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TÍTULO: Um Sonho |
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LOCAL: Portugal - Lisboa |
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DATA: 1995 |
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INFORMANTE |
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SEXO: F |
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IDADE: 29 anos |
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ESCOLARIDADE: Curso Superior |
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PROFISSÃO: Professora universitária |
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OBSERVAÇÕES: A interlocutora da informante também é de Lisboa. |
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-> então o outro era o outro, que era: estávamos na praia e aquilo tudo cheio de areia e não sei quê, era um grupo de mulheres, assim, com fatos de banho antigos tipo [...]. |
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- tipo quê? |
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-> sei lá... |
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- anos vinte? |
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-> anos vinte, sim, tipo anos vinte. mas só que os fatos eram todos verdes-escuros e assim com uns folhinhos, depois tinham uns barretinhos na cabeça, também assim com os folhinhos, tudo verde-escuro. elas também tinham toalhas verdes-escuros. e então aquilo era um grupo de prisioneiras. |
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- ah! |
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-> era tudo prisionei[...], estavam todas na praia e eu era uma delas, percebes, era, só que não era eu, era uma pessoa que eu sei que era eu, porque eu falava através daquela pessoa e sentia o que aquela pessoa sentia mas ela não tinha a minha cara... |
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- sei. |
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-> nem o meu corpo, nem nada. e então, de repente, e havia assim uma rede verde, a separar a areia e de um lado estavam as prisioneiras, não é, e do outro lado eu pressuponho que eram as pessoas normais, que estavam ali, no resto da praia e depois para se sair dali tinha que se atravessar aquele bocado da areia e depois ia-se para a prisão... |
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- sei. |
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-> suponho eu. e, e de repente elas começaram-se a arranjar e já tinham saído muitas pessoas à nossa frente, e eu olhei e disse "então, então vocês vão para onde?" porque elas em vez de irem para o lado da rede, estavam a i[...], estavam a ir para o outro lado. e elas disseram "ah nós vamos fugir". e eu acho que estava um homem metido no meio delas mas é difícil de saber isto, eu tenho a impressão que estava lá um homem... |
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- curioso. |
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-> mas não, mas não tenho a certeza, porque eram m[...], mu[...], eram, eram mulheres só, eram para aí umas três mulheres e ela "nós vamos fugir" e eu fiquei assim a olhar e disse "pois é, é muito fácil fugir, por aqui, de facto, mas não adianta de nada, fugir, para que é que a gente vai fugir? depois apanham-nos". sabes, e eu achei que aquilo era tão natural, que nos iam apanhar a seguir, não valia a pena fugir. então muito naturalmente fui-me embora sozinha. |
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- para a prisão? |
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-> para a prisão. e virei para me ir embora para a prisão, só que quando cheguei à prisão, não era nada a prisão era a minha casa... |
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- Paula! |
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-> com o António, não é giro? e o António já estava a vestir-se, no quarto, e eu fui tomar banho. e depois, saí enrolada na toalha, espreitei, vi o António a vestir-se, voltei para a casa de banho. e quando voltei para a casa de banho, a água da banheira onde eu tinha estado a tomar banho, estava cheia de peixes, Helena! |
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- incrível. |
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-> peixes, peixes de todas as cores, de todos os feitios, lindos, uns pequenos, outros grandes, uma coisa enorme, olha, e ao mesmo tempo que aquilo era lindíssimo, era aflitivo, era um horror. eu comecei a gritar "António anda cá ver, António vem cá ver". e ele "o que é que foi, o que é que foi?" porque eu entretanto, tinha, tinha ido lá para tirar o, o ralo da banheira, percebes, |
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- sei. |
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-> e fiz aquilo na mesma, em vez de não tirar o ralo, tirei o ralo na mesma, então os peixes todos a irem pelo ralo abaixo e um tão grande e eu a pensar assim "este não vai s[...], caber no ralo". então aquilo já era nojento, estás a perceber, porque o peixe já era grande demais, para caber no ralo, e eu pensei "estes peixes vieram todos agarrados à minha pele"! |
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- meu Deus, Paula, isso é |
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-> estás a perceber, |
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- Dali |
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-> era isso que eu estava a pensar, era em larvas, vieram larvas ou ovos ou, ou qualquer coisa, vieram agarrados à minha pele, porque eles, depois quando eu me meti na banheira, na água, foi como se na água eles tivessem crescido. |
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- incrível! |
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-> estás a perceber, aqueles peixes tinham vindo todos colados a mim. |
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- da praia, da pri[...], da, qu[...], daquele grupo de mulheres. |
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-> da praia, daquele grupo das mulheres, da prisão, daquela coisa toda, estás a ver, e eu ali "António vem cá ver, vem cá ver" e ele a ver, e, e pronto, e, e o, e os peixes foram-se embora. e depois eu muito aflita, com aquilo, e quando chego ao quarto, havia peixes a voarem no, num, no quarto, assim era um peixe muito lindo, assim preto e cor-de-laranja, assim com riscas... |
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- imagina. |
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-> e eu a ver o peixe assim voar, no ar, a passar assim como se estivesse num aquário e eu, e eu a olhar, para aquilo, assim. |
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- é bonito... até. |
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-> não é? mas não é? |
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- só a narrativa, já é... sugestiva |
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-> pois, mas é muito estranho, não é, |
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- é, é curioso. já falaste nisso assim? |
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-> não, não, não falei com ninguém. não sei o que é que isto quer dizer... |
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- mas deve ter aí, há cargas óbvias, não é, |
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-> sim, pois, há coisas óbvias. |
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