a garantia de que as estradas são o seu negócio, acima de qualquer circunstância da actividade económica. O Sr. Ministro não podia ter escolhido melhor exemplo para neste debate nos dizer como o Governo entende que a economia deve ser regulada e como a actuação pública responde perante os privados. Se havia quem no País ainda tivesse alguma dúvida, ela ficou hoje esclarecida. Hoje são as estradas, amanhã serão os hospitais, um dia serão as prisões e outro dia os cemitérios… O caminho está aberto, porque o Governo não tem qualquer freio na sua imensa imaginação para as privatizações, desde que haja uma taxa que garanta a rentabilidade desses capitais. Creio que, hoje, os Mello podem dar os parabéns ao Governo, porque o Governo os merece. Sr. Presidente, os Srs. Deputados não conhecem este documento, pelo que gostaria que fosse distribuída cópia desta página com este excerto, que é aquele para o qual quero chamar a atenção. Teria muito gosto nisso, Sr. Presidente, mas talvez não seja preciso. Gostaria, sim, de pedir, nos mesmos termos, que a página 15, que refere a lista exaustiva das privatizações que o Governo entende prosseguir, fosse distribuída não à Câmara, porque a Câmara conhecea, mas ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças, porque parece não a conhecer.
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Teria muito gosto nisso, Sr. Presidente, mas talvez não seja preciso. Gostaria, sim, de pedir, nos mesmos termos, que a página 15, que refere a lista exaustiva das privatizações que o Governo entende prosseguir, fosse distribuída não à Câmara, porque a Câmara conhecea, mas ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças, porque parece não a conhecer.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Um dos principais problemas da economia portuguesa é a sua baixa produtividade. Empresas e Administração Pública deparam-se com infinitas oportunidades de aperfeiçoamento que podem e devem ser aproveitadas para uma melhoria da produtividade da economia portuguesa. Todos nós conhecemos actos inúteis, que ocupam tempo de profissionais competentes e gastam recursos ao País sem que constituam um contributo real para o desenvolvimento da economia portuguesa. Um destes actos corresponde às Grandes Opções do Plano. Com efeito, ano após ano, por imperativo constitucional, o Governo tem de apresentar à Assembleia da República as Grandes Opções do Plano. Quadros técnicos e políticos da Administração Pública esmeram-se na elaboração de um documento que depois não tem qualquer repercussão na opinião pública, nem qualquer impacto na economia portuguesa. Mesmo na Casa-mãe da democracia, a atenção dada a este documento é cada vez menor, como, aliás, é bem visível pelo tempo que a Conferência de Líderes destinou ao presente debate. Bem sei que este não é caso único de documentos e relatórios governamentais que não têm qualquer consequência, a não ser o reforço do orgulho pessoal do seu autor. No entanto, o Parlamento tem aqui uma palavra a dizer e, num momento de combate ao desperdício de dinheiros públicos, é tempo de dizer «basta» à elaboração e apreciação de Opções do Plano anuais. Alguns poderão afirmar que a Constituição exige a sua elaboração, mas verdade é que a Constituição de 1976 instituiu muitas coisas que mais tarde, por largo consenso, foram revistas — caso da irreversibilidade das nacionalizações, da proibição do direito de voto aos imigrantes em eleições presidenciais, só para dar dois exemplos. Ainda hoje a Constituição prevê que os trabalhos parlamentares encerrem a 15 de Junho e, como é notório, aqui, na Assembleia da República, vamos continuar a trabalhar para além do dia de hoje, porque achamos inoportuna aquela norma constitucional. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Um País moderno e arrojado não pode ficar preso nas teias do tempo nem em dogmas ideológicos ultrapassados. A Assembleia da República daria um sinal positivo ao País se conseguisse formar um consenso no sentido de pôr fim à obrigatoriedade constitucional das Grandes Opções do Plano anuais. Esta é uma responsabilidade que cabe a cada um de nós. O PSD, tal como já o fez há um ano atrás, pela voz do Deputado Miguel Frasquilho, defende que, em próxima revisão constitucional, este assunto seja definitivamente abordado, levando ao fim de um documento que não deixa memória significativa na sociedade portuguesa. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A maior prova da inexistência política do documento relativo às Grandes Opções do Plano está nas GOP para 2008. Não fugindo ao «pecado» de anos anteriores, as GOP para 2008 apresentam um conjunto de opções genéricas, relativamente consensuais, não quantificadas, sem o estabelecimento de metas temporais, repondo, aliás, medidas que transitam de anos anteriores. Em todo o documento não se identifica qualquer novidade, nem sequer uma avaliação sobre os objectivos presentes nas GOP anteriores, da responsabilidade do mesmo Governo, de modo a que a Assembleia da República pudesse monitorizar o grau de execução das Opções anteriores e, desse modo, fosse possível elogiar o que tivesse de ser elogiado ou então criticar o que houvesse a criticar. Nada! O Governo refugia-se em princípios gerais e lugares comuns, apresentando programas sem qualquer articulação entre si, contribuindo de um modo directo para o desinteresse nacional sob o presente documento. Mesmo no capítulo referente ao cenário macroeconómico para 2008, persiste a indicação de que Portugal continuará em divergência com a União Europeia quanto ao crescimento económico, facto que evidencia o conformismo do Governo com a trajectória da economia portuguesa e com a sua própria incapacidade para gerar confiança na economia e no País. A única novidade deste debate não está nas GOP mas, antes, na intervenção do Sr. Ministro das Finanças, que anunciou a privatização da Estradas de Portugal, com mais uma taxa lançada sobre os portugueses, algo que não estava no documento em análise. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República está a apreciar e irá votar as GOP para 2008. Mais do que apreciar e votar o presente documento e as generalidades que ele incorpora, o que mereceu a crítica do Conselho Económico e Social, o Parlamento estará a apreciar e a votar a política económica e financeira deste Governo. Estaremos a avaliar a credibilidade de um Governo perito em fazer anúncios e a apresentar programas inconsequentes na reanimação da economia, no combate ao desemprego, na captação do investimento. Um Governo apostado na destruição do Estado social, com uma saúde cada vez mais cara, uma política de educação menos exigente e mais facilitadora, com uma política cultural inexistente. São este Governo, esta política, estas prioridades ou a sua ausência que a Assembleia da República estará a apreciar. O Partido Social-Democrata, mais uma vez, alerta para o caminho errado que está a ser prosseguido, de empobrecimento relativo do País, com a ausência de um projecto mobilizador para Portugal, com a resignação de quem nos governa em deixar Portugal afastar-se do desenvolvimento médio Europeu. É a tudo isto que o PSD se opõe. É por tudo isto que o PSD votará contra as Grandes Opções do Plano para 2008! É isso mesmo que queremos do Sr. Ministro e é isso que vamos requerer: que o Sr. Ministro venha aqui para dar as explicações em relação a esta matéria, que é, evidentemente, de relevante interesse nacional. Nós já tínhamos a certeza, Sr. Ministro, de que as Grandes Opções do Plano são um documento completamente inútil. Tínhamos também a desconfiança de que o Programa do Governo também é inútil — hoje temos a certeza absoluta, porque ele é constantemente incumprido! Portanto, Sr. Ministro, que fique desde já à espera disto, para que possa pensar. Vamos requerer que o Sr. Ministro venha à Comissão de Orçamento e Finanças explicar aquilo que se passa em relação a esta matéria. Explicar, como não explicou — porque não respondeu à pergunta que tive oportunidade de lhe fazer —, o que se passa em relação à taxa que foi anunciada, sendo que o conhecimento que podemos ter neste momento é um conhecimento apenas por via da comunicação social. O segundo grande tema que temos para o futuro é o da competitividade fiscal, onde nos parece claro que o Sr. Ministro tem de ultrapassar a ideia de que é um mero representante da Direcção-Geral dos Impostos. Com certeza que o papel do Director-Geral dos Impostos está a ser bem cumprido, ao fazer com que a fraude e a evasão fiscais sejam combatidas e bem combatidas, como tem sucedido desde há anos em Portugal. Mas um responsável político tem de estar para além disso e tem de ver a questão da competitividade. Que fique muito claro: a competitividade não se reduz a baixar taxas de imposto (tem, aliás, bastantes patamares para além disso)! Por isso mesmo, o CDS teve oportunidade de apresentar uma proposta no último Orçamento do Estado, proposta essa que irá repetir este ano, que se refere à aplicação, em Portugal, de um regime especial para as sociedades gestoras de participações sociais com participações sociais no estrangeiro, tal qual existe em Espanha, sendo um dos elementos essenciais do modelo fiscal espanhol. Aliás, tenho uma enormíssima dúvida, porque conheço o modelo fiscal espanhol para a competitividade fiscal, conheço o modelo fiscal irlandês para a competitividade fiscal, conheço o modelo dos países 22 I SÉRIE — NÚMERO 95 da Europa do norte para a competitividade fiscal, e só não conheço o modelo português. De resto, o modelo português é algo que ninguém consegue compreender. Até o Sr. Presidente da API, num colóquio, perante a comissão, afirmou que é necessário tomar em atenção o elemento de competitividade fiscal, tendo dado exemplos de como isso se pode fazer, não se ficando para além das meras descidas de taxa. Já agora, Srs. Ministros, que fique claro que, por muito bons sinais que possamos dar ao investimento estrangeiro que vem para Portugal, ainda não vejo dezenas e dezenas de aviões com empresários a chegarem a Portugal e a dizer: «Vamos investir em Portugal, porque em Portugal o sistema fiscal é fantástico!». Bem pelo contrário, vejo dúvidas em relação a esta matéria. É por isso que é caricato vir aqui falar das estatísticas em relação à nossa carga fiscal, porque é evidente que ela está num plano intermédio entre os países da OCDE. Ninguém põe isto em dúvida, tal como ninguém põe em dúvida que o aumento da carga fiscal em Portugal foi o mais alto, nos últimos anos, entre os países da União Europeia. Mais: o que eu queria, Srs. Deputados do Partido Socialista, não era que Portugal estivesse nos 100 lugares intermédios, mas que estivesse nos primeiros lugares da competitividade fiscal, porque é disto que o nosso país precisa. Não podemos dizer que estamos num nível intermédio na competitividade fiscal e com os piores índices em relação ao resto da competitividade e quanto à produtividade. Isto é que deveria preocupar os Srs. Deputados. Mas não! Ficam muito contentes porque vêem uns quadros, feitos em PowerPoint, que dizem que Portugal está com níveis de taxas intermédios. Portugal precisa de muito mais do que isso!
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Parece evidente que deste debate saem para o futuro dois grandes temas. O primeiro é aquele que o Sr. Ministro referiu, numa das suas respostas, como a privatização da Estradas de Portugal. Sr. Ministro, que fique muito claro: nós não vemos nem nunca veremos no sector privado um qualquer «papão» que aí vem fazer lucro à custa do Estado. Não temos esses preconceitos ideológicos, que já não são do século passado mas de há dois séculos atrás. Mas parece evidente, Sr. Ministro, que esta matéria necessita de explicações, desde logo, em relação à pergunta que lhe fiz, e à qual V. Ex.ª não deu resposta, sobre uma taxa que gostaríamos de saber se fica pela mera consignação de receitas ou se é um patamar para algo mais no futuro. Por isso mesmo, quando o vi levantar-se, Sr. Ministro, e fazer um pedido de interpelação à Mesa, pensei que o Sr. Ministro viesse dizer: «Neste debate já não tenho tempo, mas estou totalmente disponível para vir a este Parlamento dar todas as explicações que, em relação a esta matéria, sejam necessárias. É isso mesmo que queremos do Sr. Ministro e é isso que vamos requerer: que o Sr. Ministro venha aqui para dar as explicações em relação a esta matéria, que é, evidentemente, de relevante interesse nacional. Nós já tínhamos a certeza, Sr. Ministro, de que as Grandes Opções do Plano são um documento completamente inútil. Tínhamos também a desconfiança de que o Programa do Governo também é inútil — hoje temos a certeza absoluta, porque ele é constantemente incumprido! Portanto, Sr. Ministro, que fique desde já à espera disto, para que possa pensar. Vamos requerer que o Sr. Ministro venha à Comissão de Orçamento e Finanças explicar aquilo que se passa em relação a esta matéria. Explicar, como não explicou — porque não respondeu à pergunta que tive oportunidade de lhe fazer —, o que se passa em relação à taxa que foi anunciada, sendo que o conhecimento que podemos ter neste momento é um conhecimento apenas por via da comunicação social. O segundo grande tema que temos para o futuro é o da competitividade fiscal, onde nos parece claro que o Sr. Ministro tem de ultrapassar a ideia de que é um mero representante da Direcção-Geral dos Impostos. Com certeza que o papel do Director-Geral dos Impostos está a ser bem cumprido, ao fazer com que a fraude e a evasão fiscais sejam combatidas e bem combatidas, como tem sucedido desde há anos em Portugal. Mas um responsável político tem de estar para além disso e tem de ver a questão da competitividade. Que fique muito claro: a competitividade não se reduz a baixar taxas de imposto (tem, aliás, bastantes patamares para além disso)! Por isso mesmo, o CDS teve oportunidade de apresentar uma proposta no último Orçamento do Estado, proposta essa que irá repetir este ano, que se refere à aplicação, em Portugal, de um regime especial para as sociedades gestoras de participações sociais com participações sociais no estrangeiro, tal qual existe em Espanha, sendo um dos elementos essenciais do modelo fiscal espanhol. Aliás, tenho uma enormíssima dúvida, porque conheço o modelo fiscal espanhol para a competitividade fiscal, conheço o modelo fiscal irlandês para a competitividade fiscal, conheço o modelo dos países da Europa do norte para a competitividade fiscal, e só não conheço o modelo português. De resto, o modelo português é algo que ninguém consegue compreender. Até o Sr. Presidente da API, num colóquio, perante a comissão, afirmou que é necessário tomar em atenção o elemento de competitividade fiscal, tendo dado exemplos de como isso se pode fazer, não se ficando para além das meras descidas de taxa. Já agora, Srs. Ministros, que fique claro que, por muito bons sinais que possamos dar ao investimento estrangeiro que vem para Portugal, ainda não vejo dezenas e dezenas de aviões com empresários a chegarem a Portugal e a dizer: «Vamos investir em Portugal, porque em Portugal o sistema fiscal é fantástico!». Bem pelo contrário, vejo dúvidas em relação a esta matéria. É por isso que é caricato vir aqui falar das estatísticas em relação à nossa carga fiscal, porque é evidente que ela está num plano intermédio entre os países da OCDE. Ninguém põe isto em dúvida, tal como ninguém põe em dúvida que o aumento da carga fiscal em Portugal foi o mais alto, nos últimos anos, entre os países da União Europeia. Mais: o que eu queria, Srs. Deputados do Partido Socialista, não era que Portugal estivesse nos 100 lugares intermédios, mas que estivesse nos primeiros lugares da competitividade fiscal, porque é disto que o nosso país precisa. Não podemos dizer que estamos num nível intermédio na competitividade fiscal e com os piores índices em relação ao resto da competitividade e quanto à produtividade. Isto é que deveria preocupar os Srs. Deputados. Mas não! Ficam muito contentes porque vêem uns quadros, feitos em PowerPoint, que dizem que Portugal está com níveis de taxas intermédios. Portugal precisa de muito mais do que isso! Vou terminar, Sr. Presidente. Portanto, Sr. Ministro e Srs. Deputados do Partido Socialista, que fique muito claro: uma das políticas essenciais que o CDS tem para apresentar é uma política de competitividade fiscal, porque, se o Governo e a bancada do Partido Socialista não cumprem o seu papel, nós sabemos bem qual é o nosso.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As Grandes Opções do Plano para 2008 mostram bem a desvalorização crescente com que o Governo continua a encarar este debate, que podia e deveria constituir um momento político relevante, quer quanto à definição das principais opções e orientações do Governo quer quanto à afectação dos meios financeiros necessários à respectiva concretização. Está bem acompanhado o Governo nesta desvalorização, sobretudo nesta Câmara, como aqui se percebeu pelas intervenções do CDS e do PSD, ou seja, da direita desta Câmara. Como mais uma vez acentua o Conselho Económico e Social (CES), no seu parecer sobre as Grandes Opções do Plano, o Governo não disponibiliza informação sobre execução de médio prazo, particularmente no que respeita às suas metas e objectivos quantificados, não define as principais linhas de actuação política previstas, através de uma calendarização e quantificação de objectivos, e não articula, como deveria fazer e não faz, com os restantes planos e programas de âmbito mais restrito. Estas são as críticas do CES, que nos merecem total concordância. Mas este documento governamental merece alguns outros reparos e críticas, seja pela falta de transparência na forma de abordar alguns temas seja na omissão inaceitável de alguns dos problemas que hoje afectam Portugal e os portugueses. Quanto às privatizações, por exemplo, o Governo aborda de forma discriminada as vendas de participações públicas concretizadas em 2006. Fala na GALP, na Portucel, por exemplo. Confirma uma receita de 1200 milhões de euros com essas privatizações. Quanto ao Programa de Privatizações para 2007, ainda adianta uma receita estimada de 950 milhões de euros, sem contudo adiantar uma linha sobre as participações, em concreto, que pretende entregar ao capital privado. No que diz respeito ao Programa de Privatizações para 2008, nem uma palavra, nem quanto à receita prevista e muito menos sobre o que o Governo pretende privatizar!! Será a TAP? Será a ANA (com ou sem o novo aeroporto)? Pelos vistos, ficámos hoje a saber que poderá ser a empresa Estradas de Portugal, com o objectivo intermédio, bem entendido, de desorçamentar, tal como fizeram Durão Barroso e Santana Lopes, única e exclusivamente, para cumprirem o défice orçamental. Um outro assunto que as GOP não abordam é a questão relativa à política de distribuição da riqueza em Portugal. Num país onde o fosso entre ricos e pobres é dos maiores da Europa, e onde os níveis de pobreza atingem valores que deviam envergonhar os responsáveis governamentais, o Governo apresenta as suas GOP sem dizer uma palavra sobre uma política salarial e de distribuição de rendimentos que permitisse ao País sair do último lugar do ranking da zona euro, no que se refere aos níveis salariais e ao poder de compra dos trabalhadores e da generalidade da população. Uma outra questão a que as GOP 2008 passam completamente à margem prende-se com a coesão territorial. Sabe-se que o País diverge da média comunitária desde 2001! Sabe-se que, com níveis de crescimento medíocres ou manifestamente insuficientes, Portugal continua a divergir alegremente e continuará a divergir nos próximos anos. Foi a isto que conduziu, no passado e no presente, a obsessão orçamental e o cumprimento cego da imposição do Pacto de Estabilidade. Mas se o País se afasta da média comunitária, há zonas e regiões do País que se afastam não só da média comunitária como da própria média nacional. Acentuam-se o declínio e a diminuição relativa e absoluta do PIB da Região Norte, da Região Centro, do Alentejo. Boa parte do País, quase todo o seu interior e parte significativa do seu litoral, apresenta valores de produção de riqueza que estão já entre os mais baixos da Europa a 27. Os problemas de coesão interna e as questões relativas às assimetrias regionais que atingem o nosso País não merecem uma única palavra, nem nas GOP nem no Relatório de Orientação da Política Orçamental. Aliás, os cortes nas despesas de investimento vão prosseguir. Foram os cortes nas despesas de capital, que, no fundamental, asseguraram o cumprimento e a superação do objectivo relativo ao défice em 2006, e foi a quase total paralisação do investimento público no País, a partir de Agosto de 2006, que permitiram ao Governo «deitar foguetes» e festejar em Bruxelas o cumprimento de um défice orçamental que continua a manter o País quase estagnado e os portugueses a perder direitos e qualidade de vida, a perder poder de compra e igualmente a perder o emprego. Neste aspecto, espanta que os dois documentos que hoje debatemos possam continuar a insistir na diminuição da taxa de desemprego, em 2007, para 7,5%, quando só no primeiro trimestre se atingiu um valor record de 8,4%. É esta a medida que permite avaliar as preocupações sociais de um Governo que se afirma socialista mas que, cada dia que passa, concretiza políticas que fazem «roer-se de inveja» toda a direita portuguesa. São estas políticas que importa denunciar, que importa combater. São estas políticas que exigem a todos os democratas, a todos os homens e mulheres de esquerda e a milhares de socialistas eleitores e militantes verdadeiramente espantados e incrédulos com a prática governativa do seu Governo um esforço de convergência e de luta para que, mais cedo ou mais tarde, consigamos, de facto, mudar o rumo da política em Portugal.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: As GOP para 2008 confirmam o rumo político que este Governo está a prosseguir, o qual tem merecido, por parte de Os Verdes e de muitos sectores da nossa sociedade, um profundo desacordo e uma forte contestação. Estas Grandes Opções do Plano, hoje em discussão, confirmam, elas próprias, os resultados nada satisfatórios que são perspectivados para 2008. No seu quadro macroeconómico, no que respeita a alguns parâmetros importantes, perspectiva-se não só um curtíssimo abrandamento do desemprego, para 7,2%, o que significa que mais de 400 000 portugueses continuarão a conhecer o estatuto de desemprego, mas também uma descida das exportações e uma subida das importações, do que resulta uma insatisfação no dinamismo da nossa actividade produtiva e na nossa autonomia do exterior. Para além disso, estas Grandes Opções do Plano vêm reconfirmar que a consolidação das contas públicas está a fazer-se à conta da enorme fragilização dos funcionários públicos; da reforma da segurança social, pedindo aos trabalhadores que recebam menos, paguem mais ou trabalhem mais; das poupanças na saúde, que muito prejudicam populações em várias localidades do País, bem como camadas populacionais, como os idosos, que muito são afectados pelo aumento do custo dos medicamentos; e do corte no investimento público, que contribui para desacelerar o desenvolvimento do País. Afinal, as medidas que eram tomadas sob a capa da justiça não tinham outra intenção que não a de regularizar as contas públicas, para deixar Bruxelas em grande festa, mas prejudicando sobremaneira a generalidade dos portugueses. Estas Grandes Opções do Plano, por outro lado, demonstram, em relação a algumas políticas sectoriais, uma grande falta de coerência e algum desnorte do Governo, esquecendo algumas questões fundamentais e insistindo noutras, sem as medidas prévias de precaução. Vejamos alguns exemplos: Promete-se, agora, para 2008 a execução do Programa Nacional para o Uso Eficiente de Água, promessa mil vezes repetida de ano para ano. Agora, essa execução é afinal para 2008! Mas diz-se tãosomente isso, que se vai executar. Mas executar em que medida, Sr. Ministro? Com que enquadramento? Com que meios? Com que objectivos de cumprimento? Nada é dito. Na mesma linha, temos a promessa de aprovação — agora só para 2008 — do Plano Sectorial da Rede Natura 2000. Todos os anos a mesma perspectiva. Por que razão não é aprovado já em 2007? As Grandes Opções do Plano asseguram que, em 2007, foi criado o Fundo de Compensação Financeira para os organismos geneticamente modificados (OGM). Foi criado quando? Ou melhor, será criado quando? Com efeito, a falta deste Fundo de Compensação deixa os agricultores desprevenidos em caso de contaminação das suas culturas convencionais e biológicas por culturas transgénicas. É certo que a União Europeia, vergonhosamente, já admite que a tolerância zero de contaminação de culturas biológicas passe à possibilidade de contaminação até 0,9% como as culturas convencionais. É assim, afinal, que se vai garantindo a não contaminação de culturas, ou seja, aumentando o nível de contaminação aceitável. Em relação ao sector ferroviário, a prioridade vai toda para o TGV, ficando a rede convencional, mais uma vez, a aguardar melhores dias, com investimentos pontuais prometidos, mas não enquadrados em termos de operacionalidade financeira. Isto num sector fundamental para integrar nas medidas internas de combate às alterações climáticas. Também no que respeita às alterações climáticas as Grandes Opções do Plano, para além de não darem conta da situação de incumprimento dos nossos objectivos de Quioto, da qual não temos tendência a sair por irresponsabilidade dos vários governos, também não falam das medidas internas a tomar, restringindo futuras medidas ao investimento no exterior para ganharmos créditos de emissão de gases com efeito de estufa. É, afinal, para isso que servirão os 78 milhões de euros previstos no Orçamento do Estado para 2007, que saem directamente do bolso dos contribuintes! Por último, e ainda a título de exemplo, sobre as incoerências e esquecimentos das Grandes Opções do Plano, encontramos um texto dedicado ao litoral, sem que faça qualquer referência a documentos apontados no documento base para a Estratégia de Gestão Integrada da Zona Costeira, tais como a lei de bases do litoral ou a criação do observatório do litoral, que Os Verdes, de resto, propõem como urgência para instituir no País. Aliás, num País que assiste a um acelerado processo erosivo no seu litoral, não se percebe como é que, com tantos investimentos prometidos para 2007 e, segundo o Sr. Ministro do Ambiente, adiados para 2008, não se encontra a defesa do litoral no capítulo dos grandes projectos de iniciativa pública. Porque será que o TGV e outros projectos megalómanos constituem para este Governo projectos muito mais interessantes e prioritários do que a defesa do litoral? Uma nota final sobre a obsessão com a co-incineração. O Governo poderia ter a humildade de escrever nas Grandes Opções do Plano para 2008 que esta opção tem de se sujeitar obrigatoriamente a estudos de impacte ambiental. Não ficaria mal na «fotografia» reconhecer a necessidade de fazer aquilo que as populações, autarquias e tribunais reivindicam como absolutamente essencial, nem que seja para garantir que os processos democráticos e de participação não são «enfiados na gaveta» a bel-prazer do Governo e em função do seu autoritarismo. Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Estas Grandes Opções do Plano representam a continuação de uma receita que não trata a doença deste país, que não resolve um dos maiores dramas sociais, que é o desemprego, nem promove a qualidade de vida das populações. Por isso mesmo, contará com a oposição de Os Verdes. Aplausos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes e de Deputados do PCP.
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Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa. Sr. Presidente, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças acabou de dizer que, na página 15 do documento que foi distribuído a esta Câmara, não estão citadas as privatizações. Ora, na página 15, segundo parágrafo, fala-se no Programa de Privatizações aprovado por resolução do Conselho de Ministros e refere-se a Portucel Tejo, a GALP e a Portucel e não está cá a Estradas de Portugal. Sr. Presidente, era só para rectificar aquilo que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças nos acabou de dizer e recordar que o Sr. Presidente tinha dito que era desnecessária a distribuição do documento, quer por parte do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, quer por parte do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, pois toda a Câmara já o tinha.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: É só para deixar claro perante esta Câmara, depois de tudo o que aqui se passou, que aquilo a que assistimos é que o Governo, ontem, «tirou da cartola» uma nova privatização, que não estava contemplada em lado algum. E mais: nas GOP também não está referida esta privatização. Sr. Ministro, o que está referido no documento das GOP é um novo modelo, que nada tem a ver com o modelo A, B ou C, o senhor não diz qual é o novo modelo. Estamos, portanto, perante uma privatização que não tinha sido incluída na lista originalmente prevista e que consagra, única e simplesmente, uma desorçamentação, graças às insuficiências que a Estradas de Portugal revelaram no ano passado e que continuam a revelar este ano.
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Sr. Presidente, a bancada do CDS-PP cede 2 minutos ao Sr. Secretário de Estado. Sr. Presidente, o Sr. Secretário nem precisará dos 2 minutos para responder e eu comprometo-me a não ler o nome desta proposta de lei, para poder abarcar a pergunta dentro dos 3 minutos. Não resisto a mostrar aqui a proposta de lei de autorização e os diplomas que se seguirão à mesma, que nos foram apresentados no início deste mês, numa altura em que a comissão discutia a tributação automóvel a fundo, além de matérias que têm a ver com a lista dos credores ao Estado e em que estava a trabalhar um relatório importantíssimo sobre despesa pública. Portanto, tivemos aproximadamente três semanas para poder trabalhar este diploma que aqui está em discussão. Assim, Sr. Secretário de Estado, como deve imaginar, para alguns dos grupos parlamentares mais pequenos desta Câmara, não foi possível trabalhar o diploma, o que vem demonstrar que qualquer redução do número de Deputados tornará esta Assembleia uma mera repetição do que dizem algumas maiorias. Mas nós estamos muito interessados nesta proposta de lei, aliás, como o Sr. Secretário de Estado deve saber, o CDS apresentou um projecto de lei em relação a esta matéria. Aliás, ele já foi aqui apreciado, na generalidade, no mês de Janeiro, tendo baixado à comissão durante 90 dias. Por isso, aquilo que pretendo saber, Sr. Secretário de Estado, é se existe abertura por parte do Governo para que se possa discutir, após a aprovação do pedido de autorização legislativa, aquilo que o CDS propôs quanto a esta matéria, que é relativamente simples, pois tem a ver com a questão da consultadoria para investimento em instrumentos financeiros e do papel que terão os promotores de natureza individual, que podem ver a sua actividade admitida, não podendo, evidentemente, esta matéria ficar apenas para as sociedades, e, depois, com todo o regime necessário à existência desses promotores de natureza individual. Consideramos que seria importante que eles pudessem continuar a exercer a sua actividade, uma actividade, evidentemente, controlada, mas para isso, Sr. Secretário de Estado, compreenda que precisamos de uma declaração política da sua parte e de saber se poderemos, no prazo dos 180 dias, ter uma discussão em comissão, feita, naturalmente, com o tempo que a profundidade destes diplomas exige para podermos discutir essas matérias.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nem sequer faço menção da data em que me foi entregue este diploma, que é de grande complexidade técnica. Era importante que esta Câmara, sobretudo em matéria onde há intervenientes com tanta força económica, não fosse um mero coro de repetição da lex mercatoria, que não estivéssemos aqui a legitimar comportamentos empresariais sem um amplo debate. Mas pode ser que, na especialidade, isso venha a ser possível. Mas, enfim, passando ao diploma, direi que, como consequência da globalização da economia e dos sistemas financeiros, surgiu uma forte indústria dos serviços financeiros. O rápido crescimento e o cariz transterritorial dessa indústria dos serviços financeiros e a desadequação ou mesmo ausência de instrumentos normativos, esteve e está na origem de más práticas, algumas vezes deficientemente sancionadas, como o caso do fundo de pensões do Grupo Maxwell, em Inglaterra, ou os escândalos da Enron e da Worldcom. Daí que com o Cadbury Report de 1992, mais tarde complementado pelos relatórios Greenbury, Hampel e pelo Combined Code, bem como com os principles of corporate governance, propostos pelo American Law Institute, se tenha iniciado um afã regulamentador assente na trilogia informação, transparência e responsabilidade. Muita dessa regulamentação nasceu de uma elevada incorporação técnica de um mundo profissional que se auto-regulou e que produziu conteúdos normativos que as instâncias formais se limitaram a legitimar. Mas o denso corpo normativo que a actividade financeira e económica segregaram necessita da intervenção legitimadora das instituições, até porque nos Estados democráticos a lex mercatoria não pode, sem a mediação das instituições legiferantes, invadir as áreas da regulação sancionatória, nem tãopouco interferir na própria conformação da previsão das normas penais. A presente iniciativa legislativa, tendo como parâmetro a trilogia informação, transparência e responsabilidade da corporate governance, visa habilitar o Governo a adaptar o regime geral das contraordenações, no que respeita à harmonização dos requisitos em matéria de organização e às condições de exercício da actividade das empresas de investimento, à harmonização dos requisitos de transparência, no que se refere às informações respeitantes aos emitentes cujos valores mobiliários estão admitidos à negociação num mercado regulamentado. Para além disso, o Governo pretende legislar no sentido de estabelecer limites ao exercício das actividades de consultadoria para o investimento. Com esse intuito, propõe-se alterar o Código dos Valores Mobiliários, o regime jurídico das sociedades gestoras de mercados e sistemas e o regime jurídico das sociedades de consultadoria para o investimento. Cabe aqui especial relevo, no âmbito das normas de conduta aplicáveis à intermediação financeira, ao novo regime de execução de ordens, fazendo-se impender sobre o intermediário financeiro tanto o dever de adoptar uma politica de execução de ordens como o ónus de demonstrar que executou as ordens de um dado investidor de acordo com a melhor execução. Por sua vez, as sociedades de consultadoria para o investimento deverão ficar sujeitas a um regime de autorização prévia. Espero que, na especialidade e posteriormente, quando viermos a discutir as propostas do Governo, se venha, de alguma maneira, a transformar este debate numa discussão mais séria e na qual não estejamos apenas a legitimar aquilo que têm sido a auto-regulação e a própria lei de mercado. As normas de execução das disposições que regem os requisitos da transparência devem, ainda, ser concebidas de modo a assegurar um elevado nível de protecção do investidor, a reforçar a eficiência do mercado e a ser aplicadas uniformemente. A Directiva n.º 2007/14/CE, da Comissão, de 8 de Março, vem estabelecer as normas de execução da 36 I SÉRIE — NÚMERO 88 directiva da transparência, definindo o conteúdo mínimo das demonstrações financeiras semestrais não consolidadas, os mecanismos do controlo a exercer pelas autoridades competentes sobre os criadores de mercado e as condições de independência a satisfazer pelas sociedades gestoras e empresas de investimento envolvidas na gestão individualizada de carteiras. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em suma, importa sublinhar que a proposta de lei n.º 133/X consubstancia uma proposta de autorização legislativa que visa autorizar o Governo a proceder a estas alterações, sobretudo à do regime geral das contra-ordenações, e a estabelecer limitações ao exercício da profissão de intermediação financeira, no quadro da transposição das directivas atrás referidas. De acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 197.º do Regimento da Assembleia da República «A lei de autorização deve definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização». Da leitura da proposta de autorização legislativa resulta claro que os quatro requisitos referidos encontram-se devidamente identificados e delimitados, reunindo, desta forma, os elementos formais necessários para ser apreciada e discutida, tal como está a ser nesta sessão plenária, estando em condições para ser votada favoravelmente por esta Câmara.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como sabemos, no passado dia 3 de Maio o Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 133/X, que consubstancia uma proposta de autorização legislativa e que visa autorizar o Governo a proceder a alterações ao regime geral das contra-ordenações e estabelecer limitações ao exercício de actividades de intermediação financeira no quadro da transposição da Directiva n.º 2004/39/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, relativa a Mercados e Instrumentos Financeiros, mais conhecida pela DMIF; da Directiva n.º 2006/73/CE, da Comissão, de 10 de Agosto de 2006; da Directiva n.º 2004/109/CE, do Parlamento e do Conselho, relativa à harmonização dos requisitos de transparência, doravante conhecida como Directiva da Transparência; e da Directiva n.º 2007/14/CE, da Comissão, de 8 de Março de 2007. Com a presente iniciativa legislativa, o Governo pretende, no quadro jurídico da regulação e supervisão dos mercados financeiros, agravar os limites dos montantes das coimas previstos no artigo 17.º do regime geral da mera ordenação social e estabelecer requisitos adicionais ao exercício de actividades de intermediação financeira, necessitando, por isso, da correspondente lei de autorização legislativa. Considerando a directiva relativa a mercados e instrumentos financeiros, importa destacar os seus principais objectivos: a actualização do elenco de serviços de investimento e de instrumentos financeiros; um passaporte europeu mais eficaz, isto é, ao nível da actividade transfronteiriça das empresas de investimento, através de uma mais eficiente divisão de competências entre a autoridade do Estado de acolhimento e a autoridade do Estado de origem; o desenvolvimento e a harmonização dos requisitos de organização e dos deveres de conduta aplicáveis a intermediários financeiros; e o reconhecimento de novas formas organizadas de negociação. A maior novidade desta directiva relaciona-se com a harmonização das estruturas de mercado, através da instituição de um enquadramento jurídico destinado a regular a concorrência entre os mercados regulamentados e as novas infra-estruturas de negociação por esta directiva reconhecidas. De facto, o reforço dos deveres dos intermediários financeiros representa uma garantia relevante de protecção do investidor neste cenário de maior flexibilidade de formas organizadas de negociação. Relativamente à directiva da transparência, esta estabelece os princípios gerais que regem a harmonização dos requisitos da transparência aplicáveis à detenção de direitos de voto ou de instrumentos financeiros que confiram o direito de aquisição de acções com direitos de voto já emitidas, e tem como objectivo manter e reforçar a confiança do investidor através da publicação de informações exactas, completas e oportunas sobre os emitentes de valores mobiliários. As normas de execução das disposições que regem os requisitos da transparência devem, ainda, ser concebidas de modo a assegurar um elevado nível de protecção do investidor, a reforçar a eficiência do mercado e a ser aplicadas uniformemente. A Directiva n.º 2007/14/CE, da Comissão, de 8 de Março, vem estabelecer as normas de execução da directiva da transparência, definindo o conteúdo mínimo das demonstrações financeiras semestrais não consolidadas, os mecanismos do controlo a exercer pelas autoridades competentes sobre os criadores de mercado e as condições de independência a satisfazer pelas sociedades gestoras e empresas de investimento envolvidas na gestão individualizada de carteiras. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em suma, importa sublinhar que a proposta de lei n.º 133/X consubstancia uma proposta de autorização legislativa que visa autorizar o Governo a proceder a estas alterações, sobretudo à do regime geral das contra-ordenações, e a estabelecer limitações ao exercício da profissão de intermediação financeira, no quadro da transposição das directivas atrás referidas. De acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 197.º do Regimento da Assembleia da República «A lei de autorização deve definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização». Da leitura da proposta de autorização legislativa resulta claro que os quatro requisitos referidos encontram-se devidamente identificados e delimitados, reunindo, desta forma, os elementos formais necessários para ser apreciada e discutida, tal como está a ser nesta sessão plenária, estando em condições para ser votada favoravelmente por esta Câmara.
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Sr. Presidente, a não haver possibilidade de o Sr. Ministro ter tempo útil para esclarecer as questões que são colocadas, reflectiremos as nossas preocupações, em relação a esta iniciativa legislativa, em sede de intervenção.
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Sr. Presidente, peço a palavra para dizer que, se calhar, será mais útil colocar a pergunta no final da minha intervenção e, se me sobrar tempo, terei todo o prazer em cedê-lo ao Sr. Ministro para poder responder.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: Não restam quaisquer dúvidas (aliás, as intervenções que me antecederam já o demonstraram) sobre a fundamental importância de apostar nas fontes de energia renováveis e de tornar o nosso mix energético mais diversificado e assente em fontes endógenas, naturalmente para combater a dependência energética face ao exterior, em particular relacionada com o petróleo, mas também para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. É fundamental reduzir as fontes fósseis e as formas de energia mais carbonizadas, designadamente na produção de energia eléctrica. Por isso, o eólico é importante, o solar também, mas não podemos deixar de lamentar o atraso claro que apresentamos nesta matéria em geral e mormente no que se refere ao solar, na área da microgeração, que infelizmente não tem interessado, porque este Governo investe onde aparecem grandes interesses económicos apostados em fazer negócio. De facto, a microgeração, por ser uma energia mais democrática e mais espalhada pelo País, não tem merecido a devida atenção. Aliás, as propostas de Os Verdes em sede de Orçamento do Estado têm sido objecto de chumbos sucessivos, quando o que se pretendia era garantir que aqueles portugueses que têm crédito à habitação também pudessem beneficiar de apoio na aquisição de painéis solares para as suas casas, situação que hoje, infelizmente, não acontece, como o Sr. Ministro sabe certamente. De qualquer forma, não pode descartar-se o potencial da energia das ondas no nosso país. Temos um potencial muito interessante e nada desprezível. Aliás, segundo dados do Centro de Energia das Ondas, Portugal apresentará cerca de 15 GW no continente e 6 GW nas regiões autónomas, apontandose cerca de 30 MW por quilómetro de costa. Claro que, nesta história da energia das ondas, também há impactos: impactes ambientais não apenas visuais mas (por exemplo, na costa) impactos no que diz respeito à ligação à rede e, ainda, impactos em termos da incompatibilização com outros usos que acontecem no espaço de domínio público marítimo. Porventura, os impactos mais notados poderão vir a ser os relacionados com a actividade piscatória e de navegação marítima. Apesar de estes impactos serem aparentemente menores do que os de outras energias, designadamente, de outras energias renováveis, importa acautelá-los na senda do princípio da precaução e impor que a avaliação dos mesmos seja feita pela escolha dos melhores locais, isto é, os que têm menos impactos e que apresentem maior eficiência energética. Posto isto, não restam dúvidas de que é importante dar passos no sentido da implementação da energia das ondas em Portugal. Mas, Srs. Deputados, ser favorável à energia das ondas em Portugal não é, necessariamente, ser favorável a esta proposta de lei nem ser favorável às ondas no matter what!, isto é, seja qual for o custo que ele envolva. Desde já, apresentamos a nossa crítica por esta ser uma proposta de lei de autorização legislativa e limitar a intervenção da Assembleia da República a um debate em que cada uma das bancadas parlamentares dispõe de apenas 5 minutos. Mas não só: infelizmente, o Partido Socialista escolheu colocar à frente da energia das ondas ao serviço de Portugal e dos portugueses, dos interesses públicos de produção energética, ambiental e socialmente sustentável, os interesses e o lucro das empresas e o Governo optou pela via da diminuição do papel do Estado e da Administração Pública na salvaguarda do interesse público. Tal como fizeram em relação à Lei da Água e do domínio dos recursos hídricos, em que o Governo abriu, ou escancarou, as portas às albufeiras privadas, aos rios, margens e leitos privados, às praias privadas, sempre sob a forma eufemística de concessão por dezenas de anos, agora querem seguir o mesmo modelo com o offshore, não o fiscal da Madeira mas o dito «ao largo da costa privada». Aliás, as suas intenções já eram claras na Lei n.º 13/2007 (lei de autorização) e no Decreto-Lei n.º 226-A/2007, que se lhe seguiu. É dito na «Exposição de motivos» da proposta de lei que este regime implica a utilização de bens do domínio público marítimo — não temos dúvida —, mas que isto justifica a adopção de um conjunto de medidas excepcionais, designadamente dotando uma entidade gestora da zona de intervenção de um conjunto de poderes que permitam alcançar os objectivos propostos pelo Governo. Ora, quais são esses poderes, Srs. Deputados? Poderes de constituir servidões e propor expropriações, poderes na área da fiscalização da própria actividade, poderes de promover a criação, manutenção e actualização de infra-estruturas na nossa costa — já tão afectada e, por isso mesmo, qualquer intervenção na mesma tem de ser devidamente acautelada —, poderes na área de promover a caracterização geofísica e ambiental da própria zona que lhes ficará adstrita. Ainda por cima, esta entidade gestora da zona piloto será umas vezes escolhida por concurso público, outras vezes por ajuste directo, conforme refere o projecto de decreto-lei autorizado, se for sob o controlo efectivo do Estado. Então, pergunto ao Sr. Ministro: e se o deixar de ser? O que é que acontece nessa altura? Nessa altura, ficaremos com «o menino mas mãos»! Mas, passe a expressão, «por que raio de carga de água» — esta expressão vem ao caso, porque tem a ver com energia eléctrica e massas de água — não há-de ser uma entidade pública, da Administração Pública, a efectivar a gestão e a compatibilização dos muitos usos que existem na nossa costa, um bem que é público, que é de todos, Sr. Ministro? Por que é que não há-de ser a Administração Pública, onde existe, há longa data, uma tradição de muitos usos e onde assentam muitas actividades económicas, como a da pesca? Daqui parto para a última questão, Sr. Ministro, que, por ser técnica, admito que não me saiba dar uma resposta cabal, mas não posso deixar de a colocar. Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente. Todos os estudos, designadamente o do Centro de Energia das Ondas, apontam como normal para o tal offshore (ou exploração ao largo da costa) os 50 m de profundidade e fundamentam, justamente, os poucos impactos na actividade piscatória tradicional no facto de essa actividade se efectuar até aos 30 m. Mas, na realidade, a proposta do Governo prevê a exploração até aos 30 m. Porquê, Sr. Ministro? Prevê, sim! Basta ler a proposta do seu Governo. A realidade é que todos os estudos, quer nacionais quer estrangeiros, referem os 50 m. Gostava de saber qual é a razão de ser do que se prevê na proposta de lei, até porque, tanto quanto se sabe, quanto mais perto da costa, maiores serão os impactos ambientais e sociais. Sr. Presidente, interpelo a Mesa e procuro dotar o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares de todos os dados, por forma a desfazer a situação de vantagem em que me encontro, visto que li a proposta de lei. Ora, na pág. 11 desta iniciativa legislativa, no artigo 4.º, fala-se nos 30 m do offshore.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro terminou a sua intervenção, fazendo algum enquadramento político desta matéria e eu gostava de fazer ao contrário, ou seja, de terminar com a posição do PSD sobre esta iniciativa legislativa, mas de começar, justamente, pelo enquadramento político e até legislativo em matéria de energias renováveis. Apesar de podermos ter parecido um pouco descrentes, o que já é força do hábito, ficámos entusiasmados quando o Primeiro-Ministro, em Fevereiro, escolheu as alterações climáticas como tema do debate mensal e praticamente reduziu a discussão à questão da energia. Tínhamos a esperança de que aquilo que foi anunciado sobre biocombustíveis já tivesse alguma consequência, que a nova meta já tivesse sido legislada, mas, mais importante do que isso, de já perceber se vai, ou não, haver quotas de incorporação para saber se a meta vai ser atingida, visto que a de 2006, como o Sr. Ministro sabe, falhámos. Outra coisa que gostávamos de saber, que foi anunciada nessa altura mas continua em banho-maria — e talvez o Sr. Ministro queira, depois, na sua intervenção final ou de outra forma, esclarecer-nos —, é o que acontece com o novo regime jurídico da microgeração. O Partido Socialista veio anunciá-lo como uma grande revolução no mundo da energia, passaram quatro meses e não vimos nada, mas gostávamos de ver alguma coisa e, de preferência, que não fossem as posições oficiosas que a Administração Pública vai transmitindo sobre o assunto. A terceira nota tem que ver com a nova meta de produção de electricidade a partir de energias renováveis. Embora seja muito meritória e louvável, até do ponto de vista da inovação e da investigação científica, esta iniciativa que o Governo hoje, aqui, traz, não conhecemos, até hoje — e é pena! — qual é o verdadeiro enquadramento da nova produção a partir da hidroelectricidade. Sabemos, pelas notícias, que não estamos a falar de mini-hídricas mas, sim, de um vasto plano de novas barragens a instalar no País. Gostávamos que o Governo pudesse dizer alguma coisa sobre essa matéria, nomeadamente, depois de ultimamente o Ministério do Ambiente ter sido tão avesso ao instituto da avaliação de impacte ambiental, como é que ele se vai relacionar com este plano de hidroelectricidade. Trata-se de uma coisa seguramente mais importante para a composição do mix da energia nacional do que esta iniciativa, muito meritória, que hoje, aqui, nos trazem, de criar uma zona piloto e estabelecer regras para desenvolver um projecto inovador, que pode ter potencial, que se deve desenvolver mas que, neste momento, não resolve nenhum dos problemas de energia eléctrica do País. De resto, nesta matéria, gostava de recordar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que o primeiro impulso político para a produção de energia eléctrica no País a partir de recursos renováveis foi dado, justamente, pelo actual Presidente da República, quando era primeiro-ministro de um governo do PSD, em 1988. Tal veio permitir, pela primeira vez — e, aliás, antecipando em muito o que mais tarde viria a acontecer na Europa —, o exercício da actividade de produção de electricidade por pessoas singulares ou colectivas, numa verdadeira antecipação do que foi a Directiva sobre a liberalização do mercado de electricidade. De então para cá, progrediram muito os modelos de produção de energia, como o eólico, o minihídrico, o fotovoltaico, o geotérmico ou, até, a partir de resíduos. Boa parte deles, como o mini-hídrico e o eólico, são hoje indústrias consolidadas e produções de electricidade muito significativas. Contudo, o País possui, no total, uma linha de costa de quase 1500 km, que compreende áreas urbanas e industriais, de turismo e áreas naturais. Aliás, um dos problemas do País é que temos muita gente a morar perto do litoral. Visitam-nos regularmente 10 milhões de turistas, 90% dos quais convergem para as zonas costeiras, e 20% dos concelhos do País têm expressão territorial no litoral. Significa isto que, amadurecidas e disponíveis as tecnologias para a produção de electricidade a partir do mar, o nosso país não pode, naturalmente, negligenciar esta soberba riqueza com que a Natureza nos agraciou. Ora, na sequência da Directiva, de 2001, sobre fontes de energia renováveis, saudamos esta iniciativa que o Governo hoje traz para autorização legislativa e recordamos as experiências, bem sucedidas umas vezes, outras, nem por isso, já levadas a cabo no arquipélago dos Açores, na década de 90. Se bem que as costas portuguesas disponham de reconhecidas condições naturais muito favoráveis, o certo é que o aproveitamento da energia das marés é ainda experimental e raro devido a problemas técnicos e económicos. Para rentabilizar a economia energética das ondas tornam-se ainda exigíveis grandes amplitudes de maré que não são muito comuns em Portugal. O projecto pioneiro, da Póvoa de Varzim, que agora começa, tem em si o carácter de experimentalismo que pode fazer vingar este tipo de iniciativa no nosso país. Portanto, neste contexto, saudamos a iniciativa do Governo, a qual contribuirá muito positivamente, não apenas para o futuro enquadramento jurídico do desenvolvimento desta actividade no País mas, também, para um impulso mais forte e sistemático que, de um ponto de vista político — e retomo o que disse ao princípio —, entendemos ser necessário para colocar Portugal no efectivo desenvolvimento da produção de electricidade a partir de energias renováveis. É inegável que Portugal tem enormes vantagens comparativas para desempenhar um papel importante para se posicionar e assegurar uma fracção significativa do mercado mundial: boas condições naturais; boas infra-estruturas ao longo da costa atlântica; bons conhecimentos, acumulados ao longo de mais de 25 anos; um tecido empresarial dinâmico; uma Administração Pública activa; e conhecimento científico universitário disponível para recuperar o tempo perdido. A central do Pico, nos Açores, ou a zona piloto em S. Pedro de Moel, recentemente aprovada em Conselho de Ministros, são bons exemplos do empenhamento do Governo nesta área. Creio que este conjunto de medidas que hoje, aqui, o Governo apresenta dará um novo e forte impulso ao incremento da investigação e ao desenvolvimento da indústria energética nacional, atraindo para o País empresas inovadoras no domínio das novas tecnologias. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que autoriza o Governo a estabelecer o regime jurídico de utilização de bens do domínio público marítimo, incluindo a utilização das águas territoriais, para a produção de energia eléctrica a partir da energia das ondas do mar é uma corrida contra o tempo, mas também uma corrida contra a inércia e contra a indiferença. Por um Planeta mais limpo e mais amigo do ambiente.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 131/X, que visa autorizar o Governo a aprovar o regime jurídico de acesso ao exercício das actividades de produção de energia eléctrica a partir da energia das ondas, é mais um contributo para a produção de energias limpas, amigas do ambiente, com vista a melhorar a segurança no abastecimento, bem como a redução das emissões de gases com efeito de estufa. As alterações climáticas são, à escala global, o problema ambiental mais importante dos nossos dias e um desafio para as sociedades e para as economias contemporâneas. Existem apenas nove centros de produção de energia das ondas em funcionamento em todo o mundo e, em Portugal, o Professor António Sarmento, do Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação (INETI), em colaboração com o Instituto Superior Técnico e algumas empresas, tem realizado algum trabalho nesta área. A Martifer, com um protocolo celebrado com a Universidade de Aveiro, é bem um exemplo disso. Uma empresa do interior, ainda há bem pouco tempo visitada pelo Sr. Presidente da República, como um exemplo de inovação e tecnologia. É inegável que Portugal tem enormes vantagens comparativas para desempenhar um papel importante para se posicionar e assegurar uma fracção significativa do mercado mundial: boas condições naturais; boas infra-estruturas ao longo da costa atlântica; bons conhecimentos, acumulados ao longo de mais de 25 anos; um tecido empresarial dinâmico; uma Administração Pública activa; e conhecimento científico universitário disponível para recuperar o tempo perdido. A central do Pico, nos Açores, ou a zona piloto em S. Pedro de Moel, recentemente aprovada em Conselho de Ministros, são bons exemplos do empenhamento do Governo nesta área. Creio que este conjunto de medidas que hoje, aqui, o Governo apresenta dará um novo e forte impulso ao incremento da investigação e ao desenvolvimento da indústria energética nacional, atraindo para o País empresas inovadoras no domínio das novas tecnologias. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que autoriza o Governo a estabelecer o regime jurídico de utilização de bens do domínio público marítimo, incluindo a utilização das águas territoriais, para a produção de energia eléctrica a partir da energia das ondas do mar é uma corrida contra o tempo, mas também uma corrida contra a inércia e contra a indiferença. Por um Planeta mais limpo e mais amigo do ambiente.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A bondade do aproveitamento das fontes de energia renovável e as potencialidades abertas pelas tecnologias, ainda que muito experimentais, de exploração dos recursos da energia das ondas, na costa portuguesa, conduzem à oportunidade da iniciativa legislativa apresentada. Na generalidade, o Grupo Parlamentar do PCP avalia positivamente a legislação agora proposta. Em particular, consideramos útil a existência de uma entidade gestora que, entre outras missões, possa vir a disciplinar as ligações à rede. Contudo, temos sérias preocupações e discordamos fortemente que mais um segmento energético de relevante importância para o País vá ficar quase inteiramente sob a lógica e a dependência do capital privado — e temos fundadas razões para este entendimento. Isso resulta, no fundamental, da reestruturação empresarial do sector energético português levada a cabo pelo Governo do PS. Sob as orientações neoliberais de privatizações e liberalizações sopradas por Bruxelas, mas com o Governo português sempre «mais papista que o Papa», o que aconteceu e está a acontecer na EDP, na Galp e na REN, avultando o recente início de privatização desta última, que o PCP frontalmente condena, e as manobras da Comissão Europeia para expulsar qualquer vestígio da presença e da intervenção do Estado nas outras duas ditam a prática liquidação da condução, pelo poder político, do desenvolvimento, conforme aos interesses nacionais, de uma área estratégica para o País. No caso em apreço, o enorme potencial que o País tem a sorte de possuir pode, além disso, se não houver políticas nacionais adequadas, vir a ficar completa ou dominantemente nas mãos de interesses estrangeiros. É reveladora a recente notícia de que o projecto de uma central piloto, a instalar nos molhes do Douro, no Porto, resultante de uma parceria entre a EDP e o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, tenha «ido ao ar» ou «ao mar», por falta de disponibilidade orçamental do Instituto Portuário, isto é, por falta de vontade política do Governo e do Ministério das Obras Públicas. A este propósito, talvez o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares nos possa esclarecer aqui, hoje, sobre o que o Sr. Ministro da Economia não disse ou não quis dizer, quando, na última quarta-feira, foi questionado na Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas. Apesar da forte tradição de investigação e desenvolvimento neste domínio por parte das universidades portuguesas e do INETI, há, até ao momento, um débil envolvimento industrial nacional. A presença, em Portugal, de uma empresa escocesa e de uma outra finlandesa a venderem o seu produto tecnológico para exploração deste tipo de energias devia alertar o Governo português para a necessidade e a possibilidade de desenvolver uma tecnologia própria e nacional. Mas que dizer, se o Ministro da Economia anda claramente fascinado e ocupado com os êxitos da especulação bolsista das empresas do sector energético nacional? Relativamente à proposta de lei em apreço, cabe, ainda, assinalar outras preocupações e discordâncias. Discordância sobre o desenho proposto para a responsabilidade de ligação à rede que, segundo o projecto de decreto-lei, pode ficar para a rede de distribuição pública, até a 80 MW, ou para a entidade gestora da rede nacional de transporte, até 250 MW, em vez de ficar a cargo do promotor. Preocupação com a ausência de referência à necessidade de salvaguardar qualquer eventual conflito com outras entidades económicas, fundamentalmente o sector das pescas. É exigível que fique bem claro que o sentido de gestão de possíveis interesse conflituantes não se fará à custa das pescas portuguesas. Preocupação, ainda, com a indefinição do quadro de tarifas, as quais podem vir a transformar-se numa segunda versão das eólicas e, face ao sistema tarifário existente, numa nova sobrecarga para os consumidores de energia eléctrica, o que seria completamente inaceitável. É, hoje, cada vez mais claro que nada pode explicar que os sobrecustos da produção de energia eléctrica decorrentes dos incentivos ao desenvolvimento das energias renováveis não pudessem, e não devessem, ser englobados nos custos da EDP e de outros grandes produtores e absorvidos pelos respectivos sobrelucros e não à custa de consumidores e empresas. Bem pelo contrário, tal continua a ser uma consciente e clara opção política do Governo português, o Governo do PS, com evidente prejuízo para todos os consumidores domésticos e para a generalidade das empresas portuguesas.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a discutir a proposta de lei n.º 131/X, sobre a energia cinética do movimento das ondas, para a qual Portugal tem capacidade de produção, através da instalação em centrais de produção própria, com conhecimentos técnicos e científicos que podem determinar uma exploração económica viável. Já o mesmo não se pode dizer relativamente à energia das marés e à energia térmica dos oceanos, para o que Portugal não tem capacidade nem, necessariamente, potencial. O aproveitamento da energia das ondas pode ser integrado, inclusive, em obras de protecção da orla costeira, e isso é, também, uma mais-valia. No entanto, não podemos deixar de alertar o Governo para duas ou três questões relativamente ao pedido de autorização legislativa, contido neste diploma, para a definição jurídica da produção de energia. É que, como é referido no diploma, a instalação deste tipo de centrais terá de ser feita em domínio público marítimo, mas é necessário que a mesma tenha compatibilidade com o exercício de outras actividades, também no domínio público marítimo, nomeadamente, pesca, actividades de aquacultura, actividades de lazer e actividades de desportos náuticos. O País tem uma extensa costa marítima, tem potencial para esta produção. A mesma é importante para atingir as metas de produção de energias renováveis estabelecidas no Protocolo de Quioto, como já foi referido, quer pelo Sr. Ministro quer pelo Deputado José Eduardo Martins, Partido Social Democrata, mas é necessário que esta produção seja compatibilizada com outras actividades próprias deste tipo de domínio. Por fim, e sem que seja por último, é conveniente que o Governo tenha manifesta intenção de estudar definitivamente toda a costa portuguesa para verificar quais as condições de instalação mas, sobretudo, quais as condições de minimização dos impactes negativos em termos ambientais e ecológicos. A costa portuguesa é muito sensível e está sujeita a um grave processo de erosão — e não é só na Costa de Caparica mas ao longo de praticamente toda a costa —, pelo que, desde Caminha, desde a praia de Moledo, até Vila Real de Santo António, deve ser definitivamente estudado qualquer tipo de intervenção. Saudamos o facto de, neste diploma, se estabelecer o canal de produção de energias renováveis através da energia das ondas, mas é necessário, é absolutamente fundamental, que seja salvaguardado tudo o que apontei. As fontes de energias renováveis são uma ambição nacional com a qual concordamos, são um objectivo estratégico nacional com o qual estamos de acordo, são um potencial que o País detém e que, manifestamente, deve ser aproveitado. No entanto, não podemos deixar de alertar para todas estas questões, em termos de protecção da orla costeira. Vou fazer uma pergunta ao Sr. Ministro para cuja resposta vai ter tempo porque, provavelmente, vai sobrar-me e cedo-lho desde já. O que gostaria de saber é se se prevê a compatibilidade deste tipo de exploração de energia com todas as actividades conexas desenvolvidas no domínio público marítimo, nomeadamente, a pesca e as actividades de lazer. Gostaria de saber, ainda, se o Governo, não em termos de autorização legislativa mas em termos de governança, pretende fazer os estudos de todo o movimento de ondas para, depois, aí, sim, licenciar a produção de energia, já com o conhecimento efectivo do potencial do País para este efeito. Faço esta pergunta porque este aspecto ainda não está completamente esclarecido.
1CDS-PP
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