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Sr. Presidente, Srs. Deputados: No pouco tempo que me resta, queria sublinhar que o que o Sr. Deputado Renato Sampaio acabou de dizer não faz sentido, porque não corresponde, de todo, ao conteúdo do projecto de lei que nos apresenta — e devo acrescentar que o Bloco de Esquerda defende o que está previsto neste projecto de lei. Contudo, o que o Sr. Deputado acabou de dizer na sua intervenção não é o que está no projecto de lei. Ou seja, disse que, afinal de contas, o que está no projecto de lei não é para ser bem assim… Ou seja, é um princípio, é uma questão — e cito as suas palavras — de «corrigir injustiças na sociedade portuguesa». Faz muito bem! É isso mesmo que faz falta. É profundamente injusto que eu, que tenho um determinado perfil de consumidora de electricidade ou de água diferente do seu, seja sujeita exactamente às mesmas regras para a fixação da taxa de resíduos sólidos urbanos, quando esta taxa deve traduzir um incentivo às boas práticas de selecção na origem dos resíduos! Portanto, há uma injustiça enorme quando se faz a indexação da taxa de resíduos sólidos urbanos quer aos custos da água quer aos custos da electricidade. Qualquer uma delas contém uma injustiça gritante. Ora, o Sr. Deputado Renato Sampaio diz que quer corrigir esta injustiça e, por isso, inclui no projecto de lei um dos aspectos que faz falta para a corrigir, mas depois diz-nos que não é para ser bem assim… Ou é para levar a sério ou não é para levar a sério, Sr. Deputado! Portanto, é preciso ser claro! Não vale apresentar um projecto de lei para parecer «bonito» diante da opinião pública e, depois, quando se passa à concretização de facto, dizer que não é exactamente assim, continuando tudo na mesma, «como dantes em Abrantes»…! Lamento muito, mas não pode ser!! O Bloco de Esquerda está de acordo e acompanha este projecto de lei, mas o Partido Socialista tem de comprometer-se em relação ao que propõe neste mesmo projecto de lei.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 263/X, 16 DE MARÇO DE 2007 15 do PS, ora em discussão, pretende alterar o ordenamento jurídico de forma a reforçar — de acordo com os proponentes — a protecção dos utentes de serviços públicos essenciais. Assim, alarga o âmbito dos serviços públicos essenciais às comunicações electrónicas, ao fornecimento de gás canalizado e a outros serviços integrados nesta área, tais como os serviços postais, as águas residuais e os resíduos sólidos. De igual modo, consagra a proibição de cobrança aos utentes de importâncias relativas ao uso dos contadores, ou outros instrumentos de medição, aplicados pelos prestadores de serviços para efeitos de consumo e clarifica, em sede de articulação do regime da facturação por consumo estimado, a matéria da prescrição e da caducidade. Introduz ainda a regra da compensação dos pagamentos em excesso efectuados pelos utentes, por via da facturação dos consumos por estimativa, na factura em que a empresa procede ao acerto do consumo efectivo com o consumo estimado efectivamente pago. Por fim, alarga a todas as matérias relativas à prestação do serviço que impliquem uma actuação do prestador o âmbito da regra sobre o ónus da prova, que fica a cargo do prestador de serviço. São, sem dúvida — neste dia que é, aliás, simbólico —, interesses e objectivos relevantes que genericamente acompanhamos. Que nenhuma dúvida reste sobre esta questão! Contudo, como no seu completo relatório o Deputado Pedro Quartin Graça salienta, numa audiência realizada à Associação de Operadores de Telecomunicações, foi transmitido que a regulação operada por este projecto de lei não pode — e não deve, a nosso ver — substituir, suplantar ou prejudicar a regulamentação que já existe para a prestação de serviços de comunicações telefónicas e, sobretudo, não deve pôr as regras da concorrência no sector em causa, retomando até, aliás, soluções entretanto abandonadas na lei do comércio electrónico em matéria de consumos mínimos, prescrição, caducidade e resolução extrajudicial de conflitos, matérias essenciais que podem e devem ser reforçadas. O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao fornecimento dos serviços essenciais de gás natural e de serviços postais. No que respeita ao gás natural, no regime jurídico aplicável podemos encontrar normas que consagram princípios gerais, como os da racionalidade económica e da eficiência energética, é certo «sem prejuízo do cumprimento das respectivas obrigações de serviço público» ou das obrigações das concessionárias ou licenciadas da rede de distribuição, para já não falar das consagradas na própria concessão. Já no que respeita ao serviço postal, as bases da concessão aprovadas em 1999 prevêem que o regime de exploração em exclusivo do estabelecimento, gestão e exploração da rede postal pública e de prestação de serviços reservados ao concessionário não deve demonstrar preferência ou discriminação indevida ou injustificada relativamente a qualquer pessoa, singular ou colectiva, que os requeira. Ora, no entender do CDS, o que importa salientar é que a aplicação das disposições da Lei n.º 23/96 deverá ceder sempre perante normas especiais que consagrem um regime legal mais favorável ao utente sob pena de subverter os objectivos dos proponentes e do projecto de lei em causa. Por outro lado, é necessário atender a que algumas normas do projecto de lei poderão já não fazer sentido mercê da entrada em vigor de nova legislação sobre as matérias que o mesmo contempla. Só para dar um exemplo, o projecto de lei deu entrada a 16 de Julho de 2006 e o regime jurídico que se pretende alterar (o Decreto-Lei n.º 140/2006) foi publicado em 26 de Julho do mesmo ano — ou seja, 10 dias depois —, o que significa que nem todas as soluções jurídicas previstas neste projecto de lei se a adequam à lei que se pretende alterar e que foi o Governo do PS que aprovou. Outro exemplo: o n.º 1 do artigo 10.º prevê que o «direito de exigir o pagamento» do preço do serviço prescreve no prazo de seis meses, mas a nova redacção que se pretende introduzir prevê que o «direito ao recebimento» do preço do serviço caduca no mesmo prazo. Ora, parece-nos que há aqui alguma confusão entre os institutos da prescrição e da caducidade. Não se descortina o alcance desta substituição, até porque consideramos que a que actualmente está consagrada (a da caducidade) é juridicamente a mais correcta. Sublinhe-se, por fim — matéria que poderá não parecer importante mas que é absolutamente fundamental para nós —, o facto de a legislação sobre esta matéria, marcadamente técnica, requerer uma aturada audição e consulta a diversas entidades, quer em razão dos novos serviços públicos que são integrados (e que justificam a audição, por exemplo, do Instituto Regulador das Águas e Resíduos, da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos ou da Autoridade Nacional das Comunicações), quer em razão de se tratar, no caso dos resíduos, de matéria que tem implicação nos sistemas municipais e que exigem, por isso, a audição da ANMP, quer ainda porque se trata de matéria relativa ao consumo, pelo que carece de um parecer prévio ao Conselho Nacional do Consumo, para não referir a consulta a várias associações de consumidores. Em suma, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o presente projecto de lei do PS tem, na mesma proporção, boas intenções mas incorrectas ou incompletas disposições legais. Pelo que, em nome daquelas (das boas intenções) e também destas (das insuficiências de que padece), o CDS se disponibiliza para, de forma serena, em sede de comissão, proceder às necessárias audições e encontrar as melhores soluções jurídicas para a defesa de interesses que são relevantes, que têm a ver com o quotidiano do cidadão e que, por isso mesmo, exigem uma cuidada consagração legal, um cuidado e aturado trabalho jurídico na especialidade. Esta é uma matéria que merece que todos, em conjunto, procuremos encontrar as melhores soluções. Esperamos que o Partido Socialista esteja disponível para alterar significativamente este projecto de lei, na especialidade, como julgamos ser necessário. Assim o desejamos e assim, em qualquer caso, procederemos.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comemoramos hoje mais um Dia Mundial dos Direitos dos Consumidores. Esta comemoração não deixa de ser caricata na medida em que, se há matéria em que todos os dias do ano são dias dos consumidores, essa é, sem margem para quaisquer dúvidas, a matéria do consumo. O Direito do Consumidor ou Direito do Consumo é um ramo de Direito que surgiu na primeira metade do séc. XX, mas que foi antecedido pela existência de um conjunto alargado de normas e, acima de tudo, de costumes, nos mais variados países. Ainda que sem merecer à época a qualificação de categoria jurídica distinta, encontramos normas de consumo em diplomas como o Código de Hamurabi, que regulamentava o comércio na Mesopotâmia, no Antigo Egipto e na Índia antiga, onde o Código de Massú previa pena de multa e punição, além do ressarcimento de danos, aos que adulterassem géneros ou que entregassem coisa de espécie inferior à acertada ou, ainda, vendessem bens de natureza igual por preços diferentes. No Direito romano clássico, o vendedor era responsável pelos vícios da coisa, a não ser que estes fossem por ele ignorados. Já no período Justinianeu, a responsabilidade era atribuída ao vendedor, mesmo que este desconhecesse o defeito. A França de Luiz XI punia com banho a escaldar aquele que vendesse manteiga com pedra no interior para aumentar o peso ou leite com água para aumentar o volume. Com o Estado liberal do séc. XVIII assistimos à não intervenção do Estado na esfera privada. Séculos depois, já o Estado Social surge como resposta à miséria e à exploração de grande parte da população, passando a intervir na economia para promover a justiça social. Mas foi a partir das iniciativas do presidente americano John Kennedy, nos anos 60, que se verificou a consolidação dos direitos do consumidor, primeiro nos Estados Unidos e, posteriormente, num rápido movimento de internacionalização, à escala global. Entre nós, a primeira aproximação, ainda que indirecta, à protecção dos direitos dos consumidores surge na ordem jurídica liberal com a definição como crimes de ofensas à saúde pública e de certas práticas comerciais desonestas, nos Códigos Penais de 1852 e 1886. Mais tarde, o Decreto-Lei n.º 41204 condensou a legislação até então dispersa sobre delitos antieconómicos e contra a saúde pública. O Código Civil de 1966, embora sem alterações significativas, introduziu um regime de vendas a prestações que revelava alguma preocupação com a posição do comprador e o modelo de responsabilidade objectiva para os danos causados por instalações de energia eléctrica ou gás. É, contudo, a Constituição da República de 1976 que, pela primeira vez, atende de forma expressa à protecção dos direitos dos consumidores. Mas foi já no decurso da vigência da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, a qual, entre outros aspectos relevantes, configurou a relação de consumo também como a relação entre o consumidor e a Administração Pública, que foi aprovado um outro importante diploma relativo à protecção do utente dos serviços públicos essenciais: a Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, a qual constituiu um marco fundamental numa sociedade onde estes serviços são fornecidos quase sempre em regime de monopólio e em que a tradição legislativa se consolidara há muito no sentido da consagração do poder do concessionário. Sr. Presidente, Srs. Deputados: É precisamente uma alteração à Lei n.º 23/96 que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista traz hoje ao Plenário da Assembleia da República com o objectivo declarado de actualizar o regime legal em causa, «de molde a manter o nível elevado de protecção dos utentes assegurado aquando da sua aprovação». Não põe este Grupo Parlamentar em causa a relevância e o interesse para os consumidores das alterações que ora se propõem, nomeadamente em sede de inclusão dos serviços de comunicações electrónicas, dos serviços postais, dos serviços de recolha e tratamento de águas residuais e dos serviços de resíduos sólidos urbanos, da disposição em sede de ónus da prova e daquela que se refere a acerto de valores, as quais considera serem medidas globalmente positivas. Mas o mais preocupante, e são esses os aspectos que nos cabe referir enquanto oposição, é que este diploma tem falhas ou omissões que importa salientar. 16 DE MARÇO DE 2007 17 Refiro apenas três: em primeiro lugar, não encontramos no projecto do Partido Socialista qualquer norma que diga respeito à proibição da facturação por estimativa nos vários serviços públicos essenciais, matéria esta que é de extraordinária importância na medida em que a sua inexistência gera sobrefacturação e provoca o desequilíbrio no orçamento das famílias. Em segundo lugar, não vislumbramos qualquer iniciativa ou disposição legal no sentido da implantação genérica de sistemas de telecontagem nos serviços públicos. Em terceiro lugar, o projecto do Partido Socialista nada diz relativamente à questão que se prende com a possível abolição da taxa de assinatura da Portugal Telecom, valor fixo este que é pago mensalmente pelo cliente assinante detentor de um serviço de telecomunicações. Sr. Deputado Renato Sampaio, é necessário que fique aqui muito claro publicamente que a taxa de assinatura da Portugal Telecom vai ser efectivamente abolida. Enquanto relator do relatório sobre este projecto elaborado no âmbito da 1.ª Comissão, efectivamente, não vislumbrei no mesmo qualquer disposição que contemplasse esta abolição. Ficamos assim sem saber qual a posição do PS nesta matéria. Ora, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaríamos de saber da disponibilidade para, em sede de especialidade, incluir no seu projecto os contributos que ora avançamos e que se destinam a reforçar os direitos dos consumidores portugueses. Termino com uma última referência: há um ano atrás o Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor anunciou publicamente, e nesta mesma Assembleia, a obrigatoriedade de afixação, fora dos postos, dos preços comparativos de venda dos combustíveis ao público nas auto-estradas. Um ano passou e esta promessa juntou-se a um conjunto alargado de outras que não passam disso mesmo: promessas cujo cumprimento tarda ou não surge de todo. Até quando? É que as estimativas que fizemos com base num ou dois exemplos de autarquias e na perda de receitas que isto significará para algumas autarquias permitem-nos dizer — e esperemos que o 18 I SÉRIE — NÚMERO 60 PS ou o Governo venham dar os seus próprios dados — que a anulação desta receita prevista no Orçamento do Estado para 2007, nos orçamentos municipais já aprovados, significará uma perda de receita não inferior a 150 milhões de euros. Ora, esta é uma «fatia» significativa se considerarmos os orçamentos municipais, ainda por cima onerados por uma política restritiva da actual Lei das Finanças Locais e do Orçamento do Estado para esta área. Portanto, o que importa saber é se o Partido Socialista, que pretende aplicar esta norma também nestes casos, está disponível, ou não, para introduzir uma compensação para as autarquias locais; ou se, ao invés, a política do PS é aquela que já ouvimos de manhã ao Sr. Secretário de Estado da tutela: «Se quiserem aumentem as tarifas da água»… Isto é, já está a sugerir ao Governo que, para resolver o problema da não taxação, justa!, dos contadores da água, os portugueses não paguem menos na sua factura da água ou de qualquer outro serviço, mas, sim, que passem a pagar mais pelo consumo do precioso líquido propriamente dito. E este é que é o ponto que está aqui em questão: afinal, a proposta do Partido Socialista é para baixar o que se paga indevidamente ou é para se pagar por outra via como sugere o Governo nas intervenções que tem tido nesta matéria? E é o mesmo Governo, lembre-se, que introduziu e fez aprovar nesta Câmara uma lei das taxas municipais que permite um amplo leque de taxas nas mais diversas áreas e que, portanto, vai contra o princípio que aqui agora se define. É preciso dizer ainda que há uma questão legal a ser resolvida também: é porque é extremamente duvidoso, para não dizer mais, que um projecto de lei desta Assembleia possa alterar, a meio do ano, os orçamentos municipais que são tidos em conta para a elaboração do Orçamento do Estado. Isto é, não estamos aqui também no âmbito de uma norma-travão que impede que — uma vez que este projecto de lei não tem essa norma —, a meio do ano, fiquem, no mínimo, menos 150 milhões de euros nas receitas das autarquias? É possível determinar isto sem mais nem menos, a meio do ano, sem que se tenha em consideração a devida compensação? Esta é uma questão a que o Partido Socialista tem de dar uma resposta cabal e completa.
4PSD
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A primeira questão que é preciso abordar em relação a este projecto de lei do Partido Socialista é a de que este projecto de lei não pode esconder a política do Governo em matérias importantes para os consumidores; não pode esconder que foi o Governo que aumentou para 21% o IVA, com pesados prejuízos pelo seu carácter cego de aplicação para os portugueses, mesmo na sua qualidade de consumidores; não pode esconder que este Governo foi, também como anteriores, conivente com a introdução na factura da energia eléctrica, por exemplo, de matérias que não deviam constar nessa factura e que permitem que os lucros da empresa que a fornece sejam astronómicos, enquanto a factura dos consumidores é cada vez maior; não pode esconder que nessa mesma factura se tem admitido ao longo dos anos que até as indemnizações para o despedimento dos trabalhadores nas reconfigurações que a empresa sucessivamente vai tendo são descontadas nas facturas. Portanto, esta proposta, independentemente do seu conteúdo em concreto que a seguir analisarei, não pode fazer esquecer que a política do Governo em matéria de direitos do consumo das populações tem sido negativa e, pelos vistos, não vai mudar, apesar do projecto que hoje é aqui apresentado. Podemos dizer que é uma proposta de má consciência ou, utilizando uma expressão do Porto que o Sr. Deputado Renato Sampaio certamente conhecerá, uma espécie de proposta «tapadeira» da política do Governo para fingir que o PS está preocupado com os direitos dos consumidores em serviços públicos essenciais. Mas vamos ao conteúdo concreto da proposta que é aqui apresentada. Evidentemente, a proposta tem princípios positivos, designadamente o da transparência, da não facturação daquilo que não é de serviço efectivo, mesmo que em alguns casos, como já foi visível neste debate, seja necessária uma clarificação concreta. É que se há entidades que aproveitam facilmente as fugas da lei e o carácter vago de alguma legislação são estas grandes empresas que prestam serviços públicos essenciais. Portanto, o que é para consagrar é preciso estar explicitamente consagrado, caso contrário poderá não concretizar-se. É muito importante o princípio da informação, é muito importante o princípio da transparência, é muito importante repor a questão das telecomunicações no âmbito desta lei, que tinha sido retirada pelos governos do PSD e do CDS. Tudo isso é muito importante, mas não podemos deixar de chamar a atenção para a dinâmica que a aplicação desta lei pode ter. É que as estimativas que fizemos com base num ou dois exemplos de autarquias e na perda de receitas que isto significará para algumas autarquias permitem-nos dizer — e esperemos que o PS ou o Governo venham dar os seus próprios dados — que a anulação desta receita prevista no Orçamento do Estado para 2007, nos orçamentos municipais já aprovados, significará uma perda de receita não inferior a 150 milhões de euros. Ora, esta é uma «fatia» significativa se considerarmos os orçamentos municipais, ainda por cima onerados por uma política restritiva da actual Lei das Finanças Locais e do Orçamento do Estado para esta área. Portanto, o que importa saber é se o Partido Socialista, que pretende aplicar esta norma também nestes casos, está disponível, ou não, para introduzir uma compensação para as autarquias locais; ou se, ao invés, a política do PS é aquela que já ouvimos de manhã ao Sr. Secretário de Estado da tutela: «Se quiserem aumentem as tarifas da água»… Isto é, já está a sugerir ao Governo que, para resolver o problema da não taxação, justa!, dos contadores da água, os portugueses não paguem menos na sua factura da água ou de qualquer outro serviço, mas, sim, que passem a pagar mais pelo consumo do precioso líquido propriamente dito. E este é que é o ponto que está aqui em questão: afinal, a proposta do Partido Socialista é para baixar o que se paga indevidamente ou é para se pagar por outra via como sugere o Governo nas intervenções que tem tido nesta matéria? E é o mesmo Governo, lembre-se, que introduziu e fez aprovar nesta Câmara uma lei das taxas municipais que permite um amplo leque de taxas nas mais diversas áreas e que, portanto, vai contra o princípio que aqui agora se define. É preciso dizer ainda que há uma questão legal a ser resolvida também: é porque é extremamente duvidoso, para não dizer mais, que um projecto de lei desta Assembleia possa alterar, a meio do ano, os orçamentos municipais que são tidos em conta para a elaboração do Orçamento do Estado. Isto é, não estamos aqui também no âmbito de uma norma-travão que impede que — uma vez que este projecto de lei não tem essa norma —, a meio do ano, fiquem, no mínimo, menos 150 milhões de euros nas receitas das autarquias? É possível determinar isto sem mais nem menos, a meio do ano, sem que se tenha em consideração a devida compensação? Esta é uma questão a que o Partido Socialista tem de dar uma resposta cabal e completa. Depois, é preciso dizer também que o Partido Socialista tem de dar garantias muito sérias da forma como esta lei vai ser aplicada nos outros operadores, na EDP, na PT, no gás… É que já estamos tão habituados a que estas entidades, utilizando o livre arbítrio da sua prepotência face aos consumidores e a conivência de sucessivos governos, encontrem sempre outras formas para compensar aquilo que lhes é imposto em cada momento… Ora, o compromisso que o PS e o Governo também têm de assumir é que isso não vai acontecer aqui e que não vão ser compensados os accionistas da EDP e de outras entidades por aquilo que agora, de outra forma, lhes vai ser impedido de cobrar. Finalmente, é também importante referir que, no relatório ontem aprovado na 1.ª Comissão, se considerou essencial solicitar pareceres e fazer audições a diversas entidades que são muito relevantes nesta matéria, quer as várias entidades reguladoras, certamente, quer também a Associação Nacional de Municípios Portugueses, o Conselho Nacional de Consumo, as associação dos consumidores e outras entidades que eventualmente venham a ser consideradas como úteis na consideração deste projecto na especialidade. É, portanto, com este princípio que vamos para a discussão e votação deste projecto de lei. Vamos viabilizá-lo, mas não sem que digamos ao PS e ao Governo que seguiremos e participaremos com muita atenção na discussão da especialidade porque têm de ser corrigidos alguns problemas e algumas consequências graves que esta proposta traz. Caso contrário, estaremos, afinal, perante uma proposta que, em matéria de direitos dos consumidores, se trata ela também de publicidade enganosa: promete baixa de preços, mas na prática não vai concretizála junto das populações. Ora, é contra essa publicidade enganosa que também nos bateremos na especialidade para que este projecto de lei seja corrigido.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em particular Sr. Deputado Renato Sampaio, que apresentou o projecto de lei do Partido Socialista, Os Verdes consideram que se trata de uma proposta globalmente positiva quanto aos seus objectivos. Em termos de defesa dos consumidores promove o alargamento da abrangência de serviços públicos essenciais fornecidos aos consumidores, a proibição de fixação de taxas encapotadas, o que nos parece extraordinariamente importante, como os montantes pagos pela existência de um contador que permite ao prestador de serviço contabilizar o consumo efectuado, ou a classificação da regularização do pagamento por defeito e em excesso. Isto para dar alguns exemplos de algumas das matérias que nos parecem parti16 DE MARÇO DE 2007 19 cularmente relevantes. Nas anteriores intervenções dos diferentes grupos parlamentares já foram enunciados alguns défices estabelecidos neste vosso projecto de lei. Há algumas questões que não estão particularmente clarificadas e que importa clarificar no âmbito da especialidade. Esta vontade que o Partido Socialista hoje manifesta relativamente a uma defesa concreta dos direitos dos consumidores deve fazê-lo tomar posições também concretas, por exemplo, relativamente à contribuição audiovisual de determinados aparelhos que pessoas com deficiências concretas não usufruem porque não o podem fazer devido à sua deficiência. No entanto, pagam uma contribuição audiovisual. Houve outra questão que foi referida e que me parece também particularmente importante, ou seja, a questão da facturação por estimativa e a continuação da permissão dessa facturação sem outras medidas associadas. Houve ainda uma outra questão que também já aqui foi levantada e que é extremamente incoerente relativamente a afirmações do próprio Ministério do Ambiente quanto às intenções que tem relativamente à taxa de resíduos, à sua não indexação à factura da água mas, sim, à sua indexação à factura da electricidade. Esta medida vem criar alguma incongruência com este projecto de lei do Partido Socialista. Pareceunos até determinada altura que, afinal de contas, o Partido Socialista tinha encontrado e iria apontar ao Governo um caminho para uma indexação mais real da taxa de resíduos ao verdadeiro consumo de resíduos ou à aproximação do real consumo de resíduos, designadamente com uma lógica diferente de recolha desses mesmos resíduos, mas afinal não foi por aí que caminhámos. Este particular interesse que o Partido Socialista agora, subitamente, encontra relativamente à defesa dos consumidores… Já vou explicar porque é que é «subitamente». Como eu dizia, este particular interesse que o Partido Socialista encontra subitamente em relação à defesa dos consumidores pode «abrir aqui uma porta de esperança» para Os Verdes relativamente a uma breve e curta aprovação de um projecto de lei que apresentámos já há uns tempos nesta Casa e que se prende com uma questão simples, mas que é extremamente importante na nossa perspectiva, ou seja, que a factura da água passe a incluir informação aos consumidores dos parâmetros avaliados da qualidade desse recurso. É uma medida simples, extremamente oportuna para a informação e defesa dos direitos dos consumidores. E tem até outra vertente, visto que aquelas entidades que não promovem as análises devidas nos termos legais devem fazê-lo obrigatoriamente, na medida em que estão obrigadas a dar essa informação concreta. Fica, então, aqui esta «porta» de esperança relativamente à aprovação deste projecto de lei de Os Verdes. De qualquer modo, o Sr. Deputado Renato Sampaio pode perguntar por que é que classifiquei de súbita a preocupação do Partido Socialista relativamente aos interesses dos consumidores. Ora, o que se passa é que os senhores gostam muito de fazer algo que não podemos aceitar e que passa por compartimentar os assuntos, não os relacionando com a lógica política que têm desenvolvido. Todavia, a primeira coisa que este Governo fez assim que chegou ao poder foi accionar um mecanismo extremamente gravoso para os consumidores, que foi o aumento do IVA. Como tal, um Governo assim não pode propriamente vangloriarse de efectuar uma grande defesa desses mesmos consumidores, sobretudo, quando falamos do aumento de um imposto indirecto que incide sobre o consumo e que, como o Sr. Deputado bem sabe, prejudica muito mais as pessoas com menos posses económicas. O mesmo se diga sobre um Governo que direcciona uma boa parte da sua política nos mais diversos sectores — e sectores tão fundamentais para os consumidores e cidadãos como o dos transportes, o da energia, o das telecomunicações, o da saúde e o da água — numa lógica de privatização, isto é, numa lógica de entrega ao sector privado da gestão destes serviços fundamentais para os cidadãos. Este Executivo não pode, portanto, gabar-se de levar a cabo uma grande defesa dos consumidores. A verdade, Sr. Deputado, é que todos temos conhecimento dos lucros chorudos que essas empresas privadas vão retirando destes sectores essenciais. Ora, se estes montantes se repercutissem, depois, nos serviços prestados aos consumidores, ou seja, se estes montantes fossem redistribuídos e aplicados na melhoria dos serviços prestados aos consumidores e não fossem aplicados na redistribuição pelos bolsos dos accionistas, numa lógica clara de concentração de riqueza, evidentemente estaríamos a falar num outro modelo de desenvolvimento, muito mais abrangente em termos de defesa dos cidadãos e dos consumidores. É, portanto, na esperança de concretizar este modelo que partimos para a discussão, na especialidade, deste projecto de lei, que, evidentemente, Os Verdes vão viabilizar na generalidade.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados apenas dois dias desde a última quarta-feira, dia 21 de Março, em que se celebrou o Dia Mundial da Floresta, o Parlamento tem hoje a oportunidade de reflectir sobre um dos aspectos mais importantes para a sustentabilidade da floresta nacional e que tem sido tão esquecido: as espécies da nossa floresta autóctone. Se é verdade que uma árvore não faz a floresta, é igualmente verdade que uma só espécie também não faz a floresta. A floresta é um espaço de riqueza, de património natural e ambiental, fonte de vida e de biodiversidade, suporte de ecossistemas, que será tão mais rico, tão mais forte e resistente, tão mais saudável, protegido e produtivo, encerrando em si tantas mais potencialidades e oportunidades, quanto for constituído por uma variedade maior de espécies autóctones da nossa flora nacional. Não se trata aqui de excluir todas as restantes espécies exóticas do nosso território. Não se trata aqui de um qualquer nacionalismo bacoco, mas, sim, de reconhecer a importante mais-valia ambiental, económica e social que representam as espécies que a natureza seleccionou como as mais bem adaptadas aos nossos diferentes biótopos, aos nossos solos e clima, às nossas condições edafoclimáticas. A floresta espontânea e as espécies da flora autóctone portuguesa, das quais se destacam, pelo seu porte nobre e importância ambiental e cultural, as quercíneas, de que fazem parte os carvalhos como o carvalho cerquinho, alvarinho ou roble, o carvalho negral, mas também o sobreiro e a azinheira, por estarem particularmente adaptadas à nossa realidade, representam um importante factor de sustentabilidade a nível da conservação da natureza, do equilíbrio climatérico e da qualidade do ar, fixando o CO , contribuindo para a estabilidade e recarga dos aquíferos, para a preservação e regeneração dos 2 solos, agindo no combate aos incêndios pela reconhecida resistência e capacidade regenerativa que apresentam. Elas estão connosco desde os alvores dos tempos, fazendo parte da nossa cultura, da nossa história e identidade, desde os tempos em que a castanha e a bolota eram uma componente fundamental da nossa dieta (a batata da antiguidade e Idade Média), fazendo também parte da nossa memória, do nosso imaginário, da religiosidade, do património material e imaterial, deixando traços na onomástica, nos nossos nomes, e na toponímia dos lugares, por vezes até de forma insuspeita. Quem sabe, por exemplo, que a cidade de Évora deve o seu nome a um étimo de origem celta, eburone, que significa teixo? Além disso, a floresta autóctone desempenha ainda um papel económico-social de grande relevo, com importantes reflexos nos sectores agro-florestal, que, não excluindo, vão muito além da mera produção lenhosa, como a alimentação de gado de elevada qualidade, a produção de mel, cogumelos, frutos e ervas aromáticas, actividade cinegética, o turismo da natureza, geradores de emprego e riqueza, pelo que é dever do Estado, conforme está previsto na Lei de Bases da Política Florestal, dotar essas espécies de um estatuto legal conforme à sua importância e ao lugar que devem ocupar na nossa floresta e nos nossos ecossistemas. Contudo, o nosso ordenamento jurídico não tem acompanhado essa importância e tem votado ao quase total esquecimento essas espécies, não existindo nenhum diploma legal que as reconheça, de forma individualizada, como património natural nacional de biodiversidade, à excepção do sobreiro, da azinheira e do azevinho espontâneo, persistindo, assim, uma grave lacuna legislativa que cumpre suprir. Infelizmente, nem a Directiva Habitats, transposta pelo Decreto-lei n.º 49/2005, nem as tímidas medidas previstas no Plano de Desenvolvimento Rural, na Estratégia Nacional para as Florestas ou no Fundo Florestal Permanente são suficientes para inverter o actual rumo de perda de biodiversidade e declínio. É também inegável que têm estado ausentes medidas específicas que permitissem às nossas espécies autóctones recuperar o terreno que têm vindo gradualmente a perder. Dados do último Inventário Florestal Nacional demonstram que, o contrário do montado, em que sobreiros e azinheiras ainda representam, em conjunto, apesar do declínio das últimas, cerca de 36% da área total de povoamento florestal no nosso país, o que se deve, sem dúvida, ao estatuto de protecção legal de que gozam, as restantes espécies autóctones da floresta portuguesa estão em declínio, ao contrário do eucalipto, que continua a reinar. Se em 1995/98 os carvalhais já representavam apenas 4% do nosso espaço florestal, em 2006, apenas ocupam 3,76%, o mesmo acontecendo aos castanheiros e restantes folhosas, que conheceram igualmente um acentuado retrocesso. O Partido Ecologista «Os Verdes» apresenta, assim, um projecto de lei consciente da dificuldade de encontrar soluções práticas e equilibradas que salvaguardem todos os interesses em causa mas na certeza de que, em sede de especialidade, com os contributos alargados de todos, é possível melhorá-lo. Esperamos que as restantes bancadas se associem, pelo menos no objectivo que visa, respondendo ao apelo feito por importantes associações de ambiente nacionais, por investigadores e produtores florestais, que há muitos anos reivindicam um estatuto de protecção para os carvalhais portugueses, consagrar um estatuto mínimo de protecção para os carvalhos e para outras espécies da nossa flora autóctone, no intuito da sua preservação como património mas também no sentido de aproveitar todo o seu potencial para valorizar e proteger a floresta portuguesa. Não é verdade! Andou mal o Partido Ecologista «Os Verdes» nesta iniciativa legislativa, e pior andou ao incluir no seu projecto de lei um conjunto tão vasto de espécies arbóreas e arbustivas da flora autóctone 24 DE MARÇO DE 2007 17 nacional, com características ecológicas tão díspares, onde se inserem espécies cuja utilização produtiva é condição segura de protecção, como o pinheiro manso e variados arbustos bem presentes em áreas protegidas, como a camarinha, a sabina das praias, o zimbro, o loureiro ou o lódão, para citar os mais conhecidos. Não temos dúvidas que as 43 variedades inseridas no projecto de lei são para preservar e consolidar, mas importa saber do que estamos a falar, Srs. Deputados. Consultando a classificação publicada pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais, relativa às espécies autóctones, constata-se que, das 43 variedades incluídas no projecto de lei em apreço, 3 são consideradas raras, 12 são tidas como frequentes, 19 têm uma ocupação florestal de tipo abundante e 7 destas espécies têm uma presença dominante nos povoamentos em que se inserem. Com esta representatividade e tendo em conta que todas elas estão presentes e protegidas nos 31 sítios classificados e nas 29 zonas de protecção especial, faz algum sentido ambiental, social e económico generalizar a todo o território o modelo de protecção específico dos montados de sobro e azinho a estas variedades? Finalmente, gostaria de lembrar aos Srs. Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes» que, tanto nos mecanismos do Fundo Florestal Permanente como no Plano de Desenvolvimento Rural, subprograma 2, se encontram os instrumentos financeiros dirigidos à protecção e à expansão dos povoamentos florestais de algumas das espécies autóctones referidas no vosso projecto de lei, sobretudo as de longo ciclo de produção. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei — não temos dúvidas — é técnica e politicamente inconsistente, ambientalmente fundamentalista e impraticável. É apenas e só para o Partido Ecologista «Os Verdes» fazer mais um dos «números» políticos a que já nos habituou.
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Sr. Presidente e Srs. Deputados, a encerrar o debate, quero dizer que Os Verdes registam as críticas que foram feitas ao seu projecto de lei. Aliás, de alguma forma, já as esperávamos, tanto que dissemos na intervenção inicial que entendíamos importante o contributo de todos para, em sede de especialidade, se encontrar um diploma que respondesse às necessidades não só das nossas florestas como também dos produtores florestais do nosso país. Contudo, há um conjunto de ressalvas que Os Verdes têm de fazer. Nós não confundimos protecção da natureza feita dentro das áreas protegidas, quer nacionais, quer da Rede Natura 2000, com a aposta em espécies autóctones na nossa floresta nacional, incluindo a nossa floresta produtiva, que deve ser produtiva do ponto de vista multifuncional. Portanto, pretender que há uma sobreposição de diplomas, designadamente os diplomas da Rede Natura 2000, que consagram a ZPE e as ZEC, que, aliás, só protegem 12 das nossas espécies autóctones e que só as protegem se e quando se encontrarem dentro da área protegida da Rede Natura 2000… Mas não é disso que estamos a falar, mas sim da floresta produtiva, que tem de ser resistente aos incêndios e que tem de produzir riqueza aos diferentes níveis, que não apenas do ponto de vista lenhoso, para os nossos produtores florestais e para os nossos agricultores, para evitar o despovoamento do nosso mundo rural. Foi também referido que apresentamos muitas espécies. Em sede de especialidade também isso se podia corrigir, mas se consideram que as 43 espécies que Os Verdes adiantam são muitas, que se dirá das 53 espécies que o Governo prevê como espécies autóctones no Plano de Desenvolvimento Rural? Os senhores não leram o Plano de Desenvolvimento Rural! O Governo fala em 53 espécies! Os Verdes só propõem 43 espécies, mas também podemos trabalhar no sentido de podermos reduzir esse número! O que o PS está a propor é que não se discuta nada, que se continue na mesma, sem atender a que seria fundamental reconhecer às nossas espécies autóctones (que não apenas o sobreiro, a azinheira e o azevinho espontâneo, e até o olival do ponto de vista produtivo) como, por exemplo, ao castanheiro, ao teixo e às espécies ripícolas, um estatuto autónomo como espécie, como património nacional que merecem esse respeito, essa consagração e medidas específicas que as protejam. De resto, as medidas que existem na Estratégia Nacional para as Florestas, tal como no Fundo de Fomento Florestal, não são específicas para estas espécies, pelo que seria fundamental consagrar isso, o que só se conseguirá através de um diploma legislativo. Vamos esperar que este seja apenas o primeiro 24 DE MARÇO DE 2007 21 passo para uma futura legislação, seja pela mão de Os Verdes, seja pela mão do Governo. Não temos qualquer problema em relação a isso, aliás teríamos até muito gosto que o Governo apresentasse outras propostas,… Vou terminar, Sr. Presidente. Como estava a dizer, teríamos até muito gosto em que o Governo apresentasse outras propostas, que, aliás, sabemos que tem na gaveta há alguns anos mas que não saem cá para fora. E, neste âmbito muito concreto, o direito penal e o direito processual penal concedem mais garantias do que a Lei Tutelar Educativa. A alteração agora proposta vai no sentido de proporcionar ao menor garantias iguais no que diz respeito ao princípio do direito penal do facto, para que não exista o risco de ser considerado responsável por factos que não praticou. Esse risco existe ao permitir-se que, durante a apreciação do cometimento ou não dos factos ilícitos, se introduzam elementos alheios ao mesmo. Podem criar-se suspeições que, inclusive, podem levar a colocar em causa a presunção da inocência. Pretende-se, sim, salvaguardar a imparcialidade do julgador. Não se pretende eliminar da Lei Tutelar Educativa a ponderação dos elementos pessoais do agente. Tais circunstâncias são essenciais para a determinação, por exemplo, dos tipos de medidas a aplicar. Porém, esta apreciação deve ser feita, tal como no direito penal, num segundo momento, após a verificação da responsabilidade do menor. Se se compreende que o relatório social e «(…) factos relativos à personalidade e ao carácter do menor, bem como às suas condições pessoais e à sua conduta anterior e posterior, é permitido (…) para a avaliação da necessidade de medida tutelar e determinação de medida a aplicar (…)», como refere o n.º 2 do artigo 66.º, estando esta disposição legal em perfeita sintonia com o objectivo da lei — educar os menores para o direito —, já não se compreende que o mesmo se aplique para a «prova do facto», pois, neste caso, ficam os menores mais desprotegidos em relação a direitos garantidos constitucionalmente. Foi, pois, com o objectivo de que esta lei — cuja aplicação tem merecido, e bem, a atenção desta Assembleia —, seja mais perfeita que o Bloco de Esquerda apresentou este projecto de lei. 22 I SÉRIE — NÚMERO 64 O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A floresta espontânea e as espécies da flora autóctone nacional constituem, de facto, uma grande mais valia patrimonial e ambiental, cujos ecossistemas é imprescindível preservar, no respeito por uma evolução natural, onde o processo biológico e a condição edafoclimática se conjugaram de forma superior. Foi a partir da publicação do Decreto-lei n.º 49/2005, de 24 de Fevereiro, criaram-se 31 sítios ou zonas especiais de conservação e 29 zonas de protecção especial, protegendo todas as espécies da flora indígena ou autóctone, que, no seu conjunto, totalizam 82 variedades, e proibindo «a colheita, o corte, o desenraizamento ou a destruição das plantas ou partes de plantas, no seu meio natural e dentro da sua área de distribuição natural.». Entendeu o Partido Ecologista «Os Verdes» propor um projecto de lei com o intuito de estabelecer medidas de protecção aos carvalhos e outras espécies autóctones da flora portuguesa. O carvalhal, que representa 4% da nossa floresta, tem uma elevada importância ecológica pela diversidade de vegetação e fauna silvestre que alberga, pela optimização da produtividade dos povoamentos e, consequentemente, pelo sequestro de carbono. Se neste campo convergimos com a preocupação do Partido Ecologista «Os Verdes», não podemos deixar, no entanto, de realçar a importância da protecção a outra folhosa de referência, o castanheiro. Mas, contrariamente àquilo que por vezes é divulgado e apesar de os soutos e os carvalhais não ocuparem mais de 5% do coberto vegetal português, não estamos em presença de espécies em risco ou em marcada redução. Sejamos rigorosos: hoje, carvalhos e castanheiros ocupam 175 000 h na floresta portuguesa, abaixo do máximo que ocuparam, em 1928, que era 193 000 h, mas bem acima da área ocupada na segunda metade do século XX, e na segunda metade do século XIX, onde a expressão era bem mais reduzida. Estamos, portanto, em presença de espécies que, pelo seu valor ambiental, social e económico, importa proteger e expandir mas cujo ecossistema e modelo de sustentabilidade são muito diferentes dos montados de sobro e azinho, merecendo, por isso, uma abordagem legislativa completamente distinta. Mas o entendimento do Partido Ecologista «Os Verdes» não é esse. O Partido Ecologista «Os Verdes» preferiu fazer um decalque do Decreto-lei n.º 169/2001, que protege os montados de sobro e azinho, um ecossistema único, extremamente sensível e frágil, sustentável apenas numa lógica multifuncional, a única capaz de manter a ocupação humana daqueles territórios. Andou mal o Partido Ecologista «Os Verdes» nesta iniciativa legislativa, e pior andou ao incluir no seu projecto de lei um conjunto tão vasto de espécies arbóreas e arbustivas da flora autóctone 24 DE MARÇO DE 2007 17 nacional, com características ecológicas tão díspares, onde se inserem espécies cuja utilização produtiva é condição segura de protecção, como o pinheiro manso e variados arbustos bem presentes em áreas protegidas, como a camarinha, a sabina das praias, o zimbro, o loureiro ou o lódão, para citar os mais conhecidos. Não temos dúvidas que as 43 variedades inseridas no projecto de lei são para preservar e consolidar, mas importa saber do que estamos a falar, Srs. Deputados. Consultando a classificação publicada pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais, relativa às espécies autóctones, constata-se que, das 43 variedades incluídas no projecto de lei em apreço, 3 são consideradas raras, 12 são tidas como frequentes, 19 têm uma ocupação florestal de tipo abundante e 7 destas espécies têm uma presença dominante nos povoamentos em que se inserem. Com esta representatividade e tendo em conta que todas elas estão presentes e protegidas nos 31 sítios classificados e nas 29 zonas de protecção especial, faz algum sentido ambiental, social e económico generalizar a todo o território o modelo de protecção específico dos montados de sobro e azinho a estas variedades? Finalmente, gostaria de lembrar aos Srs. Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes» que, tanto nos mecanismos do Fundo Florestal Permanente como no Plano de Desenvolvimento Rural, subprograma 2, se encontram os instrumentos financeiros dirigidos à protecção e à expansão dos povoamentos florestais de algumas das espécies autóctones referidas no vosso projecto de lei, sobretudo as de longo ciclo de produção. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei — não temos dúvidas — é técnica e politicamente inconsistente, ambientalmente fundamentalista e impraticável. É apenas e só para o Partido Ecologista «Os Verdes» fazer mais um dos «números» políticos a que já nos habituou.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de saudar a iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes» de trazer à discussão a questão dos carvalhos — dos quercus — e de outras espécies arbustivas e da sua protecção. Porém, no nosso entendimento, Os Verdes trazem uma questão que é importante mas pegam nela de forma errada. Os Verdes, a propósito de medidas de protecção ao carvalho e a outras espécies, vêm aqui apresentar um excesso de protecção, que, seguramente, iria ter um efeito exactamente contrário àquele que, efectivamente, pretendiam proteger. Eu diria, em linguagem popular, que Os Verdes pretendem «deitar fora o bebé com a água do banho». Esta não é, efectivamente, a melhor forma de proteger a floresta. O sector florestal está hoje sujeito ao acompanhamento de vários diplomas legais, como VV. Ex.as sabem, desde a Estratégia Nacional para as Florestas, os planos regionais de ordenamento florestal, ao Plano Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios. Os próprios produtores florestais têm de elaborar os seus planos de gestão florestal. E, em termos ambientais, existe a Rede Natura 2000, um parque nacional, vários parques naturais, sítios e paisagens protegidas. O ordenamento do território está hoje muito regulamentado no que diz respeito à preservação de espécies, não só autóctones como de outras. Com este diploma, Os Verdes trazem aqui, relativamente a uma série de espécies arbustivas, uma espécie de regulamentação e de preservação em excesso, deixando de fora praticamente só o pinheiro bravo e o eucalipto, o que, em nosso entender, não pode ser uma boa prática. O CDS não acolhe este projecto de lei por questões que têm a ver com a sobreposição em acções conflituantes de um conjunto elevado de instrumentos legais que já existem. Há aqui muita conflitualidade em termos da legislação existente com esta que é proposta. Esta protecção generalizada de espécies florestais arbustivas vai ter um efeito oposto ao da protecção, levando, seguramente, muitas vezes, ao abandono da própria floresta e do mundo rural, ao condicionar de forma excessiva a gestão de um conjunto alargado de espécies, gerando inevitavelmente conflitos, o que constitui mais um motivo para o abandono da actividade florestal e, consequentemente, para o agravamento do processo de desertificação do meio rural, porque, face a exigências legais tão severas, condiciona, de forma desproporcionada, as opções económicas dos produtores florestais. Nesta medida, não podemos, efectivamente, acolher este projecto de lei, infelizmente para nós, porque gostaríamos de ver este diploma discutido com outra abrangência e não como uma espécie de limitação quase total da exploração e da actividade florestal.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O diploma do Partido Ecologista «Os Verdes» que hoje debatemos tem indubitavelmente algumas boas intenções, mas é imperfeito e está mal construído sob vários pontos de vista: jurídico, técnico e socioeconómico. Na óptica jurídica, deve ser referido que se trata de um diploma que vem sobrepor-se a diversos instrumentos legais em vigor, relativos especificamente à conservação dos valores naturais. Sobrepõe-se ao Plano Sectorial da Rede Natura 2000, que estabelece as medidas de gestão mais adequadas para os diferentes habitats localizados nos sítios da Rede Natura. As espécies isoladas ou de formação constantes do projecto de lei fazem parte integrante dos sítios da Rede Natura, pelo que medidas adicionais de protecção, a justificarem-se, estão plasmadas no plano que mencionei. Nas demais áreas classificadas aplica-se o mesmo princípio: a carecerem de medidas específicas de protecção, estas encontram-se nos respectivos planos de ordenamento. A negação dos princípios e trabalhos que estiveram na base da definição da Rede Natura 2000 é a negação da competência do ICN e do fundamento e aplicação da própria Directiva Habitats. No caso de as referidas espécies se encontrarem fora de áreas classificadas, quer os planos de ordenamento florestal, quer medidas específicas, nomeadamente a protecção das galerias ripícolas, a protecção do sobreiro, da azinheira, do azevinho, etc., já prevêem a sua protecção. Por outro lado, o diploma propõe a consignação de uma verba no Fundo Florestal Permanente para vários programas, dos quais chamo a atenção para dois: o «programa de reflorestação e manutenção de espécies autóctones, destinado a apoiar o fomento e a protecção dos povoamentos florestais de espécies protegidas da flora autóctone portuguesa, bem como a reflorestação de novas áreas, incluindo áreas ardidas, afectadas por doença, desérticas ou em processo de desertificação ou de erosão» e o «programa de subsidiação à plantação de espécies protegidas, a fim de incentivar o seu fomento por parte dos produtores florestais». Contudo, deve ser referido que este projecto de lei colide com o Programa de Desenvolvimento Rural, pois, se a mesma fosse aprovada, assistiríamos à existência de duas medidas para a mesma acção no mesmo território, situação que, a verificar-se, irá contra um dos princípios basilares da atribuição de fundos comunitários. A sobreposição de legislação poderá aumentar a miríade de diplomas que actualmente impendem sobre a floresta e espaços naturais, que têm tido como resultado repetidas interpretações jurídicas, por vezes dúbias e frequentemente contraditórias. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mas as nossas divergências prendem-se também com razões técnicas, que seguidamente explanarei. A responsabilidade de conservar e melhorar o nosso património de diversidade biológica deve ser um acto de lucidez, assumindo-se que alguns elementos daquela são mais importantes do que outros e que é irrealista pensar-se que todos os elementos de uma biota podem ser reabilitados e preservados. As espécies a que o projecto de lei se refere, em qualquer das situações referidas no seu artigo 3.°, com interesse para a conservação por representarem ou integrarem sistemas naturais de valor ambiental relevante, foram identificadas no âmbito da transposição da Directiva Habitats, que já referi, tendo servido de base, entre outras, à delimitação dos sítios da Rede Natura 2000. Os exemplares isolados que apresentam características individuais únicas ou raras encontram-se na lista de Árvores Monumentais que a Direcção-Geral dos Recursos Florestais mantém, sendo objecto de despacho do Director-Geral, publicado em Diário da República. A sua inclusão na lista é feita quer por identificação dos próprios serviços florestais, quer a pedido de particular ou de qualquer outra entidade, ou seja, já são objecto de medidas especiais de protecção. Na perspectiva da exploração sustentável dos recursos naturais florestais agrícolas, deverão ser os planos de gestão florestal a determinar as medidas de gestão sobre as espécies abrangidas pelo projecto de lei. Estes planos de gestão são obrigatoriamente aprovados pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais, pelo que não se justifica, nem abona para o bom funcionamento da Administração Pública e sua relação com os cidadãos, multiplicar a emissão de pareceres sobre o mesmo processo. Obviamente, subentende-se que estes planos promovem a aplicação dos critérios e indicadores do processo Pan-Europeu, assegurando a gestão florestal sustentável, no respeito pela manutenção e melhoria da diversidade biológica, em harmonia com a sua viabilidade económica. Acrescem também as nossas divergências socioeconómicas. Na verdade, a obrigatoriedade de reconhecimento de interesse relevante para a economia local nunca irá abranger os pequenos agricultores, que, no seu conjunto, são muitas vezes a própria economia local, porquanto se trata de agricultores em nome individual e/ou de empresas familiares. Os critérios propostos para reconhecimento do interesse relevante para a economia local dificilmente poderão ser alcançados pelos agricultores, em particular aqueles que se referem ao número de novos postos de trabalho criados e à obrigatoriedade de parecer pelo Conselho Consultivo Florestal. Compreendemos o projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes». Tenta, mas sem o conseguir, preencher a incapacidade e a irresponsabilidade do Governo, em especial do Ministro da Agricultura. Prova disto é o PDR que o Governo recentemente apresentou a Bruxelas mas que escondeu do Parlamento. Srs. Deputados do Partido Socialista, esse ruído só pode ser de confirmação do facto de o Sr. Ministro ter escondido o PDR do Parlamento! Um documento com uma profunda falta de visão estratégica, pois assume um papel minimalista da nossa floresta, não apoiando a floresta de protecção que representa uma relevante parte do nosso espaço florestal e desprezando também a multifuncionalidade da floresta. Termino, Sr. Presidente, referindo que a maior conclusão — e nisto Os Verdes têm o seu mérito — que podemos retirar deste debate é a manifesta falta de preparação do Governo para os desafios da floresta portuguesa. Aqui aplica-se bem o provérbio popular: «queres conhecer o vilão, mete-lhe a vara na mão». E o vilão, que não está presente neste debate, é conhecido de todos e não precisa de apresentações. … um estatuto autónomo como espécie, como património nacional que merecem esse respeito, essa consagração e medidas específicas que as protejam. De resto, as medidas que existem na Estratégia Nacional para as Florestas, tal como no Fundo de Fomento Florestal, não são específicas para estas espécies, pelo que seria fundamental consagrar isso, o que só se conseguirá através de um diploma legislativo. Vamos esperar que este seja apenas o primeiro 24 DE MARÇO DE 2007 21 passo para uma futura legislação, seja pela mão de Os Verdes, seja pela mão do Governo. Não temos qualquer problema em relação a isso, aliás teríamos até muito gosto que o Governo apresentasse outras propostas,…
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na última reunião da Comissão Permanente, nesta Assembleia, anunciei que o Partido Social-Democrata não iria continuar a esperar por mais uma falácia deste Governo. Falácia, pura falácia! Os anteriores Governos do Partido Social-Democrata (e do CDS) prepararam e iniciaram aquilo que seria uma verdadeira reforma do sistema prisional português, começando a dar consumação prática e efectiva a um relevante e competente estudo encomendado para o efeito. Aliás, nessa altura, o governo social-democrata era criticado pelo Partido Socialista com fundamento já em alguma demora no início dessa reforma. Tive oportunidade de recordar uma reunião da 1.ª Comissão (em Outubro de 2004, Sr. Presidente!...), onde o, então, Deputado Jorge Lacão dizia: «O Governo anunciou que a lei-quadro da reforma do sistema prisional português foi apresentada e aprovada, mas não falou dos timings concretos quanto às várias fases da reforma. Será possível…» — dizia Lacão — «… especificar algo sobre esta reforma, uma vez que já perdemos tantos meses desde a data em que o Prof. Freitas do Amaral apresentou o relatório no Ministério da Justiça. É uma questão da maior importância…» — rematava o Deputado. Quando este Governo tomou posse, logo no primeiro debate mensal nesta Câmara, justamente sobre justiça — vejam bem! —, coincidência das coincidências, em 29 de Abril de 2005, ficámos expectantes. E ficámos expectantes porque — não posso deixar de o repetir, Sr. Presidente — a dada altura do debate, do alto da tribuna (e também do alto das falácias), o Primeiro-Ministro, depois de se comprometer com 1001 coisas, terminou a sua prédica triunfal, dizendo: «Queria ainda assinalar um outro ponto desse calendário: na próxima sessão legislativa…» — é importante não esquecer que os socialistas pensavam que a sessão legislativa começava no dia 15 de Setembro de 2005! — «… será retomada a proposta de criação de uma lei-quadro do sistema prisional,…» — aqui parou para aplausos do PS — «… para que,…» — continuou o orador — «… finalmente, se comece a dar seguimento às recomendações da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional». Terminou, dizendo: «Já não era sem tempo». Voltou, de novo, a parar para aplausos do PS. Mas reli o debate e, a instâncias do Sr. Deputado Francisco Louçã, o Sr. Primeiro-Ministro dizia, mais adiante: «Tenho também de referir a sua bondade em invocar a Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, a ‘comissão Freitas do Amaral’. Só posso entender isso como um elogio ao Governo, já que o autor das propostas dessa comissão dele faz parte. Não posso entender isso de outra forma.». Terminava o Sr. Primeiro-Ministro: «Que melhor garantia posso dar-lhe de que essa será a nossa orientação?» — só que não foi! — «Estando o seu autor no Governo, essas propostas serão levadas à prática» — só que não foram! Está tudo aqui, neste pequeno papel e também no Diário da Assembleia da República. O problema, Srs. Deputados, é que passou 2005, passou 2006, passou 2007 e já estamos quase a acabar o ano de 2008 e nada, absolutamente nada! Aliás, é importantíssimo recordar que, no último debate quinzenal, o Presidente do Grupo Parlamentar do PSD confrontou o Primeiro-Ministro exactamente com essa matéria e ele — certamente por «dificuldades auditivas»… — não ouviu essa confrontação, pelo que «aos costumes disse nada», como é hábito. Mas as mentiras não se ficaram por aqui. Num papelete que o Ministério da Justiça distribui, aliás, com uma douta epígrafe, qual seja Justiça de A a Z — Um Ano de Governo, escrevia-se: «A revisão do mapa penitenciário existente, (…) numa óptica de optimização dos meios existentes, modernização de instalações e melhoramento das condições de segurança (…) consta de um plano de acção…» — vejam bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados — «… que ficará concluído em 2006»…! Ficaram-se pela ideia do plano, porque, quanto ao plano propriamente dito e quanto à acção, temos dito! Passou o ano de 2006 e nada! Por isso, para esconder duas mentiras, nada melhor do que uma terceira. Como o ano de 2006 terminava e nada, nem lei-quadro, nem plano, nem código de execução de penas, nem nada, o então Secretário de Estado Conde Rodrigues, em vésperas de Natal, dizia à comunicação social: «O Ministério da Justiça está a preparar o anúncio, no início do ano, do plano nacional de modernização do sistema prisional». Bem! Ele, de facto, disse que seria no início do ano, só não disse de que ano e, portanto, pode não ter dito uma mentira, já que podia estar a referir-se a um ano qualquer, quiçá um ano desta década ou do primeiro quartel do século. E, por isso, lá se passou 2007 e nada! Finalmente, e já não sei quantos verdadeiros embustes políticos contei, na discussão do Orçamento do Estado para 2008, o Ministro da Justiça anunciou, mais uma vez, que, no início do próximo ano — agora, sim, tinha de ser no início de 2008 —, seria apresentado um plano (já não sei quantos planos ou, melhor dizendo, anúncios de apresentação de planos) de intervenção no sistema prisional. É caso para dizer, com toda a seriedade: deixem lá, de uma vez por todas, de anunciar planos e mais planos que, depois, não existem e é justamente a sua falta que dificulta a gestão integrada, articulada e eficiente dos recursos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como tive oportunidade de dizer, em termos de segurança dos cidadãos — e é também disto que estamos a falar —, Portugal está doente, Portugal está verdadeiramente doente!! Vivemos um momento em que é absolutamente imperioso debaterem-se os temas que propomos: os serviços e as infra-estruturas prisionais; a execução das penas e das medidas privativas da liberdade; as competências dos tribunais de execução de penas; as competências do Ministério Público nestas áreas; o financiamento do sistema prisional; o parque penitenciário; enfim, uma verdadeira reforma do sistema prisional, indispensável num Estado de direito democrático, livre, justo e, sobretudo, seguro, como há muito os portugueses querem e há muito este Governo não concede. Srs. Deputados do Partido Socialista: Onde está o anteprojecto do código de execução de penas, que o Governo enviou só a alguns?! Onde está? Tenham a coragem de pedir ao Governo esse anteprojecto, se é que o querem ler!… Admito que não sejam agradáveis as palavras, mas tenham a coragem de trazer a este Parlamento, para nós podermos ler, estudar e debater esse anteprojecto de código de execução de penas. A título de exemplo, as medidas que lá se propõem são restritivas ou permissivas da concessão de liberdade condicional? A título de exemplo, só esta pergunta! Nós queremos lê-lo, nós queremos estudá-lo! Onde é que ele está, afinal? A insegurança dos portugueses, com violência, violência e mais violência diária, não aflige, afinal, os Srs. Deputados do Partido Socialista?! Sr. Presidente, não quero terminar sem dizer o seguinte: o nosso projecto é um ponto de partida, porventura, à espera do contributo de todos os outros grupos parlamentares. É uma alavanca que se relaciona com esse importante tema da segurança. Se o Governo e o Partido Socialista se alhearem do tema, poderemos concluir, tal como já disse, que o Partido Socialista tem feito do melhor que sabe para prejudicar a segurança de Portugal e dos portugueses. Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Sanfona, muito obrigado pelo seu pedido de esclarecimento. A Sr.ª Deputada entrou numa incoerência total porque disse que não conhece, que não apresentei, o nosso projecto de lei. Mas ele é de 2006, convém não esquecer! Sei que V. Ex.ª lê com muita fluência, e bem, e até lê bem questões jurídicas… Mas dois anos é tempo demais para ler!... V. Ex.ª pega Diário da Assembleia da República e lê o projecto de lei do PSD sobre a lei-quadro da reforma do sistema prisional. Faça favor de ler e de estudar. Agora, não quer que eu leia! Sr. Presidente, peço desculpa, gosto imenso que este tom feminino socialista ao meu lado direito me interrompa, porque é sinal de que me ouvem, mas ou falam elas todas juntas ou falo eu! Não consigo! Não oiço uma única voz tranquila ao meu lado direito, só oiço vozes femininas. Não desgosto, sinceramente, mas não consigo falar. Só se for mesmo esse o caso, Sr. Presidente… Muito obrigado. Então, passo a terminar. Trata-se mesmo de uma lei-quadro. V. Ex.ª sabe, tão bem quanto eu, que uma lei-quadro é uma «lei de fôlego», é uma lei para uma década ou mais. É! Se V. Ex.ª não sabe o que é uma lei-quadro tem de estudar. Claro, tem de estudar! Uma lei desta envergadura é justamente uma lei que contempla e complementa as medidas imediatas e a curto prazo que se vão tomando. Agora, o que quero saber, e perguntei da Tribuna, é se o PS e o Governo fazem tudo o que disseram que iam fazer ou se fazem exactamente o contrário do que disseram que iam fazer! Porque citei uma, duas, três, quatro ou cinco vezes declarações do Secretário de Estado, do Primeiro-Ministro e do Ministro em que diziam que iam aderir a isto e agora dizem que não! Portanto, das duas uma: ou aderem a isto ou votam contra! Se votarem contra, vão ter de explicar aos portugueses por que é que não querem que se debatam nesta Câmara temas com os que enunciei na Tribuna.
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Sr. Presidente, Sr. Deputado António Montalvão Machado, começo por citálo. V. Ex.ª disse na Tribuna que estava o PSD expectante relativamente às acções do Governo. Também sabemos que está expectante relativamente à evolução da criminalidade; que está expectante relativamente à situação internacional financeira e da crise dos combustíveis; que está expectante relativamente a uma série de matérias. Quero dizer a V. Ex.ª que expectantes ficámos nós de que V. Ex.ª apresentasse na Tribuna a proposta que veio defender, supostamente. Parece-me, salvo melhor opinião, que não o fez. É lamentável. Ficámos sem saber, afinal, qual é a proposta de lei-quadro, qual é o projecto de lei-quadro subscrito pelo PSD nesta discussão. Mas sabemos, contudo, porque entretanto o diploma passou pela Comissão, que não é mais do que um repositório das conclusões que a comissão presidida pelo Prof. Freitas do Amaral elaborou no ano de 2004. V. Ex.ª, do alto da Tribuna, também disse que desde 2004 até agora passaram quatro anos e que, portanto, as coisas evoluíram, mas que nada foi feito. Ó Sr. Deputado, devo dizer-lhe que ficámos mais uma vez expectantes de que o PSD abandonasse de uma vez por todas esta «política de terra queimada» de dizer sistematicamente que nada se faz e, quanto ao que se faz, que tudo está mal! Chega! Se V. Ex.ª atentar na realidade, que é uma verdade insofismável, para além de toda a falácia que V. Ex.ª apresentou, saberia, como sabe o povo português, que o Governo desde que tomou posse não proclamou princípios, não fez uma nova lei-quadro, mas actuou! Executou medidas e deu cumprimento àquelas que eram as preocupações que estavam vertidas no documento onde V. Ex.ª foi «beber» a sua inspiração para este projecto de lei! Portanto, Sr. Deputado, atenta esta realidade insofismável dos concursos abertos para a construção de novos estabelecimentos prisionais, da reforma do parque prisional que está em curso, de todas as medidas que foram tomadas entretanto relativamente a esta matéria, quero saber do PSD, pela voz de V. Ex.ª, se afinal foram ou não boas as medidas e se está ou não feita uma boa parte das reformas que entretanto foram propostas no documento originário, que é o da comissão então presidida pelo Prof. Freitas do Amaral.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal tem vindo a registar sustentadamente, nos últimos anos, um aumento dos índices de criminalidade e, dentro da criminalidade, da particularmente mais violenta. Não há dia que passe que não se conheça mais uma luta de gangs; mais um assalto a bancos, a postos de abastecimento de combustíveis, a veículos de transporte de valores, a ourivesarias; mais um roubo de automóveis com recurso ao carjacking; mais agressões a agentes das forças de segurança… Em poucas semanas, soubemos até de notícias de criminalidade praticada contra o património de dois ilustres Deputados desta Casa. O Gabinete Coordenador de Segurança deu, de resto, a conhecer um crescimento da criminalidade na ordem dos 15 %, no primeiro semestre de 2008. Pois bem, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deste ponto de vista, em relação à expectativa do País, às iniciativas que de nós espera para alterar este infeliz quadro, julgamos que a iniciativa do PSD revela uma inversão de valores e que, sinceramente, Sr. Deputado António Montalvão Machado, em relação à onda de insegurança que o País vive, resolve coisa nenhuma e mais ainda, diga-se, quando sentimos a onda de choque das reformas penal e processual penal, saídas precisamente do pacto para a justiça celebrado com o Partido Socialista. Recorde-se, a par de tantos outros exemplos que poderiam ser dados, o exemplo de um estudo recente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) que estabelece uma ligação de causa/efeito entre estas reformas de 2007, a redução do número de presos e o aumento da criminalidade violenta em Portugal, por «transmitirem à sociedade em geral e ao mundo criminoso em particular inequívoco sinal de brandura do sistema penal». Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste quadro (quadro de insegurança e aumento de criminalidade, registe-se), a prioridade do PSD foi toda para a aprovação de uma lei-quadro centrada na necessidade de melhorar as condições de reclusão e ressocialização dos criminosos. E até concedemos nas intenções meritórias, só que o CDS pensa em muito mais e seguramente com prioridade, neste momento, para a protecção das vítimas, o reforço dos seus direitos e a segurança e a liberdade das pessoas contra a criminalidade. Até porque, convenhamos, cada recluso só o é porque conduziu a sua vida de forma a justificar a privação da liberdade. Cometeu crimes, fez vítimas, causou sofrimento, foi responsável por danos e em alguns casos destruiu vidas. E a prisão é suposto ser, antes de mais, punição retributiva do Estado contra o mal que foi causado, complementarmente, como é evidente, com a obrigação de nesse tempo esse Estado criar as condições desejáveis para a ressocialização do criminoso. Pelo que, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, apesar do mérito da iniciativa, parece-nos que nesta diferente definição das prioridades percebe-se (e não vem daí mal ao mundo) como PSD e CDS são partidos diferentes. Não obstante a simpatia que alguns ilustres Deputados do PSD tiveram, e têm, pelo CDS – também daí não vem mal ao mundo. Exactamente por isso é que se a primeira iniciativa do PSD, nesta sessão legislativa, foi direccionada para a melhoria das condições dos delinquentes, já o CDS, na próxima semana, promoverá o debate e apresentará propostas na perspectiva da defesa dos direitos das vítimas e da justiça prioritária que o Estado lhes deve garantir. E aí será o momento de perceber o que é que este Parlamento pensa de algumas questões muito concretas. E o PSD? Tenho a certeza de que até pensará bem. Por exemplo, acerca da criação de um verdadeiro estatuto da vítima; acerca da necessidade de maior exigência na concessão da liberdade condicional em relação a tipos específicos de criminalidade particularmente gravosa; acerca da definição de novas regras que transformem o processo sumário numa forma realmente expedita que, com respeito por todas as garantias, permita uma justiça rápida e actual; acerca da consagração de verdadeiras medidas que acautelem e demovam os fenómenos da reincidência que mostram aumento constante; acerca da possibilidade da manutenção da situação de detido, em flagrante delito e fora dele, que não autorize equívocos, como actualmente o Código de Processo Penal consente, em benefício de quem comete os crimes; acerca da obrigação de o Estado dotar — primordialmente, antes de toda e qualquer outra medida — as forças de segurança das condições que não têm para garantir, todos os dias, a segurança dos cidadãos e do Estado. E acerca de muito mais, Sr.as e Srs. Deputados. Seja como for, esta discussão não tem de se centrar, para já, nas prioridades do CDS. Sobre o que ao PSD pareceu mais relevante, algumas notas devidas, a terminar. Em primeiro lugar, pelas referências que temos por justas, aos XV e XVI Governos Constitucionais, que nem sequer hesito de particularizar nos Ministros Celeste Cardona e José Pedro Aguiar Branco. Depois, pelos pressupostos que, suponho, nenhum democrata rejeita, a propósito de um sistema prisional humano, justo e seguro, que garanta os direitos dos reclusos e crie oportunidades de reinserção. Ainda assim, deixo duas dúvidas ao Partido Social-Democrata. A primeira relacionada com o combate à sobrelotação dos estabelecimentos prisionais, porque este combate permite, antes de mais, uma opção filosófica por um de dois caminhos possíveis (e seria bom perceber qual é o apontado pelo PSD): criar processualmente as formas que diminuam o número de presos e detidos, adequando-os à capacidade física das prisões existentes, ou dotar o País das prisões necessárias à evolução da criminalidade verificada. Não temos dúvidas quanto ao caminho que estaremos dispostos a aprovar. O primeiro é artificial, irresponsável e não protege a sociedade de quem comete crimes;… O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) — … o segundo é realista e uma obrigação do Estado. A segunda dúvida prende-se com as referências à adopção adequada de tratamento e recuperação dos reclusos toxicodependentes como verdadeira prioridade desta reforma — e bem! —, porque esta referência, deverá implicar a garantia antecipada de que o Estado prescinde de conceder aos reclusos quaisquer meios que lhe sirvam de instrumentos para o seu consumo. Um Estado que, sob o argumento do pragmatismo, auxilia quem cumpre penas no consumo das drogas, que em grande parte dos casos foram a causa justificativa da actividade delinquente, é apenas um Estado que capitulou e prescindiu de parte da sua função soberana de fazer cumprir a lei no espaço penitenciário, desde logo, no que ao tráfico de droga respeita. Possa então o PSD esclarecer estas dúvidas que temos por boas, porque desses esclarecimentos dependerá também a posição do CDS.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Costuma dizer-se que a imagem de um país se reflecte nas suas prisões e eu julgo que, neste caso, até poderemos dizer que a imagem da governação do País se reflecte na história desta reforma do sistema prisional. Vale a pena, pois, reflectir sobre a história deste processo. A Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, que elaborou o texto que serve de base a este projecto de lei do PSD, foi nomeada pelo governo do PSD e do CDS — pela ministra Celeste Cardona —, em Abril de 2002. Aliás, o governo tomou posse em Abril de 2002 e esta Comissão foi criada, por portaria, em Fevereiro de 2003, 10 meses depois da tomada de posse do governo. Portanto, o governo esteve 10 meses sem saber o que fazer ao sistema prisional até ter uma ideia: a de nomear uma comissão. Então, depois da apresentação do relatório, logo veriam o que fazer. Esse trabalho desenvolveu-se e o relatório desta Comissão foi entregue em 12 de Fevereiro de 2004, sensivelmente um ano depois de ter sido nomeada, o que estava dentro do que foi estabelecido pelo próprio governo. Portanto, a 12 de Fevereiro de 2004 foi entregue o relatório da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, presidida, como todos sabemos, pelo Prof. Diogo Freitas do Amaral. O relatório foi recebido pelo governo em Fevereiro de 2004, mas passou Fevereiro, passou Março, passou Abril, passou Maio, passou Junho e a ministra Celeste Cardona nada entregou nesta Assembleia. E ficámos a perceber porquê: a intervenção do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo reflecte uma concepção do sistema prisional que é diametralmente oposta ao que consta desta proposta de lei-quadro. Agora, sim, percebemos por que é que o governo não entregou a proposta de lei na altura do XV Governo Constitucional! Porque houve uma ministra do CDS-PP que encomendou o estudo, mas o CDS-PP não estava de acordo com a reforma proposta pelo estudo! E, portanto, a proposta ficou no tinteiro. Foi o governo seguinte, também do PSD e do CDS, mas agora com o Ministro José Pedro Aguiar Branco, que, quatro meses depois de tomar posse (esteve quatro meses a reler a proposta), lá entregou a proposta! O governo tomou posse em 17 de Julho de 2004 e em 19 de Novembro apareceu a proposta de reforma do sistema prisional. Portanto, o ano zero, que era 2004 (a proposta de reforma era calendarizada), aquele ano em que devia ser aprovada a lei-quadro do sistema prisional para dar início às fases seguintes, divididas em três fases de 12 anos, já estava «queimado»! Ou seja, no momento em que a proposta é apresentada pela primeira vez, já o ano zero tinha passado, praticamente. … e houve uma grande expectativa com o governo seguinte, por várias razões justificadas. Desde logo, porque o autor principal do estudo, o Prof. Freitas do Amaral, era membro do Governo, embora de outro ministério. Em todo o caso, havia a expectativa de que o Governo tivesse em consideração o que o Prof. Freitas do Amaral tinha feito na legislatura anterior, aliás, com aplauso geral. Quando o relatório aqui foi apresentado pelo Prof. Freitas do Amaral, houve, da parte de todos os grupos parlamentares, uma anuência, um respeito muito grande pelo trabalho que tinha sido desenvolvido. … nada, de parte nenhuma! Na altura, o Governo não avançou com a proposta de lei, ela não foi retomada; o CDS retirou a fotografia do Largo do Caldas para o Largo do Rato do autor principal do estudo; o PSD ficou na expectativa de que, tendo em conta o que o Primeiro-Ministro tinha anunciado (tal como foi referido, há pouco, pelo Sr. Deputado António Montalvão Machado), que o Governo pudesse avançar com a proposta. Mas, o que é facto é que as medidas anunciadas no plano da reforma prisional têm sido, sobretudo, medidas relacionadas mais com o mercado imobiliário: vende-se esta prisão a quem a quiser comprar para construir noutro lado… É o que este Governo tem anunciado. A conclusão de tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, em Setembro de 2008,… Srs. Deputados, a acústica desta sala não é fácil, por isso se falarmos todos ao mesmo tempo, não nos ouvimos! Estamos em Setembro de 2008 e, nesta altura, devia estar concluída a primeira fase da reforma do sistema prisional. Ou seja, deveria estar, neste momento, aprovada… Devia estar, não é «estará», Sr.ª Deputada! Depois, a Sr.ª Deputada já fala, se se inscrever para o efeito. Como dizia, deveriam estar aprovadas a lei para execução de penas e medidas não privativas da liberdade, a lei dos tribunais de execução das penas, a lei orgânica dos serviços prisionais, a lei orgânica dos serviços de reinserção social, o regulamento geral dos estabelecimentos prisionais, o novo regime jurídico da vigilância electrónica, nomeada a comissão para acompanhamento da execução da reforma, celebrado o acordo de cooperação que regula a relação entre os serviços prisionais e os serviços de reinserção social previsto na presente lei, iniciada a execução do programa de renovação do parque penitenciário e já deviam ter sido apresentados quatro relatórios por parte da comissão para acompanhamento da reforma do sistema prisional. Entretanto, em que pé estamos, Sr. Presidente? Estamos a discutir quando é que se acaba com o balde higiénico! Esta é a realidade. A reforma nada avançou, rigorosamente nada, e ainda hoje, em 2008, estamos a discutir quando é que o Governo toma medidas para erradicar, definitivamente, o balde higiénico do sistema prisional português. Esta é a triste realidade com que estamos confrontados. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sistema prisional é uma peça-chave do nosso edifício jurídico-penal, uma peça que, infelizmente, há muitos anos padece de elevadas deficiências e carências que dificultam o trabalho e aumentam gravemente o risco para os trabalhadores, em especial os guardas prisionais, e que impede o mesmo sistema de cumprir. cabalmente e com eficácia um dos seus principais objectivos — a ressocialização dos reclusos. Este fim primacial das penas deveria ser um dos principais objectivos não apenas do sistema prisional mas também do próprio edifício penal português e, contudo, continua em segunda, terceira ou quarta linha das preocupações do mesmo, porque temos um parque prisional degradado, sobrelotação das prisões, falta de condições de trabalho para os guardas prisionais, ausência de planos individuais de ressocialização, falta de condições higieno-sanitárias, deficiência no acesso a cuidados de saúde — nem o balde higiénico foi ainda totalmente erradicado —, e porque as prisões continuam a ser locais onde, com demasiada facilidade, se contraem doenças graves ou mesmo se morre. Várias vozes, dentro do Partido Ecologista «Os Verdes» e fora dele, como o Sr. Provedor de Justiça, a Amnistia Internacional, o Sindicato dos Guardas Prisionais e várias associações de defesa dos direitos dos reclusos, têm denunciado os muitos problemas que, infelizmente, subsistem. Em Fevereiro de 2003, pela Portaria n.º 183/2003, foi criada a comissão de estudos e debate da reforma do sistema prisional, a qual viria a ser presidida pelo Doutor Diogo Freitas do Amaral, ex-Ministro de Estado deste Governo, que realizou um relatório final muito interessante e completo sobre a realidade prisional nacional, terminando, aliás, com um conjunto de recomendações relativas às penas e sua execução, mas também ao próprio sistema prisional, designadamente em relação à efectiva integração dos serviços de saúde prisionais no SNS, à criação de um programa de combate à toxicodependência e às doenças infecciosas graves e a meios para o implementar ou a medidas de preparação dos reclusos para o ingresso na vida activa, entre outros. Desta comissão saiu também o texto-base desta iniciativa que hoje analisamos — o projecto de lei n.º 238/X (1.ª) — Lei-quadro da reforma do sistema prisional. Os Verdes saúdam a discussão de hoje, porque é inegável que esta reforma do sistema prisional faz falta e se impõe. E, porque se impõe — e já se impunha há vários anos, mesmo muito antes do dito relatório — e deixou de ter qualquer desculpa desde 2004, não podemos deixar de lamentar a inacção e o atraso com que fazemos a discussão de hoje. A reforma apresentada aparece enformada de objectivos e princípios correctos, que acompanhamos, como a construção de um sistema prisional humano, justo e seguro, a garantia dos direitos fundamentais dos reclusos, uma maior dignificação da condição de vida dos reclusos, a criação de oportunidades necessárias para o desenvolvimento do processo individual de reinserção social, o combate à sobrelotação dos estabelecimentos prisionais, a prestação de apoio aos ex-reclusos, etc., etc. Certamente que o diploma apresentado pode ser melhorado em sede de especialidade, onde poderá contar com uma ampla discussão, audição e contributo dos diferentes grupos parlamentares, mas, contudo, já percebemos, pela intervenção da Sr.ª Deputada Sónia Sanfona, qual é o discurso do PS sobre esta matéria neste debate. O PS diz: «Esta reforma já está em curso e, portanto, esta iniciativa não faz qualquer falta». Parece-me que o receio do Partido Socialista é consagrar em diploma legal a obrigatoriedade de conceber uma reforma coerente e integrada, que integre as diferentes vertentes da reforma prisional e que não atenda apenas a medidas e a reformas pontuais, designadamente no âmbito da construção de novas prisões, uma determinada especulação imobiliária e o incorrecto ordenamento do território, que tem vindo a promover, designadamente quando entende que, para implantar prisões no nosso país, é preciso derrubar sobreiros, quando há tanto espaço disponível para instalar prisões e quando há tantas autarquias que, inclusivamente, para a prisão referida, Sr.ª Deputada Sónia Sanfona, andaram a brigar pela sua localização. Aliás, não se percebe como é que o Governo já abriu o processo… Vou concluir, Sr. Presidente. Como eu estava a dizer, não se percebe como é que o Governo já abriu o processo para a implantação do estabelecimento prisional no concelho de Almeirim, quando ainda não deu entrada nos Serviços Florestais o pedido para o abate daqueles sobreiros.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei apresentado pelo PSD, que hoje debatemos, tem por base, como, aliás, já aqui foi muitas vezes referido, o relatório produzido pela Comissão para o Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, presidida pelo Prof. Freitas do Amaral, que é, porventura, um dos documentos mais aprofundados sobre a situação das prisões no nosso país e que gerou um enorme consenso, mas que, infelizmente, passados mais de quatro anos sobre a sua apresentação, não teve as consequências que se impunham, traduzidas em alterações legislativas que proporcionassem não só a alteração das práticas mas também a alteração da concepção sobre a função do sistema prisional. Aqui reside o essencial do que vale a pena discutir, e, nesse aspecto, é muito elucidativa a intervenção do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, em nome da bancada do CDS-PP, ou seja, em nome dos valores mais conservadores da sociedade portuguesa. «Assentou-lhe que nem uma luva», Sr. Deputado! As prisões cerram as portas e o que lá se passa dentro incomoda, por isso o caminho mais fácil é ignorar. Manter um manto de opacidade sobre o que se passa nas prisões não dignifica o Estado de direito nem a democracia. Sr.as e Srs. Deputados: Nos tempos em que a criminalidade anda na boca de toda a gente, incluindo na dos políticos, há que ter a coragem de ir ao fundo do problema e fazer o balanço do desígnio da ressocialização e da integração no sistema prisional, porque, provavelmente, a prisão é a última etapa de um processo, mas é a primeira etapa de uma função de que o Estado não se pode demitir e de que, até hoje, se tem demitido. Mas, Sr.as e Srs. Deputados, se me permitem, gostaria de dar mais uma achega à cronologia que o Sr. Deputado António Filipe aqui fez sobre este processo, que me parece que é bastante elucidativa. Para o efeito, socorro-me de um documento do Governo, que aliás, deve ser conhecido de todos os Srs. Deputados, que é o já mencionado livro Justiça de A a Z, do Ministério da Justiça, do ano de 2006, onde se diz exactamente o seguinte em relação ao sistema prisional: «Na sequência das recomendações da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, encontram-se em fase adiantada de elaboração diversos diplomas legislativos, nomeadamente: Lei-Quadro do Sistema Prisional Português, Lei da Execução das Medidas Penais (…)». Continuamos no livro Justiça de A a Z, agora do ano de 2007, que em relação ao sistema prisional diz o seguinte: «Na sequência das recomendações da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, encontram-se em fase adiantada de elaboração diversos projectos de diplomas legislativos, nomeadamente: Lei da Execução das Medidas Penais (…)». Portanto, passa logo para a Lei de Execução das Medidas Penais. Desapareceu a lei-quadro do sistema prisional português. Para onde é que foi? Saltou a ordem alfabética?! Desapareceu?! O PS desistiu dela?! Assumam, Srs. Deputados! O que é facto é que o Partido Socialista desistiu da reforma do sistema prisional. Desistiu! Assumam-no, Srs. Deputados! Assumam isso! E estamos à espera do livro Justiça de A a Z do ano de 2008 para ver a evolução! Srs. Deputados, o PS até poderia ter desistido da Lei-Quadro da Reforma do Sistema Prisional, o que era errado, erradíssimo, mas podia ter desistido, aliás, contrariamente àquilo que escreve no livro Justiça de A a Z, mas dizer que tem feito tudo, como, aliás, a Sr.ª Deputada Sónia Sanfona disse, quando falou, inclusivamente, das medidas emblemáticas que o relatório recomenda e que o Governo «está a aplicar».… Não temos tempo para mais, por isso vamos apenas falar de duas medidas. Uma já aqui referida pelo Sr. Deputado António Filipe, que eu sublinho, é o humilhante e degradante balde higiénico. Peço desculpa, Srs. Deputados, mas tenho de voltar outra vez ao livro Justiça de A a Z, de Março de 2006, onde se diz concretamente: «No final de 2007, o balde higiénico estará completamente erradicado dos 55 estabelecimentos prisionais (…)». Mas vamos continuar no livro Justiça de A a Z, agora de Março de 2007, que diz que presentemente se encontram já recuperadas 867 celas. É verdade. Sabem quantas faltam, Sr.as Deputadas, dito aqui pelo vosso Governo? Faltam 772 celas! Para um Governo que está a chegar ao fim do seu mandato, convenhamos que não é obra que se mostre…! Mas mais um exemplo, Sr.as Deputadas: e a entrada do Serviço Nacional de Saúde nas prisões? E o grande desígnio escrito nesta reforma e reafirmado pelo Sr. Ministro da Justiça, que, questionado por mim já duas vezes, dá o dito pelo não dito? Respondam, se forem capazes, pelo vosso Governo, que não está aqui presente, quando é que o Serviço Nacional de Saúde entra nas prisões. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, só podemos tirar uma conclusão, três anos e meio depois de este Governo iniciar funções, e que se ficou pelo balanço dos dois anos, de A a Z (não fez ainda outro; esperemos por ele): é que, de facto, o PS e o Governo do Partido Socialista desistiram de investir nas prisões; foi, de facto, o parente pobre do Ministério da Justiça. Por isso, votaremos favoravelmente o projecto de lei apresentado pelo PSD, porque tem princípios correctos, porque permite, inclusivamente, desfazer uma discussão existente na sociedade portuguesa sobre a importância de a prisão ser um sistema ressocializador, até nos tempos que correm, como um princípio fundamental e de fundo de combate à criminalidade. Aplausos do BE e do Deputado do PSD António Montalvão Machado.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Numa altura em que, confesso, achávamos que o Grupo Parlamentar do PSD já não mais nos poderia surpreender, eis que somos «brindados» com mais uma surpresa! Pena é que nunca nos consigam surpreender pela positiva. Apesar de tudo, não pode esta bancada deixar de manifestar o seu regozijo pelo facto de o Grupo Parlamentar do PSD ter acordado de uma longa amnésia, em que permaneceu ao longo dos últimos quatro anos e meio, a propósito da reforma do sistema prisional português. Amnésia que, de tão profunda, Srs. Deputados, apenas consegue ser suplantada pelo «ensurdecedor» silêncio da sua actual liderança partidária no que respeita a todas as questões políticas de fundo que interessam ao País e que preocupam os portugueses. O Grupo Parlamentar do PSD vem agora transmitir-nos essa grande e absoluta necessidade de reformar o sistema prisional português. Lamentamos o facto de esta ideia não ser, hoje, nem nova nem boa. É grande e absoluta a necessidade de reformar o sistema prisional português. Isso mesmo reconhecemos nós, um reconhecimento do Governo do PS que, há já muito, começou a executar as medidas concretas que realizam os princípios programáticos que o PSD agora vem propor. E fizemo-lo porque temos sobre a matéria em questão uma visão e uma atitude de Estado. Para nós, socialistas, as mudanças governativas não implicam que se reinvente o Estado. E, portanto, partimos de um longo e aturado trabalho de estudo produzido pela Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, criada, em Fevereiro de 2003, por um governo de maioria PSD/CDS-PP e presidida pelo Prof. Dr. Freitas do Amaral. Estudo este, finalizado já desde Fevereiro de 2004, que, além de identificar os principais problemas do sistema prisional português, aponta um conjunto de princípios programáticos para atenuar e resolver esses mesmos problemas. Em 2005, o actual Governo, quando entrou em funções, optou por não perder mais tempo, uma vez que, no dito estudo, nos parágrafos um e dois da página 5, «definem-se e calendarizam-se os passos concretos a empreender para dar corpo às principais alterações consideradas necessárias». E continua: «É de realçar também que o que aqui se apresenta é um programa a longo prazo (12 anos), a iniciar-se no princípio do ano de 2005 e até final de 2016». Estabelecido que estava por esta Comissão o conteúdo programático das acções a realizar, incluindo a sua calendarização, a responsabilidade do Governo do PS, a quem o povo confiou o governo da Nação, era lançar mãos à obra. E, como é óbvio, assim o fez. Outros, antes de nós, tendo este mesmo estudo que os próprios encomendaram, resolveram alterar-lhe o título e apresentá-lo à Assembleia da República sob a forma de proposta de lei-quadro de reforma do sistema prisional, em Novembro de 2004, permitindo, por essa via, que todos os problemas permanecessem na mesma, enquanto os autores da dita proposta, com isso, afagavam as suas consciências. Mas, nesta como noutras matérias, os socialistas não são de almejos mas, sim, de acções. Por isso, o actual Governo passou, desde logo, à implementação da reforma do parque prisional, que promove a maior reestruturação de sempre das infra-estruturas prisionais, com objectivos muito claros, como o de reforçar a segurança; melhorar as condições de reclusão; e outros tantos, que por manifesta falta de tempo me escuso de enunciar, porque o dever geral de informação que impende sobre todos os Deputados desta Casa impõe a necessidade de ter o conhecimento. Nesta grande reforma já iniciada e levada a cabo pelo actual Governo realça-se a construção de 10 novos estabelecimentos prisionais e a requalificação de três dos já existentes, num investimento total — ouçam, Srs. Deputados! — de cerca de 450 milhões de euros, a concretizar entre 2008 e 2013. À medida que forem entrando em funcionamento os novos ou remodelados estabelecimentos prisionais serão desactivados 28 dos hoje existentes. Concluído este plano, passaremos dos actuais 50 estabelecimentos prisionais para 32, sendo certo que, por esta via, faremos acrescer à capacidade de reclusão, Sr.ª Deputada Helena Pinto, não cerca de 700 lugares mas, sim, mais 1907 lugares, passando dos actuais 12 285 para 14 192. Isto não se traduz apenas num acréscimo numérico mas também numa substancial melhoria da qualidade e das condições gerais de reclusão. Não era mais possível continuar a atirar medidas legislativas — programáticas ou enquadradoras — para cima de problemas tão humilhantes como seja o balde higiénico. Lembro que em todos os estabelecimentos prisionais regionais, hoje, ele já não existe. A Sr.ª Helena Terra (PS): — Existe ainda, lamentavelmente, em dois estabelecimentos prisionais nacionais, sendo certo que hoje, nestes mesmos estabelecimentos prisionais, contrariamente ao que acontecia no tempo do anterior governo, já existe apenas, e só, um recluso por cela. Não está bem ainda existir essa situação, mas erradicaremos o balde higiénico até ao final do ano de 2008. Ou ainda problemas como a manifesta insalubridade e exiguidade das celas prisionais. Era, e é, preciso requalificar efectivamente o nosso parque prisional. E isto já está no terreno, como já está no terreno a construção de raiz de três novos estabelecimentos prisionais, dos 10 que o programa contempla: no Alentejo (Grândola), em Angra do Heroísmo e na área de Lisboa e Vale do Tejo. É evidente que os problemas do nosso sistema prisional, os mais complexos, necessitam de uma política criminal e judicial transversal e integrada. Falo, a título de exemplo, de dois deles: a sobrelotação das cadeias, que remonta ao início do século, e o excesso de preventivos. Pois bem, também aqui foi o actual Governo que lançou mão de actos concretos, como foram o novo Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Organização da Investigação Criminal (LOIC) e a Lei de Segurança Interna. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para concluir, que mais se pode dizer do projecto de lei do PSD ora em apreço? Não é novo, porque faz um copy e paste dos resultados do estudo da Comissão criada para o efeito, cujo trabalho foi concluído em 2004; não é bom, porque continua a tentar mistificar problemas reais e concretos com medidas meramente proclamatórias. Ao invés, o actual Governo começou a atacá-los com a execução das medidas concretas a que já aludi. Mas não parámos por aqui, note-se! No tocante à execução de penas e à organização do tribunal de execução de penas o actual Governo concluiu, em Maio deste ano, o projecto de código de execução de penas e medidas privativas da liberdade, que abrange, como sabem, Srs. Deputados do PSD, a revisão da Lei de Execução de Penas, que remonta a 1979, a lei dos tribunais de execução de penas, que é já de 1976, e de mais legislação avulsa conexa. Este projecto está em fase de consulta, uma coisa que, para nós, é importante, e espera-se que entre na Assembleia da República para processo legislativo até final do corrente ano. Que mais se pode dizer deste projecto de lei — pergunto eu ainda —, senão que é absolutamente extemporâneo, tanto que não serve sequer o eventual intuito do PSD em parecer hoje preocupado com que outros façam aquilo que eles próprios poderiam ter feito e não fizeram? Mas, atenção, Srs. Deputados do PSD — e termino de imediato, Sr. Presidente —: não venham VV. Ex.as, movidos por um qualquer afã demagógico e com o desnorte e a desatenção a que já nos habituaram, tentar, um dia destes, patentear a roda ou, quiçá, reclamar a descoberta da pólvora! Sr. Presidente, concluo de seguida, mas não sem antes alertar a bancada do PSD para o seguinte: os portugueses já perceberam que, enquanto VV. Ex.as proclamam, nós e o Governo do PS fazemos! E é por demais evidente que, até para a proclamação, VV. Ex.as começam a chegar com vários anos de atraso. Em regozijo pelo pessoal apreço pelo Sr. Deputado António Montalvão Machado — que, aliás, já foi referido pelo Sr. Presidente —, num tom simpático, fleumático e até com um sotaque british, ocorre-me dizer: you can fool some people sometime, but you cannot fool all the people all the time.
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Não tem, mas devia ter! Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com o último relatório anual do Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR) sobre a qualidade da água para consumo humano e também de acordo com uma recomendação do IRAR produzida já este ano sobre o mesmo tema, é visível que temos ainda falhas preocupantes no que concerne justamente às análises destas águas. Desde logo, um primeiro problema é o facto de a lei determinar que essas análises devem ser feitas com uma regularidade determinada que não é cumprida, pelo que falham as análises. Por outro lado, muitas vezes essas análises são feitas, mas são escamoteados alguns parâmetros relevantes cuja aferição é obrigatória por lei. Depois, um outro problema resulta do facto de haver determinados parâmetros que apresentam valores de má qualidade, valores de incumprimento, da água servida a cerca de 20% da população. Os valores relativos a parâmetros microbiológicos representam, veja-se, mais de 40% dos incumprimentos registados. Deparamo-nos, pois, com esta realidade, mas nós, Os Verdes, também entendemos que é possível alterála e que alguns passos determinados no sentido de a alterar justamente podem contribuir para a melhoria da realização destas análises da água para consumo humano. Aquilo que Os Verdes hoje propõem à Assembleia da República é um passo simples que consideramos que poderá dar um excelente contributo para a alteração desta realidade em duas vertentes. Vejamos como é que o regime está estabelecido. Fazem-se as análises da água e, depois, elas têm de ser publicitadas. Ora, a lei actual determina que essa publicitação seja feita de forma indirecta, ou seja, por via de edital ou, em alternativa, através da imprensa regional. Suponho que a maior parte dos Srs. Deputados aqui presentes e, seguramente, a maior parte da população portuguesa não consulta com frequência estes parâmetros de avaliação da qualidade da água que consome e que sai das suas torneiras. Mas aquilo que Os Verdes entendem é que essa informação, essa publicitação da análise da água deve ser feita de forma directa. Qual é, então, a forma mais directa de fazer essa publicitação? Justamente através da factura da água que, bimensalmente, as pessoas recebem para pagar e da qual deveria constar essa informação detalhada sobre os parâmetros da qualidade da água. Para além disso, mantemos a ideia de que essa informação deve ser prestada também através do edital e, não em alternativa, mas, sim, cumulativamente, através da Imprensa Nacional ou do Boletim Municipal. Consideramos que os cidadãos sairiam a ganhar nesta matéria porque estariam mais informados sobre o que é o seu direito de consumir água de boa qualidade e de ter acesso à informação relativa à avaliação da qualidade da água. Por outro lado, estas medidas seriam um factor de motivação das entidades gestoras para proceder com rigor às análises que devem ser feitas. É um passo simples que pode ter uma dimensão muito significativa no que diz respeito à análise da água para consumo humano.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ouvimos com atenção as intervenções das diferentes bancadas. De resto, todas reconheceram o mérito dos princípios enunciados e do objectivo traçado neste projecto de lei de Os Verdes. Recolhemos os contributos que, eventualmente, serão dados, ou poderiam ser dados, na especialidade, pelas diferentes bancadas. Consideramos que alguns aqui foram traçados com grande objectividade e mérito também e recolhemos também uma crítica, por parte do Partido Socialista, quanto à questão do cariz técnico da informação a constar da factura, dizendo «É uma informação técnica, as pessoas não iriam perceber»… Então, pergunto: se ela estiver na Internet ou se, porventura, a factura referir apenas, quanto a essa informação, que as pessoas podem encontrá-la no edital ou no jornal local, ela não continua a ser técnica? Evidentemente, há sempre forma de simplificar essa informação e de traduzir, com objectividade e clareza para o cidadão comum, aquilo que, no fundo, tecnicamente se avalia e que deve ser transmitido com clareza ao cidadão, neste caso concreto ao consumidor da água. Registo, por último, que o Partido Socialista disse o que disse relativamente a esta iniciativa, mas avançou já que, no futuro, vai apresentar uma iniciativa legislativa onde procurará que conste da factura da água informação relativamente à sua qualidade, talvez não da forma que apresentamos mas remetendo para onde ela existe. Bom, Sr. Deputado, está visto que o Partido Socialista funciona assim! Aprovam as iniciativas em função dos seus autores: quando vêm dos outros e até têm mérito, não servem, mas depois adoptam-nas para si. Sr. Deputado, consideramos que foi muito pertinente termos trazido esta matéria à Assembleia da República, nem que seja para levar o Partido Socialista a fazer alguma coisa.
5PEV
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Ex.mo Sr. Presidente, Ex.mos Sr.as e Srs. Deputados: «Somos todos consumidores», relembrou John Kennedy a propósito da necessidade de se reforçarem os direitos dos consumidores, caminhada que se iniciou nos Estados Unidos da América e, de imediato, em muitos outros países europeus. Entre outras prerrogativas consagradas nos Estados de direito, os consumidores têm direito a conhecer a qualidade da água que consomem e a ser informados sobre a sua composição. Sem água, a vida neste maravilhoso planeta não seria possível e temos de ter a consciência de que é prioritário a salvaguarda da sua qualidade e do seu bom uso. Saber usar a água sem a desperdiçar é uma prova de sabedoria. Reutilizar águas usadas para os fins adequados significa que pensamos nos cidadãos, naqueles que ainda não nasceram e que têm o mesmo direito a viver no planeta azul. Mas valorizar o ambiente é também promover o emprego e erradicar a pobreza. Recordo, a este propósito, que se celebra hoje o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. O Primeiro-Ministro sueco, Olof Palme, sabia bem do que falava quando afirmou que a prioridade do seu país era erradicar a pobreza. Conseguiu-o mantendo bons indicadores ambientais. É importante, neste momento chamar a atenção para algumas das crises ambientais verificadas em Portugal e provocadas pela má qualidade da água de consumo. Recordo o caso de Évora, com excesso de alumínio na água, de Faro, com água com nitratos, e da Chamusca, com a água contaminada com um princípio activo de um herbicida. O presente projecto de lei, cujo conteúdo, espero, esteja já a ser levado à prática em todas as autarquias onde os proponentes estão em coligação com o Partido Comunista — já que nada impede actualmente que as autarquias, querendo, tenham já as salutares práticas ora preconizadas — aprofunda o relacionamento entre os consumidores e fornecedores. É um projecto que saudamos, mas relativamente ao qual não poderemos deixar de formular algumas sugestões para a discussão na especialidade. Em primeiro lugar, deixo uma referência ao facto de se saber que nem sempre a água distribuída é proveniente da mesma origem, o que significa que cada rede com a mesma origem deve ser publicitada. Uma segunda e última questão que nos parece óbvia é que toda a informação deve estar disponível na Internet, devendo o endereço electrónico da entidade gestora ser publicitado na factura e no respectivo recibo.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar de Os Verdes tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 233/X. De forma resumida, os Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes» pretendem, com este projecto de diploma, que a informação sobre os resultados das análises de aferição de conformidade da água para consumo humano sejam integrados na respectiva factura. Contudo, o que está em causa neste projecto não é o mérito do seu objectivo mas, sim, o facto de não encontrarem a forma e as soluções mais eficazes, com vista ao reforço da informação sobre a qualidade da água distribuída ao público em geral. Senão, vejamos. Relativamente à frequência da divulgação dos dados, importa referir que o Partido Ecologista «Os Verdes» propõe que estes sejam divulgados de 15 em 15 dias, solução impraticável, visto que a facturação é bimestral. Considera, contudo, o PS que se deve manter a periodicidade actual, pois Portugal é dos Estados-membros da União Europeia que mais detalhe e rigor exige nesta matéria. Na verdade, a maioria dos Estados disponibiliza apenas informação para consulta, enquanto a nossa prática corresponde a uma divulgação oficial. No que diz respeito à informação que deve constar da factura, importa referir que em 2006 se verificou que 68 entidades gestoras têm mais de 20 zonas de abastecimento, o que significaria, na prática, o mesmo número de resultados por cada uma dessas entidades. Face a esta realidade, entendemos ser inviável a inclusão na factura de todos os elementos relativos à qualidade da água, pois estes representam um grande volume de informação, além de serem de cariz extremamente técnico. Convém também referir que o Decreto-Lei n.º 306/2007, de 27 de Agosto, legislou no sentido de proporcionar um maior detalhe da informação a disponibilizar aos consumidores. Segundo este Decreto-Lei, passam a constar dos editais trimestrais ou da informação a publicitar na imprensa regional, os seguintes elementos: o número de análises previstas no programa de controlo da qualidade da água para esse trimestre; a percentagem de análises realizadas; os valores paramétricos; a percentagem de análises que cumprem a legislação; e a informação complementar relativa às causas dos incumprimentos e às medidas correctivas implementadas. Sr. Presidente, por considerarmos ser possível contribuir para melhorar a divulgação da informação relativa aos resultados da qualidade da água junto dos consumidores, iremos apresentar brevemente uma iniciativa que atinja alguns objectivos. Relativamente à divulgação da qualidade da água, esta iniciativa levará a que exista uma referência na factura onde constem os resultados, de forma a aferir se estes cumpriram ou não a legislação em vigor. Por outro lado, tornar-se-á obrigatória a indicação na factura das formas de aceder a informação mais detalhada e actualizada relativa à qualidade da água e do serviço prestado. Sr.as e Srs. Deputados: Estamos certos de que as medidas já tomadas pelo Governo e a iniciativa que iremos apresentar em breve são os instrumentos mais eficazes para conferir total transparência à informação divulgada sobre a qualidade da água distribuída em Portugal para consumo humano.
0PS
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o CDS-PP, a questão da qualidade da água é fundamental e é evidente que estamos preocupados com as notícias relativas à sua falta em várias zonas do País. Temos, obviamente, uma enorme curiosidade em saber como é que vai avançando o PEAASAR II (Plano Estratégico de Abastecimento e de Saneamento de Águas Residuais) e, quanto a isso, o PS muito pouco nos tem dito aqui, na Assembleia. Confessamos que não nos sentimos tranquilizados pela promessa do Partido Socialista de apresentar um projecto de lei que permita avaliar a qualidade da água e forneça essa informação aos consumidores. É evidente, para nós, que é fundamental não apenas ter os dados, porque a maior parte dos consumidores não consegue avaliar esses mesmos dados, mas que haja um tratamento dessa informação, que ela seja fornecida aos consumidores já tratada, para que eles possam ter a noção daquilo que é efectivamente a água que estão a beber. Agora, também entendemos que este projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» é pouco ambicioso. E é pouco ambicioso na medida em que, se estamos a procurar evoluir para um modelo de informação ao consumidor mais actual e com maior frequência, aquilo que deveria ter sido o instrumento preferencial era o informático – quer a publicação na Internet quer a evolução para a factura electrónica. Deveria ser esse o meio preferencial para divulgação da informação relativamente à qualidade da água. Manter o sistema do edital na junta de freguesia, em papel (o que, evidentemente, leva a consumo de recursos que deveríamos poupar), e falarmos na factura (mais uma vez, é papel e gasto de tinta), se o Partido Ecologista «Os Verdes» apresentou este projecto de lei, faria todo o sentido avançar efectivamente para meios modernos de divulgação dos resultados relativamente à qualidade da água. Portanto, deveria ter-se ido mais longe neste projecto de lei e procurar-se que a divulgação, do ponto de vista institucional, fosse por via da Internet e não pelo edital da junta de freguesia, que deveria, quanto a mim, passar a ser um elemento de divulgação do passado. Quanto à divulgação através da factura, isso deveria começar por ser feito através da factura electrónica — sabemos que, hoje em dia, isso já é feito nalgumas empresas fornecedoras de água, como é o caso da EPAL, que já tem a factura electrónica — e aí deveria começar-se por fazer essa experiência, evoluindo-se no sentido de que, de forma bimensal, tendo em atenção a frequência das análises, essa informação fosse fornecida por meio electrónico aos consumidores.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero associar-me, em nome do PCP, à justeza deste projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes», com as correcções que, entretanto, foram introduzidas pelo próprio grupo parlamentar, que, aliás, recolheu, até agora, o apoio unânime de toda a Câmara nas suas intenções, embora com opiniões diversas, evidentemente, e até mereceu da parte do Partido Socialista a confirmação da sua aprovação com a ideia de que vão apresentar novas propostas para acrescentar ainda àquilo que consta deste projecto de lei. De resto, algumas das que enunciou são exactamente as que estão no projecto de lei de Os Verdes e, portanto, certamente que essas propostas revestirão a forma de proposta a apresentar na especialidade, ou outra semelhante, para poder permitir que ambas as iniciativas continuem o seu percurso até à aprovação de uma lei da Assembleia da República. É verdade que o princípio que está neste projecto de lei é essencial. Os cidadãos, os utentes deste serviço de distribuição de água pública, essencial para a vida das populações, devem ter o direito, da mais simples forma possível, de aceder aos índices sobre a qualidade da água que consomem. Eles pagam, e não só por pagarem mas porque é um direito próprio de quem consome água, das populações do País, e devem ter acesso a esta informação, que deve ser completa e de fácil acessibilidade. Por outro lado, não há nenhuma razão visível que impeça, de entre a parafernália de informação que já vem nas facturas dos serviços públicos, incluindo nos da água, a inclusão de mais um parâmetro, este essencial e que deve ter o devido destaque, que é o relativo à qualidade da água. Quanto a esta matéria, é evidente que não é esta informação que vai resolver os problemas que ainda temos de qualidade da água. Por si só, não os vai resolver mas vai certamente alertar a população para estar mais atenta a esses indícios e para exigir essa qualidade, seja na distribuição da água para consumo humano, seja na questão das estações de tratamento das águas residuais, o que tem depois também influência, a jusante, na água para consumo humano, na captação de água e na qualidade da água no meio ambiente. Portanto, é uma necessidade o aumento do nível de informação. Termino dizendo que é evidente que aqueles que, como o Governo PS, planeiam privatizar a distribuição de água para consumo humano, provavelmente, têm dificuldade em justificar a máxima informação ao consumidor, a máxima informação às populações. Quem quer privatizar a água, quem quer transformá-la num negócio, pode ter dificuldade em admitir que as populações saibam o mais possível daquele serviço que lhes é prestado. Nós, pela nossa parte, estamos a favor da máxima informação e estaremos sempre contra a privatização que o Governo PS vai preparando, por estes dias. O PS vai chumbar a iniciativa para propor uma igual?! Não, não é possível!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quais são as condições indispensáveis para um casamento? A esta pergunta, simples, qualquer pessoa responderá: amor e vontade de duas pessoas. Tempos houve em que tal não era condição necessária e outros interesses se entrelaçavam no casamento — económicos, de propriedades, de acordos políticos e entre famílias. A família, como a conhecemos, não é um fenómeno estático e o casamento ainda há poucas gerações era encarado como um qualquer contrato de negócios. O afecto era acessório. Se hoje ninguém é capaz de defender o casamento forçado, aliás, considerado crime, qual a razão para obrigar centenas de pessoas a manterem-se num casamento contra a sua vontade, quando as condições que determinaram o casamento já não existem? Se para que o casamento se realize é necessária a vontade inequívoca e expressa de duas pessoas, para o manter também deverá ser necessária essa vontade mútua. Se aceitarmos que para manter um casamento basta a vontade de um, estamos a violar o mais elementar dos direitos humanos: a liberdade individual de cada um e de cada uma. O divórcio litigioso, que este projecto de lei não exclui, não pode ser a única saída para as situações em que, pura e simplesmente, o amor acabou. Ao manter-se a actual situação, obriga-se centenas de portugueses e portuguesas a percorrerem um penoso caminho que pode levar a anos e anos de um divórcio litigioso. Obriga-se à separação de facto durante três anos ou mesmo à violação dos deveres conjugais, quantas vezes contra a vontade das pessoas. Três anos que nunca são três anos, sendo esse apenas o prazo para que se inicie um processo judicial que poderá demorar mais 3, 4, 5 ou 6 anos. Quando se ataca este projecto de lei dizendo que favorece a leviandade porque «uma pessoa não se desapaixona e sai de casa no dia seguinte», estamos a falar de uma mistificação, porque, como é normal, não existe lei alguma que proíba que uma pessoa saia de casa quando se desapaixona. O que a actual lei não permite é que resolva a sua situação pessoal e, por arrastamento, a da sua família, obrigando ao longo e penoso calvário de três anos de separação e ainda o tempo gasto num processo que se arrasta em tribunal. Nos casos em que existem filhos, obriga-se os menores, e mesmo os maiores, a conviver com essa situação. O casamento é um contrato, mas acima de tudo é a união voluntária de duas pessoas com um projecto de vida e de felicidade, o encontro de duas liberdades, uma associação fundada na ligação afectiva e na conjugação de duas vontades livres. Esta é a base do contrato de casamento e não outra qualquer. Nuns casos dura para toda a vida e noutros acaba. Será isto banalizar o casamento e as relações de afecto entre as pessoas? Será isto desproteger um dos membros do casal? O casamento não se banaliza! Bem pelo contrário, ele é valorizado na medida em que é válido enquanto forem válidas as razões que o justificam. Os direitos individuais das pessoas são defendidos. Nada justifica que uma pessoa, homem ou mulher, para o qual o casamento terminou se veja obrigado a esperar três anos, com as consequências pessoais e mesmo patrimoniais que daí advêm, para poder iniciar um processo de divórcio, ainda por cima litigioso. Que sentido tudo isto faz? O que é que a legislação deve fazer perante este quadro? Não pode, não consegue, nem lhe compete reparar as emoções, mas pode — e deve! — acompanhar os tempos que se vivem e responder às necessidades das pessoas, pode e deve impedir que o sofrimento das pessoas seja levado ao extremo!! Ora, Sr.as e Srs. Deputados, ser obrigado a manter um casamento sem o desejar durante anos e anos, abandonando o lar, vivendo separado, ou provocando situações-limite para que o outro seja obrigado a reagir e, ainda por cima, no fim, ter de viver um divórcio litigioso é levar o sofrimento ao extremo. O projecto de lei do Bloco de Esquerda não desprotege cônjuges em que os seus direitos foram violados, como os casos de violência doméstica. Isso é crime e como tal deve ser tratado! Não desprotege os filhos e filhas menores, porque exige que para se dar início a um requerimento de pedido de divórcio por um só cônjuge, no mínimo, já tenha entrado um pedido de regulação do poder paternal que terá o seu curso normal num tribunal. Não desprotege em relação aos bens patrimoniais cujo processo também corre em paralelo, mas separado, e onde o resultado da partilha dos bens nunca poderá ser superior ou equivalente à comunhão de adquiridos, mesmo que o regime de casamento seja diferente. Os «golpes do baú» não serão permitidos! Prevê-se a possibilidade de atribuição de alimentos ao cônjuge que dependa economicamente do outro. O projecto de lei do Bloco de Esquerda não é o «divórcio na hora», como algumas vozes do Partido Socialista tentaram fazer crer, com o intuito de desvalorizar esta iniciativa legislativa. Prevê-se a existência de duas, repito, duas conferências: na primeira, o Conservador tenta reconciliar os cônjuges e, na verificação da impossibilidade, adverte o requerente do divórcio que deverá renovar o pedido após um período de reflexão de três meses. O casamento assumiu uma dimensão de realização afectiva. O direito ao divórcio deve ser comum a todos os que se casam, até para se casarem de novo. Não propomos, nem defendemos o «divórcio na hora», mas, Sr.as e Srs. Deputados, somos claramente, contra o casamento contrariado e forçado. Sr.ª Deputada, que eu saiba, o divórcio obtém-se de duas formas: pela via litigiosa (quando um dos cônjuges viola os deveres conjugais e o outro invoca e prova essa violação este tem direito ao divórcio) e pelo mútuo consenso (quando ambos os cônjuges — e não apenas um deles — se querem divorciar). Sr.ª Deputada, não se diga que não tem havido simplificação neste processo de divórcio por consenso!… V. Ex.ª sabe que inicialmente só os cônjuges com mais de 25 anos de idade é que podiam pedir o divórcio por acordo, mas isso desapareceu; só os cônjuges casados há mais de três anos é que podiam pedir o divórcio por mútuo consenso, mas isso desapareceu; hoje, se ambos os contraentes, que quiseram casar-se, querem ambos divorciar-se isso é concedido sem condicionantes ou requisitos — mas ambos, Sr.ª Deputada, e nunca só um deles!! O que querem os Srs. Deputados? Querem apenas que um só dos cônjuges, unilateralmente, imponha a vontade ao outro e obtenha o divórcio sem o consentimento da outra pessoa. É isso o que os senhores querem! O que os senhores querem, em bom rigor, é permitir objectivamente que, por exemplo, um cônjuge que viola os deveres conjugais obtenha o divórcio contra a vontade do cônjuge que não viola os deveres conjugais! Sr. Presidente e Sr.ª Deputada, a proposta que hoje aqui é apresentada é intolerável e inadmissível! O vosso projecto de lei é um ataque irresponsável à figura do casamento. V. Ex.ª foi ali com «pezinhos de lã», com afectos, com mais não sei o quê tentar «dinamitar», atacar irresponsavelmente a figura do casamento.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados Montalvão Machado e Nuno Magalhães, porque o fundo das vossas questões parece muito semelhante, aproveitarei por responder aos dois em conjunto. Para o Bloco de Esquerda, o casamento não é um contrato qualquer!! Não, não parece, Sr. Deputado! Para os senhores parece, sim, que, de acordo com o que estão a defender, o casamento quase que se limita a um mero contrato comercial. Ó Srs. Deputados, Montalvão Machado e Nuno Magalhães, imaginem a situação: um casal vive há 15 anos um casamento e, a determinado momento, para um dos elementos do casal esse casamento terminou. O outro decide não lhe dar o divórcio. A alternativa para o que se deseja separar é separar-se de facto durante três anos, esperar que o outro cometa algum deslize para invocar que foram violados os direitos conjugais e depois de tudo disso iniciar um processo judicial litigioso que sabemos que dura mais 3, 4, 5 ou 6 anos. Sr. Deputado, quem nesta Câmara não conhece um caso em que isso se passou? Quem não conhece?… O Sr. Deputado Montalvão Machado disse que o nosso projecto é um ataque irresponsável ao casamento, mas a verdade é que não estamos a discutir o casamento! O que estamos a discutir é a possibilidade de um dos elementos do casal, por sua livre e expressa vontade, pôr fim a esse contrato que, por ser tão especial, precisa da vontade de duas pessoas. Mas o que é, para os senhores, defender o casamento? É defender as famílias desavindas? É defender as famílias que passam anos e anos em litígio nos tribunais? O que os senhores defendem é que os filhos assistam à litigância entre os pais e às situações em que os bens patrimoniais e a sua tutela é usada como arma de arremesso? Se é esta a vossa concepção de casamento e a vossa defesa do contrato especial que é o casamento, estamos conversados, Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP! De facto, ficamos esclarecidos quanto ao «relevante interesse» que, para vós, o casamento tem para a sociedade portuguesa…! O Bloco de Esquerda não está a pôr em causa o casamento mas, sim, o casamento obrigado e forçado a que centenas de casais estão sujeitos no nosso país. Sr. Deputado Nuno Magalhães, sempre lhe digo que esta «ideia fracturante» do Bloco de Esquerda foi imposta nos Estados Unidos da América em 1969, no estado da Califórnia, pelo «grande esquerdista e fracturante» que, como sabe, foi Ronald Reagan!… Não estamos a fazer qualquer inovação mas, sim, a adaptar o quadro legal à realidade social em que vivemos. Aliás, para encontrarmos soluções semelhantes basta olhar para nossa vizinha Espanha. Escusam, portanto, de tentar rotular esta iniciativa como «fracturante» porque ela não o é. É antes uma medida que procura repor a justiça em centenas de famílias. Aliás, muitos dos senhores são advogados e sabem muito bem do que estou a falar. O próprio Bastonário da Ordem dos Advogados disse que este projecto de lei merece, no mínimo, ser visto com muita atenção. Não podem, por isso, dizer que estamos a inventar problemas! Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro, gostaria de dizer-lhe que, de facto, o que propomos é uma nova modalidade de divórcio e não o desaparecimento de qualquer das duas modalidades já existentes. Em relação ao divórcio por mútuo consentimento, penso que há muito pouco a dizer e creio, aliás, que estamos todos de acordo. Por outro lado — e respondendo também ao Sr. Deputado Montalvão Machado —, pensamos que deve continuar a existir a modalidade de divórcio litigioso. Na verdade, um cônjuge que queira pôr um processo em tribunal porque viu violados os seus direitos conjugais pode e deve fazê-lo. Não é para esses casos que este projecto de lei existe. Esta iniciativa existe exactamente para as situações que não podem ser resolvidas, sendo as pessoas obrigadas a percorrer penosamente o caminho que actualmente existe. Outra das questões colocadas pela Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro estava relacionada com a convenção antenupcial, mas tal tem sobretudo a ver com a protecção de ambos os elementos do casal. Esperamos, contudo, que algumas destas questões possam ser dirimidas em sede de especialidade, se esta Assembleia da República, amanhã, der mais este passo no sentido de responder aos problemas das pessoas e das famílias, aprovando este projecto de lei. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Varanda.
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Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, ouvi atentamente a sua intervenção — aliás, ouvi-a já hoje de manhã nos meios de comunicação social. Sr.ª Deputada, não há qualquer dúvida de que o casamento é, de facto, um contrato, à luz do Código Civil é um contrato, mas é importante esclarecer que não é um contrato qualquer. Não é um contrato em que, se uma das partes violar ou desrespeitar as obrigações emergentes desse contrato, a outra parte pode exigir em tribunal que a parte violadora dos deveres cumpra esses deveres. Em tribunal não é possível pedir-se a condenação de um cônjuge a cumprir as obrigações emergentes de um contrato de casamento. O cônjuge tem, sim, o direito potestativo de pedir o divórcio. Além do mais, não é um contrato qualquer por outro motivo — e quero deixar bem claro à Câmara que para o PSD o casamento não é um contrato qualquer mas não apenas por questões jurídicas: é algo de interesse social relevante para a própria estrutura da sociedade! Sr.ª Deputada, que eu saiba, o divórcio obtém-se de duas formas: pela via litigiosa (quando um dos cônjuges viola os deveres conjugais e o outro invoca e prova essa violação este tem direito ao divórcio) e pelo mútuo consenso (quando ambos os cônjuges — e não apenas um deles — se querem divorciar). Sr.ª Deputada, não se diga que não tem havido simplificação neste processo de divórcio por consenso!… V. Ex.ª sabe que inicialmente só os cônjuges com mais de 25 anos de idade é que podiam pedir o divórcio por acordo, mas isso desapareceu; só os cônjuges casados há mais de três anos é que podiam pedir o divórcio por mútuo consenso, mas isso desapareceu; hoje, se ambos os contraentes, que quiseram casar-se, querem ambos divorciar-se isso é concedido sem condicionantes ou requisitos — mas ambos, Sr.ª Deputada, e nunca só um deles!! O que querem os Srs. Deputados? Querem apenas que um só dos cônjuges, unilateralmente, imponha a vontade ao outro e obtenha o divórcio sem o consentimento da outra pessoa. É isso o que os senhores querem! O que os senhores querem, em bom rigor, é permitir objectivamente que, por exemplo, um cônjuge que viola os deveres conjugais obtenha o divórcio contra a vontade do cônjuge que não viola os deveres conjugais! Sr. Presidente e Sr.ª Deputada, a proposta que hoje aqui é apresentada é intolerável e inadmissível! O vosso projecto de lei é um ataque irresponsável à figura do casamento. V. Ex.ª foi ali com «pezinhos de lã», com afectos, com mais não sei o quê tentar «dinamitar», atacar irresponsavelmente a figura do casamento. Ora, a pergunta que lhe quero fazer, Sr.ª Deputada, é a seguinte: V. Ex.ª não considera injusto que o cônjuge que não viola os deveres conjugais tenha de aguardar passivamente que o outro, que viola os deveres conjugais, proponha e obtenha automaticamente o divórcio? Essa questão das duas conferências é para tentar animar o que não está animado, mas isso e não convence ninguém! Portanto, Sr.ª Deputada, não considera injusto para o cônjuge que não viola os deveres conjugais estar submisso à vontade daquele que viola os deveres conjugais, que viola o contrato que celebrou com a outra parte? Não considera essa situação injusta, Sr.ª Deputada? Sinceramente, era isto que queria perguntar. É porque a situação actual do casamento e das hipóteses de divórcio é uma situação já muito tolerante. O divórcio por acordo é um divórcio concedido sem requisitos e sem condicionantes e nós entendemos que a lei actual nesse âmbito está correcta.
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Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, o projecto de lei que acabou de apresentar, e tal como tive oportunidade de dizer muito claramente no relatório que apresentei hoje na 1.ª Comissão e que foi objecto de aprovação, suscita algumas dúvidas. Destas dúvidas permitir-me-ia destacar duas: a primeira tem a ver com o contrato que está aqui em causa e que é dissolvido pelo divórcio. Ora, o contrato que é dissolvido pelo divórcio é um negócio jurídico. O casamento é tratado como um negócio jurídico que configura um contrato típico que específica claramente deveres. A lei consagra especificamente estes deveres que não resultam de uma vontade unilateral — pelo contrário, como a Sr.ª Deputada teve ensejo de dizer na sua intervenção, resultam da vontade de dois. Sendo assim, de que forma é possível então conceber-se que uma vontade unilateral seja sancionada por uma mera decisão administrativa, que, de «uma penada só», remove e resolve dois contratos: por um lado, este contrato que enquadra um negócio jurídico que é o casamento e, por outro, um outro contrato que em todo o Direito da Família não é susceptível de ser modificado, ou seja, a convenção antenupcial do regime de bens? Aliás, permita-me só que acrescente nesta pergunta a título de exemplificação, relativamente aos casos internacionais citados na vossa exposição de motivos (e destes destaco só dois), isto é, o caso espanhol e o caso alemão, que esta decisão não é uma decisão meramente administrativa, mas uma decisão judicial. De facto, decorre do pedido estabelecido por um dos cônjuges, mas a sua sanção, atendendo à natureza dos bens que estão ali garantidos no contrato prévio, precedem e carecem de uma decisão e de uma verificação judicial. Uma outra questão que gostava de colocar-lhe — e vou fazê-lo muito rapidamente — é a seguinte: a proposta que hoje é apresentada no projecto de lei coloca-nos a dúvida de saber se estamos perante um novo modelo de divórcio, isto é, um terceiro modelo de divórcio. Ou seja, passaremos a ter o divórcio por mútuo consentimento, o divórcio litigioso e agora um terceiro divórcio a pedido de um dos cônjuges!? Contudo, esta modalidade apresentada pelo projecto de lei pelo Bloco de Esquerda subsume componentes de cada um destes modelos: subsume, por um lado, a decisão administrativa que está subjacente ao divórcio por mútuo consentimento e, por outro, subsume o que é de litigante no que tem a ver com a decisão e a formulação por só um dos cônjuges. Ora, a questão que coloco, para além da clarificação do que se trata de facto e sendo uma nova modalidade, é a seguinte: qual é então a sua articulação lógica, quais são as suas relações nesta nova arquitectura proposta para o instituto do divórcio?
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Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, evidentemente, discordamos do conteúdo do presente projecto de lei do Bloco de Esquerda que procura tratar igualmente aquilo que é manifestamente desigual. Obviamente, para nós, o contrato de casamento é um contrato específico, com efeitos muito especiais e muito próprios, de carácter pessoal, e que requerem uma especial tutela e ponderação dos interesses e dos bens jurídicos em causa. Aliás, terei oportunidade de dizê-lo na intervenção que farei seguidamente. O pedido de esclarecimento que gostaria de obter de V. Ex.ª, por força de algumas dúvidas que assaltam o nosso espírito, tem a ver com aquilo que V. Ex.ª disse daquela tribuna. Para o Bloco de Esquerda e para VV. Ex.as a questão está no facto de as pessoas que pretendam divorciar-se terem de esperar entre três a quatro anos para obter esse divórcio sem o consentimento do outro cônjuge. Então, mas se é assim, Sr.ª Deputada, por que razão o Bloco de Esquerda não cuidou de apresentar uma proposta, que para nós teria algum cabimento, alguma seriedade e seria até susceptível de obtermos alguma discussão, para reduzir o prazo dos «divórcios remédio»? Três anos é muito, como disse? Então, vamos discutir os dois anos!… Dois anos ainda é muito? Poderemos ponderar um ano! Agora, aquilo que o Bloco de Esquerda propõe é pura e simplesmente, independentemente da vontade e até no limite do desconhecimento do outro cônjuge, que um dos cônjuges possa rescindir unilateralmente um contrato como o casamento! É que, a ser assim, Sr.ª Deputada, somos forçados a pensar que o Bloco de Esquerda não quer discutir seriamente esta questão, que é séria, e apenas pretende fazer mais um número pseudoprogressista da sua pseudo agenda fracturante. Não, não parece, Sr. Deputado! Para os senhores parece, sim, que, de acordo com o que estão a defender, o casamento quase que se limita a um mero contrato comercial. Ó Srs. Deputados, Montalvão Machado e Nuno Magalhães, imaginem a situação: um casal vive há 15 anos um casamento e, a determinado momento, para um dos elementos do casal esse casamento terminou. O outro decide não lhe dar o divórcio. A alternativa para o que se deseja separar é separar-se de facto durante três anos, esperar que o outro cometa algum deslize para invocar que foram violados os direitos conjugais e depois de tudo disso iniciar um processo judicial litigioso que sabemos que dura mais 3, 4, 5 ou 6 anos. Sr. Deputado, quem nesta Câmara não conhece um caso em que isso se passou? Quem não conhece?… O Sr. Deputado Montalvão Machado disse que o nosso projecto é um ataque irresponsável ao casamento, mas a verdade é que não estamos a discutir o casamento! O que estamos a discutir é a possibilidade de um dos elementos do casal, por sua livre e expressa vontade, pôr fim a esse contrato que, por ser tão especial, precisa da vontade de duas pessoas. O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Como precisa a sua dissolução!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda propõenos hoje uma espécie de revolução no regime jurídico do divórcio. É, contudo, uma revolução perfeitamente desgarrada, inconsistente e desajustada, para além de desarticulada com o restante regime legal, que permanece inalterável. Recuperando um projecto de lei que já tinha apresentado na anterior Legislatura e que não chegou, porém, a ser discutido, o Bloco de Esquerda propõe-nos que o divórcio possa ocorrer a pedido de um dos cônjuges. Até aqui não há absolutamente nada de novo, porque também o divórcio litigioso ocorre justamente a pedido de um dos cônjuges contra a vontade do outro. Ou seja, no divórcio litigioso um dos cônjuges requer contra o outro, em acção judicial, o divórcio, invocando a causa específica da dissolução do casamento, que pode ser de uma de duas: uma causa subjectiva, assente na violação culposa dos deveres conjugais, ou uma causa objectiva que se reconduz a uma situação de ruptura da vida conjugal, considerada independentemente de culpa dos cônjuges. As novidades propostas na iniciativa ora em discussão consistem, por um lado, na desnecessidade de invocação de qualquer causa específica para o divórcio e, por outro, na atribuição de competência exclusiva para o efeito aos conservadores do registo civil. De facto, segundo o projecto de lei, o cônjuge que não deseje manter-se casado pode a qualquer momento requerer o divórcio na conservatória do registo civil competente, declarando expressamente ser essa a sua vontade. Basta para o efeito instruir o pedido com uma certidão de cópia integral do registo de casamento, uma certidão da convenção antenupcial, se a houver, e, no caso de haver filhos menores, uma certidão da pendência ou da sentença judicial de regulação do exercício do poder paternal. É tão simples quanto isto!! A simplificação proposta pelo Bloco de Esquerda, fundada na evidente intenção de liberalizar o divórcio, é de tal ordem que será muito mais fácil requerer o divórcio a pedido de um dos cônjuges contra a vontade do outro do que o divórcio por mútuo consentimento, o que é verdadeiramente paradoxal! Na verdade, no divórcio requerido por ambos os cônjuges de comum acordo é necessário um rol muito mais extenso de documentos a apresentar na conservatória do registo civil. Ou seja, o divórcio a pedido de um dos cônjuges contra a vontade do outro afigura-se muito menos exigente do que o actual regime do divórcio por mútuo consentimento, o que não faz sentido algum!! A par da singeleza do pedido, o processo proposto pelo Bloco de Esquerda para o divórcio a pedido de um dos cônjuges afigura-se de uma ligeireza atroz, em manifesto prejuízo dos direitos do cônjuge não requerente. Se não, vejamos: requerido o divórcio por um dos cônjuges, o conservador convoca ambos para uma primeira conferência de conciliação. Não sendo a conciliação possível, o conservador adverte o requerente de que deverá renovar o pedido de divórcio após um período de reflexão de três meses. Se na segunda conferência não for novamente possível a conciliação, o conservador declara o divórcio, procedendo, de seguida, ao respectivo registo. Que processo tão simples!… Um dos cônjuges deseja divorciar-se e esse pedido, após umas ligeiras formalidades, é-lhe concedido praticamente «na hora». Onde fica o outro cônjuge no meio deste processo? Só é ouvido nas duas tentativas de conciliação e mais nada, rigorosamente mais nada!! Não pode contestar o pedido de divórcio, não pode alegar factos que lhe permitam a atribuição de indemnização por danos não patrimoniais causados pela dissolução do casamento, não pode requerer o arrendamento da casa de morada de família, não pode fazer absolutamente mais nada!! Pior: o cônjuge não requerente é altamente prejudicado em termos patrimoniais com o divórcio assim declarado! Não pode receber na partilha mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime de comunhão de adquiridos. E, tendo contraído casamento segundo o regime de comunhão geral, o prejuízo é óbvio: por outro lado, perde todos os benefícios recebidos ou a receber do outro cônjuge ou de terceiro em vista do casamento ou em consideração do estado de casado. É caso para perguntar onde está o equilíbrio deste regime. É evidente que não há qualquer moderação no regime proposto. Trata-se, isso sim, de impor a vontade de um cônjuge sobre o outro, em claro prejuízo deste último, de forma praticamente automática. Será legítimo favorecer inadvertidamente a vontade de um dos cônjuges, sacrificando injustificadamente os interesses do outro? Isto é, a nosso ver, um profundo despautério! Uma autêntica aberração jurídica! E não venha o Bloco de Esquerda com argumentos de Direito Comparado porque não há, noutros ordenamentos jurídicos, um sistema igual ao que agora é por si proposto! Apesar de a lei espanhola, desde 2005, permitir o divórcio a pedido de um dos cônjuges, não o faz nos moldes irreflectidos e levianos propostos pelo Bloco de Esquerda. Ou seja, em Espanha não vigora um regime cego e automático como o proposto pelo Bloco de Esquerda, já que o pedido de divórcio por um dos cônjuges passa necessariamente pelo crivo do tribunal, que salvaguarda e zela os interesses de ambos os cônjuges. O Bloco de Esquerda também faz referência, na exposição de motivos do projecto em discussão, ao Direito francês e ao Direito alemão. A verdade, porém, é que nem um nem outro prevêem algo sequer similar ao proposto na iniciativa ora discutida. Não há, portanto, paralelo possível entre o Direito alemão ou o Direito francês e o regime inusitadamente proposto pelo Bloco de Esquerda. Acolhendo de forma tão desmesurada a liberalização do divórcio, não se percebe por que é que o Bloco de Esquerda não levou a sua proposta às últimas consequências e, pelo contrário, manteve o regime do divórcio litigioso em vigor, o que é um evidente contra-senso. Haverá alguma razão em particular para isso? Sinceramente, parece-nos que nem próprio o Bloco de Esquerda acredita na bondade sua proposta. Só isto pode justificar a proposta de um regime que prejudica visivelmente outro (o do divórcio litigioso), mantendo-se, todavia, este último em vigor. A actual configuração jurídica do divórcio, que admite, por um lado, o divórcio por mútuo consentimento e, por outro lado, o divórcio litigioso, quer na vertente de «divórcio-sanção» quer na de «divórcio-ruptura», parece-nos adequada, ponderada e ajustada. Não vemos, pois, necessidade de que o regime jurídico do divórcio seja revisto e menos ainda compactuaremos com uma proposta que, acima de tudo, constitui um factor de manifesto desequilíbrio entre os cônjuges na extinção do vínculo conjugal, com a inerente desestabilização social e familiar que isso acarreta. Por isso, rejeitamos peremptoriamente este projecto de lei.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, dizia há pouco a Sr.ª Deputada Helena Pinto que esta questão deveria, ao menos, ser considerada. Pensamos que, de facto, é assim e que a questão suscitada pelo Bloco de Esquerda é pertinente, na medida em que são conhecidos casos de pessoas que, contra a sua vontade, ficam longos anos casadas, dada a discordância do outro cônjuge em conceder o divórcio. Ora, estas situações, por vezes, destroem vidas, pelo que a procura de uma solução jurídica que permita contorná-las e pôr-lhes termo é algo que pensamos que deve ser considerado, tendo mesmo em atenção experiências comparadas e as soluções que se encontraram noutros países. Também não estamos de acordo com a ideia divulgada de que estamos a discutir um projecto de lei de «divórcio na hora». De facto, haverá críticas a fazer a este projecto — e daqui a pouco farei algumas —, mas creio que essa não é uma delas. Na verdade, o divórcio por mútuo consentimento é mais «na hora» do que este. Aliás, nesta iniciativa prevê-se a realização de duas conferências para que o divórcio seja obtido, o que não acontece, como se sabe, no divórcio por mútuo consentimento. Parece-nos, portanto, que essa crítica não é justa. Do nosso ponto de vista, há, contudo, algumas fragilidades neste projecto de lei que deveriam ser ponderadas e que, se houver discussão na especialidade, merecem atenção para não criar situações indesejáveis. Há uma questão que, sendo secundária, não deixarei de mencionar. Refiro-me ao papel de certo modo exorbitante que é conferido ao conservador do registo civil ao prever que este terá por função procurar obter a conciliação entre os cônjuges. Parece-nos que o conservador do registo civil não serve para isso e que, se as pessoas se pretendem divorciar, o conservador do registo civil tem de «tomar conta da ocorrência» e não de procurar conciliar os cônjuges na primeira ou na segunda conferências. É admissível que esse papel seja atribuído ao juiz no divórcio por mútuo consentimento, mas pensamos que o conservador não deve ter de o fazer. Mas o problema maior que vemos neste projecto de lei está relacionado com o facto de nada se prever relativamente à casa de morada de família, o que se conjuga com outro aspecto, que é o da eventual desprotecção da parte economicamente mais fraca. Está previsto no projecto que haverá pensão de alimentos, designadamente no caso de um dos cônjuges estar numa situação de dependência em relação ao outro por não ter emprego, situação em que normalmente se encontram as domésticas. Mas há mais casos para além deste que se prevê. Pode haver, por exemplo, uma situação de desemprego involuntário de um dos cônjuges, que estará numa situação de carência caso o divórcio siga em frente. Ora, causa-nos alguma perplexidade que alguém que esteja numa situação difícil em termos económicos, precisando do apoio económico do outro cônjuge para sobreviver, veja ser-lhe imposto, unilateralmente, um divórcio que agrave essa situação. Mais difícil será ainda a situação se a casa em que ambos vivem for, por direito próprio, de um dos cônjuges (porque a herdou, por exemplo). Ora, de acordo com as regras aplicáveis deste projecto, segundo as quais ninguém pode ficar com situação diversa da que resultaria de um casamento realizado no regime da comunhão de adquiridos, pode acontecer que um dos cônjuges seja, pura e simplesmente, expulso de casa… Pensamos, portanto, que esta situação deve ser acautelada. Há alguns aspectos, por outro lado, que nos parecem merecer intervenção judicial. Está prevista, por exemplo, a regra relativa ao regime de bens após o divórcio por decisão de um dos cônjuges. Todavia, uma coisa é estabelecer a regra e outra é ver como é que ela se aplica em concreto. Tem de haver, portanto, alguém que certifique como é que as coisas vão ficar depois do divórcio consumado. Neste aspecto é dificilmente contornável a intervenção de um juiz, porque não nos parece suficiente a intervenção do conservador do registo civil. Referirei mais dois aspectos, um dos quais relacionado com a cessação dos deveres conjugais. Na verdade, pensamos ser prematuro dizer que cessam os deveres conjugais quando é apresentado o requerimento na primeira conferência e dizemo-lo porque nem no divórcio é assim! No divórcio litigioso só cessam os deveres conjugais quando este é decretado, a exemplo do que acontece com o divórcio por mútuo consentimento. Parece-nos, portanto, prematuro fazer cessar os deveres conjugais antes de existir o divórcio, porque tal pode levar, por exemplo, ao abandono dos deveres de cooperação ou de assistência mútua, o que pode ser gravoso para o outro cônjuge. Finalmente, há um outro aspecto que deveria ser acautelado, porque me parece que não o é suficientemente, que tem a ver com o problema das doações para casamento e das doações entre cônjuges, porque, nos termos do Código Civil, estas são irrevogáveis. Se tal não for acautelado numa legislação que preveja o divórcio por decisão unilateral de um dos cônjuges, essa será uma forma de, por aplicação da regra da comunhão de adquiridos, contornar essa irrevogabilidade e de um dos cônjuges conseguir, por esse via, que seja revogada uma doação entre cônjuges ou uma doação para casamento. Portanto, repito, a nossa posição é a de que esta é uma questão que vale a pena ser ponderada. Não nos choca que, no plano dos princípios, possa haver uma terceira possibilidade de divórcio que não seja apenas a do mútuo consentimento ou a do litigioso, mas há aspectos que teriam de ser muito bem ponderados, e aqueles que acabei de referir são os que, numa leitura atenta do projecto de lei, nos parece que careceriam de melhor ponderação.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, sumariamente, o presente projecto de lei introduz uma nova figura de divórcio decretado pela conservatória do registo civil, mediante pedido efectuado por um dos cônjuges em qualquer altura, prevendo-se que os deveres conjugais cessem imediatamente no momento da entrada do requerimento do divórcio. Cumpre, desde logo, perguntar o que é que sucede quantos aos alimentos, que, eventualmente, poderão ter de ser prestados, e à casa de morada de família, durante a pendência do processo. É porque o artigo 12.º do diploma do Bloco de Esquerda prevê, no que diz respeito ao artigo 2016.º do Código Civil, a fixação da prestação de alimentos apenas no momento em que o divórcio for decretado. Ora, se um dos cônjuges é o único titular de rendimentos e pede o divórcio, de que forma o outro cônjuge, que não tem qualquer tipo de rendimentos, poderá sobreviver durante esta pendência e até ser eventualmente fixado esse seu pedido na segunda conferência e quando for decretado o divórcio na sua plenitude? Parece-nos que, de facto, o Bloco de Esquerda — embora não se trate do «divórcio na hora» —, imbuído do «espírito Simplex» do PS, pretende instituir um processo similar ao do divórcio por mútuo consentimento, com uma pequena grande diferença: é que o consentimento não é mútuo…!! Para ser claro, no fundo, o que o Bloco de Esquerda nos pretende propor é um divórcio por mútuo consentimento sem o mútuo consentimento, o que nos parece ser a principal incongruência deste projecto de lei. Aliás, é através de uma forma de divórcio em que há uma mera declaração unilateral receptícia, em que a quebra contratual se justifica por si só e que não exige qualquer tipo de demonstração de vontade da outra parte, prescindindo-se, aliás, de qualquer acordo para a sua revogação. Portanto, em suma, o que o Bloco de Esquerda nos propõe é o seguinte: alguém celebra livremente um contrato, do qual, como é normal, resultam direitos e deveres, e viola reiterada, culposa e intencionalmente os seus deveres, violação esta que até tem efeitos colaterais ao nível patrimonial, mas, numa jogada de antecipação, pode, a qualquer momento, dizer: «Agora já não quero» e o outro cônjuge, pura e simplesmente, nada pode fazer. É isto que o Bloco de Esquerda nos propõe!! Portanto, até entendemos algumas razões que podem estar por detrás desta intenção — e já o dissemos! Se a questão é o tempo que decorre ou aquele que é necessário para alguém obter o divórcio — e a Sr.ª Deputada Helena Pinto não respondeu a essa minha pergunta —, então, vamos discutir isso. Repito: três anos é muito? Vamos para dois. Dois é muito? Até admitimos um ano…, o que não podemos é desproteger desta forma um cônjuge que se divorcia sem ter vontade, sem até ter conhecimento! Imagine-se que um dos cônjuges, intencionalmente ou não, desconhece o paradeiro do outro cônjuge. Isto pode acontecer, eu até conheço situações… Neste caso, como é que se faz a citação para a primeira conferência? Recorre-se à citação edital?! O que poderá perfeitamente acontecer é que alguém que se ausente por algum tempo do País ou que até se encontre no País mas cujo cônjuge receba as cartas em seu nome e não lhe dê conhecimento, quando dá por si já está divorciado sem estar regulada a prestação de alimentos e a utilização da casa de morada de família!! Nada está regulado! Quando dá por si está, pura e simplesmente, divorciado, objectivamente, sem qualquer tipo de fiscalização, até judicial!! Um mero acto na conservatória é aquilo que se pede neste caso! Portanto, parece-nos não fazer sentido a discussão desta proposta, pois a discussão do fundo da questão com certeza fará sentido. Até porque entendemos que, entre 1994 e 2001, as alterações que ocorreram durante uma década permitiram uma flexibilização do regime do divórcio, quer na sua obtenção, quer na forma, quer nos meios. Repare-se: permitiu-se a obtenção de divórcio por mútuo consentimento a todo o tempo, eliminando-se — e bem! — a moratória dos três anos; reduziu-se o prazo para a obtenção do divórcio com base na ruptura da vida em comum, de seis para três anos, no caso da separação de facto — mas, repito, estamos disponíveis para discutir estes três anos — e de quatro para dois anos no caso da ausência; eliminou-se a intervenção judicial nos casos de divórcio por mútuo consentimento; criaram-se gabinetes de mediação familiar e até se procedeu a um conjunto de alterações que visaram equiparar a união de facto ao casamento. A prova de que, de facto, resultou, é que cerca de um quarto dos casamentos realizados no ano passado resultaram de uma situação de união de facto. Portanto, há hoje uma panóplia de mecanismos legais que permitem às pessoas decidirem livremente se pretendem, ou não, abraçar uma vida em comum, pelo que esta decisão não pode ser vista como uma decisão… não direi «leviana» mas de que, quando a tomam, as pessoas não tenham consciência dos direitos e deveres que dela resultam. Portanto, parece-nos que este projecto de lei sofre de diversas e graves incongruências. Aliás, é curioso que o Bloco de Esquerda invoque a experiência dos Estados Unidos da América, e ainda é mais curioso o exemplo espanhol e da lei de 2005 de Espanha. É porque se é verdade que, em Espanha, a lei foi alterada, não é menos verdade que um dos recentes relatórios do Instituto de Política Familiar sobre a evolução da família na Europa, em 2007, acusa directamente o governo espanhol de estar a realizar uma política «regressiva de família que fomenta a ruptura familiar». Estas palavras não são minhas, Sr. Deputado Luís Fazenda, são de um relatório de uma instituição independente. Não há aqui qualquer tipo de concepção ideológica em relação à qual V. Ex.ª possa ficar incomodado — as palavras são da União Europeia! Mas, se quer que lhe diga, até concordo com o que está aqui escrito, se isso de alguma forma lhe consola a alma. A nosso ver, nesta matéria, não podemos adoptar soluções facilitistas, conformando-nos com os factos. Ao invés, podemos e devemos procurar mais e melhores políticas de família, mais e melhores formas de compromisso entre a vida profissional e a familiar, mais e melhor apoio à natalidade, enfim, mais e melhor qualidade de vida para os nossos cidadãos. Para nós, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Presidente, esta é a diferença entre a demissão deste projecto de lei e o inconformismo que pretendemos para esta matéria, entre a resignação e a mobilização, entre o facilitismo e a responsabilidade. Uns entregam-se, outros resistem. É o que distingue verdadeiramente os homens e as mulheres que procuram a verdadeira mudança.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há tempos li num artigo o seguinte: há quem case a acreditar na frase «para todo o sempre», quem case a pensar «se não der não dá» e quem veja no divórcio a «solução de um erro». Num momento em que os números nos dizem que cada vez mais se realizam divórcios e menos casamentos, o projecto de lei agora discussão leva-nos a reflectir sobre um assunto de extrema sensibilidade. Para existir divórcio tem, antes de tudo, de haver casamento, que, segundo o Código Civil, é um contrato entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida. Actualmente, e de acordo com a legislação portuguesa, o divórcio pode ser obtido por duas vias: por mútuo consentimento ou litigioso. Por mútuo consentimento, pode ser requerido por ambos os cônjuges, de comum acordo, que não necessitam de revelar a causa do divórcio, ficando definida a prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça, e o exercício do poder paternal relativamente aos filhos menores, entre outros. O divórcio litigioso pode ser requerido por um dos cônjuges desde que se alicerce nalgum dos fundamentos previstos no artigo 1779.º do Código Civil. Assim, o cônjuge tem de explicitar a causa do divórcio, dado que é condição necessária a violação culposa de algum dos deveres conjugais. Também pode ser requerido o divórcio litigioso com base na separação de facto por três anos consecutivos, mas, mesmo neste caso, o tribunal deve declarar a culpa dos cônjuges, quando a haja. Além disso, para se divorciar sem o acordo do outro cônjuge, tem de se aguardar três anos, no «limbo» do casamento, caso não exista, ou não se queira inventar, a tal violação culposa dos deveres conjugais. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na década de 70, os divórcios litigiosos eram maioritários em relação aos de mútuo consentimento, situação que se foi invertendo com o decorrer dos anos. Já em 2005 passa-se o contrário: os litigiosos são muito inferiores aos divórcios por mútuo consentimento. Alguns dos presentes estarão, neste momento, a questionar-se: então para quê avançar com este projecto de lei se os números nos dizem que os divórcios litigiosos estão a diminuir? Somos de opinião de que, mesmo assim, é importante e mais que não seja serve para despertar consciências e reflectir sobre o drama que é um divórcio. Esta proposta vem permitir que um dos cônjuges possa pedir o divórcio sem o consentimento do outro. É mais uma «machadada» na instituição família, dirão uns. A verdade é que se a manifestação da vontade é importante aquando do casamento, ela também deverá relevar quando já não existem condições para continuar o casamento e o divórcio apareça como uma última solução, sempre dolorosa e à qual não se adere de ânimo leve. No fundo, se aquelas duas vontades se conjugaram para o casamento, será legítimo que, quando uma delas deixar de existir, possa pôr-se termo a uma relação que se tornou inviável. Hoje, não faz sentido «acorrentar» uma pessoa a outra quando uma delas deixou de sentir vontade de permanecer. No entanto, há que reconhecer que enfrentar o divórcio é sempre uma situação difícil, mesmo quando há mútuo acordo e as relações entre o casal são as melhores possíveis. É importante que, no meio de todo este processo, se salvaguardem e se protejam os filhos do casal, essencialmente quando estes são menores. Trata-se de um processo que implica uma reestruturação da vida de todos os envolvidos, e a mudança, mesmo quando desejada, pode ser aterradora. Estamos, afinal, perante uma realidade familiar em transformação. Actualmente, a família é encarada como uma comunidade emocional e afectiva com base no amor, o que torna o casamento mais vulnerável à dissolução comparativamente à concepção que dele se tinha antes. Numa sociedade em que tudo é imediato e efémero, também o casamento tende a sê-lo. As ideias de partilha, de solidariedade e de tolerância são relegadas para um plano secundário, num modelo de vida que escolhe em primeiro lugar a satisfação material e a satisfação individual. Se o casamento não consegue concretizar o sonho que lhe deu origem acaba por morrer, ainda que um dos elementos do casal continue a acreditar nessa concretização. Os Verdes consideram pertinente a apresentação deste projecto de lei.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, faço uma pequena nota introdutória para dizer que percebemos, hoje, que o Bloco de Esquerda «bebe» doutrinalmente do grande estadista Ronald Reagan e percebemos — o que, do nosso ponto de vista, é mais grave — que pretende discutir o divórcio desassociando-o de uma discussão ponderada sobre o contrato que lhe está necessariamente implícito, ou seja, o casamento. É uma surpresa, pois julgamos que não podemos discutir uma coisa sem a outra. Mas concordamos, Sr.as e Srs. Deputados, como princípio, que esta matéria deve ser considerada e deve receber atenção e ponderação de toda a Câmara. Acontece que o projecto de lei n.º 232/X, apresentado pelo Bloco de Esquerda, nos propõe a criação de um regime jurídico do divórcio a pedido de um dos cônjuges. Esta iniciativa, partindo de alegadas mutações sociais e a pretexto de facilitar o processo de divórcio a pedido de um dos cônjuges, atenta contra um instituto jurídico socialmente consolidado. O Grupo Parlamentar do PS está ciente de que o instituto do casamento coloca em confronto interesses e valores jurídicos eventualmente conflituantes, por um lado, a liberdade e o direito individual de pôr termo a uma relação conjugal, que, porventura, se torne indesejável e, por outro, a tutela de um vínculo contratual tipificado na lei, que reveste natureza especial decorrente da sua função também estruturante da vida em sociedade. O quadro constitucional português confere uma especial atenção à família e ao casamento, surgindo a sua tutela inserida no capítulo dos direitos, liberdades e garantias, bem como em sede de direitos económicos, sociais e culturais. O texto constitucional português consagra o dever que recai sobre o Estado de proteger o casamento e a família. Todavia, não é constitucionalmente admissível uma configuração legal da família de acordo com um modelo autoritário ou com uma visão que «absolutize» o interesse supra individual e colectivo da família, não ignorando o legislador nem a jurisprudência que, na sociedade actual, por largas camadas da população, o casamento já não é encarado como uma instituição acima dos próprios cônjuges. O casamento não deve ser encarado como um valor absoluto, intocável, sobrepondo-se a quaisquer outros direitos e liberdades individuais, mas também não deve ser afectado no seu núcleo essencial de forma desproporcionada e desadequada. Se é verdade que está fora de causa a constitucionalidade do divórcio com fundamento numa causa objectiva e, portanto, fora das hipóteses de divórcio-sanção por violação culposa dos deveres conjugais, tal não significa que a lei deva admitir o divórcio sem limites, permitindo, designadamente, que, a todo o tempo, por simples declaração unilateral e arbitrária de um dos cônjuges, se proceda à dissolução do casamento. Por contraposição à união de facto, o casamento tem na sua génese uma garantia institucional e uma tutela assentes numa perspectiva duradoura e estável do vínculo, incompatível com uma natureza demasiado precária. Afectar o núcleo essencial do direito ao casamento, através, por exemplo, da consagração do direito ao divórcio por uma mera vontade ou declaração unilateral, não pode deixar de ser questionado no plano da sua conformidade com a Constituição da República Portuguesa. Com efeito, para alguns sectores da doutrina, nomeadamente o Professor Jorge Miranda e o Professor Rui Medeiros, é «duvidosa a constitucionalidade de uma solução que permita, por mera manifestação de vontade unilateral e arbitrária de um dos cônjuges, a dissolução do casamento.» Vão no mesmo sentido os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira, na sua recente Constituição anotada. Uma política de promoção da família pode passar pelo casamento, mas não deve assentar numa compressão injustificada da liberdade de cada um nem implicar um sacrifício desproporcionado dos cônjuges. É neste contexto que esta questão deve ser enquadrada. Pela sua sensibilidade, as alterações ao Direito de Família devem pautar-se por pequenos avanços e não por «passos de gigante», susceptíveis de desestruturarem o tecido social. Esta alteração legal, com implicações no contrato de casamento, não corresponde a um compromisso eleitoral que nós, Partido Socialista, tenhamos assumido perante os cidadãos portugueses. Pela nossa parte, no domínio da defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, sempre advogámos mais liberdade, mas também maior responsabilidade. Demos ao longo da história recente provas do nosso envolvimento e participação activa na adaptação do quadro legal à evolução da realidade social e cultural. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Relembro que fomos precursores do processo de consagração legal da união de facto e do regime de economia comum, e autores da última alteração legal no sentido da agilização do processo de dissolução do casamento, quer por via da diminuição do prazo para efeitos de separação de facto como fundamento de divórcio quer por via da supressão do prazo de duração do casamento fixado na lei para que o divórcio pudesse ser requerido. Estamos disponíveis, no âmbito do divórcio e no quadro da ruptura da vida em comum, para proceder à alteração dos prazos respeitantes à separação de facto, enquanto fundamento sem culpa, da dissolução. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista não rejeita este debate nem se furta às suas responsabilidades. Estamos atentos, como sempre, à evolução social e aos sinais dos tempos. Mas, sejamos claros, esta iniciativa legislativa corresponde apenas ao objectivo partidário de confundir o contrato de casamento com o instituto da união de facto. Não há uma necessidade imediata ou que traduza o sentimento generalizado, ou pelo menos maioritário, da população portuguesa, neste sentido. Pela nossa parte, uma alteração legal deste tipo deveria ser previamente sufragada em programa eleitoral de candidatura. Por esta razão, não nos revemos nos objectivos preconizados neste projecto de lei do Bloco de Esquerda e duvidamos das opções de técnica legislativa adoptadas, até quanto à sua constitucionalidade. Com efeito, introduzir a modalidade de divórcio a pedido de um dos cônjuges, fora do regime do divórcio litigioso, deixa por resolver a forma de articulação e coexistência com as restantes modalidades de divórcio e, desde logo, as relações patrimoniais e de filiação. Acresce que o projecto de lei não acautela questões fundamentais para a vida familiar, como a atribuição da casa de morada de família, a consolidação da dimensão patrimonial do casal, ou a garantia de fixação de uma pensão de alimentos ao cônjuge, deixando, desta forma, o cônjuge requerido numa situação de plena desprotecção. E mais: preconiza que a decisão final seja de natureza meramente administrativa, o que, naturalmente, põe em causa, desde logo, o respeito pelo princípio da separação dos poderes e as garantias de salvaguarda que apenas o poder judicial pode assegurar. Neste sentido, o divórcio, e por consequência o casamento, é tratado de forma aligeirada, abrindo a porta a que, no limite e como já aqui foi referido, possa ser decretado o divórcio sem o conhecimento do cônjuge requerido. Estas são as razões políticas, jurídicas e constitucionais que nos afastam deste projecto de lei do Bloco de Esquerda.
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Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, agradeço a questão que colocou e passo já a explicitar qual é a posição do Partido Socialista. Não é a posição do Bloco de Esquerda! E passo a dizer-lhe porquê. Em primeiro lugar, os senhores apresentaram um projecto de lei e quem os ouviu com atenção ficou a pensar que o casamento hoje é um contrato indissolúvel. O que é um erro! O casamento hoje não é um contrato indissolúvel. Não é verdade que seja, nem é verdade que não possa ser dissolvido, com vários fundamentos e através de vários expedientes legais, que estão previstos e consagrados na lei. Portanto, como ninguém fica amarrado a um casamento, porque a lei prevê que não fique se o não quiser, nesta matéria estamos conversados! Quanto à citação que faz do Deputado Jorge Strecht, devo dizer-lhe que é uma citação com propriedade, porque o Deputado Jorge Strecht é, além de mais, autor da lei que temos em vigor. Portanto, foi neste sentido do seu entendimento que se facilitou e que se tem vindo a facilitar a possibilidade de os cônjuges que não querem estar casados poderem entrar num processo de divórcio. Sr. Deputado, também existe na lei a possibilidade de dissolver o casamento sem ser com base na culpa de qualquer dos cônjuges, e mesmo com base na violação culposa dos deveres conjugais. Nós hoje temos a possibilidade de os cônjuges dissolverem o seu casamento, após um período de separação de facto. Esta é a verdade! Sr.ª Deputada, se me ouviu com atenção, também terá percebido que o Partido Socialista está disponível para impor um limite mais baixo a esse percurso de tempo para a separação de facto. Pode ser dois anos, pode ser um ano, estamos abertos a pensar sobre isso! Mas a verdade também é que as alegações que VV. Ex.as fazem relativamente à dificuldade de o cônjuge que quer o divórcio se ausentar de sua casa e fazer decorrer esse percurso de separação de facto — sejamos verdadeiros — não são resolvidas com o projecto de lei que VV. Ex.as apresentam aqui. Nada disso é resolvido! Nem esse problema nem qualquer dos outros que lhe estão agregados, como seja a questão da atribuição da casa de morada de família. Porque, se o casal viver num apartamento arrendado, gostaria de saber se é o conservador que vai dizer ao cônjuge que está presente na primeira conferência: «O senhor ficará com o direito ao arrendamento». Mas vamos falar dos menores. O simples processo de dar entrada com um pedido de regulação do poder paternal, como única condição de o divórcio a pedido de um dos cônjuges poder ter o seu decurso, também não acautela a tutela dos menores, nem aquilo que eventualmente venha a passarse. Vou concluir, Sr. Presidente. Como a Sr.ª Deputada sabe, as acções que entram no tribunal não têm de chegar ao fim, podem ficar a meio. E a regulação do poder paternal depende, em boa medida, da disponibilidade financeira, da disponibilidade afectiva e do interesse dos menores, o qual pode não estar minimamente assegurado, uma vez que o cônjuge, que até foi culposo e que até é o que tem vencimento no final do mês, pura e simplesmente, decidiu abandonar tudo! Não é uma questão de culpa, é uma questão de responsabilidade! Repito, é uma questão de responsabilidade!
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Não é a mesma coisa! A vossa é que, na realidade, não sei qual é! Como digo, tem dias!… Depois, quero dizer também que, dentro desta posição do Deputado Jorge Strecht — que em tempos já foi a do Partido Socialista (não sei se ainda é ou não!?) —, estamos absolutamente dispostos a melhorar este projecto de lei. Somos sensíveis às sugestões feitas pelo Sr. Deputado António Filipe fez, bem como às apresentadas pela Sr.ª Deputada Rosário Carneiro, em relação à questão de fazer entrar uma entidade judicial. Estamos, pois, dispostos a contemplar com mais atenção outras sugestões em matéria de preservação dos interesses patrimoniais, desde que se parta de uma base. Não esperamos que haja consenso connosco da parte dos partidos da direita em matéria de doutrina acerca do entendimento que temos dos fundamentos da dissolução. Com a posição que o Partido Socialista teve em tempos estamos de acordo. Com o que a Sr.ª Deputada acabou de dizer hoje estamos totalmente em desacordo, porque é pior ainda do que os outros disseram. Neste sentido, estamos à espera de saber qual é a posição do Partido Socialista, na esperança de que isto possa ter «pés para andar». De resto, fico sempre perplexo porque, na comunicação social, no contrato de trabalho, na questão do divórcio, nunca se sabe qual é a vossa posição. Os portugueses julgarão! Os senhores, quando estão na oposição, pensam uma coisa, quando estão no poder pensam outra… Olhe, Deus lá sabe o que é que os senhores pensam! Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, agradeço a questão que colocou e passo já a explicitar qual é a posição do Partido Socialista. Não é a posição do Bloco de Esquerda! E passo a dizer-lhe porquê. Em primeiro lugar, os senhores apresentaram um projecto de lei e quem os ouviu com atenção ficou a pensar que o casamento hoje é um contrato indissolúvel. O que é um erro! O casamento hoje não é um contrato indissolúvel. Não é verdade que seja, nem é verdade que não possa ser dissolvido, com vários fundamentos e através de vários expedientes legais, que estão previstos e consagrados na lei. Portanto, como ninguém fica amarrado a um casamento, porque a lei prevê que não fique se o não quiser, nesta matéria estamos conversados! Quanto à citação que faz do Deputado Jorge Strecht, devo dizer-lhe que é uma citação com propriedade, porque o Deputado Jorge Strecht é, além de mais, autor da lei que temos em vigor. Portanto, foi neste sentido do seu entendimento que se facilitou e que se tem vindo a facilitar a possibilidade de os cônjuges que não querem estar casados poderem entrar num processo de divórcio. Sr. Deputado, também existe na lei a possibilidade de dissolver o casamento sem ser com base na culpa de qualquer dos cônjuges, e mesmo com base na violação culposa dos deveres conjugais. Nós hoje temos a possibilidade de os cônjuges dissolverem o seu casamento, após um período de separação de facto. Esta é a verdade! Sr.ª Deputada, se me ouviu com atenção, também terá percebido que o Partido Socialista está disponível para impor um limite mais baixo a esse percurso de tempo para a separação de facto. Pode ser dois anos, pode ser um ano, estamos abertos a pensar sobre isso! Mas a verdade também é que as alegações que VV. Ex.as fazem relativamente à dificuldade de o cônju17 DE MAIO DE 2007 43 ge que quer o divórcio se ausentar de sua casa e fazer decorrer esse percurso de separação de facto — sejamos verdadeiros — não são resolvidas com o projecto de lei que VV. Ex.as apresentam aqui.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, diz o preâmbulo do projecto de lei que hoje discutimos que «Cada criança que nasce não tem apenas valor para os pais. Representa também um importante valor social, garante a continuação da própria sociedade. Por isso, cabe ao Estado assegurar o apoio à criança que vai nascer, à mãe durante a gravidez e o parto, e aos pais na criação das condições sociais e humanas para a criança que decidem ter». A Constituição da República estabelece, no seu artigo 68.º, que «a maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes» e que os pais e as mães têm direito à protecção social da sociedade e do Estado. Contudo, a realidade tem demonstrado que muito falta fazer para, efectivamente, atingir níveis de protecção da maternidade e paternidade adequados. Na verdade, o modelo económico vigente, a crescente desregulamentação das relações de trabalho, um Estado cada vez mais ausente levam a que a protecção da maternidade e paternidade seja hoje claramente insuficiente. A título de exemplo, veja-se o papel do actual Governo e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ao aprovar um aumento do período de licença maternidade e paternidade, mas sem que este seja pago na sua totalidade, impossibilitando quem menos pode e menos tem do exercício de um direito e infligindo, deste modo, mais uma discriminação inaceitável em matéria de protecção à maternidade. Importa sublinhar que as opções económicas deste Governo e a perversa manutenção do modelo de desenvolvimento assente em baixos salários e níveis de trabalho precário inaceitáveis provoca graves problemas sociais que também se reflectem na maternidade e paternidade. Este modelo acarreta ainda um aumento do número de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração, e que, por isso, não cumprem os requisitos previstos na lei para acederem ao subsídio de maternidade e paternidade, e o aumento do número de mulheres à procura do primeiro emprego ou em situação de desemprego, sem direito ao subsídio de desemprego graças as alterações recentemente introduzidas pelo Governo do Partido Socialista. Por outro lado, temos de referir a pressão existente junto das mulheres trabalhadoras para não engravidarem. Esta ilegítima e imoral pressão por parte das entidades patronais reflecte-se, muitas vezes, na hora de escolher uma trabalhadora para um determinado emprego, em que é preterida a mulher que pretenda engravidar, ou nos inúmeros casos em que os contratos não são renovados caso a mulher engravide. Assim, como sempre afirmámos, «o respeito da função social da maternidade e da paternidade implica, igualmente, a responsabilidade das entidades patronais relativamente à renovação das gerações, cumprindo os seus deveres para com os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, no exercício pleno dos seus direitos de maternidade e da paternidade. Ao Estado cabe não só uma acção de fiscalização do cumprimento das leis, mas igualmente a adopção de medidas que promovam e afirmem as suas próprias responsabilidades na protecção desta importante função social». Todas estas condicionantes, bem como os baixos salários — sempre mais baixos no caso das mulheres —, o desinvestimento numa rede pública de jardins de infância adequada e a preços acessíveis, os cada vez mais elevados custos da educação, da saúde e o já avançado caminho na sua privatização, são, entre outros, entraves a uma maternidade e paternidade que devia ser protegida e apoiada. Todas estas condicionantes levam a que os portugueses não tenham os filhos que querem mas, sim, os filhos que podem ter. Curioso é assistir à utilização, por parte do Governo, de argumentos de natureza demográfica, a utilização do envelhecimento da população e do aumento da esperança média de vida para justificar cortes nos direitos e retrocessos sociais — veja-se toda a discussão em torno do aumento da idade da reforma —, mas já não se utiliza esta argumentação para melhorar os níveis de protecção da maternidade e paternidade. O projecto de lei do Partido Comunista Português que hoje discutimos visa aprofundar os mecanismos de protecção do direito a uma maternidade livre, consciente e responsável e de protecção da função social da maternidade e da paternidade. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O presente diploma cria o subsídio social de maternidade e paternidade. Este subsídio visa garantir a protecção social nas situações de gravidez, maternidade e paternidade para os cidadãos nacionais, estrangeiros e apátridas residentes em território nacional que, actualmente, não usufruem de qualquer protecção na maternidade e paternidade. Assim, o projecto de lei do PCP propõe que seja criado um subsídio social, integrado no subsistema de solidariedade do sistema público de segurança social, que seja atribuído à mãe quando esta não exerça qualquer actividade laboral, não seja titular de prestações de protecção na eventualidade de desemprego e não seja titular de rendimento social de inserção. Esta prestação pode ser atribuída ao pai da criança quando, além das condições referidas, se verifique a incapacidade física ou psíquica da mãe e nos casos da morte desta. Cria-se, por esta via, um subsídio social para aquelas situações em que actualmente não existe nenhum esquema de protecção da maternidade e paternidade. O PCP propõe que se equipare o valor do subsídio social ao da pensão social, garantindo-se a sua atribuição por 120 dias, que cessará em caso de início de exercício de actividade laboral. Esta prestação marcará a diferença para as famílias vítimas do desemprego de longa duração, em que deixaram de receber o subsídio de desemprego, para as mães adolescentes que ainda não iniciaram qualquer actividade profissional e para os jovens trabalhadores que hoje trabalham em situações de precariedade laboral tão injusta como inaceitável. Estas situações não encontram qualquer protecção, pelo que é urgente corrigir esta grave lacuna. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei que hoje o Partido Comunista Português apresenta à discussão não é um diploma isolado nas questões da protecção da maternidade e paternidade. Além da defesa pelo integral respeito dos direitos dos trabalhadores e o respectivo exercício dos direitos da maternidade e paternidade, apresentámos propostas, nesta Legislatura, para o pagamento integral do subsídio de maternidade e paternidade, caso optem pela licença de 150 dias. Apresentámos um projecto de resolução que aponta um conjunto de medidas para reforçar a protecção da maternidade e paternidade. Apresentámos um projecto de lei que altera o actual regime de prestações familiares, congregando num só diploma as prestações existentes, retomando o subsídio de nascimento e a universalidade do abono de família. O diploma que hoje discutimos não resolve todos os problemas que dizem respeito à maternidade e paternidade, não é esse o seu objectivo. Este projecto de lei do PCP vem resolver um problema grave. E as vozes que, aquando da campanha do referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, exigiam a protecção da maternidade e paternidade, têm aqui o mais cabal exemplo da efectivação dessa protecção: a exigência de que o Estado assuma as suas responsabilidades. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os direitos de maternidade e paternidade bem como o seu reforço são um imperativo. Não se consegue alterar o declínio do número de nascimentos mantendo esta política que, dia após dia, agrava as condições de vida dos trabalhadores e das trabalhadoras. É preciso mudar de rumo, valorizar o salário mínimo, garantir uma rede pública de infantários e creches de qualidade; é preciso garantir a educação universal, gratuita e de qualidade, a saúde pública e gratuita; é prede; é preciso garantir a educação universal, gratuita e de qualidade, a saúde pública e gratuita; é preciso reforçar os meios de protecção da maternidade e paternidade. O que hoje se propõe às Sr.as e Srs. Deputados é tão somente a atribuição do subsídio de maternidade e paternidade àquelas famílias que não têm nenhuma fonte de rendimento. É, portanto, uma medida da mais elementar justiça social. Chegou, pois, o momento de abandonar a discussão retórica e passar à prática.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como todos sabemos, a família é uma das unidades base da sociedade, cabendo ao Estado promover a melhoria da qualidade de vida dos seus membros e proteger os direitos das crianças e das mulheres. Portugal enfrenta os desafios demográficos que se colocam à maioria dos países europeus, nomeadamente a diversidade das situações familiares, a diminuição da natalidade e o envelhecimento da população. Por isso, é fundamental que a criação de apoios à família como garante da coesão social e da solidariedade entre gerações se desenvolva numa parceria com os diversos agentes sociais. Num país como o nosso, onde existem bolsas de pobreza persistentes e factores acrescidos de exclusão, abandono escolar, desemprego, imigração, a maternidade protege-se com políticas sociais consistentes. Aliás, quem tenha convivido com esta problemática sabe que não é só a pobreza mas também o abandono a que a mãe é sujeita durante a gravidez que empurra a mulher para o aborto. Mulheres com fracos recursos mas com uma rede que as acompanhe ultrapassam uma gravidez, mesmo que imprevista. Por outro lado, mulheres com recursos, mas sozinhas, sem apoios afectivo e psicológico, também elas sofrendo de idêntico abandono, são tomadas por um sentimento de medo e um instinto de rejeição. Há, pois, que criar uma rede de aconselhamento que tenha como competências expressas dar informação, apurar da situação socioeconómica e laboral da mulher com o apoio dos serviços competentes da saúde e da segurança social — centros estes que deveriam passar a existir em todos os distritos do País —; aumentar o apoio às instituições que apoiam mães e filhas em situações precárias; estimular a criação e o desenvolvimento dos centros de apoio à vida, com o objectivo de apoiar mães grávidas com dificuldades económicas e financeiras (eventualmente, passar este aumento de 50% para 70% ou 80%) A todas as mães adolescentes ou em particulares dificuldades e cujos filhos necessitem de uma protecção especial, o Governo deveria dar novas respostas. Por outro lado, às mães muito jovens devem ser garantidas condições que lhes permitam continuar a estudar, nomeadamente no que respeita a horários e à frequência pelos filhos de creches e jardins de infância. As práticas de apoio activo à família têm de ser a regra nas empresas, e é preciso dizer claramente que não o são neste momento. Esta não é uma responsabilidade que caiba primordialmente ao Estado, ainda que este deva incentivar as boas práticas neste domínio. O PSD defende que se cumpra toda a legislação que está em vigor, ou seja: um amplo acesso ao planeamento familiar, a protecção da maternidade e da paternidade, passando o instituto da adopção a ser, cada vez mais, um instrumento de capital importância que pode contribuir para a resolução harmoniosa de muitos problemas. Impõe-se igualmente alargar a cobertura em termos de consultas de planeamento familiar e saúde materna a grupos particularmente vulneráveis, como os adolescentes e os imigrantes, e, ainda, apostar na educação para a saúde. Se o Estado cumprir toda a legislação que já existe nesta matéria, nomeadamente os destinatários do rendimento social de inserção, que foi instituído pela Lei n.º 13/2003, de 21 de Maio, que estabelece que os seus destinatários são todos aqueles indivíduos e famílias que se encontram numa situação grave de carência económica e, ainda, que para serem titulares do direito ao rendimento social de inserção, os indivíduos têm que ter idade igual ou superior a 18 anos, ou inferior, se tiverem menores na sua dependência ou no caso de mulheres grávidas, se tudo isto for cumprido, repito, os artigo 53.º e 57.º da Lei n.º 32/2002 não necessitam de ser alterados como hoje está a ser proposto pelo projecto de lei do Partido Comunista.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, a Câmara analisa hoje um projecto que visa a criação do subsídio social de maternidade e paternidade. A defesa da família é um direito fundamental, desde logo consagrado no n.º 3 do artigo 16.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, onde se lhe atribui o papel de elemento natural e fundamental da sociedade, merecendo a protecção desta e do Estado. Também a Constituição estabelece princípios de protecção da família no seu artigo 67.º e especificamente da maternidade e paternidade no artigo 68.º. Por isso mesmo, saudamos a iniciativa do Partido Comunista. Bem-vindos ao arco daqueles partidos que, intransigentemente, sempre lutaram, dentro e fora desta Câmara, pela defesa da família em todas as suas componentes. Foi, aliás, por iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS que várias vezes foram discutidos, neste Plenário, projectos de lei de bases da família, que tinham como objectivo criar um compromisso programático no desenvolvimento dos princípios consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Constituição. Infelizmente, o processo legislativo nunca foi concluído, facto ao qual não é indiferente — algumas vezes — a oposição do PCP, mas, acima de tudo — muitas vezes —, a oposição da bancada do Partido Socialista, que hoje apoia o Governo. É mesmo de assinalar o facto de quem agora aparece com iniciativas desgarradas nunca ter apresentado um projecto global de lei de bases da família que estabelecesse um apoio e uma protecção da família como célula fundamental da nossa sociedade, até com apoios que vão muito para além dos que são, única e exclusivamente, as prestações pecuniárias do Estado. No século XXI, merecia Portugal, mereciam os portugueses que houvesse um enquadramento global, uma lei de bases da família que definisse muito bem quais são os apoios e os incentivos que devem caber ao Estado. É por isso que digo que muitos dos que hoje, da bancada da maioria, ainda falarão sobre a família deviam pôr a mão na consciência e recordar o que fizeram, neste Plenário, no passado. É um facto que o CDS sempre teve um papel importante na defesa e consagração de soluções políticas que acolhessem a protecção da família. Nos últimos tempos, quer nesta Câmara quer quando exercemos funções governativas, há a destacar, desde logo, o alargamento do período de licença de maternidade de 90 para 120 dias e, depois, de 120 dias para 150 dias, neste caso sem que houvesse um acréscimo de remuneração, a gozar pela mulher e pela família;… Mas acha mal, Sr.ª Deputada?! Se acha mal que a licença de maternidade tenha aumentado de 120 dias para 150 dias proponha a sua redução de novo para 120 dias! Não venha é criticar uma medida com a qual, pelos vistos, a Sr. Deputada concorda! Como dizia antes de ser interrompido, Sr. Presidente, outra das soluções consagradas foi a obrigatoriedade de a licença de maternidade ser gozada logo após o parto (também esta uma medida proposta e aceite pelo CDS); ou, por exemplo, a justificação de faltas, trimestralmente, para que os pais possam acompanhar a vida escolar dos filhos; ou ainda (algo de que nos orgulhamos muito) a instituição dos centros de apoio à vida e das casas de acolhimento, matéria tão importante quando se fala destas prestações e destes apoios, mas que foi retirada, aquando da discussão da Lei de Bases da Segurança Social, por iniciativa do Partido Socialista (no caso dos centros de apoio à vida e do mecenato para a vida). Assistimos, chocados, à retirada, na Lei de Bases da Segurança Social, do apoio a estas instituições, tão importantes no apoio às mulheres, muitas delas adolescentes, que estão grávidas e que querem ter os seus filhos. Fica claro, Sr. Presidente, que mesmo em tempo de grandes restrições orçamentais, o CDS sempre priorizou o apoio à família, nomeadamente a defesa da maternidade e da paternidade. Com o projecto de lei ora em discussão, o PCP propõe a criação de um subsídio social de maternidade e paternidade para os casos de quem não exerce qualquer actividade profissional. Em termos genéricos, propõe-se a atribuição, por um período de 120 dias, de um subsídio de valor equivalente ao da pensão social a quem não aufira rendimentos de trabalho nem beneficie de subsídio de desemprego ou de rendimento social de inserção. Ora, se, à cabeça, esta ideia parece ser generosa, não podemos esquecer que o articulado do projecto de lei do PCP ignora quaisquer outros rendimentos que o agregado familiar possa auferir, o que é, óbvia e manifestamente, injusto. Para que seja possível atribuir, com justiça, uma prestação social deste tipo é essencial avaliar os rendimentos de todo o tipo auferidos pelo eventual beneficiário — e, obviamente, não podemos excluir aqui os rendimentos do seu agregado familiar. Seria chocante uma situação em que beneficiasse desta prestação alguém que, não tendo rendimentos de trabalho, não recebendo subsídio de desemprego nem rendimento social de inserção, tivesse outro tipo de rendimentos, como, por exemplo, rendimentos patrimoniais avultados, rendimentos muito avultados provenientes de rendas ou, já agora, rendimentos provenientes da Bolsa, que o PCP tantas vezes questiona e tantas vezes põe em cheque! Ou quando esses rendimentos não sejam da eventual beneficiária mas, sim, do seu marido ou companheiro. Por esta razão, é absolutamente essencial avaliar os rendimentos de todo o agregado familiar e não apenas do eventual beneficiário para que, também por esta via, não se esteja a dar um apoio a quem dele não carece. Por isso mesmo também, e porque estamos a falar de uma prestação social, é importante que se diga que, a partir destes princípios de justiça e progressividade, faria todo o sentido que esta prestação, a ser criada, não fosse universal. Conhecemos a posição do Partido Comunista Português relativamente à universalidade das prestações familiares: para o PCP não é possível introduzir progressividade nas prestações familiares. Porém, a verdade é que todas as prestações sociais têm de ser orientadas para dar mais a quem tem menos e até, em última análise, para não dar a quem não precisa. Ora, muitas vezes, a esquerda desta Câmara entende que as prestações sociais têm de chegar de igual forma a todos, não percebendo que quando se quer dar tudo a todos dá-se quase nada a cada um. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, por isso mesmo, com todas estas restrições, obviamente esta medida terá um efeito prático muito reduzido, como aliás já aqui foi hoje dito. Efectivamente, é muito reduzido o universo de pessoas a quem esta medida se dirige. Aliás, é curioso que o partido proponente nem sequer elenque o universo de pessoas a quem se dirige esta medida. Mesmo assim, neste projecto de lei, que é relativamente reduzido, falta um conjunto de matérias que, à cabeça, considero essenciais. Obviamente, como sempre que falamos de uma prestação social, é essencial que exista um grau de exigência e fiscalização por parte de quem tem de atribuir essas prestações sociais. Por exemplo, falta também a matéria que ainda há pouco referi, isto é, deverem ser englobados todos os rendimentos do agregado familiar; falta contemplar uma prova da manutenção dos requisitos para que esta prestação possa ser atribuída; falta uma inscrição obrigatória, por parte do beneficiário, no rendimento social de inserção, porque pode dar-se o caso de o beneficiário nem sequer estar inscrito; falta igualmente, no caso de suspensão desta prestação, referir que o titular passa a receber um benefício quer de rendimento social de inserção quer de subsídio de desemprego. Por isso mesmo, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, esta ideia é, à cabeça, uma ideia generosa, mas já está subsumida noutras prestações de apoio público e que tem, no seu seio, um conjunto de carências muito grandes e muito graves. A licença de maternidade passou de 90 para 120 dias! Acha mal?! Infelizmente, o Partido Socialista continua a não aceitar rever o Código do Trabalho! O Bloco de Esquerda também está contra o aumento para 150 dias de licença?! Desde o princípio que o Partido Socialista se tem recusado, por várias vezes, a rever a discriminação inaceitável que tem a ver com a redução do valor do subsídio a quem opte por uma licença de 150 dias. Isto é discriminatório! Significa que as mulheres que ganham o salário mínimo ou que têm maiores dificuldades na sua família — sublinho «na sua família» — optam por não gozar toda a licença, indo trabalhar mais cedo. Ora, é preciso mudar esta situação. Por outro lado, do nosso ponto de vista, os direitos da maternidade e da paternidade necessitam, inclusivamente, de ser actualizados e deveriam ser fiscalizados na sua aplicação. É preciso falarmos do aumento do tempo da licença de maternidade e de paternidade. É preciso falar do direito a acompanhar os filhos em situação de doença, que está a ser alterado, mas também nas actividades escolares e nas outras. É necessário alargarmos plenamente o reconhecimento destes direitos às situações de união de facto. É preciso olhar para a situação das mães adolescentes — espero que esta Assembleia, em breve, discuta as propostas do Bloco de Esquerda sobre esta matéria — numa perspectiva dos seus direitos, incluindo o não abandono escolar ou mesmo o regresso à escola. Também em todos estes aspectos necessitamos de uma política pública consistente no apoio à maternidade e à paternidade. Justifica-se, portanto, e sem prejuízo de novos aprofundamentos destes direitos, a atribuição do subsídio social de maternidade e de paternidade que hoje o PCP nos propõe através deste projecto de lei. É preciso não confundir o que este subsídio social significará e o que ele trará de benefício para um conjunto alargado da população que não tem este direito e que também não recebe todos os outros subsídios. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não posso deixar de me dirigir à bancada do CDS-PP, que é um partido que «anda sempre com a família na boca», mas que, quando se trata da defesa dos mais pobres, não hesita na perseguição, que é vossa característica. Os senhores não percebem! A vossa direita não consegue perceber a diferença entre as medidas e os direitos que visam a autonomia das pessoas e uma mera política assistencialista aos pobrezinhos!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A maternidade e a paternidade são, de facto, valores sociais eminentes, mas não são valores sociais abstractos. A estes valores estão e devem estar associados direitos sociais para o exercício pleno dessa mesma maternidade e paternidade. As mulheres continuam a ser penalizadas devido à maternidade. Porém, isto nada tem a ver com o seu direito de decidir quantos filhos querem ter, quando os querem ter, qual o espaço de tempo entre eles. Essa é outra discussão e que, felizmente, ficou praticamente resolvida no dia 11 de Fevereiro. As mulheres continuam a ser penalizadas devido à maternidade no acesso ao emprego, na progressão na carreira profissional, na exclusão de muitos direitos no próprio emprego. E os direitos da paternidade — sublinho «da paternidade» —, embora reconhecidos, ainda estão muito longe de serem assumidos. Ora, esse constitui também um caminho que é preciso percorrer. O Código do Trabalho mantém uma discriminação inaceitável! E, Sr. Deputado Mota Soares, trata-se do seu Código do Trabalho, da autoria de um ministro do seu partido: Bagão Félix! Infelizmente, o Partido Socialista continua a não aceitar rever o Código do Trabalho! Desde o princípio que o Partido Socialista se tem recusado, por várias vezes, a rever a discriminação inaceitável que tem a ver com a redução do valor do subsídio a quem opte por uma licença de 150 dias. Isto é discriminatório! Significa que as mulheres que ganham o salário mínimo ou que têm maiores dificuldades na sua família — sublinho «na sua família» — optam por não gozar toda a licença, indo trabalhar mais cedo. Ora, é preciso mudar esta situação. Por outro lado, do nosso ponto de vista, os direitos da maternidade e da paternidade necessitam, inclusivamente, de ser actualizados e deveriam ser fiscalizados na sua aplicação. É preciso falarmos do aumento do tempo da licença de maternidade e de paternidade. É preciso falar do direito a acompanhar os filhos em situação de doença, que está a ser alterado, mas também nas actividades escolares e nas outras. É necessário alargarmos plenamente o reconhecimento destes direitos às situações de união de facto. É preciso olhar para a situação das mães adolescentes — espero que esta Assembleia, em breve, discuta as propostas do Bloco de Esquerda sobre esta matéria — numa perspectiva dos seus direitos, incluindo o não abandono escolar ou mesmo o regresso à escola. Também em todos estes aspectos necessitamos de uma política pública consistente no apoio à maternidade e à paternidade. Justifica-se, portanto, e sem prejuízo de novos aprofundamentos destes direitos, a atribuição do subsídio social de maternidade e de paternidade que hoje o PCP nos propõe através deste projecto de lei. É preciso não confundir o que este subsídio social significará e o que ele trará de benefício para um conjunto alargado da população que não tem este direito e que também não recebe todos os outros subsídios. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não posso deixar de me dirigir à bancada do CDS-PP, que é um partido que «anda sempre com a família na boca», mas que, quando se trata da defesa dos mais pobres, não hesita na perseguição, que é vossa característica. Os senhores não percebem! A vossa direita não consegue perceber a diferença entre as medidas e os direitos que visam a autonomia das pessoas e uma mera política assistencialista aos pobrezinhos!
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, penso que este debate tem alguns aspectos muito interessantes. O debate é sobre apoios muito concretos à maternidade. Falamos de discriminação, porque a licença de maternidade não é igual para todas as mulheres, e falamos da criação de um instrumento de apoio à maternidade. Contudo, o Partido Socialista responde enumerando as resoluções em que está dito que, sim senhor, somos a favor da promoção da maternidade e falando da conciliação entre a vida familiar e a vida privada! Já chega, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas! Não é isso que estamos a discutir! Não estamos a discutir os princípios e os valores generalistas que regem a nossa actividade. Estamos a falar de questões muito concretas! Os senhores dizem que não sabemos qual é o grupo social de falamos? Que é reduzido o número de mães em causa? Bom, se fosse reduzido até seria melhor, pois resolveríamos o problema sem que houvesse grandes encargos. Mas como é que julgam que a nossa sociedade está dividida? Entre quem tem trabalho e quem recebe rendimento social de inserção?! Lamento, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, mas há muita gente pelo meio que, não tendo direito a este rendimento, enfrenta sérias dificuldades. Ou será que estamos também a ignorar o reflexo do desemprego feminino nesta questão? E não estaremos a ignorar as mães adolescentes que não têm meios? Não o podemos fazer! Reafirmo que falamos de coisas muito concretas que era possível alterar, de discriminações que, lamentavelmente, o Partido Socialista ainda não quis desfazer ao fim de quase dois anos e meio de Governo e não de princípios generalistas!
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Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, começo por agradecer a questão que me colocou. Penso, contudo, que o principal erro da iniciativa que hoje nos traz aqui é, claramente — e permita-me que use este termo —, a falta de rigor que preside à forma da sua atribuição. Eu não duvido do sentido de justiça social que o PCP colocou no texto, nem duvido, sequer, do grau de intencionalidade que tem ao eventualmente dirigir esta medida a uma franja de mulheres que, não estando estatisticamente localizadas, existirão. Mas a falta de rigor que existe sintetiza-se na lógica da iniciativa, que colide com a própria lei de bases da segurança social. Não tenho dúvida alguma de que, se essa falta de rigor for reconduzida, poderemos voltar a reflectir sobre estas mesmas matérias neste Plenário. Todavia, a questão que me coloca, sobre a justiça da medida, está naturalmente subordinada a esta dimensão do rigor, porque a justiça social, tendo em conta os seus destinatários, tem de ter rigor.
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Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, que o CDS tenha dado muitas voltas à procura de uma justificação para não votar favoravelmente este projecto não me surpreende. De facto, chegando à política de classe, o CDS toma claramente o seu partido e, portanto, o discurso da família cai redondo. Contudo, é curioso que o Partido Socialista, no meio da discussão de uma iniciativa que lhe pergunto se considera justa ou não, tenha encontrado apenas um nicho, uma pequena percentagem de mulheres a quem esta situação se pode aplicar. Sr.ª Deputada, a generalidade das mulheres a quem este diploma se destina não faz parte de famílias ricas. Não é esse o objectivo da iniciativa! Para mais, a Sr.ª Deputada sabe muito bem que, mesmo que suceda o que descreveu, essa será sempre uma situação muito residual. De todo o modo, penso que isso não vos pode servir de desculpa, porque a justiça social também se faz por via fiscal. Todavia, se é esse o problema, aprovem esta iniciativa na generalidade e discutimos na especialidade os mecanismos destinados a melhorá-la. O que não podem é utilizar esta desculpa. Quanto aos estudos de que falou, queria dizer-lhe que esta é uma reivindicação do movimento sindical. Aliás, basta olhar para a realidade para percebermos que há hoje mulheres que não recebem subsídio de desemprego por causa das alterações que os senhores introduziram a este mecanismo, que não recebem rendimento social de inserção e que não têm qualquer protecção na maternidade. Ora, são estas situações que queremos acautelar com esta iniciativa. Pergunto-lhe se tem coragem de dizer que esta não é uma reivindicação justa das mulheres. Não venha, contudo, repetir o vosso discurso da agenda e do planeamento das medidas do Governo. Como eu disse na intervenção, é chegado o momento de abandonar a retórica e de passar às questões práticas. E, no que a estas respeita, lembro que o Partido Socialista mantém uma rede social cuja parcela pública é de apenas 1,9%. Há, portanto, muito caminho para percorrer e muito para fazer. Como tal, o que lhe pergunto é o seguinte: tendo em conta este esclarecimento, a Sr.ª Deputada pensa que esta é uma iniciativa justa ou não? Por muito rigor que introduzamos nas coisas, vocês votam sempre contra! Eu não duvido do sentido de justiça social que o PCP colocou no texto, nem duvido, sequer, do grau de intencionalidade que tem ao eventualmente dirigir esta medida a uma franja de mulheres que, não estando estatisticamente localizadas, existirão. Mas a falta de rigor que existe sintetiza-se na lógica da iniciativa, que colide com a própria lei de bases da segurança social. Não tenho dúvida alguma de que, se essa falta de rigor for reconduzida, poderemos voltar a reflectir sobre estas mesmas matérias neste Plenário. Todavia, a questão que me coloca, sobre a justiça da medida, está naturalmente subordinada a esta dimensão do rigor, porque a justiça social, tendo em conta os seus destinatários, tem de ter rigor.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal é cada vez mais um país multilingue. Um em cada dez alunos não tem como língua materna o português. Em 2004, um estudo do Ministério da Educação registou 58 línguas diferentes nas 410 escolas inquiridas. Dessas línguas, o crioulo de Cabo-Verde, o guzerate, o mandarim e o ucraniano correspondem a 50% do conjunto das crianças e jovens que não têm o português como língua materna, sobretudo na zona da Grande Lisboa. A modernização do ensino para garantir a sua qualidade exige, portanto, uma resposta ao problema do multilinguismo nas escolas. E é nas escolas que essa resposta deve ser dada. O projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje submete a esta Assembleia representa uma estratégia para a integração de todos os estudantes na escola portuguesa, em coerência, aliás, com o que foi recomendado pelo Parlamento Europeu. Essa estratégia tem como primeiro pilar a aprendizagem da língua portuguesa, que é e deve ser a língua de trabalho predominante e fundamental. Todos os estudantes nas escolas portuguesas devem conhecer correctamente o português, e o Bloco de Esquerda só lamenta o facilitismo, a incompetência, a invenção de padrões desajustados e a desorientação que, muitas vezes, tem percorrido as orientações para o ensino do português, mudando programas ao sabor dos governos e diminuindo a exigência. A proficiência na língua portuguesa é determinante para o sucesso de todos e, por maioria de razão, para os que chegam. Ainda este ano foi publicado um despacho normativo que determina um esforço significativo na assunção do português como língua segunda. O Bloco de Esquerda só pode saudar este esforço assumido pelas escolas. Ao mesmo tempo, nas escolas está a desenvolver-se o inglês, que é a língua de comunicação mais universal, e esse esforço, sempre que for competente, só pode merecer o aplauso de todos. É necessário, então, acrescentar novas formas de aprendizagem que utilizem igualmente a língua materna dos estudantes, quando se trate de comunidades em grande número? A recomendação do Parlamento Europeu é a de que sim, sendo essa também a nossa resposta. É necessário e é urgente porque é a forma de promover a qualificação dos estudantes e de dar-lhes a oportunidade e a responsabilidade de aprenderem; é necessário porque a língua materna é uma forma essencial de construção da pessoa e da sua comunicação quotidiana: em casa e no bairro, é na língua materna que as crianças e os jovens filhos de imigrantes comunicam e é com ela que também se fazem pessoas. A escola não pode ser um lugar estranho nem, muito menos, hostil, porque assim dificultaria o sucesso escolar e aumentaria o abandono. Pelo contrário, é necessária a comunhão estreita entre as línguas maternas das crianças e dos jovens e a língua do país de acolhimento, o português, como língua de escolarização. Esta é uma questão central para a próxima geração na sociedade portuguesa. E, simplesmente, é tempo de criar as condições para este desafio — desafio que começa nas escolas. As experiências de ensino bilingue nos Estados Unidos, na Alemanha, no Canadá ou na França, onde a aprendizagem da língua materna é um direito reconhecido aos filhos de imigrantes no 1.° ciclo, são bons exemplos, exemplos que não podemos recusar. Vejam, Sr.as e Srs. Deputados, o que se passa em França, onde nas escolas com, pelo menos, 25% de alunos portugueses ou filhos de portugueses algumas aulas são leccionadas em português; ou em Hamburgo, na Alemanha, onde um professor de português e outro de alemão estão presentes na sala de aula das crianças do 1.º ciclo. Aplaudimos essa iniciativa em nome dos portugueses que vivem no estrangeiro e pedimos o mesmo para os estrangeiros que vivem entre nós — o que é bom para uns é bom para outros, e o que faz falta é a mesma política. Recusar aos imigrantes em Portugal o que queremos para os portugueses que emigram seria prova, Sr.as e Srs. Deputados, de racismo, o que é absolutamente inaceitável! Aliás, há boas razões, baseadas no sucesso da experiência, para promover o ensino apoiado do português e da língua materna de comunidades mais numerosas. É o que se está a fazer em Portugal em alguns jardins de infância, com experiências extraordinariamente positivas. Em particular nos primeiros anos de escolarização, as crianças que não compreendem o português, ou o fazem com muitas dificuldades, devem ser apoiadas por um professor da sua língua materna e por um professor de português. Propomos que se vá mais longe do que nestes primeiros anos de escolaridade, isto é, que, em contextos que o justifiquem, ou seja naqueles onde uma determinada comunidade imigrante tiver forte expressão, as turmas bilingues possam ser criadas noutros níveis de ensino para além do 1.º ciclo, tornando possível que se possa leccionar também uma ou mais disciplinas em língua parceira, ou que esta seja opção de segunda ou terceira língua, ou mesmo opção não curricular. Estas são as escolhas abertas pelo projecto de lei do Bloco de Esquerda, que assume, claramente, a multi e interculturalidade no desenvolvimento das crianças, dos jovens e da sociedade em geral, a valorização da cultura das crianças e jovens filhos de imigrantes, os direitos de língua como direitos linguísticos destas crianças; que reconhece a escola pública como o espaço por excelência onde estes direitos devem ser consagrados; que assinala o ensino pré-escolar como o nível onde o ensino multilingue deve ser largamente apoiado e que o estende a outros níveis de ensino; que não esquece os adultos imigrantes, prevendo que as escolas assegurem o ensino do português aos imigrantes adultos em horário póslaboral ou fins-de-semana; que valoriza a aprendizagem do português como ferramenta essencial para o sucesso escolar dos alunos; e que defende a autonomia e responsabilidade das escolas pela educação multicultural, através do projecto educativo e de outras portas que são abertas, como o tratamento das questões multiculturais nas áreas curriculares não disciplinares e o investimento nas tutorias. Este projecto de lei não obriga nenhuma escola a nada. Dá-lhes, sim, a possibilidade de escolher, de fazer as escolhas. Cabe ao Ministério da Educação a aferição da razoabilidade destas escolhas e à União Europeia o desafio de articular uma rede de escolas multilingues, tal como foi consagrado na resolução que o Parlamento Europeu aprovou em Outubro de 2005. Sr.as e Srs. Deputados: A questão essencial que aqui trazemos é esta — o bilinguismo é uma necessidade no contexto multilingue, em particular para as crianças com maior dificuldade com o português e com a adaptação ao meio escolar, ou para aquelas que têm mais factores de risco para o abandono escolar. Os estudos sobre indivíduos bilingues demonstram que, ao contrário do que se pensou durante muito tempo, o bilinguismo é um apoio importante ao desenvolvimento intelectual e psicológico do indivíduo. Como defende Isabel Aires de Matos, o ensino bilingue faz falta às crianças, «de maneira a serem acompanhadas durante os primeiros anos de escolaridade, deixando, assim, de estar abandonadas, para que anos mais tarde a sociedade não venha a ser vítima do gueto para onde a escola as atirou». O estudo Diversidade Linguística na Escola Portuguesa afirma que «Quando se verifica a existência de um contexto multilingue em situação formal de ensino, devem criar-se condições para que os falantes comuniquem entre si sem perderem a sua identidade linguística e cultural». Rui Marques, Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, no prefácio da obra de Dulce Pereira, Crescer Bilingue, escreve que «Num contexto de construção de uma sociedade intercultural, a defesa do bilinguismo tem todo o sentido e representa uma expressão concreta de respeito pela diversidade. Proporciona a cada uma destas crianças, descendente de imigrantes, a possibilidade de, simultaneamente, se sentir com um lugar pleno na sociedade de acolhimento e de manter o vínculo às origens.» Pretende-se, assim, sublinhar a igualdade dos direitos educativos e o reconhecimento dos direitos de língua que assistem a todas crianças e jovens, criando melhores condições para o sucesso escolar e favorecendo a integração das segundas e terceiras gerações de imigrantes. O ensino multilingue é parte das escolhas da democracia e da modernidade, porque, voltando a Dulce Pereira e à experiência de ensino bilingue nos jardins-de-infância do bairro 6 de Maio e Marvila 3 e às razões com que justifica o registo desta experiência na obra Crescer Bilingue: «a realidade deste projecto foi boa. Enleou-nos de prazeres inesperados, vislumbres de compreensão, certezas de mudança, sensações de bem-estar em crianças e adultos… Deixemos, pois, dela memórias, percursos e ideias (…) transportes para outros voos e golpes de asa, para um pouco mais de azul.» Com «um pouco mais de azul» podemos melhorar o nosso sistema educativo e responder a alguns dos seus problemas. Sabemos que esses problemas estão a crescer e vão crescer no futuro imediato — é preciso que as soluções cresçam também. Este é o desafio que aqui trazemos.
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Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, Sr. Deputado Miguel Tiago, quero agradecer-vos o reconhecimento que fizeram de que a proposta que hoje aqui apresentamos merece reflexão e aprofundamento, merece um debate sério, muito mais sério do que foi aqui assumido nesta Assembleia. Nem o PSD nem o CDS-PP leram o «relatório Portas», o que é extraordinário. Ou se leram, não perceberam. E, para além de não terem lido o «relatório Portas», não leram o projecto de lei do Bloco de Esquerda. Não leram! Não leu, Sr. Deputado. Não percebeu. Ou não pode sequer perceber, e essa é a questão fundamental. É que a questão fundamental é que aquilo que serve para os filhos dos emigrantes portugueses não serve, pelos vistos, para os outros! Esta é que é a questão, para a qual os senhores não têm resposta! Para os senhores, imigrantes, pelos vistos — e foi o que depreendi da intervenção do Sr. Deputado Emídio Guerreiro —, são os europeus, os europeus brancos, Sr. Deputado. Portanto, foi essa a leitura, enviesada, que o senhor fez do «relatório Portas», sendo essa a questão determinante na vossa leitura. Depois, há erros de interpretação que são de um primarismo gritante. A proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda abre várias portas, e os senhores sabem-no. A língua parceira pode ser língua segunda, língua terceira, pode ser uma opção extracurricular, e as turmas bilingues adaptam-se a contextos onde uma comunidade imigrante tem uma expressão significativa ou maioritária. Este é o contexto da adopção desta estratégia, que é uma opção das escolas, que respeita a autonomia das escolas e que envolve os pais no processo. Mas os senhores «estão-se completamente nas tintas» para isso! Não vos interessa fazer a discussão de fundo. Além disso, Sr.ª Deputada Paula Barros, tenho a dizer-lhe que o presidente do agrupamento que ontem visitámos — que, não sei se sabe, tem 85% de imigrantes, 75% dos quais são crianças e jovens oriundos dos PALOP — manifestou-se favorável à introdução de turmas bilingues no 1.º ciclo. É, pois, preciso gerir toda a informação para conseguirmos falar com alguma seriedade destas matérias. Efectivamente, os Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas perderam uma oportunidade de discutir uma questão fundamental para o futuro. Este é o desafio que falta fazer! Trata-se do futuro das segundas e terceiras gerações de imigrantes. Repito, é um desafio fundamental e é um desafio da modernidade, a que os senhores se recusaram. Os Srs. Deputados invocaram o português. É evidente que o português é a língua da escolarização. Mas com o nosso projecto de lei esse aspecto não está minimamente comprometido! Nem um pouco! O que está comprometido é um passado que, por exemplo, no programa de língua portuguesa para o ensino secundário fez «esfumar» Gil Vicente. Isto é que é não saber o que se quer com a língua portuguesa! Não está em discussão a língua segunda e o esforço que foi feito do português como língua segunda. Se querem discutir com alguma seriedade, pensem efectivamente no que fizeram com os programas do ensino secundário e por que é que fizeram «esfumar» Gil Vicente ou Fernão Lopes! A Sr.ª Deputada Paula Barros há pouco falou de um «dedo acusatório», mas «dedo acusatório» é aquilo que o Partido Socialista aqui nos está a deixar perante uma discussão que deveria ser profunda e séria. O dedo acusatório que é feito é um dedo acusatório para o futuro, que aponta para estas crianças e estes jovens a quem estão a recusar os direitos de língua como direitos fundamentais e a quem estão a recusar que a escola pública tenha uma palavra essencial no reconhecimento e valorização das línguas de origem como línguas de construção das pessoas. As Sr.as e os Srs. Deputados sabem disto perfeitamente. São línguas do quotidiano. E o que os senhores dizem a estas crianças e a estes jovens é que eles não têm direito. Eles não têm direito! Foi o que os senhores disseram dessas bancadas! Não têm direito! Isso não lhes interessa! E as segundas e terceiras gerações de imigrantes, o futuro deste País não vos interessa, porque a vossa leitura é que imigrantes, pelos vistos, são só alguns. E aquilo que querem para os filhos dos portugueses para os outros não serve,
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A fixação em Portugal de diversas comunidades imigrantes constitui, sem sombra de dúvida, uma importante mais-valia económica e cultural para o País. O acolhimento destas comunidades e a garantia dos seus direitos deve ser constante preocupação do Estado. Da convivência multicultural e multiétnica, as populações criam novos ambientes culturais e sociais, ambientes mais ricos e capazes de garantir a permeabilidade entre as diferentes comunidades e etnias. Por isso mesmo, o Estado deve também contribuir para a preservação das culturas, num regime de troca e permuta e no sentido do seu mútuo enriquecimento. O Estado deve, sem dúvida, criar os mecanismos de apoio e de estímulo que propiciem este ambiente. O projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje apresenta traz-nos a identificação de um problema e de uma insuficiência reais. A dissolução da variedade cultural e a constante tentativa da sua absorção e formatação nos padrões da cultura portuguesa, onde tem tido papel importante o sistema de ensino, deve ser combatida. De facto, suprimir as línguas estrangeiras nas escolas portuguesas não contribui para uma verdadeira integração, mas para uma gradual diluição que, como sabemos, dará origem a graves problemas sociais, entre os quais o insucesso e o abandono escolares e, em última análise, a segregação social. No entanto, a forma como o projecto de lei sugere agir sobre o problema correctamente identificado parece ainda pouco fundamentada em experiência factual. Ministrar aulas em línguas distintas, de forma simultânea, apresentando a virtude de proporcionar a todos o contacto com uma língua que não a sua, não nos parece, no entanto, a ideia mais ajustada à realidade das escolas e do universo estudantil que se pretende atingir. O essencial do projecto de lei, contudo, constitui uma abordagem positiva e sugere passos para a melhoria de uma situação que carece de acção política. O apoio efectivo a acções escolares que visem a integração e a promoção da tolerância e da convivência multicultural; o apoio ao ensino da língua portuguesa a imigrantes e a estudantes que não a tenham como língua materna; a possibilidade de aprender línguas maternas que não o português como segunda língua estrangeira e a formação de docentes no sentido do enriquecimento das suas capacidades para ensinar num ambiente multicultural são passos importantes que merecem o apoio do PCP. No entanto, experiências mais avançadas, como as aulas bilingues e a forma como estas são ou devem vir a ser feitas, parecem carecer de maior experiência e capacidade de avaliação objectivas. São significativas as dúvidas que surgem em torno dessa medida concreta e da forma como seria levada a cabo. Contudo, embora a solução possa não receber o nosso aplauso, convergimos no sentido de adoptar criativamente formas de integração real e de valorização das línguas como expressões culturais de inestimável valor cuja preservação é fundamental. A integração dos imigrantes ou dos seus descendentes deve ser uma prioridade do sistema educativo e as próprias orientações do projecto de lei podem servir de base para esse trabalho, nomeadamente no que toca à criação de medidas de apoio a iniciativas escolares de valorização de culturas estrangeiras. É um caminho seguro e capaz de fornecer a experiência pedagógica num registo mais gradual e capaz de ser avaliado. Apoiamos a criação de um programa de estímulo à iniciativa escolar no sentido da promoção da tolerância e multiculturalidade e, embora não consideremos criadas as condições para uma aplicação plena deste projecto de lei em toda a sua amplitude, daremos o nosso contributo para a sua discussão na especialidade em sede de comissão.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos anos, Portugal transformou-se também num país de imigração. Com a chegada de muitas dezenas de milhares de cidadãos estrangeiros a Portugal, o nosso país passou a conhecer o outro lado do fenómeno das migrações. De país com quase 5 000 000 de emigrantes espalhados por 121 países de todo o mundo, passou igualmente a país com cerca de 500 000 imigrantes legais, que actualmente representam já quase 10% da nossa população activa e 5% da nossa população residente, oriundos de mais de 150 países de todo o mundo. Os desafios para a integração destes cidadãos estrangeiros são incomensuráveis. Nos últimos anos, sobretudo por acção dos XV e XVI Governos Constitucionais, pôs-se em prática uma verdadeira política de imigração com vectores-chave de actuação muito claros. Entre outras medidas, foram criados o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, o Observatório da Imigração, dois Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante, 50 Centros Locais de Apoio ao Imigrante, a Linha SOS Imigrante, o programa «Escolhas 2.ª Geração» e um Gabinete de Apoio ao Reconhecimento de Habilitações e Competências, além de muitos outros instrumentos de concertação de uma política de imigração assente não só no pilar da segurança interna mas também no pilar do acolhimento e integração. Recordo que, ainda recentemente, no debate na nova lei da imigração, os Ministros António Costa e Silva Pereira reconheceram a importância destes instrumentos. O PSD, em matérias de integração, tem um trajecto com provas dadas e está permanentemente disponível para, de forma clara e segura, dar mais e mais passos que, efectiva e objectivamente, promovam a integração dos imigrantes no seio da nossa sociedade. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estudos recentes atestam que, até ao ensino secundário, temos uma população estudantil que fala cerca de 230 línguas maternas diferenciadas. Assim, as necessidades de concretização de políticas na área da educação e formação direccionadas para esta população devem ser bem ponderadas e devem efectivamente promover a integração. O projecto de lei que debatemos, partindo de matérias importantes que merecem uma reflexão positiva por todos nós, é, contudo, redutor e suscita a nossa rejeição nalgumas soluções. É verdade que invoca o «relatório Portas», mas este tinha uma amplitude e uma abrangência completamente diferentes das que agora nos são apresentadas. Tendo por base um relatório que visa aplicar-se a uma realidade de populações imigrantes extra-União Europeia, o BE exemplifica com o case study de uma experiência realizada em Hamburgo com cidadãos da União Europeia, no caso crianças portuguesas. O relatório aponta diversos caminhos, referindo-se ao apoio por parte da União aos projectos educativos que, «para lá das suas obrigações curriculares, ensinem a língua e a cultura do país de acolhimento aos imigrantes que não estejam em idade escolar», bem como aos que construam pontes de diálogo entre a cultura e a história da região em que se inserem e a cultura e a história das comunidades de imigração. Frisa ainda o mesmo relatório que devem ser tidos em conta, nomeadamente, os projectos que associam as pessoas a quem cabe o exercício do poder paternal, em especial as mães. O relatório, ao qual este projecto de lei foi beber apenas uma das suas exortações, incentiva o patrocínio da União Europeia à constituição de uma rede europeia de escolas que espontaneamente desejem concretizar projectos educativos e comunitários que respondam às necessidades de aprendizagem, socialização e cultura referidas, sem esquecer o princípio da subsidiariedade. O relatório afirma ainda que «a integração dos imigrantes na escola não se deve processar em detrimento do desenvolvimento da língua veicular do sistema educativo, especialmente se esta língua se encontra em situação minoritária», o que contrasta claramente com as turmas multilingues com dois professores e «um terço» de alunos de língua materna portuguesa, que o Bloco de Esquerda propõe no seu projecto! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD rejeita o caminho que o Bloco de Esquerda hoje nos propõe. Mais importante e decisivo do que este projecto de lei teria sido o voto favorável do Bloco de Esquerda, em Março de 2006, ao projecto de resolução que então apresentámos, que propunha a criação de um programa denominado “+ Inclusão”. As medidas que então apresentámos visavam o reforço da integração dos imigrantes, com a criação, em cada escola ou agrupamento de escolas, de equipas multidisciplinares de apoio especializado, compostas por professores, assistentes sociais, sociólogos e psicólogos, que interviriam em articulação com todos os parceiros institucionais e também com as comunidades imigrantes. Foi este tipo de intervenção global, mobilizadora e potenciadora de uma verdadeira integração que o Bloco de Esquerda então rejeitou. Não é com a criação de quotas de portugueses nas salas de aulas que se promoverá a integração. Esta nunca se fará por decreto ou por lei. É pelo reforço da autonomia das escolas que estas poderão, se assim o desejarem, reforçar os projectos multiculturais que já existem. É com mais autonomia e com o envolvimento das comunidades na definição dos diferentes projectos educativos que as escolas promoverão a integração dos jovens imigrantes. Para isso é necessário que este Governo, e também o Bloco de Esquerda, abandonem o modelo centralista de gestão das escolas e dos seus recursos. É preciso dotar as escolas de competências e meios, reduzindo os espartilhos de organização e gestão, para que casa e escola possam livremente definir o modelo que melhor se adapte ao reforço da integração das comunidades imigrantes. E aqui não temos dúvidas em afirmar que, antes de chegarmos ao ensino multilingue, temos de aumentar a integração pelo reforço do ensino da nossa língua nos jovens e também no restante agregado familiar e pelo reforço da interculturalidade entre as diferentes comunidades. Este é o caminho que defendemos e em que acreditamos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda, ao lançar este debate, partiu de um bom princípio para um mau projecto. Partiu de uma boa ideia para uma má concretização da mesma e, deste modo, o PSD votará contra este projecto de lei.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito rapidamente, gostaria de dar conta do seguinte: de facto, não sei o que as outras pessoas lêem ou deixam de ler, mas sei o que leio e sei aquilo que estudo. Além disso, muito sinceramente, não me incomoda muito que, em sede de debate parlamentar, se façam determinadas acusações. A última coisa que estava à espera hoje era de ser acusado de racista. Mas, sinceramente, passa-me ao lado, porque não é isso que está em causa, não é isso que eu sou, por isso passa-me ao lado. Mas, nesta matéria, em que estamos a falar de inclusão e de integração das comunidades imigrantes, não posso deixar de fazer novamente referência àquilo que já disse há pouco, ou seja, para que esta matéria seja uma coisa séria e profunda, penso que é importante relembrar que foi criado o Alto Comissariado para a Integração das Minorias Étnicas, o Observatório da Imigração, Centros de Apoio ao Imigrante, a nível nacional e a nível local, uma linha SOS, o programa Escolhas 2.ª geração, dirigido especificamente para as comunidades imigrantes, um gabinete de apoio para o reconhecimento das habilitações literárias dos imigrantes, ou seja, um conjunto de medidas que os governos que antecederam este levaram a cabo, que promovem, de forma efectiva, a integração das comunidades imigrantes. Também não posso deixar de referir que, quando discutimos aqui, em Março do ano passado, portanto há poucos meses, um projecto da autoria do PSD, não ouvi o Bloco de Esquerda manifestar-se a favor da criação das equipas multidisciplinares que, então, nós preconizávamos nas escolas e nos agrupamentos de escolas, com psicólogos, sociólogos, assistentes sociais, professores e com o envolvimento das comunidades imigrantes e dos representantes das famílias, enfim, não só dos alunos mas também das famílias. O Bloco de Esquerda votou contra. Ou seja, para o Bloco de Esquerda a inclusão e a integração faz-se por isto, faz-se pelo projecto que agora aqui trouxe. É uma coisa fantástica! Mas não posso deixar de recordar à Câmara que, numa peça televisiva, ontem à noite, ouvi o Sr. Presidente do agrupamento a falar, mas também ouvi um conjunto de alunos, um conjunto de jovens imigrantes que disseram ser muito interessante mas que, sobretudo, era preciso reforçar o português, porque para poderem ter sucesso neste País precisavam, cada vez mais, de saber português. É que, como dizia esse conjunto de jovens nessa mesma peça, nas suas casas já falam a língua materna dos seus pais e, por isso, gostariam era que a escola reforçasse o português. Foi nesse sentido que, de facto, apresentámos, anteriormente, um projecto e é esse o caminho que o PSD defende: uma inclusão e uma integração que não seja pontual e, sobretudo, que não seja residual. Aliás, é este também o sentido do «relatório Portas», contrariamente ao que acontece com o projecto que estamos hoje aqui a discutir. O que estamos hoje aqui a discutir é uma coisa muito mais pequenina e muito mais isolada.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda vem apresentar o projecto de lei n.º 201/X, que pretende introduzir o ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e ensino. Este projecto de lei é mais um dos exercícios demagógicos do Bloco de Esquerda. É sabido que, só nas escolas de Lisboa, convivem alunos que falam 17 línguas diferentes, havendo turmas onde existem alunos de mais de 10 nacionalidades e línguas diversas. Perante isto, o Bloco de Esquerda propõe que, na mesma aula e em simultâneo, se falem todas estas línguas e dialectos?! Dirão que todos não, mas apenas as línguas e dialectos daqueles que são a maioria. Mas, então, «atirase pela janela» aquilo que este diploma queria proteger: as minorias e o multiculturalismo. O respeito e a consideração que nos merecem todos os imigrantes e, muito em particular, todos aqueles que querem voluntariamente estar no nosso país, aceitando todas as condições que temos para oferecer, em igualdade de circunstâncias com os nossos nacionais, impõem que tenhamos para com eles especial atenção. Entre outras coisas, devemos ser capazes de lhes permitir a aquisição de aprendizagem e de formação para o país em que querem estar inseridos, aceitando que a inserção não é um processo de corte com a sua cultura, com a sua língua, com a sua religião ou com o seu passado. Para nós, o mais importante é que os imigrantes e seus filhos possam falar português e ter acesso ao mesmo currículo de formação dos seus colegas portugueses, em igualdade de oportunidades proporcionadas aos nacionais. No relatório do Parlamento Europeu afirma-se o seguinte: «Os filhos de imigrantes em idade escolar têm direito ao ensino público. (…) Esse direito inclui a aprendizagem da língua do país de acolhimento, sem prejuízo do direito destas crianças à aprendizagem da sua língua materna.» Quem o afirma é o Eurodeputado Miguel Portas, o relator deste documento. Este, sim, é um verdadeiro e primeiro direito com vista à integração dos imigrantes e dos seus filhos. Portugal foi e ainda é um país de emigrantes, mas tornou-se mais recentemente num país de imigrantes, que deve saber acolher. Mas é ou não verdade que todos os cidadãos residentes em Portugal devem saber falar e escrever bem português? A língua estrangeira ensinada no 1.º ciclo já pode hoje ser a língua materna do aluno. Por outro lado, já existe actualmente a possibilidade de se escolher a língua materna como segunda ou terceira língua, no caso dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e secundário. Veja-se, por exemplo, o que dispõe o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, e o que refere o currículo nacional do ensino básico, a partir da pág. 39 e seguintes. Este projecto de lei está, portanto, e nestes casos, atrasado em já vários anos. As inovações que contém são, contudo, impraticáveis. Se não, vejamos: como se pode ter, na mesma aula e em simultâneo, um professor que fala português, outro que fala crioulo, ou ucraniano, ou mandarim, ou inglês, ou francês, ou árabe?! Para mais, dirigindo-se a alunos que falam crioulo, ucraniano, mandarim, inglês, francês ou árabe, para além de português! Somos, como sempre temos demonstrado, defensores da liberdade de escolha, defenderemos sempre e contra quem quer que seja o direito de todas as minorias, mas não entendemos como se podem obrigar a alunos cuja língua materna é o português a frequentar turmas de ensino bilingue. Ora, de acordo com o artigo 4.°, n.º 3, do projecto de lei, 30% das turmas bilingues devem ser constituídas por alunos de língua materna portuguesa. Será que, havendo alunos interessados em frequentar aulas na sua língua materna, serão impedidos de o fazer por não haver alunos portugueses interessados? Deve, como já hoje é possível através da lei em vigor, o Estado possibilitar a todos os cidadãos, sejam eles nacionais ou filhos de imigrantes, o direito de escolha da língua estrangeira que querem aprender. O combate de atitudes racistas, xenófobas ou étnicas faz-se pela integração de todos, no respeito pela sua diferença e na criação de regras que possibilitem às minorias a manutenção da sua cultura, onde se inclui, obviamente, a língua. Porque o projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda em nada contribui para a melhoria da qualidade de ensino em Portugal, porque não apresenta nenhuma novidade que possa melhorar a integração dos imigrantes e porque não passa de um projecto de mera demagogia política, o CDS votará contra.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os fenómenos migratórios são quase tão antigos quanto a existência de vida. A luta pela sobrevivência determinou-os. A espécie humana não fugiu a esta regra e, portanto, desde os primórdios da história da humanidade que nos é permitido estudar fenómenos de nomadismo presididos pela necessidade de procura de melhores condições para a garantia de satisfação das necessidades mais básicas, como a da própria alimentação. Na actualidade, vivemos fenómenos de crescentes movimentos migratórios não só na busca de melhores condições de vida como também, e felizmente, como processo de opção e expressão de vontade. Em consequência, Portugal, um país com elevada percentagem de emigrantes, passou também a país de acolhimento de muitos movimentos de imigração. Por este motivo, penso não exagerar se disser que é não só responsabilidade mas também vontade e dever de todos colaborar, potenciando a criação de melhores condições de acolhimento e, acima de tudo, de inclusão dos nossos imigrantes. É com base neste pressuposto que analisamos atentamente o projecto de lei n.º 201/X, hoje apresentado pelo Bloco de Esquerda, que aponta para a introdução do ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e de ensino. Se, por um lado, encontramos neste projecto uma preocupação legítima e louvável com a inclusão da população imigrante, não podemos deixar, por outro lado, de fazer um reparo à sombra de um dedo apontado, acusador das comunidades imigrantes como responsáveis pelos fenómenos de violência e marginalidade. Não consideramos que estes fenómenos devam ser associados às minorias migrantes. Essa é uma verdadeira forma de discriminação. Entendemos que a inclusão deve ser olhada de acordo com diversas vertentes e que maiorias e minorias devem aprender a conviver saudavelmente, sem que reciprocamente se absorvam ou prejudiquem, antes se constituindo esta convivência como um processo construtivo, potenciador de oportunidades. A multiculturalidade resultante deste processo de convivência já é olhada com relativa naturalidade e respeitada. Aliás, ao nível das comunidades educativas temos, felizmente, exemplos de muito boas práticas de educação intercultural. Mas, acima de tudo, gostávamos de deixar bem expresso que entendemos que a preocupação com a inclusão dos imigrantes passa pela capacidade de lhes propiciar igualdade de oportunidades para a participação crítica e activa na nossa sociedade, que para eles funciona como de acolhimento. E não tenhamos ilusões: o domínio da língua portuguesa é de primordial importância para que o processo de inclusão se efective. É por isso que vemos com bons olhos todos os esforços que têm sido desenvolvidos no que respeita ao apoio aos alunos imigrantes na aprendizagem da língua portuguesa. Naturalmente, defendemos e apoiamos todos os projectos que versem também a aprendizagem das suas línguas maternas. A este nível, as comunidades educativas estão dotadas de autonomia para os idealizar e desenvolver no âmbito dos seus projectos educativos. E quem melhor que as próprias comunidades educativas para o fazer conscientemente e com a capacidade de resposta máxima para as situações que vivenciam em concreto? É que, a este nível, o Bloco de Esquerda faz jus à sua genética centralista e mais uma vez nos confronta com uma posição de afastamento das realidades concretas, como se existisse, unicamente, um cérebro central com capacidade para avaliar e decidir sobre as situações. Acreditamos, pois, nas boas práticas das escolas e comunidades educativas no que concerne ao respeito pela multiculturalidade e à promoção de uma educação intercultural. Revemo-nos em políticas inclusivas que visem a igualdade de oportunidades na aprendizagem da língua inglesa, como meio de comunicação fundamental para capacitar os indivíduos para um verdadeiro exercício de cidadania numa sociedade globalizada. Revemo-nos ainda em políticas que tenham por objectivo o reforço da aprendizagem da língua portuguesa por todos os que, tendo-a por língua materna, manifestam dificuldades na sua prática e por todos os demais em relação aos quais o Estado tem o dever de promover o seu domínio como verdadeiro motor de inclusão numa sociedade em que escolheram viver. Assim, o projecto de lei aqui apresentado pelo Bloco de Esquerda, para além de ser tecnicamente frágil, na medida em que não parte de um diagnóstico consistente da realidade escolar portuguesa nem aponta reais mecanismos de operacionalização das suas propostas, ainda não compactua com o nosso entendimento de inclusão como a capacidade de facilitar e de incentivar a participação de todos, em real igualdade de oportunidades, na sociedade onde se encontram inseridos. Não podem, contudo, acusar o Partido Socialista de estar isolado. Não temos de ir mais longe do que ao dia de ontem, no qual, numa visita a uma escola que se constitui como um verdadeiro exemplo de boas práticas de educação intercultural, o Sr. Deputado Francisco Louçã foi confrontado com a posição discordante do respectivo presidente do conselho executivo face ao conteúdo do projecto de lei aqui em análise. Sabemos que não podemos estar desatentos nesta matéria, mas tal passa por saber corresponder às necessidades reais que outros, em convívio directo com as situações, estão, neste momento, mais habilitados do que nós para diagnosticar, propondo soluções. Acreditemos neles e saibamos apoiálos. E, para além de não terem lido o «relatório Portas», não leram o projecto de lei do Bloco de Esquerda. Não leram! Não leu, Sr. Deputado. Não percebeu. Ou não pode sequer perceber, e essa é a questão fundamental. É que a questão fundamental é que aquilo que serve para os filhos dos emigrantes portugueses não serve, pelos vistos, para os outros! Esta é que é a questão, para a qual os senhores não têm resposta! Para os senhores, imigrantes, pelos vistos — e foi o que depreendi da intervenção do Sr. Deputado Emídio Guerreiro —, são os europeus, os europeus brancos, Sr. Deputado. Portanto, foi essa a leitura, enviesada, que o senhor fez do «relatório Portas», sendo 52 I SÉRIE — NÚMERO 32 essa a questão determinante na vossa leitura. Depois, há erros de interpretação que são de um primarismo gritante. A proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda abre várias portas, e os senhores sabem-no. A língua parceira pode ser língua segunda, língua terceira, pode ser uma opção extracurricular, e as turmas bilingues adaptam-se a contextos onde uma comunidade imigrante tem uma expressão significativa ou maioritária. Este é o contexto da adopção desta estratégia, que é uma opção das escolas, que respeita a autonomia das escolas e que envolve os pais no processo. Mas os senhores «estão-se completamente nas tintas» para isso! Não vos interessa fazer a discussão de fundo. Além disso, Sr.ª Deputada Paula Barros, tenho a dizer-lhe que o presidente do agrupamento que ontem visitámos — que, não sei se sabe, tem 85% de imigrantes, 75% dos quais são crianças e jovens oriundos dos PALOP — manifestou-se favorável à introdução de turmas bilingues no 1.º ciclo. É, pois, preciso gerir toda a informação para conseguirmos falar com alguma seriedade destas matérias. Efectivamente, os Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas perderam uma oportunidade de discutir uma questão fundamental para o futuro. Este é o desafio que falta fazer! Trata-se do futuro das segundas e terceiras gerações de imigrantes. Repito, é um desafio fundamental e é um desafio da modernidade, a que os senhores se recusaram. Os Srs. Deputados invocaram o português. É evidente que o português é a língua da escolarização. Mas com o nosso projecto de lei esse aspecto não está minimamente comprometido! Nem um pouco! O que está comprometido é um passado que, por exemplo, no programa de língua portuguesa para o ensino secundário fez «esfumar» Gil Vicente. Isto é que é não saber o que se quer com a língua portuguesa! Não está em discussão a língua segunda e o esforço que foi feito do português como língua segunda. Se querem discutir com alguma seriedade, pensem efectivamente no que fizeram com os programas do ensino secundário e por que é que fizeram «esfumar» Gil Vicente ou Fernão Lopes! A Sr.ª Deputada Paula Barros há pouco falou de um «dedo acusatório», mas «dedo acusatório» é aquilo que o Partido Socialista aqui nos está a deixar perante uma discussão que deveria ser profunda e séria. O dedo acusatório que é feito é um dedo acusatório para o futuro, que aponta para estas crianças e estes jovens a quem estão a recusar os direitos de língua como direitos fundamentais e a quem estão a recusar que a escola pública tenha uma palavra essencial no reconhecimento e valorização das línguas de origem como línguas de construção das pessoas. As Sr.as e os Srs. Deputados sabem disto perfeitamente. São línguas do quotidiano. E o que os senhores dizem a estas crianças e a estes jovens é que eles não têm direito.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Partido Ecologista «Os Verdes» acompanha, em geral, as preocupações expressas na exposição de motivos do projecto de lei n.º 201/X, do Bloco de Esquerda. Hoje, a escola portuguesa, como a nossa sociedade, é cada vez mais plural, diversificada, cosmopolita e composta por pessoas das mais diferentes proveniências, trazendo consigo a sua história, cultura e, em muitos casos, a sua língua. Esta realidade, criada também pelos muitos imigrantes que trabalham no nosso país, contribuindo para o seu crescimento, desenvolvimento e riqueza, veio tornar ainda mais clara uma realidade de sempre – cada aluno é uma pessoa individual, com características individuais, à qual a escola pública (que se quer cada vez mais inclusiva, democrática e igualitária) tem o dever e a responsabilidade de procurar dar resposta, indo ao seu encontro, estabelecendo a comunicação, o contacto e a efectiva transmissão de conteúdos e da vontade de aprender. No caso dos alunos portadores de outra língua materna, esta necessidade é ainda mais premente, o que resultou claro da exposição de motivos do projecto de lei do Bloco de Esquerda. Por outro lado, a necessidade de dar resposta aos filhos de imigrantes, quer estejam em situação de legalidade ou não, é fundamental, pelo que gostaríamos de realçar essa preocupação no projecto de lei do Bloco de Esquerda. Em nosso entender, este projecto de lei encerra questões profundamente positivas, que merecem, por isso, a nossa aprovação. Refiro-me, por exemplo, à necessidade de reforçar os meios na escola pública para dar resposta a estas populações portadoras de uma língua materna diferenciada. Há questões profundamente positivas, que merecem por isso a nossa aprovação, designadamente pela necessidade de reforçar os meios na escola pública para dar resposta as estas populações portadoras de uma língua materna diferenciada. Contudo, há questões de pormenor e de aplicação prática que nos parece ser fundamental analisar em sede de especialidade, que são as questões que se prendem com aspectos pedagógicos e de aplicação prática à realidade das escolas portuguesas, das quais dependerá a sua efectivação e a obtenção de resultados positivos. É fundamental estudar tudo isto na especialidade e para isso estamos disponíveis. E, para além de não terem lido o «relatório Portas», não leram o projecto de lei do Bloco de Esquerda. Não leram! Não leu, Sr. Deputado. Não percebeu. Ou não pode sequer perceber, e essa é a questão fundamental. É que a questão fundamental é que aquilo que serve para os filhos dos emigrantes portugueses não serve, pelos vistos, para os outros! Esta é que é a questão, para a qual os senhores não têm resposta! Para os senhores, imigrantes, pelos vistos — e foi o que depreendi da intervenção do Sr. Deputado Emídio Guerreiro —, são os europeus, os europeus brancos, Sr. Deputado. Portanto, foi essa a leitura, enviesada, que o senhor fez do «relatório Portas», sendo 52 I SÉRIE — NÚMERO 32 essa a questão determinante na vossa leitura. Depois, há erros de interpretação que são de um primarismo gritante. A proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda abre várias portas, e os senhores sabem-no. A língua parceira pode ser língua segunda, língua terceira, pode ser uma opção extracurricular, e as turmas bilingues adaptam-se a contextos onde uma comunidade imigrante tem uma expressão significativa ou maioritária. Este é o contexto da adopção desta estratégia, que é uma opção das escolas, que respeita a autonomia das escolas e que envolve os pais no processo. Mas os senhores «estão-se completamente nas tintas» para isso! Não vos interessa fazer a discussão de fundo. Além disso, Sr.ª Deputada Paula Barros, tenho a dizer-lhe que o presidente do agrupamento que ontem visitámos — que, não sei se sabe, tem 85% de imigrantes, 75% dos quais são crianças e jovens oriundos dos PALOP — manifestou-se favorável à introdução de turmas bilingues no 1.º ciclo. É, pois, preciso gerir toda a informação para conseguirmos falar com alguma seriedade destas matérias. Efectivamente, os Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas perderam uma oportunidade de discutir uma questão fundamental para o futuro. Este é o desafio que falta fazer! Trata-se do futuro das segundas e terceiras gerações de imigrantes. Repito, é um desafio fundamental e é um desafio da modernidade, a que os senhores se recusaram. Os Srs. Deputados invocaram o português. É evidente que o português é a língua da escolarização. Mas com o nosso projecto de lei esse aspecto não está minimamente comprometido! Nem um pouco! O que está comprometido é um passado que, por exemplo, no programa de língua portuguesa para o ensino secundário fez «esfumar» Gil Vicente. Isto é que é não saber o que se quer com a língua portuguesa! Não está em discussão a língua segunda e o esforço que foi feito do português como língua segunda. Se querem discutir com alguma seriedade, pensem efectivamente no que fizeram com os programas do ensino secundário e por que é que fizeram «esfumar» Gil Vicente ou Fernão Lopes! A Sr.ª Deputada Paula Barros há pouco falou de um «dedo acusatório», mas «dedo acusatório» é aquilo que o Partido Socialista aqui nos está a deixar perante uma discussão que deveria ser profunda e séria. O dedo acusatório que é feito é um dedo acusatório para o futuro, que aponta para estas crianças e estes jovens a quem estão a recusar os direitos de língua como direitos fundamentais e a quem estão a recusar que a escola pública tenha uma palavra essencial no reconhecimento e valorização das línguas de origem como línguas de construção das pessoas. As Sr.as e os Srs. Deputados sabem disto perfeitamente. São línguas do quotidiano. E o que os senhores dizem a estas crianças e a estes jovens é que eles não têm direito.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas deixar três registos simples sobre o debate que aqui tivemos. A divergência entre o Bloco de Esquerda e, em particular, as bancadas da direita, e presumo que também a bancada do Partido Socialista, incide em três questões. Em primeiro lugar, na avaliação das experiências concretas com emigrantes portugueses em França e na Alemanha. A utilização do argumento que aqui é apresentado pela direita e pelo Partido Socialista exclui por completo o sucesso extraordinário com as crianças portuguesas em França, onde aprendem em francês, como têm de aprender, e também português, o que é útil para a sua aprendizagem escolar. Na Alemanha acontece o mesmo. Mas o que é bom para os portugueses em França é péssimo e impossível para os angolanos ou para os cabo-verdianos em Portugal… Nem pensar…! Abrenúncio Satanás…! Nunca tal pode acontecer…! Em segundo lugar, temos a experiência concreta. Diz o Deputado do PSD: «Fizemos muito!», «Alto Comissariado!». É verdade! Devia ouvir o que diz o Alto Comissário, Rui Marques, sobre esta matéria, porque ele defende exactamente este projecto, a partir da experiência de ensino bilingue que já há no ensino pré-primário e até no 1.º ciclo em Portugal. Além disso, é extraordinário, porque estamos a introduzir uma segunda língua no ensino em Portugal, que é o inglês. Há aulas na universidade que já só são dadas em inglês e é natural que, nos outros níveis de ensino, se ensine cada vez mais o inglês. Só aplaudimos isso! Mas já não podemos aceitar que, para outras crianças, em particular de comunidades que têm maiores dificuldades de escolarização, não haja a possibilidade de maximizar a sua introdução no sistema escolar, como se faz noutros países. Inclusive com as crianças portuguesas, já não é possível. Mas, em último lugar, dizem os Srs. Deputados que é preciso reforçar o português. Pois claro que é! O português é a língua veicular, é a língua de base do sistema. Todos os estudantes têm de saber muitíssimo bem o português, porque é em português que vão fazer os testes e que vão ser avaliados. O que nós queremos é criar um sistema que ajude a percepção do português e de todas as matérias. Mas temos de lembrar ao Governo do Partido Socialista que ninguém fez pior ao ensino do português do que os Governos dos últimos anos. Quem é que inventou a terminologia de aplicação no ensino secundário, senão o CDS e o PSD?! Quem é que inventou a terminologia para o ensino secundário, com o substantivo canino com quatro patas e outros?!… Quem é que o fez, senão o CDS e o PSD quando estiveram no Governo?! Lembram-se de alguma coisa pior que tenha sido feita à competência do ensino do português do que a vossa passagem pela educação?! Lembram-se?! Tirar o Gil Vicente, como foi lembrado, ou impedir que Luís de Camões seja aprendido pela grande maioria dos estudantes no ensino secundário?! Querem falar-nos do reforço do português, depois de um currículo e de uma habilitação lamentáveis dos Governos de direita em relação ao português?! O português tem é de se defender dos Governos de direita e, por isso mesmo, promover a capacitação das escolas, que é o objectivo deste projecto, respondendo à diversidade que hoje têm os grupos destas escolas, exige olhar para a experiência. E talvez fosse bom pensar nas recomendações do Alto Comissário e segui-las. Se assim fosse, este projecto seria aprovado por unanimidade. … que não pactua com os princípios da tolerância que constantemente aqui invocam, em todos os projectos que, sucessivamente, vão apresentando. Mas gostava também de saber de que forma é que consideram sério invocar exemplos de outros países onde não existe a prática daquilo que aqui propõem. Em França, não há prática de ensino de turmas bilingues! Para além do mais, consideram sério deturpar aquilo que é dito pelos outros Deputados, quando aquilo que propõem é exactamente o reforço da língua portuguesa?! Sim! Consideramos que isso é fundamental para o processo de inclusão. A inclusão só se efectiva com o reforço da língua portuguesa. Mas isto não obsta a que as comunidades educativas optem também por incluir, nas actividades de enriquecimento, as línguas maternas dos alunos de comunidades imigrantes que estejam presentes nessas comunidades educativas. Lembro mais uma questão: com certeza, também não consideram séria a aprovação que foi feita, por esta Assembleia, da Lei da Nacionalidade, que marcou, definitivamente, uma conquista de direitos por parte dos nossos imigrantes. Isto é sério, isto é trabalhar em prol da inclusão dos nossos imigrantes! Aos olhos da bancada do PS, o projecto que o Bloco de Esquerda aqui apresenta não parece que sirva a necessidade de falar de um conceito mais lato e mais importante, e que não pode ser confundido com multiculturalismo, que é o conceito de integração dos próprios migrantes em Portugal. Neste debate, e é esta a segunda nota que quero deixar, confundiram-se muito os conceitos, e também não é sério «falar, porque fica bonito», falar de inclusão, de integração e de multiculturalismo,… O que é isso do «não é sério»?!
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito rapidamente, no final deste debate, gostaria de salientar aqui três pontos que me parecem essenciais. O primeiro ponto é o de que estamos a falar de imigração e de comunidades migrantes em Portugal e creio que não é sério, nem para este Parlamento, nem para o exterior, nem para as comunidades migrantes, que se trate o ensino bilingue como se fosse uma «grande conquista», ainda por cima — e digo isto com todo o respeito pelos Srs. Deputados subscritores — nos termos em que o projecto de lei aqui apresenta. Aos olhos da bancada do PS, o projecto que o Bloco de Esquerda aqui apresenta não parece que sirva a necessidade de falar de um conceito mais lato e mais importante, e que não pode ser confundido com multiculturalismo, que é o conceito de integração dos próprios migrantes em Portugal. Neste debate, e é esta a segunda nota que quero deixar, confundiram-se muito os conceitos, e também não é sério «falar, porque fica bonito», falar de inclusão, de integração e de multiculturalismo, que são três questões diferentes, são três questões que exigem uma conceptualização como deve ser. E mais, Sr. Deputado Francisco Louçã: tenho muito respeito por si, mas o Sr. Deputado e a Sr.ª Deputada Cecília Honório quiseram aqui insultar todos os Deputados. E, portanto, não termino este debate sem dizer também ao Sr. Deputado que para nós, Partido Socialista, e depois das várias… Ó Sr. Deputado Francisco Louçã, como me conhece, sabe perfeitamente que se há princípio por que zelo, aqui, é o da tolerância, o do respeito e o da democracia e, sobretudo, da tolerância entre todos nós e pela opinião de todos nós! Mas os senhores não podem arrogar-se o direito de dizer que todos nós faltámos com seriedade política a este debate e que os senhores são os únicos que chegam aqui com a seriedade total! Portanto, o que quero dizer-lhe, Sr. Deputado, é que quando estamos a falar da integração e da verdadeira inclusão das comunidades migrantes em Portugal, estamos a falar do reforço necessário da língua portuguesa e do seu ensino a estas comunidades. Por isso mesmo, Sr. Deputado Francisco Louçã e Sr.ª Deputada Cecília Honório, é preciso dizer que as experiências que existem de ensino bilingue, quer na Alemanha quer em França, são experiências extracurriculares; o ensino bilingue não é obrigatório, não está no currículo, são experiências para ajudar de uma outra forma à integração. Aquilo que nós aqui defendemos, e temos defendido ao longo dos tempos, é que a língua portuguesa deva ser o factor mobilizador de inclusão destas comunidades migrantes em Portugal. Não estamos apenas a falar dos filhos dos migrantes; estamos a falar das comunidades migrantes no seu todo e, por isso mesmo, Sr. Deputado Francisco Louçã, «estamos a introduzir o inglês»!! Não percebo o seu argumento, porque quanto ao ensino do inglês nós também já o introduzimos! Portanto, não percebo qual é o seu argumento na questão da integração, mas quero dizer-lhe, sobretudo, Sr. Deputado Francisco Louçã, que esta sua intervenção revela, isso, sim, que com este projecto de lei o BE está a fazer demagogia política, e não é assim que se trata a inclusão dos migrantes em Portugal!
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 26.º da Constituição da República Portuguesa, no seu n.º 1, estabelece que a todos é reconhecido o direito à identidade pessoal. Este direito traduz-se na garantia da identificação de cada pessoa, do direito ao nome, do direito à historicidade pessoal, e este último abrange o direito ao conhecimento da identidade dos progenitores. Ocorre que o limite imposto, hoje, na lei é, na perspectiva de Os Verdes, excessivo: impõe prazos curtos para propositura de acções de investigação da paternidade e da maternidade. A regra é a de que pode ser feita durante a menoridade ou nos dois primeiros anos a seguir à maioridade ou à emancipação da pessoa em causa. O que aparentemente originou a limitação do prazo para a propositura de acções de investigação da paternidade foi o combate à acção da determinação legal dos progenitores como puro instrumento de caça à herança paterna. Então, parte-se aqui do princípio de que só esta razão motiva a investigação da paternidade, o que é manifestamente excessivo. Assim, colocam Os Verdes a seguinte questão: por que é que uma pessoa há-de ficar privada de conhecer a identidade dos seus progenitores depois dessa idade? Por que é que há-de ficar privada do direito a investigar a sua paternidade ou maternidade? Não há, na perspectiva de Os Verdes, razão objectiva para isso. Gostávamos também de referir, tal como consta na nota introdutória do nosso projecto de lei e no relatório que foi feito a propósito do mesmo, que há já outros países, como a Itália, a Espanha e a Alemanha, que não têm qualquer limite à propositura destas acções. Sr. Presidente e Srs. Deputados, o projecto de lei que Os Verdes, hoje, aqui apresentam foi feito com base numa recomendação de 1999, do Sr. Provedor de Justiça, que, por considerarmos perfeitamente justa, entendemos traduzir em projecto de lei. Este projecto de lei foi apresentado nas VIII e IX Legislaturas, foi reapresentado na X Legislatura e é hoje discutido. Na VIII Legislatura, exactamente no ano 2000, foi aprovado, na generalidade. Este processo legislativo só não chegou ao fim, na medida em que caducou devido à finalização antecipada dessa Legislatura. Sr. Presidente e Srs. Deputados, embora a lei hoje já tenha erradicado — e muitíssimo bem, como é evidente! — a classificação de filhos legítimos e ilegítimos, mantém, contudo, resquícios da sua presença, e é este o caso. Qualquer pessoa, em qualquer altura da sua vida, tem direito a saber quem são os seus pais e a não ter na sua identificação «filho de pai incógnito». Por isso, Os Verdes propõem que, desde que os efeitos pretendidos sejam de natureza meramente pessoal, a acção de investigação da maternidade e da paternidade possa ser proposta a todo o tempo. É este o objectivo do nosso projecto de lei.
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… para, depois, me poder dirigir às outras bancadas, porque o CDS provou claramente que está mais preocupado com os pais que não querem reconhecer os filhos do que com os filhos que têm direito a conhecer os pais. Foi até curioso perceber a forma como o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo foi avançando argumentos que outrora tinham sido dados para inviabilização eventual deste projecto de lei, mas, ao mesmo tempo, foi desmontando os seus próprios argumentos. Foi, pois, curioso e interessante assistir à intervenção do Sr. Deputado. Relativamente às outras bancadas, que me pareceu que iam mais ou menos no mesmo sentido em termos de opinião sobre o conteúdo do projecto de lei, gostava de dizer o seguinte: posso enganar-me, mas se Os Verdes, porventura, tivessem proposto neste projecto de lei a eliminação dos prazos para investigação da paternidade também com efeitos de natureza patrimonial, algumas bancadas tinham usado e abusado do argumento da segurança jurídica. Lá vinha o argumento da segurança jurídica para, eventualmente, inviabilizar este projecto de lei! Srs. Deputados, assumimos aqui que decidimos, justamente para que este projecto de lei pudesse ter «pés», ficarmo-nos, na apresentação, na generalidade, deste projecto de lei, pela recomendação do Sr. Provedor de Justiça. Mas também quero dizer que fiquei profundamente satisfeita pelo facto de, como o projecto de lei de Os Verdes não propõe os efeitos de natureza patrimonial, todas as bancadas terem decidido salientar a importância de que esses efeitos também estivessem contemplados num projecto de lei desta natureza. E eu digo-vos, Srs. Deputados, que estamos plenamente de acordo e perfeitamente abertos para que, em sede de especialidade, todos esses efeitos sejam reconhecidos, para que não haja discriminação absolutamente nenhuma relativamente a qualquer dos filhos. No entanto, aquilo que não podemos tolerar é a discriminação que hoje a lei já contempla: aqueles que têm direito a ser filhos e aqueles que nem sequer têm o direito a reconhecerem-se como filhos. Esta discriminação é também, como disseram vários Srs. Deputados, profundamente preocupante, pelo que há que erradicá-la claramente do nosso sistema jurídico. Sr. Deputado António Montalvão Machado, este projecto de lei tem «pés» para andar, sim senhor. Vamos, então, juntos, na especialidade, pôr-lhe «cabeça», para que ele fique completo… A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … e para que, de facto, erradique esta discriminação perfeitamente intolerável. Quero só relembrar, para que também fique registado nesta Acta, que na anterior discussão deste projecto de lei nenhuma bancada votou contra, ou seja, viabilizou-se a sua discussão na especialidade, o que só não aconteceu por causa do final antecipado da legislatura. Estamos, portanto, agora, em condições de retomar este processo legislativo e de o terminar, a bem deste combate a esta discriminação concreta, cuja eliminação Os Verdes hoje propõem.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por dizer que esta discussão não é nova no Parlamento. Tal como referido, o diploma foi apresentado na VIII Legislatura e mereceu, de resto, a primeira intervenção de um Deputado do CDS, à data eleito pelo Círculo Eleitoral de Viana do Castelo, o Sr. Deputado Alves Pereira, que por razão de coerência partidária, também seguirei de perto. Basicamente, o que o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» pretende é que seja aditado um novo número ao artigo 1817.º do Código Civil, que permita que as acções de investigação da maternidade e da paternidade sejam intentadas a todo o tempo, desde que os efeitos pretendidos sejam de natureza meramente pessoal, logo não patrimonial. É uma questão que alguns juristas vêm suscitando — o próprio Provedor de Justiça, à data, o terá feito — e que no Direito Comparado também foi objecto de discussão. Essa possibilidade foi até ponderada na alteração ao Código Civil, que a reforma promovida pelo Decreto-Lei n.º 496/77 tratou. E, como em quase tudo, há argumentos contra e argumentos a favor relativamente a esta tese. Ora bem, à data dessa reforma do Código Civil o legislador optou pela manutenção de um prazo para efeito da promoção de acções de investigação da maternidade e da paternidade e, devo dizê-lo, quanto a nós bem. Argumentou-se, então, com a prova difícil e arriscada sobre a matéria da filiação em acções muito diferidas no tempo. Claro que agora se pode argumentar com a evolução tecnológica, com a possibilidade que isso nos traz. Argumentou-se também com a incerteza e a ameaça mantidas por demasiado tempo sobre um pretenso progenitor e os seus familiares e com o que isso acarretaria, um factor que não é apenas psicológico e que é também ponderado na perspectiva do legislador. Teve-se, igualmente, em conta a evidente possibilidade de a acção de investigação da maternidade ou da paternidade se poder transformar num mero instrumento de candidatura a herança, o que, diga-se também, não é uma razão meramente académica; os nossos tribunais estão cheios de exemplos desse tipo. E não é raro que uma ou outra vez profissionais do foro depararem-se com «orquestrações» difíceis, por vezes impossíveis de desmontar, na tentativa de aquisição de heranças pertencentes, por direito, a terceiros. Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta alteração, sem mexer nos efeitos patrimoniais resultantes do eventual reconhecimento filial, pretende alargar a possibilidade legal de pôr em prática o princípio constitucional que reconhece a todos o direito à identidade pessoal. Aparentemente, a ideia e o impulso são bondosos, e o CDS é um partido que tem subjacente à sua própria doutrina a defesa dos direitos do Homem e dos direitos de personalidade. Só que é bom que saibamos que, a menos que os legisladores, principalmente os juristas, tenham presente o que está em causa se esta iniciativa por aprovada, as consequências são muito difíceis de conceber, de controlar e, até, de conciliar em termos dos diferentes diplomas. Vou deixar aqui algumas hipóteses. Primeira: ao não determinar um prazo para a caducidade do direito de propositura da acção, cuja contagem comece depois do conhecimento dos factos que lhe dão origem, obviamente são postos em causa os princípios da certeza e da segurança, que são os pilares de qualquer sociedade organizada. Já não se trata de poder intentar a acção a todo o tempo, mas de intentar a acção a partir do conhecimento dos factos que lhe dão origem. Segunda hipótese: tal como se encontra redigido, o projecto iria estabelecer uma diferenciação, dificilmente justificável, entre um regime de filiação com direitos patrimoniais, consubstanciados no instituto da herança, e outro regime que, independentemente dos prazos de caducidade e de prescrição, não contemplaria tais direitos. Desta forma, estabeleceria uma desigualdade que nem os princípios nem o direito podem acolher. Basicamente, estabeleceríamos a possibilidade de termos filhos e filhos mais ou menos: filhos com todos os direitos, inclusivamente os patrimoniais e o direito à herança; e os outros que, sendo-o, não poderiam herdar. Além disso, colocam-se questões de ordem prática na sua aplicação. Perguntamos: a nível registral, como é que seria registada a filiação do descendente assim comprovado? Como outro filho qualquer ou com o anátema do filho só para efeitos do nome, sem direito à herança, voltando, de novo, ao sistema de uma espécie de filhos legítimos e de filhos ilegítimos?! Será isso que o Partido Ecologista «Os Verdes» pretende? A nível da lei sucessória, todos os filhos são herdeiros legitimários. E como é que se conciliaria esta realidade, que a lei civil contempla, com a bondade aparente que o Partido Ecologista «Os Verdes» aqui nos traz? Mais: o que é que se passaria em relação aos bens existentes no estrangeiro — bens do de cujus — perante legislações que não reconhecem, na prática, a figura dos filhos para efeitos de natureza pessoal? Mais: no caso de a filiação estar reconhecida antes da partilha, a nível de habilitação de herdeiros o que é que se faria? Omitir-se-ia a existência desse filho? Esse filho havia sido comprovado, mas omitir-se-ia na habilitação de herdeiros? Ou, então, não se omitindo, dir-se-ia que é quase filho? Dir-se-ia que é filho, mas não herda? Que mecanismos concretos é que o Partido Ecologista «Os Verdes» prevê para tornar transponível este impedimento, que, quando muito, me parece de bom senso? Mais: será que é também intenção do proponente, porque no projecto de lei não se percebe — e isso é fundamental —, alterar a lei sucessória, a lei registral, a lei processual, desde logo no que respeita a inventários? Por que se não o fizerem, esta alteração é impossível, não é compatível! Srs. Deputados, nós estamos a falar do Código Civil e o Código Civil não se altera pelo aditamento de um número sem ter presente tudo o que lhe é conexo, principalmente nesta matéria. Não faz qualquer sentido! Além de mais, é uma irresponsabilidade que o legislador, nesta Casa, não devia permitir. Posso imaginar o que, no dia seguinte, diriam todos os professores, dos mais ilustres aos mais recentes, sobre a técnica legislativa, o impulso legislativo e o legislador que o País tem! E isto leva-nos a uma outra questão, a de que legislar sobre o Código Civil implica um estudo aprofundado, em que sejam previstas todas as implicações da alteração legislativa. Por exemplo, até poderia ter havido a prudência, por parte do Partido Ecologista «Os Verdes», de auscultar a opinião da Ordem dos Advogados, do Conselho Superior de Magistratura e de outros representantes de profissões judiciárias que seriam chamados a aplicar a futura lei. O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Pelo que — e com isto termino, Sr. Presidente —, independentemente da bondade do projecto de lei, deixo a seguinte sugestão: no limite, quem esteja na disposição de aprovar este projecto de lei aconselhe o Partido Ecologista «Os Verdes» a aceitar que o diploma baixe à comissão, sem votação, na comissão respectiva, far-se-ia a ponderação de todas estas consequências e, depois, logo se veria. Devo dizer que a aprovação do projecto de lei tal qual está significaria uma grande irresponsabilidade do Parlamento português.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Lemos com atenção este projecto de lei de Os Verdes e não vamos alterar significativamente a nossa opinião sobre esta matéria, dado que esta iniciativa, como já aqui foi dito, é uma repetição simples de outra já anteriormente apresentada. É claro que hoje é pacífica a orientação de que os prazos da caducidade para as acções de investigação de maternidade e de paternidade, previstos no Código Civil, são impróprios e injustificados. Outrora, no Código Civil da década de 60, eles justificavam-se, mas, se recuarmos um pouco mais, no Código de Seabra, no velho Código de Seabra, as acções de investigação de paternidade podiam propor-se a todo o tempo, mesmo depois da morte do réu! Nos idos anos 60, esses prazos do Código Civil justificavam-se. Existiam em nome da segurança jurídica dos pretensos pais e seus herdeiros, em nome do envelhecimento das provas — mas em quantas e quantas acções de investigação de paternidade intervim, como advogado, apenas com prova testemunhal, a mais falível das provas! — e, também, em nome do combate à chamada «caça das fortunas». Mas hoje, de facto, os tempos são outros. O «outro prato» da balança está mais pesado, muito mais pesado, o «prato» onde estão o direito a conhecer a minha história, o direito a conhecer a minha origem, o direito ao livre desenvolvimento da pessoa humana, o direito à identidade pessoal, o direito à integridade pessoal, no fundo, a própria dignidade humana. E, a acrescer a tudo isto, temos hoje os novos rumos da ciência, os desenvolvimentos intensos da genética, o ADN e a sua profunda infalibilidade. É por isso que todos compreendemos que o pensamento de hoje não é, não pode ser, igual ao que era nos idos anos 60. É natural! Foi há 40 anos! Eu disse que os prazos eram impróprios e injustificados, mas, além disso, também são inconstitucionais. Já o disse, por três vezes, o Tribunal Constitucional, pelo menos de acordo com o que analisei, e a doutrina di-lo. Seguramente, se estudarmos os ensinamentos de uma das vozes, quiçá, mais autorizadas, o Professor Guilherme de Oliveira, verificamos que, ele próprio, mudou de opinião de há vinte anos para cá e considera estes prazos injustos, inadequados, impróprios e, de facto, inconstitucionais. Portanto, poderia pensar-se que este projecto de lei de Os Verdes, apesar de não original, tem «pés e cabeça». Mas não: só tem «pés», não tem «cabeça»! E não tem «cabeça» porque, envergonhadamente, prevê a não caducidade — aliás, há no projecto uma grande confusão entre prescrições e caducidades mas, depois, na especialidade, a gente explica — destas acções de investigação apenas para efeitos pessoais e não para todos os efeitos legais, como se impunha, neles incluindo, evidentemente, os efeitos patrimoniais! Quer dizer, objectivamente, o projecto de Os Verdes prevê dois tipos de filhos: por um lado, os filhos que são filhos e que herdam e, por outro lado, os filhos que são filhos mas que não herdam. É uma espécie de filhos de 1.ª e de 2.ª classe! É à moda antiga, Sr. Presidente, quase como no tempo dos filhos legítimos e dos filhos ilegítimos, os chamados filhos bastardos ou, como o nosso povo dizia, por graça, «os filhos da mão esquerda». Estes que agora se pretendem criar não são «os filhos da mão esquerda», são (ou seriam) os filhos criados por aquela esquerda, mas que não vão ser criados porque aprovar este diploma assim seria da maior insensatez. Era mesmo o que mais faltava! Não me interpretem mal, mas estou a imaginar, numa ceia de Natal, os filhos de 1.ª classe, à direita, a comerem o lombo, a parte do bacalhau melhor, e os filhos de 2.ª classe, à esquerda, a comerem as badanas e a couve penca que sobrava!
4PSD
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… designadamente o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa. Para concluir, Sr. Presidente, somos da opinião de que o projecto de lei tem uma leitura meritória: possibilitar àqueles que procuram o conhecimento e o reconhecimento da sua identidade genética, sem daí retirar qualquer proveito, poderem fazê-lo a qualquer altura da sua vida, o que, em nossa opinião, é muito melhor do que o regime hoje em vigor.
0PS
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que hoje debatemos, da iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes», visa, na sua essência, alargar o prazo para que as pessoas que pretendem investigar a sua maternidade ou paternidade o possam fazer em qualquer momento da sua vida. Sabemos que esta questão marcou milhares de pessoas no nosso país e ainda hoje marca. O estigma do filho ou da filha de pai incógnito teve um significado muito profundo num País marcado pelo obscurantismo e pelo autoritarismo. Quantas mulheres criaram e educaram os seus filhos sem que os pais assumissem a sua responsabilidade?! Não só a responsabilidade de dar um nome ao filho mas também a plena responsabilidade inerente a ter um filho. Consideramos que esta situação ainda hoje persiste, embora em muito menor escala, felizmente. Consideramos também que não pode ser negado a pessoa alguma o direito de interpor uma acção de investigação da sua maternidade ou paternidade, por isso não nos opomos a esta alteração. Consideramos ainda que existem questões, nomeadamente algumas que o Sr. Deputado António Montalvão Machado acabou de levantar na sua intervenção, que devem merecer um debate aprofundado em sede de comissão, que poderá ser um debate bastante interessante não apenas desta questão mas também de outras questões que se vão colocar no futuro. E isto tudo, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, heranças à parte. No entanto, não podemos deixar de referir alguns aspectos que se nos afiguram de grande interesse e que têm sobretudo a ver com as mudanças que se verificam nas sociedades actuais. Hoje, outros laços, para além dos laços biológicos, assumem predominância nas relações afectivas e mesmo nas relações familiares, e este é também um dado importante para este debate. Hoje, privilegiam-se os afectos e a responsabilidade plena, aquela que não havia antigamente. Hoje, estão disponíveis técnicas de procriação medicamente assistida, que esta Assembleia aprovou, que garantem a confidencialidade dos dadores envolvidos, mas, amanhã, seremos, com certeza, confrontados com os chamados bancos de esperma, a que as mulheres poderão recorrer para concretizarem o seu desejo de serem mães. No entanto, Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de alteração ao Código Civil hoje apresentada não pode estar — e, do nosso ponto de vista, não está, queremos reafirmá-lo — em contradição com a evolução que se tem verificado e que ainda se vai verificar, por isso votaremos favoravelmente este projecto de lei.
3BE
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei tem um mérito reconhecido por todos, que é o de considerar a inconstitucionalidade do artigo 1817.º do Código Civil e de procurar encontrar uma solução legislativa que possa colmatar esse facto, que está, aliás, reconhecido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional. Essa inconstitucionalidade baseia-se, fundamentalmente, na consideração de que o direito à identidade pessoal, consagrado no artigo 26.º da Constituição, e também o direito a constituir família, consagrado no artigo 36.º da Constituição, que proíbe qualquer discriminação entre filhos nascidos na constância do casamento ou fora do casamento, tornam inconstitucional esta disposição do Código Civil, que faz depender de um prazo o direito de solicitar judicialmente o reconhecimento da paternidade e maternidade. Este é, pois, um problema com que a ordem jurídica portuguesa se confronta e que faz todo o sentido que resolva legislativamente, eliminando essa inconstitucionalidade do Código Civil. Isto porque é reconhecido que o direito à identidade pessoal previsto na Constituição implica o direito ao apuramento da paternidade, o tal direito à historicidade pessoal, de que falam os Prof. Gomes Canotilho e Vital Moreira, e não reconhecer esse direito a todo o tempo seria, de facto, violador do núcleo essencial do direito à identidade pessoal. Não faz sentido que qualquer cidadão, a partir dos 20 anos, possa ser privado do direito fundamental à identidade pessoal. Não faz qualquer sentido, e isso está hoje reconhecido. Mas também consideramos que este projecto de lei poderia e deveria ir mais longe. Ou seja, este projecto de lei teve a preocupação de ficar nos termos em que o Provedor de Justiça recomendou à Assembleia da República que se ficasse. Isso é claro e, aliás, é assumido pelos proponentes. Por isso, creio que este projecto de lei não merece alguns epítetos que lhe foram lançados, na medida em que não propõe algo que seja absurdo. Aliás, vai no sentido do que é proposto pelo Provedor de Justiça. Mas, do nosso ponto de vista, para que a inconstitucionalidade seja, de facto, eliminada, é necessário que os efeitos patrimoniais também estejam presentes. Não faz sentido, de facto, excluí-los. E os argumentos que aqui foram expendidos em legislatura anterior, quando um projecto de lei no mesmo sentido também foi debatido, de defesa de uma suposta segurança jurídica patrimonial, do nosso ponto de vista e também do ponto de vista do Tribunal Constitucional, não faz hoje qualquer sentido. Falou-se em eventuais fraudes, dizendo-se que poderia dar azo a eventuais fraudes: por exemplo, um vigarista qualquer poderia, falsamente, interpor uma acção de investigação da paternidade para procurar beneficiar de uma herança que não lhe pertencia. Srs. Deputados, isso pertence ao passado! Hoje em dia, há testes absolutamente fiáveis que impediriam fraudes dessa natureza. Já não estamos na época em que a única prova seria era a prova testemunhal. Não! Hoje em dia há testes de ADN que permitem, com grande fiabilidade, determinar se existe fraude ou não. Temos de confiar na justiça, tanto mais que a justiça tem hoje meios absolutamente fiáveis para resolver este problema com absoluta segurança. Depois, fala-se na segurança jurídica no interesse do progenitor, o que parte de uma presunção extraordinária, que é a presunção de que quem pretende investigar a sua paternidade é pobre e que o pai é rico. Ora, não é forçosamente assim! Até pode ser o contrário, ou nem uma coisa nem outra! Há o direito à identidade pessoal, que implica que alguém tenha o direito de saber quem é o seu pai e quem é a sua mãe, e esse direito pessoal não pode ser preterido em nome de uma suposta tranquilidade patrimonial, ou seja, aquilo a que o Tribunal Constitucional chama o direito a não ser considerado pai. Ora, entre o direito a não ser considerado pai, sendo-o, e o direito de um filho a querer ser reconhecido como aquilo que é, do nosso ponto de vista deve prevalecer o direito do filho sobre o direito do pai. E também não faz sentido, do nosso ponto de vista, que, havendo um reconhecimento da paternidade de alguém se diga: «não, ele é reconhecido como filho, mas isso não tem efeitos patrimoniais!» Isto é, aqueles que já estavam reconhecidos ficam e os que ainda não estavam nunca ficarão. Isso é que, de facto, do nosso ponto de vista, também é inconstitucional e, portanto, manter-se-ia a inconstitucionalidade. Portanto, quanto a nós, aquilo que está a mais neste projecto de lei tem a ver com a referência ao carácter exclusivamente pessoal, porque entendemos que, constitucionalmente, os efeitos patrimoniais têm também de ser previstos. Do nosso ponto de vista, não pode ser de outra forma. Portanto, consideramos que esse inciso está a mais no projecto de lei e deveria ser eliminado ou, então, deveremos clarificar que o reconhecimento da paternidade e da maternidade é válido para todos os efeitos pessoais e patrimoniais, porque, do nosso ponto de vista, só assim é que ele será conforme com a Constituição Portuguesa e com a nossa jurisprudência constitucional firme e mais recente, que considera que este artigo 1817.º do Código Civil viola os artigos 26.º e 36.º da Constituição e, nesse sentido, não deve continuar a vigorar na ordem jurídica portuguesa. Portanto, como é óbvio, votaremos favoravelmente este projecto de lei, considerando que, na especialidade, deve ser aperfeiçoado, por forma a que a deficiência de que ainda padece possa ser colmatada, para que possamos, de facto, aprovar legislação compatível com a Constituição Portuguesa neste ponto tão importante e sensível, como é o reconhecimento do direito de cada cidadão à sua identidade pessoal.
2PCP
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Sr. Presidente, peço a palavra. Sr. Presidente, é para defesa da honra da bancada,… A ofensa, foi esta, Sr. Presidente: dizer-se que o CDS está preocupado com a defesa dos pais que o não querem ser é para o CDS objectivamente ofensivo. Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a propósito desta ofensa, que o é verdadeiramente, por muito que custe ao PCP… O PCP tem um conceito de honra diferente do nosso, manifestamente, mas isso também não é de estranhar. Saiba, Sr.ª Deputada, que o CDS não está preocupado com quem não queira ser pai. O que o CDS não aceita é qualquer solução legislativa que determine que uns são mais filhos do que outros. Não sei se percebeu a diferença! Nós não aceitamos que o Partido Ecologista «Os Verdes» diga ao País que lhe faz sentido que alguém, sendo filho, tem menos direitos do que outro que também o é. Sr.ª Deputada, devo dizer que, para mim, o que está em causa a este propósito nem é uma situação de inconstitucionalidade, é uma situação de discriminação! E é uma situação de discriminação inacreditável da parte de quem, nessa esquerda, normalmente a invoca para tudo e para mais alguma coisa! Sr.ª Deputada, quero também dizer-lhe que não se pode sequer tratar de uma distracção de pormenor ou de circunstância, porque, Sr.ª Deputada, desde a VIII Legislatura até hoje passaram anos. E apesar de tudo isto já ter sido dito nesses tempos, ao que parece os senhores não aprenderam coisa alguma, o que é estranho, tendo em conta a natureza das matérias! Por isso, para terminar, fique a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia a saber duas outras coisas. A primeira é a de que, a esse propósito, abstivemo-nos, não votámos contra. Em segundo lugar, não somos contra a solução que propõe, desde que nela não estabeleça essa discriminação. A nuance que levantámos quanto aos prazos foi a de saber se faz ou não sentido — e essa é uma discussão que, porventura, também teremos de fazer em sede de especialidade, se o projecto for aprovado, mas espero que não seja tal qual está — que o prazo deva ser concebido a partir do conhecimento do facto. Ou seja, a partir do momento em que o pretenso filho tem conhecimento da existência daquele que será o seu pai, deve ou não começar a correr um prazo para a propositura da acção? É que isto é diferente da hipótese que concebe.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, fica provadíssimo que não ofendi o Sr. Deputado Nuno Melo, que mais uma vez abusou da figura da defesa da honra para fazer uma segunda intervenção. Sr. Deputado, não sei se ouviu a minha segunda intervenção, mas aplaudo, de pé, a questão da introdução dos efeitos de natureza patrimonial neste projecto de lei. Sr. Deputado, já não andamos nisto há pouco tempo — e tenho-o afirmado e reafirmado em relação a muitos projectos que Os Verdes têm apresentado — e não trazemos um projecto de lei trabalhado entre nós com a pretensão de que ele é a perfeição das perfeições. Se alguém tem essa pretensão, considero-a perfeitamente errada! É que o projecto de lei é normalmente o «pontapé de saída», se for aprovado, havendo depois uma discussão e um trabalho de especialidade que visa aperfeiçoar o primeiro texto que foi apresentado, com o contributo de todas as bancadas, para, depois, sair daqui uma lei «com pés e cabeça». Nós demos o «pontapé de saída», esta discussão já faz parte integrante do projecto de lei, avancemos, pois, para a discussão na especialidade, porque, pelos vistos, estamos todos de acordo relativamente à impossibilidade de manter esta discriminação na nossa lei. Estamos, portanto, em condições de terminar este processo legislativo e de promover, como o Sr. Deputado dizia, um conjunto de audições no sentido de colher algumas opiniões relativamente a esta matéria. Trabalhemos intensamente e façamos o nosso dever em relação a esta lei contra a discriminação que existe. Como disse, Os Verdes deram o «pontapé de saída», e muito bem, estamos satisfeitos com a intervenção da generalidade das bancadas e estamos prontos para «arregaçar as mangas» e começar a trabalhar neste processo.
5PEV
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O objectivo do Partido Social Democrata com a apresentação e o agendamento desta iniciativa é simples, é, creio, claro e não deixará grandes dúvidas e hesitações aos diferentes intervenientes neste processo legislativo. Assenta em princípios, também eles, muito claros e muito objectivos: os da transparência e da clareza, nomeadamente no nosso meio universitário, que, por excelência e por definição, deve ter estas mesmas características. Na verdade, no âmbito do natural processo de desenvolvimento de uma carreira académica, verificamos que os diferentes professores do nosso ensino superior, para além das provas que lhes conferem os diferentes graus académicos, prestam, igualmente, provas de agregação que lhes conferem a categoria de professor propriamente dita. A verdade é que esta prova pública de agregação tem uma particularidade que, na nossa óptica, é, hoje em dia, absolutamente injustificada, é uma particularidade que assenta na própria metodologia de avalização. Isto é, depois da avaliação natural do currículo pedagógico e científico do respectivo candidato a professor, depois da prestação de uma lição própria desta mesma agregação, a verdade é que, no momento da avaliação, se passa algo de, diria, estranho: os diferentes membros do júri depositam secretamente, numa urna para votação referente ao respectivo candidato, uma bola branca, se quiserem aprová-lo, e uma bola preta, se quiserem reprová-lo. Ora, no momento em que vivemos grandes mudanças no nosso ensino superior até à escala, diria, global ou, pelo menos, europeia; no momento em que consideramos que temos de conferir modernidade, transparência, a todos os processos que dizem respeito, nomeadamente, ao ensino superior, é, de facto, insustentável a manutenção de uma prática — diria, de uma tradição — que, hoje em dia, é absolutamente desajustada e desadequada com os novos tempos. Pretendemos — como espero que toda a Assembleia pretenda — um ensino superior aberto, moderno, competitivo. Para este efeito, temos evidentemente, também, de querer um ensino superior exigente e responsável. É por isso que o PSD propõe, hoje, a esta Câmara uma alteração, que é, de facto, pequena, que pode mesmo ser considerada pontual, mas que tem um enorme valor substantivo, por um lado, e simbólico, por outro. Tem um enorme valor substantivo, porque esta medida, que visa acabar com este secretismo, com esta opacidade na prestação de provas de agregação no âmbito da carreira académica, visa dar justiça, mais transparência, conferir mais modernidade aos processos naturais no desenvolvimento das carreiras académicas, portanto, promover a própria excelência do nosso ensino superior. Tem este valor substantivo, desde logo. Mas tem, igualmente, um valor simbólico. O que propomos é que se acabe com o tal secretismo e, nesse sentido, que as provas que visam atribuir o título de agregado sejam conferidas através de uma votação não secreta, uma votação nominal, uma votação que seja necessariamente justificada por cada um dos elementos do júri. Nesse sentido, tem valor simbólico, porque representa, na nossa óptica, uma mudança de atitude no seio do ensino superior. Se calhar, deixamos para trás uma Universidade com rituais, que, na nossa opinião, são mais próprios do século XIX, e damos um passo em frente para uma atitude diferente, uma atitude própria do século XXI. É assim, com clareza e com transparência, na nossa opinião, que podemos dar este passo em frente. Assim, o desafio que é colocado a esta Câmara pelo PSD é bastante claro: por um lado, podemos ter aqueles que defendem a cristalização, a tradição estéril por si mesma, a opacidade; por outro, aquilo que propomos é a clareza dos procedimentos nos processos, é a transparência no desenvolvimento das carreiras académicas, no fundo, na nossa opinião, é dar mais qualidade ao nosso ensino superior. É, portanto, uma proposta que, na nossa óptica, visa introduzir claramente uma melhoria no nosso sistema de ensino. É das tais propostas que trazem benefícios claros para todos aqueles que defendem a qualidade do nosso ensino e que não trazem quaisquer custos, a não ser, eventualmente, para aqueles que não estão do lado da dignificação e da qualidade do nosso ensino superior! Assim, pensamos que, se a Assembleia da República aprovar, hoje, esta iniciativa do PSD, está a cumprir bem o seu papel, o qual foi conferido a todos nós pelos portugueses. Queremos introduzir, repito, uma clara melhoria no nosso ensino superior, dando-lhe transparência e mais exigência, mas também dignificando a carreira docente e, assim, qualificando o nosso ensino superior. É o desafio que lançamos a todas as bancadas para que, com sentido de responsabilidade e de exigência, possamos dar este passo visando a qualificação do nosso ensino superior. De facto, a agregação fundamenta-se em dois diplomas do Estado Novo, um de 1970 e outro de 1972, que, entre outras coisas ruins, determinam o que o Sr. Deputado Pedro Duarte acabou de dizer, que é aquele sistema de escrutínio secreto em que os membros do júri recebem duas bolas, uma preta e uma branca, e secretamente, de acordo com as suas opções, que podem não ser científicas, põem a bola preta ou a bola branca numa urna e o candidato é aprovado ou reprovado sem saber porquê e, sobretudo, sem saber por quem. 27 DE ABRIL DE 2007 33 Ora bem, o projecto de lei do PSD, hoje em discussão, tem por único objectivo resolver esse problema. Relativamente a essa questão, não há qualquer dificuldade: achamos que esse processo deve acabar. Eu fui vítima — felizmente, só com bolas brancas — desse processo e gostaria, já agora, que essa situação deixasse de acontecer. Contudo, o problema é que existe uma história, que é preciso contar. Já a contei no relatório que apresentei à 8.ª Comissão, relatório esse que foi aprovado por unanimidade, e que apresenta algumas deficiências do vosso projecto de lei. Mas, no fundo, acho muito bem que o assunto seja discutido e está a sê-lo neste momento. Já na anterior Legislatura, 10 Deputados do Partido Socialista apresentaram um projecto de lei, que foi aprovado na generalidade, que baixou à comissão, que teve relatório e que só não foi submetido a votação final global porque, entretanto, a Assembleia foi dissolvida. O PSD, em Outubro de 2005, muito correctamente, apresentou este projecto de lei, que na altura fazia todo o sentido, ou seja, o PSD achou que se deveria acabar com o escrutínio secreto nas provas de agregação. Só que se esqueceu de que, matéria do título de agregação e das provas, há mais coisas a corrigir, para além do sistema das bolas pretas e das bolas brancas. Foi por isso que apresentámos um projecto de lei e que, já nesta Legislatura, o Governo aprovou, no passado dia 15 de Março, um decreto-lei. Achamos que isto não deve ser matéria de lei da Assembleia da República, deve ser matéria de decreto-lei.
4PSD
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que este apelo do Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte faz muito sentido, pelo que tenho uma proposta concreta a fazer à maioria socialista e a todas as bancadas. Chegámos à conclusão que estamos todos de acordo substantivamente com o que aqui está em causa. Podemos divergir sobre se deveríamos alterar este decreto-lei, aquela lei, fazer uma lei nova, portanto, na forma processual podemos divergir mas substantivamente estamos todos de acordo. O PS trouxe-nos a novidade de que há um decreto-lei a ser preparado algures próximo do Conselho de Ministros. Aprovado supostamente na generalidade, faz parte de um comunicado mas, como aqui já foi bem dito e bem visto, vale juridicamente zero, por enquanto. Portanto, a proposta é muito clara. Se estamos todos, de facto, de boa-fé, a maioria socialista aprovará, na generalidade, este projecto de lei que aqui discutimos e, depois, então, temos tempo para ver se é inútil ou não a aprovação e votação final global deste projecto de lei. Não tem nada de saber, é uma questão de boa-fé política! Se, de facto, o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte for coerente com aquilo que aqui disse hoje, a maioria socialista aprovará na generalidade esta iniciativa, poderemos, na especialidade, discutir outros acertos, nomeadamente outras sugestões que aqui bem acolhemos, e, então, veremos quais são os passos que vão ser dados pelo Governo nesta matéria. Porque a verdade é que, como já aqui foi dito, estamos há dois anos à espera que o Governo faça alguma coisa. E aqui, também como noutras áreas no âmbito do ensino superior, nada tem sido feito e continuamos todos a olhar para uma qualquer miragem, à espera que, um dia, o Sr. Ministro desça à terra com propostas concretas para que, então aí, a bancada socialista possa vergar-se perante as sugestões do Governo. Não é essa a nossa atitude, vamos desempenhar o nosso papel, vamos aprovar, na generalidade, esta iniciativa e, então, depois, pode ter a certeza de que terá a melhor das predisposições do PSD para colaborar no sentido de a melhor solução ser encontrada.
4PSD
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há bizarrias que não deveriam ser agendadas para discussão no Plenário da Assembleia da República e este projecto de lei, que foi agendado para hoje, é, não pelo conteúdo mas pelo seu processo, uma bizarria em termos de agendamento. E já vou explicar porquê. No que respeita ao título, gostaria de fazer uma correcção: não se trata de «(…) provas de agregação na carreira académica», como consta no projecto de lei. Isso está errado, uma vez que a carreira académica envolve o politécnico e a agregação só é feita na carreira universitária. Portanto, este projecto começa um pouco mal pelo título. De facto, a agregação fundamenta-se em dois diplomas do Estado Novo, um de 1970 e outro de 1972, que, entre outras coisas ruins, determinam o que o Sr. Deputado Pedro Duarte acabou de dizer, que é aquele sistema de escrutínio secreto em que os membros do júri recebem duas bolas, uma preta e uma branca, e secretamente, de acordo com as suas opções, que podem não ser científicas, põem a bola preta ou a bola branca numa urna e o candidato é aprovado ou reprovado sem saber porquê e, sobretudo, sem saber por quem. Ora bem, o projecto de lei do PSD, hoje em discussão, tem por único objectivo resolver esse problema. Relativamente a essa questão, não há qualquer dificuldade: achamos que esse processo deve acabar. Eu fui vítima — felizmente, só com bolas brancas — desse processo e gostaria, já agora, que essa situação deixasse de acontecer. Contudo, o problema é que existe uma história, que é preciso contar. Já a contei no relatório que apresentei à 8.ª Comissão, relatório esse que foi aprovado por unanimidade, e que apresenta algumas deficiências do vosso projecto de lei. Mas, no fundo, acho muito bem que o assunto seja discutido e está a sê-lo neste momento. Já na anterior Legislatura, 10 Deputados do Partido Socialista apresentaram um projecto de lei, que foi aprovado na generalidade, que baixou à comissão, que teve relatório e que só não foi submetido a votação final global porque, entretanto, a Assembleia foi dissolvida. O PSD, em Outubro de 2005, muito correctamente, apresentou este projecto de lei, que na altura fazia todo o sentido, ou seja, o PSD achou que se deveria acabar com o escrutínio secreto nas provas de agregação. Só que se esqueceu de que, matéria do título de agregação e das provas, há mais coisas a corrigir, para além do sistema das bolas pretas e das bolas brancas. Foi por isso que apresentámos um projecto de lei e que, já nesta Legislatura, o Governo aprovou, no passado dia 15 de Março, um decreto-lei. Achamos que isto não deve ser matéria de lei da Assembleia da República, deve ser matéria de decreto-lei. Os senhores apresentaram um projecto de lei, porque estão na oposição, como nós apresentámos na anterior Legislatura. Nesse momento, porque o governo da maioria de então não resolveu o problema, apresentámos um projecto de lei. Actualmente, o Governo, na reunião do Conselho de Ministros de 15 de Março, aprovou um decretolei, cujo processo normal está a decorrer — suponho que já estará na Presidência da República para promulgação. Quando foi feito o agendamento deste projecto de lei, o PSD já sabia que o decreto-lei tinha sido aprovado! O decreto-lei foi aprovado no dia 15 de Março! Portanto, este projecto de lei que quer resolver… Não, Sr. Deputado! Há um comunicado do Conselho de Ministros, que está na página do Governo, que é público, do dia 15 de Março, e o vosso representante na Conferência de Líderes sabia disso perfeitamente. Ora bem, o projecto de lei do PSD tem apenas um artigo para resolver um aspecto concreto. Acontece que, neste momento, já está aprovado um decreto-lei que não só resolve esse problema como enquadra o assunto da agregação no conjunto da reforma do sistema do ensino superior, que está neste momento a decorrer. Por isso, o projecto de lei do PSD, por muito boas intenções que tenha, é perfeitamente inútil. É-o, porque actualmente já está aprovado um decreto-lei que vai muito mais além do que o projecto de lei apresentado pelo PSD. Se o PSD queria apenas fazer isso, poderia tê-lo feito, por decreto-lei, na altura em que esteve no governo. Não o fez, e agora apresenta um projecto de lei, com todo o direito, mas que nem fica a meio do caminho, é apenas um remendo, é um «penso rápido», numa «doença» bastante prolongada que vem do período anterior ao 25 de Abril. É por estas razões, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que o Partido Socialista não vai viabilizar este projecto de lei. Seria aprovar um projecto cuja característica fundamental é a sua inutilidade. A verdade é que o mesmo não foi agendado, porque isso nos foi solicitado pelo Governo, dado que iria preparar também uma proposta sua para este efeito. A realidade é que já passaram alguns meses. Se calhar, é melhor nem os contar para não perder muito tempo…! A segunda nota que vale a pena referir relativamente à sua intervenção é a seguinte: V. Ex.ª disse, e bem, que prestou provas de agregação — e não tenho a mais pequena dúvida de que teve bolas brancas —, mas não foi na área legislativa ou, se quiser, jurídica, porque senão saberia que não tem qualquer valor jurídico uma aprovação na generalidade ou um comunicado do Conselho de Ministros. Isso é absolutamente irrelevante do ponto de vista legislativo. Não há nada publicado em Diário da República sobre esta matéria e nós somos Deputados da Assembleia da República e temos de nos guiar por esses princípios. As informações privilegiadas que um grupo parlamentar possa ter da parte do Governo não nos dizem respeito, nem devem nortear um processo legislativo na Assembleia da República, Sr. Deputado. Por isso, a minha pergunta é muito clara. Hoje, temos aqui uma proposta concreta e V. Ex.ª acabou de dizer que concorda com ela. Ela visa introduzir claramente uma melhoria, não traz prejuízos para ninguém, não tem quaisquer custos associados, só temos vantagens em aprová-la. V. Ex.ª sente-se bem no papel de recorrer a expedientes de muito duvidosa validade ou razoabilidade política, se me permite a minha opinião, que, ainda por cima, não têm qualquer valor jurídico ou legislativo?! Sente-se bem nesse papel de absoluta submissão de um órgão de soberania, como é a Assembleia da República, àquilo que é um eventual processo legislativo do Governo e que está há dois anos para surgir, em promessas?! Nós entendemos que devemos cumprir o nosso papel de acordo com a nossa consciência, independentemente daquilo com que outros órgãos de soberania queiram ou não contribuir para o mesmo processo legislativo, nos termos constitucionalmente previstos. Era esta a questão que pretendia colocar-lhe, Sr. Deputado. Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, estou de tal forma de acordo com o fim das bolas pretas e das bolas brancas nesse sistema que, eu próprio, subscrevi o projecto de lei n.º 521/IX, em que já se acabava com isso. Portanto, na altura, tivemos essa consciência, elaborámos o projecto de lei… Mas os senhores, na altura, podiam ter feito o decreto-lei para resolver o assunto e não o fizeram. Portanto, Sr. Deputado, estamos de acordo. Agora, o Sr. Deputado funciona segundo os princípios do seu grupo parlamentar, que respeito, e nós funcionamos segundo os nossos. E a informação que temos, que é pública,… Não é de submissão, e eu já dei provas suficientes de que não funciono nesses termos! Como estava a dizer, é público, foi anunciado publicamente, num comunicado do Conselho de Ministros, que o decreto-lei sobre esta matéria foi aprovado. De acordo com o sistema actualmente em vigor, depois de um diploma ser aprovado em reunião do Conselho de Ministros, entra em segredo de Estado. Também não tenho o texto, mas sei que existe, está na Presidência da República e será promulgado. Se não for, então, nesse caso, veremos outra maneira. Dir-me-á, com certeza, o Sr. Deputado como é que conciliaria uma lei da Assembleia da República que iria alterar um artigo de um decreto-lei do tempo do Estado Novo com um decreto-lei que tem exactamente o mesmo valor depois de publicado e que tem uma visão perfeitamente global e integrante do processo. Aliás, o Governo, em Maio de 2006, já tinha em cima da mesa, em discussão pública, um anteprojecto desse decretolei, que está aqui à disposição das pessoas e que já previa toda esta situação. Portanto, Sr. Deputado, respeitamos a vossa preocupação mas entendemos, pura e simplesmente, que não vale a pena estarmos a aprovar uma lei minúscula que não vem resolver nenhum problema, que funciona apenas como um «penso rápido», quando temos, de facto, um projecto global, que já está aprovado e que vai resolver não apenas esse problema mas também todos os outros que têm a ver com o título de agregado no ensino universitário.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de alertar esta Câmara para o facto de estarmos perante duas opções. Assim, ou temos um decreto do tempo do fascismo com um «penso rápido» acrescentado à pressa pela Assembleia da República, pela mão do PSD, ou — outra opção — temos um decreto global que vem colocar a agregação no contexto da grande reforma que está a ser feita do sistema do ensino superior. O que pergunto é isto: o que é que queremos? Uma emenda a um decreto do tempo do fascismo ou um decreto novo, cuja informação está publicada, que, conforme é público, foi aprovado em Conselho de Ministros e que muito em breve, depois do processo normal, será devidamente aprovado e promulgado? Fica ao critério e à consciência dos Srs. Deputados.
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Sr. Presidente, Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte, há algumas ilações que se podem tirar da sua intervenção. A primeira — e a mais óbvia — é que V. Ex.ª está inteiramente de acordo com a substância da nossa proposta. Esse é um ponto que nos agrada. Em segundo lugar, já que fez o historial de todo este processo, vale a pena dizer que o Partido Social Democrata apresentou o projecto de lei praticamente no início desta Legislatura, foi ainda em Outubro de 2005. A verdade é que o mesmo não foi agendado, porque isso nos foi solicitado pelo Governo, dado que iria preparar também uma proposta sua para este efeito. A realidade é que já passaram alguns meses. Se calhar, é melhor nem os contar para não perder muito tempo…! A segunda nota que vale a pena referir relativamente à sua intervenção é a seguinte: V. Ex.ª disse, e bem, que prestou provas de agregação — e não tenho a mais pequena dúvida de que teve bolas brancas —, mas não foi na área legislativa ou, se quiser, jurídica, porque senão saberia que não tem qualquer valor jurídico uma aprovação na generalidade ou um comunicado do Conselho de Ministros. Isso é absolutamente irrelevante do ponto de vista legislativo. Não há nada publicado em Diário da República sobre esta matéria e nós somos Deputados da Assembleia da República e temos de nos guiar por esses princípios. As informações privilegiadas que um grupo parlamentar possa ter da parte do Governo não nos dizem respeito, nem devem nortear um processo legislativo na Assembleia da República, Sr. Deputado. Por isso, a minha pergunta é muito clara. Hoje, temos aqui uma proposta concreta e V. Ex.ª acabou de dizer que concorda com ela. Ela visa introduzir claramente uma melhoria, não traz prejuízos para ninguém, não tem quaisquer custos associados, só temos vantagens em aprová-la. V. Ex.ª sente-se bem no papel de recorrer a expedientes de muito duvidosa validade ou razoabilidade política, se me permite a minha opinião, que, ainda por cima, não têm qualquer valor jurídico ou legislativo?! Sente-se bem nesse papel de absoluta submissão de um órgão de soberania, como é a Assembleia da República, àquilo que é um eventual processo legislativo do Governo e que está há dois anos para surgir, em promessas?! Nós entendemos que devemos cumprir o nosso papel de acordo com a nossa consciência, independentemente daquilo com que outros órgãos de soberania queiram ou não contribuir para o mesmo processo legislativo, nos termos constitucionalmente previstos. Era esta a questão que pretendia colocar-lhe, Sr. Deputado. Portanto, na altura, tivemos essa consciência, elaborámos o projecto de lei… Mas os senhores, na altura, podiam ter feito o decreto-lei para resolver o assunto e não o fizeram. Mas aprovámos o vosso projecto de lei! E, na altura, tínhamos a maioria! Portanto, Sr. Deputado, estamos de acordo. Agora, o Sr. Deputado funciona segundo os princípios do seu grupo parlamentar, que respeito, e nós funcionamos segundo os nossos. E a informação que temos, que é pública,…
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar esta minha intervenção concordando um pouco com algo que foi referido pelo Sr. Deputado Pedro Duarte, que nos disse que o diploma que estamos aqui a discutir parece, à primeira vista, insignificante. De facto, isso é verdade, ele parece, à primeira vista, insignificante, porque apenas toca num aspecto de natureza muito parcelar quanto àquilo que é o ensino superior público em Portugal. Porém, logo a seguir, vejo que existe alguma unanimidade em relação à crítica, quando falamos das bolas pretas e quando falamos das bolas brancas, sem qualquer desrespeito pelo nosso colega Ribeiro Cristóvão, de quem, todos nós, muito gostamos. Este, de facto, não é o método aceitável para uma universidade que quer ser contemporânea, que quer ser transparente, na qual as opções devem ser tomadas de uma forma muito clara, conforme dizem quer os candidatos que tiveram bolas pretas, quer os que tiveram bolas brancas nas suas provas de agregação. Este parece ser um aspecto evidente e por isso mesmo, independentemente de podermos considerar que é minúsculo, concordamos com a sua alteração e entendemos que esta concordância é uma questão de bom senso. Agora, já estamos um pouco cansados de esperar pelas políticas do Governo em relação ao ensino superior em Portugal, em relação, por exemplo, às regras de avaliação do ensino superior, onde não avançámos, antes, regredimos, em relação à forma de avaliar as instituições de ensino superior em Portugal, e esta, sim, é uma matéria de natureza central, esta, sim, deve ser tratada num debate em Plenário. Aquilo que acontece em Portugal, neste momento, é que mantemos um lamento muito grande em relação à extinção do CNAVES, que era uma instituição que servia muito o ensino universitário em Portugal e era composta por pessoas da maior credibilidade. Pois, em relação a isso, aquilo que o Governo decidiu foi uma extinção completamente cega e que pouco atende ao elemento essencial de avaliação do ensino superior. E se diz que nada apresentou, Sr. Deputado Fagundes Duarte, aquilo que lhe peço é que tenha um pouco de atenção e, desde logo, que vá ao site do CNAVES e veja todo o trabalho que foi feito e os pareceres que foram elaborados sobre essa matéria. A nós, já nos tinha parecido que isso, para os senhores, era igual a zero, já o haviam demonstrado, mas, com toda a sinceridade, é pena que assim seja, porque esse é que é o desafio essencial que hoje se coloca ao nosso ensino superior. Temos de ter uma avaliação que seja transparente, perceptível por todos e pública, mas continuamos com uma inexistência total a esse nível, o que em nada obsta a que o passo que o Partido Social Democrata aqui nos apresenta seja um passo de natureza positiva. É que nós não podemos continuar com um sistema de avaliação extraordinariamente exigente para aqueles que são os docentes do ensino superior — e sei daquilo que estou a falar —, que passam, em algumas fases da sua carreira, por processos que podem gerar algumas dúvidas. Continuamos à espera, aliás, daquilo que o Governo nos vai trazer, de tão inovador, em relação a essa matéria. É curioso que pudemos ouvir o Sr. Deputado Fagundes Duarte dizer «têm aí o projecto, ele vai aparecer», mas nada nos disse sobre o caminho, sobre as intenções e os objectivos quanto a esta matéria da carreira docente para o ensino superior, que é uma matéria central. Sr. Deputado Fagundes Duarte, ainda poderemos continuar a aguardar mas, muito em breve, vai ter propostas nossas em relação a esta matéria central da avaliação do ensino superior e, também aqui, marcaremos a nossa oposição ao actual Governo.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Combater os atavismos corporativos é um dos lemas da retórica do Governo e do Partido Socialista. Combater as corporações, os privilegiados… E, no entanto, este Governo demorou mais de dois anos a avançar com uma proposta de extinção de um aspecto que é absolutamente medievo, ou seja, as bolas brancas e as bolas pretas, um processo altamente tradicional, arcaico e pouco dignificante daqueles de quem se espera as melhores provas públicas e a maior transparência, quando publicitam e apresentam aquele que é o seu trabalho, o seu rigor, o seu trajecto de investigação. Portanto, o Partido Socialista perdeu, pelo menos, dois anos, se não contarmos com todos aqueles que estão para trás enquanto foi governo, para extinguir este atavismo, e diz que há um decreto-lei que enquadra algumas das grandes prioridades que correspondem a preocupações quer dos professores, como é evidente, quer do próprio movimento sindical. Tendencialmente ou potencialmente, o decreto-lei constitui júris maioritariamente externos, que é um princípio de isenção e de rigor, e, ao mesmo tempo, constitui estas provas na base da isenção de que elas carecem, de uma votação uninominal e devidamente justificada. Isto é o que, eventualmente, estará no decreto-lei de que estamos à espera. Nesse sentido, queremos estranhar, porque, desta vez e nesta matéria, o bloco central não conseguiu uma política harmoniosa. Não faz muito sentido, efectivamente, os senhores do Partido Social Democrata evocarem esta matéria com todo o calor, quando, a confiar nas palavras do Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte, há um decreto-lei que consagra alguns dos princípios que são preocupações de toda a comunidade. Apesar disto, os senhores têm razão! Os senhores têm razão! E têm razão no sentido de que existe, de facto, um vazio legal, que se prolonga desde a década de 70, que é absolutamente vergonhoso e que permite uma prática baseada no costume e, evidentemente, a arbitrariedade que aqui caracterizaram, e bem. Têm razão, neste aspecto! É vergonhoso, é indecente que provas desta natureza e com esta importância estejam subordinadas a um vazio legal! Mas têm também razão, quando defendem que o júri deve proceder a uma votação uninominal e que ela deve ser fundamentada, sem dar lugar a abstenções. Neste sentido, as vossas preocupações são, naturalmente, legítimas. É, no entanto, um pouco preocupante a interpretação que fazem do Decreto n.º 301/72. É que os senhores integram, recuperam um decreto, ao qual dão uma «bola branca», que é um decreto assinado, simplesmente, por Veiga Simão e pelo então Sr. Presidente Américo Tomás. É estranho que o façam, que o evoquem, nomeadamente, como saberão, porque o decreto em causa prevê a possibilidade de a prova de agregação não carecer, sequer, do grau de doutoramento. É por todas estas indecisões, relativamente à política de ensino superior, que o Governo e o Partido Socialista continuam, exemplarmente, a pautar toda a sua orientação. Por um lado, uma retórica contra os atavismos, contra os atrasos, em prol da modernidade e, por outro, estas práticas de desnorte, de desorientação, sem um futuro, sem uma política clara para aquilo que se espera do ensino superior em Portugal.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei do PSD que hoje discutimos identifica, no âmbito da carreira universitária, um problema cuja relevância e importância já foi aqui por demais referida e que, portanto, vou escusar-me a prolongar. Mas há, antes de mais, uma evidência que importa referir, que é a evidência de que existe, neste âmbito, um regime jurídico que não é claro e que necessita de correcções. Aliás, o próprio Partido Socialista reconhece esta evidência, ainda que tenha já afirmado a sua intenção de rejeitar a iniciativa que está em discussão. Esta evidência resulta, por um lado, do regime jurídico que temos, plasmado, antes de mais, no Decreto-Lei n.º 525/79, que não revoga, expressamente, o Decreto n.º 301/72, e numa série de outros diplomas legislativos que não contribuíram para a clarificação desta situação. O Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte já fez aqui referência ao relatório produzido e aprovado em comissão em 2005, mas valia a pena referir também que, já depois da aprovação desse relatório, entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 74/2006, que veio revogar o último dos diplomas sobre o qual incidiu aquele relatório e que, portanto, lançou, também aqui, mais uma vez, dúvidas sobre o facto de estar ou não em vigor o Decreto n.º 301/72, o que adensa as incertezas sobre qual o regime jurídico que, na prática, vigora. A verdade é que, na realidade, é o Decreto n.º 301/72 que é aplicado pelas instituições e é este Decreto que, entre outras situações menos claras e que exigem correcção, prevê uma regra de votação secreta, não fundamentada, numa situação de avaliação, o que, em nosso entender, não é, obviamente, uma regra que seja de aceitar. A iniciativa do PSD que está em discussão propõe, concretamente, duas medidas para resolver este problema: por um lado, a aplicação do regime previsto no Decreto n.º 301/72, de 14 de Agosto, que, em nosso entender, não será um regime isento de críticas e de erros mas que poderia, eventualmente, numa apreciação na especialidade, ser corrigido, e, por outro lado — e é esta a fundamental proposta que esta iniciativa do PSD nos traz —, a alteração da regra da votação secreta e não fundamentada para uma regra de votação nominal e justificada. O PCP está de acordo com as soluções concretas que a iniciativa do PSD propõe, porque, por um lado, entendemos que importa definir claramente qual o regime legal que se aplica nestas situações, sem prejuízo de o regime legal previsto no Decreto n.º 301/72, como já referi, poder ser corrigido em alguns aspectos, e, por outro lado, porque concordamos com a alteração desta regra de deliberação na avaliação em causa. No entanto, já foi aqui referido pelo Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte que está para ser publicado um decreto-lei, já aprovado em Conselho de Ministros, segundo dá conta o comunicado do Conselho de Ministros de 15 de Março passado, o qual dá resposta a estas situações com um novo regime jurídico que as regulará. Obviamente que essa é uma questão que terá de ser tida em conta, sob pena de o trabalho que a Assembleia da República desenvolve poder dar origem a um «nado morto». No entanto, esta aprovação no Conselho de Ministros de um decreto-lei não poderá significar, de maneira nenhuma, que a Assembleia da República se sinta limitada ou constrangida face à necessidade de dar resposta a um problema que parece estar unanimemente identificado e enquadrado. E, portanto, não podemos aceitar de maneira nenhuma aquele que vai sendo o recurso useiro e vezeiro do PS de rejeitar consecutivamente iniciativas parlamentares que visam dar respostas a problemas concretos e cuja resolução é exigida pela realidade com o pretexto de que o Governo está a trabalhar ou já aprovou ou está para ser publicado. Portanto, entendemos que a Assembleia da República deve ter em conta o facto de ter sido aprovado um decreto-lei em Conselho de Ministros mas não deve sentir-se limitada ou constrangida na discussão de uma determinada iniciativa que aponta uma resolução concreta para um problema que é unanimemente identificado e enquadrado. … pela mão do PSD, ou — outra opção — temos um decreto global que vem colocar a agregação no contexto da grande reforma que está a ser feita do sistema do ensino superior. O que pergunto é isto: o que é que queremos? Uma emenda a um decreto do tempo do fascismo ou um decreto novo, cuja informação está publicada, que, conforme é público, foi aprovado em Conselho de Ministros e que muito em breve, depois do processo normal, será devidamente aprovado e promulgado? Fica ao critério e à consciência dos Srs. Deputados.
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Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje apresenta é mais um contributo — do nosso ponto de vista, fundamental — para que se equacionem as medidas estruturantes necessárias para responder ao grande desafio, que está colocado às sociedades modernas, de diminuir, significativamente, o recurso à utilização do transporte individual. Já aqui debatemos, por diversas vezes, nesta Assembleia, a questão da mobilidade enquanto direito democrático e as questões que lhe estão associadas, como a necessidade de garantir o passe social, enquanto política pública, assim como a questão de fundo que lhe está associada, o funcionamento das autoridades metropolitanas de transporte, cuja proposta do Governo tarda em chegar. Não pretendemos hoje repetir esses debates mas, sim, introduzir uma nova componente. A política tarifária nos sistemas de transporte público é essencial para atingir objectivos de verdadeira mobilidade. Neste sentido, este projecto de lei propõe uma série de princípios que devem enquadrar esta política. Desde logo, no que diz respeito às relações contratuais com os operadores privados, consideramos que estas devem ser claras, assim como a repartição das receitas. Existe, hoje, uma tecnologia que permite que tal aconteça com o máximo de rigor — refiro-me à tecnologia do cartão «Lisboa Viva». Mas a questão dos subsídios de exploração, ou indemnizações compensatórias a atribuir pela prática de preços sociais aos operadores privados, não pode limitar-se a um mero acerto de contas, também tem de prever outros critérios fundamentais para a elevação da qualidade do transporte público, tais como a frequência das carreiras, a cobertura horária, as condições dos veículos, as condições de acesso de pessoas deficientes, entre outros aspectos. O passe social intermodal tem de ser extensível a todos os operadores, públicos e privados, que prestem serviço nas áreas metropolitanas e não continuar com a situação actual, em que, por exemplo, a Fertagus, embora utilize uma infra-estrutura pública, está fora do passe social, e existem sérias dúvidas sobre se o mesmo não se prepara para o Metro Sul do Tejo. A criação de passes e bilhetes multimodais que introduzam o estacionamento, sobretudo em parques na periferia das cidades, é uma questão fundamental para reduzir de forma efectiva o número de automóveis dentro das cidades. Propomos ainda a criação do bilhete único diário multimodal, que é muito mais do que aquilo que a Secretária de Estado dos Transportes agora anunciou para a cidade de Lisboa. A actualização dos preços deve ser realizada uma vez por ano e deixar de existir a possibilidade de aumentar a meio do ano, mediante a variação dos preços, como agora acontece — aliás, porque esta possibilidade só leva em conta os aumentos e não diz que quando os preços dos combustíveis baixarem, também baixam os preços dos transportes. Por último, quero ainda destacar a possibilidade de se criar uma isenção temporária para os desempregados. As notícias sobre o desemprego são diárias e o dia de hoje não escapa. Uma política pública de transportes tem de abranger a hipótese de garantir este tipo de isenção, até porque a procura activa de emprego que o Governo tanto apregoa implica deslocações e implica gastos. Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: A promoção do transporte público não é possível sem uma política pública activa e inovadora. É esse o contributo que hoje o Bloco de Esquerda aqui traz.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel Coelho: A proposta do Bloco de Esquerda não é ingénua, mas a resposta do Partido Socialista é cínica, Sr. Deputado! A resposta do PS diz o seguinte: «está tudo bem. Está tudo previsto. Estamos a trabalhar em todos em modelos. Estamos a prever todas as situações»! Mas, ao fim de dois anos e meio de Governo socialista, que tem enunciada no seu Programa do Governo a questão da mobilidade como fundamental, o que é que vemos de medidas concretas? Muito pouco! E se quisermos o exemplo da Autoridade Metropolitana de Transportes, então, sobre isso estamos conversados, nem vale a pena dizer mais nada! Srs. Deputados do PS, vamos ter o bilhete único Carris/Metro, finalmente, após a interpelação com a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes que o BE, «por acaso»…, promoveu, ao fim de dois anos e meio. Mas, como os Srs. Deputados sabem — e bem, aliás, foi aqui reconhecido pela Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes —, existem, só na Área Metropolitana de Lisboa, centenas de títulos de transporte. Hoje, por acaso, não trouxe as folhas todas com essa indicação, mas sabemos que isto é verdade. E onde está, então, a política de uniformização desses títulos de transporte? Também estão, com certeza, a pensar nela e a ver como se há-de resolver a questão!… Srs. Deputados, o caso paradigmático da Fertagus, que é constantemente chamado a esta Assembleia da República, continua a não ter qualquer resposta por parte do PS. Inclusivamente, torno a colocar a questão: o que é que se prevê para o Metro Sul do Tejo? Ou vamos continuar a ter operadores privados que vão sucessivamente ficar de fora do passe social? E o passe social não é o «passe dos pobrezinhos»! O passe social é parte integrante de uma política pública de transportes! Já agora, Sr. Deputado Miguel Coelho, ninguém aqui propôs transportes gratuitos — não é essa a proposta do BE! Não vale a pena fazer demagogia! —, mas permita-me que lhe diga que a Agência Europeia do Ambiente propôs transportes gratuitos e disse que com os problemas ambientais que se vivem hoje a nível da Europa poderia inclusivamente equacionar-se haver transportes públicos como uma solução para esses problemas. O BE não o propôs, mas a Agência Europeia do Ambiente já chegou a propô-lo. E digo-lhe que não é completamente descabido, nem se trata aqui de qualquer medida bondosa, pensar nos desempregados e fazer-lhes uma redução. Veja-se o caso de Londres: o que é que aconteceu hoje em relação à rede de transportes em Londres e está a ser praticado? Uma redução de 50% nos bilhetes para todos os desempregados e para as famílias pobres. Há países que estão a perceber a necessidade objectiva de criar medidas positivas para apoiar, neste caso, os desempregados ou os mais pobres mas também no sentido de promover quer a utilização do transporte público quer também a mobilidade das pessoas. Portanto, repetindo, ninguém está aqui a propor transportes públicos gratuitos, mas também não são medidas que não estejam inclusivamente a ser aprofundados. Srs. Deputados do PS, falta aprofundar muita coisa, o projecto de lei está incompleto, há assuntos que não são tratados na sua profundidade como deviam. Sim senhor, Srs. Deputados, da parte do BE há toda a abertura para melhorarmos o diploma e chegarmos a uma lei que seja efectivamente uma lei da Assembleia da República sobre a política tarifária de transportes. Levem este projecto de lei à discussão em sede de especialidade e aí conheceremos com todo o gosto as propostas do PS, que até hoje não se conhecem. O Governo — e com isto termino, Sr. Presidente — quer tratar os assuntos da mobilidade e os assuntos relacionados com os transportes públicos com sorrisos, os sorrisos que vemos estampados nos autocarros mas que não vemos nas caras dos utentes que utilizam os transportes públicos; o Bloco de Esquerda quer tratar esta questão com coragem e assumindo políticas muito concretas.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Alguns números recentemente divulgados parecem indicar que os transportes colectivos voltam a ser atractivos, voltam a ser a melhor solução para a mobilidade de grande parte da população portuguesa. Senão, repare-se: O Metro de Lisboa subiu de 179 milhões de passageiros transportados em 2004 para 185 milhões em 2005; As linhas ferroviárias urbanas de Lisboa e do Porto, grandes responsáveis pelo aumento no sector ferroviário, transportaram em 2006 mais 2,5 milhões de passageiros do que no ano anterior; A Carris inverteu a tendência decrescente da última década; O comboio da Ponte 25 de Abril passou dos 11 milhões de passageiros em 2000 para os 21 milhões em 2006; O Metro do Porto passou dos 10 milhões de clientes em 2004 para os 38 milhões de 2006. Sabemos que cada caso tem a sua explicação e que cada um poderá fazer interpretações diferentes destes números, mas interpretações que, infelizmente, não se estruturam em políticas sustentadas, estruturais e globais que tenham sido implementadas. E prova disto é que, apesar deste afluxo para o transporte público, os automóveis continuam diariamente a «invadir» as cidades. Na Cidade Invicta, apesar do efeito do Metro do Porto, entram mais de 270 000 veículos por dia e em Lisboa são mais de 400 000 os automóveis que todos os dias entram e saem da cidade. Conclui-se, assim, que não deixam de aumentar os utilizadores de viatura própria, um aumento para o qual a simples explicação de comodismo não é suficiente. As razões são mais profundas e assentam muito fortemente nas políticas urbanísticas seguidas, que permitiram uma dispersão das áreas residenciais a que os transportes colectivos, sejam eles o comboio, o Metro ou o autocarro, não conseguem dar resposta. As explicações assentam também na total inoperância que o Governo socialista tem revelado neste sector. Aliás, é mais uma área em que o prometido, o assumido, não é respeitado. Basta olhar para o Programa do Governo aqui aprovado para ver o desleixo que a área do sector dos transportes está a merecer por parte do Executivo. Nesse Programa o Governo diz ter uma visão estratégica para a mobilidade de pessoas e bens, que deve ser sustentada e assente em cinco propósitos principais. Vamos aos propósitos. O primeiro propósito do Governo era «criar um sistema de mobilidade mais solidário, com mais conforto e com mais segurança». Há uma falha total neste capítulo, pois as injustiças nos tarifários estão hoje à vista de todos, como está à vista a omissão inqualificável do Ministério das Obras Públicas. Há utilizadores que todos os dias são espoliados de muito dinheiro e o Governo fecha os olhos perante essas ilegalidades — isto passase em Portugal, isto passa-se na CP! O segundo propósito do Governo era promover «políticas de transporte sustentável integradas em novas políticas de cidade». Palavras bonitas, mas nada de sustentabilidade no sector dos transportes e nada de novas políticas de cidade. O terceiro propósito do Governo era «promover o respeito pelo ambiente», mas nada de substancial nos é dado ver, a nós ou aos portugueses, que tenha sido feito pelo Governo nesse capítulo. O quarto propósito do Governo era a integração portuguesa, de forma eficiente, nas redes de transporte ibéricas. Também aqui nada de palpável, citando-se como exemplo o não acompanhamento no sector ferroviário da adaptação das nossas linhas para a bitola europeia, como os espanhóis vão fazer nos seus 7200 km até 2010. O quinto propósito do Governo, também falhado — e que daria para rir se não fosse uma questão séria —, foi a promessa de diminuir os custos totais dos transportes. Até a diminuição de preços nos transportes serviu para enganar os portugueses!… O Governo defendeu a intermodalidade, objectivo com que o Partido Social-Democrata não pode estar mais de acordo, mas até hoje não se vê a concretização prática e plena dessa funcionalidade. Lamentamos que assim seja, pois não bastam anúncios mediáticos de propaganda, é urgente a concretização da intermodalidade para se conseguir atenuar o chamado «efeito Madrid», e o Governo tem de actuar para bem dos portugueses. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No sector dos transportes a política parece ser nada fazer, nada alterar, nada de «mobilidade sustentável», como o Governo gosta de encher a boca. Ora, se a mobilidade não tem sido sustentável para o Governo, também para o Bloco de Esquerda, através deste projecto de lei, não o é. Há indefinições graves de responsabilidade, pouca clarificação do serviço público e pouca planificação dos custos e de quem e como os suporta. Por isso, o projecto de lei em análise não é consequente na alteração equilibrada do actual estado de coisas, fica de braço dado com o Governo, que, no seu Programa, defendia que, para haver mobilidade sustentável, deviam: Atribuir-se poderes efectivos às Autoridades Metropolitanas de Transportes de Lisboa e do Porto; Concretizar projectos integrados de bilhética nas áreas metropolitanas; Reforçar-se a coordenação física, tarifária e de horários entre os modos de transportes colectivos e da capacidade de estacionamento nas interfaces periféricas; Definir-se uma política de gestão integrada para as empresas ao nível dos transportes urbanos de Lisboa e do Porto… Onde pára tudo isto? Desapareceu!! Mas tudo isto coube, Sr.as e Srs. Deputados, num Programa de Governo demagógico, retalhado por trapalhadas, como a da promessa de activação das autoridades metropolitanas de transportes no prazo de seis meses após a tomada de posse e que até hoje, passados dois anos, não viram ainda a luz do dia. Dois anos e meio! Onde já vai! O Governo vive dilacerado entre a privatização dos transportes públicos das áreas metropolitanas e uma incapacidade total na gestão desses transportes. O Programa do Governo foi rasgado sem qualquer pudor. Os habitantes das áreas metropolitanas sofrem diariamente as consequências da ausência de políticas sustentadas na área dos transportes por parte de um Governo mais interessado nos grandes anúncios do que nos problemas das pessoas. É esta ausência de políticas sérias por parte do Governo socialista, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o PSD denuncia e sempre continuará a denunciar.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a analisar um projecto de lei, apresentado pelo Bloco de Esquerda, sobre a política tarifária nos sistemas de transportes públicos. Trata-se de um documento que, aparentemente, poderemos designar como «politicamente correcto», seguramente demonstrativo da boa intencionalidade dos seus promotores, mas que, após uma observação pormenorizada, se revela como um projecto redundante e desequilibrado. Com efeito, aquilo que o Bloco pretende com esta proposta será, porventura, o que qualquer um de nós poderia idealizar, independentemente da bancada onde nos situemos: transportes públicos gratuitos ou tendencialmente gratuitos, parques de estacionamento dissuasores também gratuitos junto de todos os interfaces, passe social universal e alargado geograficamente muito para além das áreas metropolitanas, quase constituídos como passes regionais, seriam propostas que qualquer um de nós gostaria de apresentar, sem a preocupação, porventura «mesquinha» para os proponentes, de nos questionarmos sobre «quem pagaria a factura». Um dos objectivos assumidos na exposição de motivos que acompanha este projecto de lei é o de, ao ser aprovado, estarmos a promover o transporte público em detrimento do transporte individual. Não duvidamos da boa intencionalidade deste propósito, nem sequer contrapomos que, se fosse possível oferecer a todos transportes gratuitos, seguramente diminuiria o uso do transporte individual. Contudo, seria, mesmo assim, uma medida insuficiente para contrariar o excesso do seu uso. Reconhecemos que este projecto de lei não nos vem propor a utilização gratuita dos transportes públicos, mas a verdade é que nos apresenta um conjunto de propostas que, tendencialmente, poderão fazer cavar o fosso entre o custo da deslocação e o seu valor real. Aliás, isso é mesmo assumido pelos seus proponentes, esquecendo-se de referir que, assim sendo, essa mesma diferença será cada vez mais suportada pela generalidade dos contribuintes. E, Sr.as e Srs. Deputados, estamos aqui confrontados com uma contradição difícil de ultrapassar: os senhores exigem permanentemente uma diminuição da carga fiscal, mas, em simultâneo, propõem com perseverança encargos com aumentos dos serviços públicos a prestar. Quanto a nós, esta contradição resolve-se com a introdução da adopção de medidas de qualidade que visem melhorar e modernizar os serviços prestados. Não rejeitando o argumento de que o preço do passe social é um elemento importante da política de favorecimento do transporte público colectivo em detrimento do transporte individual, temos, hoje em dia, a convicção — suportada por inúmeros estudos sectoriais — de que os cidadãos valorizam cada vez mais a qualidade do serviço que lhes é prestado, sendo essa qualidade um dos factores determinantes na opção que tomam sobre o tipo de transporte que utilizam. Sem menosprezar, portanto, o factor preço, naturalmente que entendemos que os elementos decisivos para a escolha do tipo de transporte são cada vez mais a sua modernidade, a sua comodidade e a sua rapidez. Neste sentido, estamos confrontados com uma proposta desequilibrada, apenas assente no factor preço, que, a ser tido em conta unilateralmente, inviabilizaria a implementação das outras vertentes igualmente essenciais para a prossecução deste objectivo. O aumento na utilização do transporte público e a sua promoção, em detrimento do transporte individual, dependem da conjugação de uma série de medidas combinadas, coordenadas por uma autoridade metropolitana ou regional, e não apenas da implementação de uma medida isolada. Mas se este projecto de lei se revela imbuído de alguma ingenuidade e não atende à realidade financeira do País, tem uma outra componente que importa analisar e desmistificar: é que os seus proponentes ignoram ou omitem todos os esforços que têm vindo a ser implementados pelos governos durante a última década, os quais evidenciam uma evolução acentuada no sentido da implementação de algumas das ideias e propostas defendidas neste projecto de lei, sendo por isso um diploma com uma grande dose de redundância. Os seus autores ignoram, por exemplo que na região de Lisboa já existem passes intermodais válidos na generalidade dos operadores públicos e privados, os quais já abrangem uma área significativa da Área Metropolitana de Lisboa; omitem que já existe um bilhete único Carris e Metro para 1 e 5 dias e que os títulos combinados entre vários operadores já integram a possibilidade de estacionamento, como é o caso da Fertagus; esquecem que, a partir de 1 de Novembro próximo, a Carris e o Metro lançam o Cartão Sete Colinas, bilhete que permitirá aos cidadãos viajar em qualquer das empresas com um único suporte carregável, que, aliás, até ao final do ano será alargado à Transtejo; e não consideram nas suas ponderações o facto de, em Agosto último, a Transtejo e a Soflusa terem eliminado as senhas de passes próprios e combinados com a Carris, Metro e Transportes Colectivos do Barreiro, passando os utentes a utilizar apenas um suporte electrónico recarregável. Também os avanços significativos observados na região do Porto são omitidos neste projecto de lei em apreciação, mais parecendo que para os seus autores está ainda tudo por fazer e implementar. Já existem títulos intermodais, nomeadamente passe STCP/operadores privados, passe STCP/CP e os títulos Andante. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se bem que já se verifiquem regimes especiais de preços nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto para a 3.ª idade, reformados, pensionistas e crianças, o Bloco de Esquerda apresenta a proposta de o mesmo ser extensivo aos desempregados. Não rejeitamos a bondade deste ponto, mas, certamente, concordarão que o mesmo necessita de melhor aprofundamento e previsão dos seus encargos no Orçamento do Estado. Não basta apresentar propostas fáceis e populares, é igualmente importante demonstrar se as mesmas são exequíveis financeiramente. Por último, Sr.as e Srs. Deputados, uma nota sobre a proposta do alargamento da coroa da Área Metropolitana de Lisboa até ao Entroncamento no modo de transporte ferroviário. Mais uma vez, trata-se de uma proposta fácil, mas não devidamente aprofundada. Os dados da procura para a Área Metropolitana de Lisboa resultantes do Censo de 2001 apontam com nitidez que, à medida que nos afastamos dos concelhos envolventes de Lisboa, se verifica uma redução significativa da procura pendular para a capital, o que evidencia uma acentuada quebra da relação de dependência destes municípios para com Lisboa e a sua envolvente directa. Analisando também os dados da procura dos municípios que constituem a Comunidade Urbana da Lezíria do Tejo, poderemos constatar que cerca de 85% das viagens/dia são internas à lezíria e que apenas 10% têm por destino o distrito de Lisboa, dados que, aliados ao facto de o Entroncamento distar cerca de 120 km de Lisboa, nos poderão levar a concluir que as relações existentes são sobretudo de índole regional e não de características urbanas e suburbanas. Assim sendo, também não se justifica o alargamento da coroa metropolitana de Lisboa até ao Entroncamento. Estamos, deste modo, confrontados com um projecto de lei que, contrariamente ao que seria expectável sobre política tarifária nos sistemas de transporte público, não abrange satisfatoriamente todas as componentes do sistema tarifário, esquecendo, nomeadamente, as áreas não urbanas. No que se refere à estrutura de títulos, centra-se apenas no passe social e na criação de um bilhete único intermodal, ignorando os restantes títulos para as áreas urbanas e não urbanas. Omite que a implementação do novo modelo das Autoridades Metropolitanas de Transporte de Lisboa e do Porto está em curso, em diálogo com as autarquias e juntas metropolitanas, as quais terão atribuições nos domínios do planeamento, coordenação, fiscalização, financiamento e tarifação. A exemplo do que já está em progressão na Área Metropolitana do Porto e vai sendo igualmente implementado na Área Metropolitana de Lisboa, está a ser desenvolvido um novo sistema de tarifário, baseado no conceito de intermodalidade, com um sistema integrado de bilhética, suportado por uma tecnologia comum, com um tarifário comum e com um critério de repartição de receita coerente. Por estas razões, Sr.as e Srs. Deputados, apenas podemos aprovar a boa intencionalidade dos autores deste projecto de lei, mas, com sentido de responsabilidade, não podemos aprovar as suas propostas.
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Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, uma vez que se me dirigiu pessoalmente na sua segunda intervenção, gostava de lhe dizer, fazendo o trocadilho, que, com certeza, nem eu sou ingénuo nem a Sr.ª Deputada é cínica, apenas temos, porventura, perspectivas diferentes sobre o tempo e o modo de implementação de medidas para alcançar objectivos, com os quais, provavelmente, todos concordamos. Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada, referi bem aqui que o Bloco de Esquerda propõe transportes públicos tendencialmente gratuitos. É verdade! Os senhores assumem isto na vossa exposição de motivos, apontando até como pecado defender-se que se deve procurar aproximar o custo real do transporte do preço da viagem. Os senhores defendem o afastamento deste valor. Isto tem uma consequência social, porque alguém vai ter de pagar esse custo. Os senhores têm de perceber que esta é, de facto, uma proposta um pouco confusa nesta matéria. Também defendem, expressamente, parques dissuasores gratuitos. São, portanto, propostas muito interessantes, muito bonitas, mas que não podem ser implementadas no nosso país, assim, «do pé para a mão», como a Sr.ª Deputada sabe. Sr.ª Deputada, todos desejaríamos que houvesse um único passe social intermodal, mas o Bloco de Esquerda tem de reconhecer que estão a ser dados passos neste sentido e que isto tem de ir passo a passo. Ainda há dias, na assembleia municipal, por exemplo (e isto não tem a ver directamente com o passe social intermodal), o Bloco de Esquerda votou a favor de uma moção de apreço pela introdução do cartão «7 Colinas», que foi implementado, agora, na cidade de Lisboa. Isto é, estão a ser dados passos positivos, no sentido de se alcançar a meta que os senhores pretendem, mas não é possível fazê-lo com o projecto de lei que agora apresentam, porque, por um lado, o mesmo propõe propostas completamente irrealistas e não quantificadas e, por outro, a serem unicamente tidas em conta tal como são apresentadas, não vão favorecer assim tanto o uso do transporte público em detrimento do transporte individual, uma vez que, para levar os cidadãos a abandonarem o transporte individual, é necessário adoptar um conjunto de medidas concertadas. Por outro lado, também lhe devo dizer que, não estando nós em Londres, a Sr.ª Deputada omite que, por exemplo, já existem descontos sociais para idosos, que vão até aos 53%, e para crianças, que vão até aos 27%, sendo gratuito até aos quatro anos. O Bloco de Esquerda apresenta-nos, aqui, uma proposta como se nada disto existisse e como se tivessem descoberto agora «o caminho marítimo para a Índia». É, de facto, um projecto interessante, mas perfeitamente redundante e desequilibrado no conteúdo concreto das propostas que apresenta.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É hoje apreciado o projecto de lei n.º 169/X, apresentado pelo Bloco de Esquerda, que visa rever a política tarifária nos sistemas de transporte público. Os transportes públicos são um bem essencial para a boa mobilidade das pessoas, tanto em meio urbano como em meio rural. Hoje temos um sistema complexo de transportes públicos que, na sua maioria, não serve os reais interesses e necessidades das populações. É, por isso, necessária uma reformulação deste sistema. Não podemos, porém, confundir o sistema público de transportes com o serviço público, porque aqui temos o grande apoio das empresas privadas, que colmatam a maioria das deficiências das empresas públicas. Mas é nas grandes Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto que a deficiência destes serviços públicos mais se dá a conhecer. Todos os dias surgem deficiências na cobertura de grandes áreas populosas, obrigando, assim, ao uso do transporte individual. O CDS entende, por isso, que a mobilidade dos cidadãos é hoje um direito fundamental dos mesmos, tendo os transportes um papel preponderante e indispensável no que concerne à qualidade de vida. Uma rede de transportes multimodal é o que ambicionamos. A execução de um plano global de redes de transportes é o motor para o desenvolvimento sustentável e equitativo não só das grandes áreas metropolitanas mas, sim, da totalidade do território português. O Governo, no que concerne à mobilidade das grandes áreas metropolitanas, coloca o País nume indefinição política, pois está constantemente a apresentar projectos e programas, mas no terreno não se vê o desenvolvimento de qualquer desses projectos, nem os esperados resultados, quando não se chega à situação de cancelar os mesmos. Falemos agora na melhoria da mobilidade dentro das cidades, mais propriamente dentro das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Estas duas áreas urbanas possuem hoje uma oferta variada de transportes, no entanto estes continuam a ser preteridos em relação ao uso do automóvel. A dispersão urbanística residencial, a par com a desnuclearização das actividades, torna a mobilidade urbana muito complexa. A articulação entre os sistemas de ordenamento do território e dos transportes condiciona em larga medida o sucesso do funcionamento das cidades e, especialmente, das áreas metropolitanas, pelo que é indispensável a adopção de políticas de ordenamento do território e dos transportes concordantes e complementares. A 28 de Outubro de 2003 são criadas as Autoridades Metropolitanas de Transportes de Lisboa e do Porto, tendo como objectivo estratégico alcançar a mobilidade sustentada, criando um sistema de transportes públicos de qualidade, alcançável com uma política global de ordenamento do território e dos transportes, bem como a integração de redes e serviços. A criação destas autoridades foi aplaudida por diversos grupos políticos, bem como por organizações ambientais e organizações públicas e privadas, sendo que todos esperavam um desenvolvimento do projecto. Passado todo este tempo, o Governo do PS paralisou esta estrutura. Sempre disseram que estavam a trabalhar neste projecto, no entanto os seus desenvolvimentos são poucos e os resultados ainda são nulos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Da nossa parte entendemos que não é tanto um passe social, que é igual para ricos e pobres, que se justifica mas, sim, um título multimodal que seja mais justo e socialmente mais eficaz. O passe social, hoje, não financia os utentes carenciados mas, sim, as empresas públicas técnica e financeiramente falidas. Este projecto de lei merecerá da nossa parte a maior atenção e aprofundamento e esperamos discuti-lo em sede de comissão.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como o PCP sempre fez questão de sublinhar, a criação do passe social em 1976 significou a consagração da mobilidade como um direito fundamental de cidadania, constituindo uma importante conquista para a população e uma medida de indesmentível alcance e justiça social tornada possível no Portugal de Abril. O passe social é indissociável de uma estratégia de dissuasão à utilização do transporte individual e de salvaguarda do meio ambiente, constituindo um importante factor de coesão social e territorial, e constitui um dos elementos essenciais à implementação de um sistema integrado de transportes públicos, vital para a melhoria da qualidade de vida urbana e factor estruturante do desenvolvimento. É por isso que, desde há muitos anos, o PCP afirma com clareza a necessidade de confirmar, defender e actualizar um sistema tarifário assente no passe social intermodal. É indispensável salvaguardar os princípios e objectivos que estiveram na sua origem, o que implica, antes de mais, uma outra política de financiamento do transporte público, em que o poder central assuma as suas obrigações. Mas também se coloca a exigência de uma política que defenda o serviço público e o sector público dos transportes, porque a verdade é que a privatização de importantes sectores do transporte público veio trazer a diminuição efectiva da oferta e da qualidade do serviço. Este cenário tem contribuído para o recurso ao transporte individual, com todos os inconvenientes económicos, sociais e ambientais daí decorrentes. O que a vida tem demonstrado, o que os utentes sentem diariamente, é uma oferta de serviço de transportes que não corresponde às necessidades e aos anseios das populações. É uma política de «recolher obrigatório» para milhares e milhares de pessoas, confrontadas com os famigerados «ajustamentos» e «reestruturações» das redes de transportes, com as supressões e os encurtamentos de carreiras, com a eliminação de circulações. Na cidade do Porto a resposta de utentes e populações fez-se com a luta, com a mobilização de acções de protesto, na firme recusa das alterações à rede da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP), uma resposta que levou ao recuo da administração da empresa, com a alteração de decisões tomadas. Mesmo que insuficiente no alcance das correcções efectuadas, este resultado veio demonstrar que a mobilização e a luta das populações vale sempre a pena e é sempre insubstituível. O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mais recentemente, em Lisboa, tivemos a notícia de mais uma «reorganização» da rede da Carris, desta vez apresentada como segunda fase da Rede 7, a tal que mereceu o parecer negativo quer da Câmara Municipal quer da Assembleia Municipal de Lisboa. Agora aí está a Carris a preconizar novas supressões de carreiras, contando já com a oposição e o protesto de várias juntas de freguesia da cidade de Lisboa. O PCP não guarda silêncio face a estas preocupantes intenções da Carris, nem no poder local nem na Assembleia da República. Por isso, hoje mesmo, na Comissão Parlamentar de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou uma proposta para que se realize uma audição sobre esta matéria, para que sejam ouvidas a administração da Carris e a comissão de trabalhadores da empresa, bem como o Movimento dos Utentes dos Serviços Públicos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O flagrante subfinanciamento do sector por parte do Estado tem condenado as empresas públicas de transporte a uma grave situação financeira, isto apesar do constante aumento dos custos para os utentes. Veja-se o caso concreto do passe social L123, o mais utilizado na Área Metropolitana de Lisboa. Ora, nos últimos sete anos este passe social aumentou 44%, enquanto que o salário mínimo aumentou 26%. É uma política injusta para as populações e ineficaz para a promoção do transporte público. Outro exemplo concreto: o passe social, para poder valer no Metro Sul do Tejo (MST), custa mais 8,50 €. Só que as pessoas não recorrem a esse suplemento tarifário e, por isso, o Metro Sul do Tejo continua com uma utilização muito abaixo do que seria de esperar. É um caso flagrante que demonstra a importância da integração tarifária para a própria promoção do transporte público. Perante este cenário é indispensável confirmar o passe social intermodal como título de transporte de insubstituível importância socioeconómica, inegável factor de justiça social e importante incentivo à utilização do transporte colectivo. Registamos, assim, que o projecto de lei em debate assume, em larga medida, os objectivos e os princípios que o PCP defende nesta matéria há muitos anos. E registamos também o entendimento que agora lhe está subjacente de que a Assembleia da República deve legislar sobre esta questão e não apenas emitir recomendações ao Governo. É uma posição que vem ao encontro do que o PCP tem afirmado. Entretanto, e quanto ao alargamento das coroas geográficas — e, sublinhamos, coroas conforme a concepção do Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROTAML) —, o PCP tem propostas concretas, designadamente para a Área Metropolitana de Lisboa. Mais do que uma possibilidade, esse alargamento deve ser visto como uma necessidade real, e nesse sentido deve também ser definido em legislação. É preciso apontar orientações concretas face à situação diferente que existe no território hoje em dia. E, a este propósito, consideramos que referir apenas a integração do Entroncamento em termos concretos é uma abordagem muito limitada. No essencial, e na generalidade, estamos perante uma proposta que corresponde ao entendimento do PCP sobre esta matéria, pelo que manifestamos a nossa disponibilidade para discutir e contribuir em sede de especialidade para uma solução eficaz em termos de articulado.
2PCP
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A mobilidade tem sido uma matéria a que Os Verdes têm dado particular atenção, como é sabido, através da sua própria agenda parlamentar. Relembramos os Srs. Deputados de que Os Verdes foi o grupo parlamentar que fez uma interpelação ao Governo justamente sobre a matéria dos transportes. Na altura, como bem nos recordamos, ficámos bastante preocupados com as respostas, e até com as não respostas, que o Governo apresentou nesta Câmara. Mas também hoje, e na sequência dos debates que têm ocorrido posteriormente, podemos ficar muito preocupados com as respostas e as posições assumidas pelo PS, que se encontra — para usar a mesma expressão, na continuação do debate anterior — muito estagnado no que concerne às soluções para a promoção do transporte colectivo. Sabemos, e em termos de diagnóstico concordamos sempre todos, que este é um grande problema, que estamos confrontados com uma realidade muito preocupante ao nível dos sistemas de transporte, decorrentes, certamente, das políticas que têm sido adoptadas (ninguém quer assumir responsabilidades, designadamente os partidos que se têm alternado no governo, o PS e o PSD), mas depois, no que toca a soluções concretas, uns adiam-nas eternamente, outros nem querem ouvir falar delas e outros vão apresentando propostas concretas. Ora bem, os problemas decorrem, desde logo, de matérias de ordenamento do território, como é evidente e bem sabido — aliás, alguns Srs. Deputados já aqui o referiram —, mas também da política de transportes que tem sido prosseguida. É importante talvez referir o caos a que isto chegou. Penso que ainda nenhum Sr. Deputado utilizou este dado hoje, mas talvez seja importante referir que 400 000 carros entram diariamente em Lisboa. E não há cá as soluções milagrosas das portagens à entrada das cidades, porque já temos adoptada essa prática a sul da cidade de Lisboa e não resolve absolutamente nada. Aquilo que resolve é uma rede eficaz de transportes colectivos que dê resposta às necessidades dos cidadãos — e é justamente isto que nós queremos e, ao que parece, o PS não está muito apostado em ter. Por outro lado, todos sabemos que o transporte colectivo, no início da década de 90, ao nível dos movimentos pendulares, era a opção da maior parte dos cidadãos. Hoje, a opção é o transporte individual — não há dúvida absolutamente nenhuma sobre isto. Também sabemos que Portugal é o quarto país da União Europeia que mais aumentou as suas emissões de CO no sector dos transportes. 2 Sabemos que o Plano Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) traça alguns objectivos a cumprir para o quadriénio 2008-2012, como, por exemplo, a transferência modal do transporte individual para o transporte colectivo em 5%. Isto está conseguido? Não, porque a utilização do transporte individual tem vindo sempre a crescer. Vou terminar, Sr. Presidente. É claro que o PNAC não dá a resposta ao como é que conseguimos chegar a este objectivo. Por outro lado, é evidente que a política tarifária é uma questão determinante. O problema é que o preço dos transportes está sempre, sempre, sempre a aumentar. E aquilo que os cidadãos precisam perceber é que o transporte colectivo compensa no tempo, compensa no preço e compensa no conforto. E é esta resposta que não lhes é dada. Relembro que, em 2004, o preço dos transportes urbanos de Beja foi reduzido e, no final do ano, tinham um aumento de receitas. Porquê? Porque tornou o transporte mais atractivo, o que levou a haver mais passageiros, logo há mais receita. A lógica tem sido completamente a inversa. E ao nível das indemnizações compensatórias e da compensação com base no passe social, elas são também completamente aleatórias e injustas. Portanto, como é evidente, Os Verdes vão votar favoravelmente este projecto de lei do Bloco de Esquerda, como tem feito com outros de reforço do passe social intermodal que o PCP aqui apresentou e fará com todas as propostas que venham garantir e reforçar a mobilidade dos cidadãos.
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Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, a Sr.ª Deputada Helena Pinto não lhe poderá responder, porque já fez duas intervenções, mas gostaria de lhe dizer que não propomos os parques dissuasores gratuitos — não lerá isto no nosso projecto de lei. Aliás, a sua leitura distorceu bastante o nosso diploma, atribuindo-lhe intenções que não tinha, embora, depois, as releve num exercício de paternalismo absolutamente despropositado. O Sr. Deputado falou do tempo e do modo. Para o Partido Socialista, nesta área, como noutras, o tempo é o «logo se verá» e o modo é o «há-de chegar um dia», porque é o que se passa nesta área, desde a autoridade metropolitana dos transportes à política tarifária. O ponto essencial aqui é aquele a que o Sr. Deputado e a sua bancada não responderam. Valorização do passe social ou não? Bilhete único intermodal ou não? Estas são as perguntas concretas que os utentes, as cidadãs e os cidadãos, gostavam de ver respondidas. E a isto o Partido Socialista nada diz, vai adiando decisões, e quer que, neste exercício de uma certa soberba política, reconheçamos alguns pequenos passos positivos dados aqui ou além. Mas o que é que isso tem a ver com o programa eleitoral do Partido Socialista ou com o Programa do Governo? O que é que isso tem a ver com compromissos que já aqui foram datados por membros do Governo e já se passaram seis meses, um ano, ano e meio dessa data, sendo alguns deles já anunciados para dois anos depois? Era a isto que o Partido Socialista deveria ter respondido e não criticar a nossa iniciativa por debilidades de aprofundamentos vários e por estudos, um pouco escrutinados pelo Sr. Deputado Miguel Coelho. Mas, enfim, não resistirão a uma comparação, na hora em que a pudermos fazer. E essa hora seria, desejavelmente, a de um debate na especialidade, com todos os estudos, com todos os aprofundamentos, mas na direcção certa: a revalorização do passe social, o bilhete único intermodal e todo um conjunto de medidas que são absolutamente necessárias na área da mobilidade, que é cada vez mais um direito democrático dos cidadãos e uma condição essencial das políticas ambientais. A isto, hoje, aqui, disse o Partido Socialista coisa nenhuma; disse o Sr. Deputado Miguel Coelho nada ao Bloco de Esquerda.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Alguns municípios portugueses têm como riqueza própria o facto de se encontrarem nas proximidades da orla costeira e de estarem efectivamente virados para uma frente ribeirinha ou estuarina que propicia às populações, além daqueles recursos naturais que noutros tempos justificaram a escolha dos locais para o início da concentração da actividade humana, uma mais-valia ambiental importantíssima, em torno da qual giram hábitos culturais ou de lazer, actividades económicas e elementos importantes de atracção turística. A actividade portuária, por sua vez, é obviamente um vector económico de importância estratégica para todo o País. Além da indústria das cidades onde existem portos comerciais, todo um outro conjunto de indústrias que labora em Portugal tem óbvias ligações à actividade portuária, além de os portos nacionais e o próprio território nacional funcionarem como autênticos canais de mercadorias no plano internacional. A constituição das Administrações dos Portos do Douro e Leixões, de Lisboa, de Sines e de Setúbal e Sesimbra, entretanto transformadas em sociedades anónimas de capitais públicos, a que se veio mais tarde juntar a Administração do Porto de Aveiro, S.A., veio atribuir a estas administrações a capacidade de intervir, designadamente em matéria de urbanismo, em toda a zona terrestre abrangida pelos diplomas de criação. No entanto, a configuração dessas áreas tem-se mostrado desadequada, sendo que nela recaem zonas sem qualquer ligação à actividade portuária, mesmo tendo em conta as perspectivas de futuro contidas nas estratégias portuárias. A inclusão de zonas desligadas objectivamente da actividade portuária nas zonas sob gestão e intervenção das administrações significa, pois, a sua exclusão da alçada municipal, muito embora sejam, em grande parte, áreas que, pelas suas características, uso de solos e utilização, deveriam ser geridas pelo poder local democraticamente eleito. Nada justifica que continuem sob tutela das administrações portuárias vastas áreas de terrenos que não fazem parte, nem directa nem indirectamente, dos planos estratégicos de desenvolvimento e expansão das actividades portuárias sob gestão e jurisdição dessas administrações. Nada justifica que esses terrenos permaneçam em muitos casos abandonados, sem qualquer estratégia de ordenamento, sem que possam integrar os planos directores municipais dos concelhos em que estão localizados. Pior: nada justifica que terrenos sem qualquer utilização ligada à actividade portuária, actual ou futura, possam ser objecto de intervenção do tipo urbanístico para a qual as administrações portuárias nem têm vocação nem tão pouco legitimidade funcional e administrativa. O Partido Comunista Português propõe que esta Assembleia atribua, como é justo e mais adequado, às autarquias, aos municípios, a gestão e a salvaguarda dos valores patrimoniais e paisagísticos, possibilitando inclusivamente a integração efectiva das zonas ribeirinhas nos instrumentos de ordenamento do território, nomeadamente nos planos directores municipais. A natureza das administrações portuárias não lhes atribui, nem deve, qualquer vocação para o ordenamento do território, particularmente de áreas integradas em zonas urbanas, o que agrava o facto de os instrumentos municipais de ordenamento do território não incluírem grandes partes desses terrenos. Esta desadequação do quadro legal, sem um critério que a justifique, coloca estas partes do território urbano sob uma tutela injustificada que redunda no «divórcio» entre as frentes ribeirinhas e as cidades, os municípios e as populações. É incompreensível que o desenvolvimento urbanístico das zonas ribeirinhas seja um acto independente das competências municipais quando nelas não existe, nem previsivelmente virá a existir, qualquer relação com actividades portuárias. As administrações portuárias devem, naturalmente, ter os poderes e os meios necessários à prossecução dos seus fins, no cumprimento do interesse público que lhes é confiado, mas isso não pode implicar que esses poderes excedam as suas atribuições. Ou seja, a intervenção das administrações portuárias deve ser dirigida na justa medida da sua missão, no quadro da actividade portuária que lhes cabe gerir, sem que isso implique a jurisdição plena — principalmente no quadro do planeamento urbanístico — em vastas áreas inteira e claramente desligadas da vocação portuária. O Grupo Parlamentar do PCP propõe, por isso mesmo, que a jurisdição, titularidade de gestão ou propriedade dos bens sobre as zonas terrestres ribeirinhas em áreas não afectas directamente à actividade portuária seja desafectada das administrações portuárias e seja transferida para os respectivos municípios. Os municípios devem ter competência para determinar os usos do solo e para licenciar nas áreas actualmente sobre gestão das administrações portuárias que não estejam ligadas à actividade que essas administrações gerem, assim integrando essas áreas nos instrumentos de ordenamento do território em vigor. O projecto de lei que hoje o PCP apresenta propõe inclusivamente a criação de uma comissão de delimitação da zona portuária que funcionaria junto do Governo, envolvendo os municípios, com o objectivo específico de traçar a nova configuração das zonas terrestres ribeirinhas afectas às administrações portuárias, observando os princípios que já apresentámos. Da mesma forma, o presente projecto de lei materializa a obrigatoriedade de articulação entre município e administração portuária, mesmo nas áreas de jurisdição desta última, devendo essas administrações obedecer na sua intervenção aos instrumentos de planeamento, ordenamento e gestão territoriais de âmbito nacional, regional ou local em vigor. Sobre essas áreas competirá, portanto, às administrações portuárias gerir em observância dos planos e das estratégias política e legalmente estabelecidos e aos municípios, através das câmaras municipais, competirá o acompanhamento da actividade das administrações através da emissão de pareceres sobre obras e utilização dos terrenos. Este projecto de lei traz um conjunto de propostas que dão resposta a uma situação aberrante que se vai verificando no quadro do ordenamento do território. Este projecto de lei dá corpo e traduz a vontade expressa de muitos autarcas, principais responsáveis pelo ordenamento do território nos municípios onde estas situações ocorrem, designadamente em Aveiro, Lisboa, Matosinhos, Porto, Sesimbra, Setúbal e Vila Nova de Gaia. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Transferir para os municípios a gestão das zonas ribeirinhas terrestres que não estejam afectas à actividade portuária é, além de uma operação lógica, imposta pela própria natureza e vocação das administrações portuárias, um imperativo de salvaguarda da integridade da estrutura do planeamento e ordenamento do território, com a inerente protecção de valores ambientais ou patrimoniais a que esse planeamento, na óptica do Partido Comunista Português, deve obedecer.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do conjunto das intervenções, resultou bem claro que, na generalidade, embora sejam suscitados alguns aspectos técnicos do projecto de lei que, certamente, seriam passíveis de ser corrigidos em sede de especialidade, há um acordo das várias bancadas, à excepção da bancada do Partido Socialista, cuja falta de concordância até é a mais surpreendente, tendo em conta que autarcas do Partido Socialista, nomeadamente em períodos de campanha eleitoral, faziam desta questão um ponto de honra da sua propaganda. «Aquilo que não são áreas estritamente para actividades portuárias não devem competir ao Porto de Lisboa. O Porto de Lisboa não tem competência para gerir a cidade. (…) O Porto de Lisboa deve confinar-se ao que lhe compete: a actividade portuária (…)» — António Costa, candidato à presidência da Câmara Municipal de Lisboa. Ora, é exactamente isto que o PCP propõe. É que não se retira nenhuma importância às administrações portuárias, bem pelo contrário, reforça-se até a necessidade de serem elas a intervir nas matérias que lhes são estritamente correspondentes, mas, obviamente, retiram-se da sua alçada aquelas áreas relativamente às quais, pelos vistos, o Sr. Deputado Renato Sampaio considera que é passar para as autarquias jardins ou áreas urbanas em que sociedades anónimas podem licenciar obras, podem gerir o território, mas as autarquias não podem. Aliás, o Sr. Deputado Renato Sampaio acusa, inclusivamente, este projecto de lei de estar ferido de inconstitucionalidade, mas foi uma conveniente acusação, já que nem sequer se deu ao trabalho de suscitar um único aspecto da iniciativa que pudesse levantar essa suspeição. A questão que ressalta é a de que, para o Partido Socialista, a gestão territorial, o planeamento do território, o licenciamento de obras por sociedades anónimas, que não têm nenhuma competência nem vocação para estas tarefas, é perfeitamente natural, até se adequa à sua Lei da Água, mas já não é natural e é até inconstitucional passar para as autarquias a gestão de áreas que lhes dizem directamente respeito. É que não estamos a falar nem dos cais, nem dos portos, nem das linhas férreas, que o Sr. Deputado Renato Sampaio fez questão de debitar, como se fosse dessas estruturas que estivéssemos a falar. Ora, além de não ser dessas estruturas que estamos a falar, o que está bem claro no corpo deste texto, o artigo 8.º que propomos, e que passo a ler, «A transferência de jurisdição para os municípios deve observar todas as disposições legais relativas ao Domínio Público Marítimo ou Hídrico, da Reserva Ecológica Nacional e da faixa costeira, quanto ao seu uso, ocupação e transformação», salvaguarda, claramente, o conjunto de questões que quer o PSD quer o PS suscitaram durante este debate. Não é dessas áreas que estamos a falar! Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente, quero agradecer à bancada do Partido Social Democrata a cedência de 2 minutos, que certamente não utilizarei na totalidade, até porque me vou limitar a explicar ao Sr. Deputado Renato Sampaio que nem faria qualquer sentido — e quem estiver a ouvir este debate deve pensar que estamos loucos nesta Câmara! —, estarmos, através de um projecto de lei que transfere competências das administrações portuárias para as autarquias, basicamente a não transferir nada, porque, segundo o Sr. Deputado Renato Sampaio, estas áreas estão sob a tutela do Ministério do Ambiente. Pois, Sr. Deputado Renato Sampaio, apelo, novamente, a que leia o projecto de lei para que perceba que não é dessas áreas que estamos a falar. Estamos a falar de áreas que, por via dos estatutos orgânicos das administrações portuárias, estão atribuídas à gestão dessas administrações e estão sob tutela dessas administrações! Obviamente, não estamos a colocar quaisquer outras áreas, como, aliás, tentei explicar-lhe duas ou três vezes! O Sr. Deputado certamente conhecerá situações destas por todo o País! Os seus camaradas de partido seguramente conhecerão, porque até falam disto nos jornais — veja bem! Portanto, decerto saberá de muitas áreas que estão sob tutela das administrações portuárias e que não devem estar sob essa tutela. E não diga que não estão, porque estão! Não estamos a falar da gestão das zonas marinhas, não estamos a falar do meio hídrico! Estamos a falar das zonas terrestres, ribeirinhas, onde, inclusivamente, muitas vezes se «plantam» parques, edifícios ou outros meios de utilização do domínio público! Por conseguinte, o Sr. Deputado não pode vir, aqui, dizer que estamos a passar competências do Ministério do Ambiente para as autarquias, porque não é esse o âmbito deste projecto. E isso resulta bem claro do que vou ler a seguir: «As câmaras municipais conservam todas as suas competências, incluindo as de gestão urbanística, quanto a quaisquer obras e utilizações na área de jurisdição das administrações portuárias que não se relacionem (…) com a actividade portuária.» Repito: «(…) das administrações portuárias que não se relacionem (…) com a actividade portuária.»! Julgo que mais claro do que este artigo poderá ser difícil encontrar. O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, passamos à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 178/X — Investigação da paternidade/maternidade (alteração de prazos) (Os Verdes). Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
2PCP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tema que hoje abordamos nesta reunião plenária reveste-se da maior relevância política em termos de uma adequada e racional repartição de poderes e competências entre, por um lado, os órgãos da administração central e, por outro, os municípios. As denominadas áreas portuárias subsistem ainda, actualmente, como um conjunto heterogéneo de terrenos que se podem integrar, tanto no domínio público ou privado do Estado, como no domínio municipal ou, ainda, mesmo em propriedade particular, embora muitas vezes não estejam sequer afectas à actividade portuária. Assim, o único traço dominante que engloba a situação em que se encontram estes imóveis é o facto de se encontrarem, todos eles, sob jurisdição portuária. Tentando visualizar numa perspectiva histórica, constata-se um paradoxo evidente: enquanto, por um lado, o modelo de administração dos portos tem vindo a sofrer mutações de relevo nos últimos 20 anos, por outro, os instrumentos e poderes de intervenção no território ao dispor destes agentes encontram-se, em grande medida, ainda regulados por legislação muito antiga que, por isso, carece de uma adequação às realidades actuais. Falo concretamente do Decreto-Lei n.º 32 842, de 11 de Junho de 1943, que, ao fim de 64 anos, se encontra ainda em vigor e que, por isso, se revela totalmente desactualizado face aos novos princípios políticos, constitucionais e legais da descentralização e da autonomia local. Daqui resulta que a jurisdição portuária compreende actualmente um conjunto de poderes de administração das áreas em causa que não se articulam, de forma alguma, com as novas competências dos municípios. Aliás, segundo a Associação Nacional de Municípios Portugueses são «naturalmente complexas as relações que se estabelecem entre uma cidade e o seu porto, pela existência de um conjunto de múltiplos e distintos interesses públicos e privados, que se territorializam nas frentes urbanas marítimas e portuárias, ao coexistirem entidades de jurisdição completamente autónoma, num território urbano por princípio indivisível, aumentando, de forma exponencial, a impossibilidade de colaboração e concentração com vista ao desenvolvimento do interesse público. Não fará sentido que, estando o conjunto dos territórios municipais totalmente coberto com planos de ordenamento, as áreas portuárias existam dentro destes territórios como espaços ‘vazios’ de qualquer disciplina regulamentar e para os quais não há sujeição à obrigatoriedade de elaboração de estudos de planeamento e ordenamento.» Impõe-se, assim, repensar a configuração do sistema de gestão territorial nas áreas sob jurisdição portuária, assegurando uma articulação com o planeamento territorial de nível municipal, sem prejuízo das atribuições da administração central em matéria de domínio público. Entendemos, por isso, que aos municípios deve competir uma acção de planeamento integradora e coordenadora das diversas redes de infra-estruturas e de serviços e uma efectiva gestão territorial das áreas portuárias não afectas à actividade portuária. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Embora comunguemos do espírito e dos propósitos do projecto de lei que o PCP apresenta, entendemos, contudo, que esta iniciativa pode pecar por não curar de se compatibilizar com a legislação ainda vigente relativa aos denominados Planos de Arranjo e de Expansão dos Portos, previstos no velhinho decreto-lei de 1943, bem como de se enquadrar e articular com todo o actual regime da Lei de Bases da Política do Ordenamento do Território e de Urbanismo. Pensamos, assim, que a iniciativa do PCP deverá, por um lado, encontrar uma solução para o que fazer com o regime legal ainda vigente — alterando-o, revogando-o ou ajustando-o, como, eventualmente, parecer melhor e mais adequado aos autores da iniciativa — e, por outro lado, adequar a pretensão de fundo da sua iniciativa ao quadro legal decorrente da aprovação da lei de bases do ordenamento do território e de urbanismo e da criação do sistema de gestão territorial e dos novos instrumentos de gestão territorial. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PPD/PSD defende uma solução técnica e política que passe genericamente por: enquadrar a articulação das entidades da administração central e dos municípios, relativamente às áreas portuárias, na tipificação dos planos já existentes para a gestão do território; devolver à gestão municipal áreas que, embora denominadas portuárias, não sirvam directa e principalmente esse propósito, segundo os princípios e as regras de gestão decorrentes dos planos municipais; e finalmente, promover um figurino legal para a actuação da administração central e dos municípios neste domínio que privilegie métodos de actuação o mais concertados possíveis. Desta forma, o Grupo Parlamentar do PSD apresentará, muito em breve, uma iniciativa legislativa que se enquadrará e contemplará estes aspectos, do nosso ponto de vista, essenciais para uma boa gestão das áreas portuárias com o envolvimento directo e efectivo dos municípios.
4PSD
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei do PCP em apreço propõe a transferência da jurisdição das zonas terrestres ribeirinhas das administrações portuárias para as autarquias. Para além das dúvidas de inconstitucionalidade que este projecto de lei nos parece conter, outros aspectos existem que não podemos deixar de analisar e que nos habilitam a tomar uma decisão sobre o mesmo. Em primeiro lugar, a oportunidade. É do conhecimento público que o Governo está em negociação com as autarquias no sentido de partilhar com estas a gestão de parcelas do território que constituem o domínio público hídrico, aliás, de acordo com o plano estratégico da actividade portuária, apresentado pelo Governo. Ora, o PCP, que tem conhecimento desta realidade, no meio deste processo negocial vem introduzir um ruído de fundo que pode prejudicar esta acção descentralizadora do Governo, que nós apoiamos e desejamos tenha êxito. Esta habilidade política até pode satisfazer os interesses localistas e o seu populismo autárquico, mas que se revela de um certo oportunismo político não temos dúvidas. Em segundo lugar, a incongruência. Este projecto de lei revela na sua formulação muitas incongruências ao ignorar as Leis da Água e da Titularidade dos Recursos Hídricos, aprovadas nesta Assembleia, que explicitam que os bens do domínio público hídrico não são da titularidade das administrações portuárias, como prevê o projecto, mas, sim, do Estado, e os poderes do Estado nesta matéria são exercidos pelos serviços do Ministério do Ambiente, que delega competências nas administrações portuárias de certas zonas do domínio público hídrico. O projecto de lei ignora também a possibilidade consagrada na Lei da Água da faculdade de delegação de competências nos municípios da gestão dos recursos hídricos. Ora, seria exactamente este instrumento, previsto na Lei da Água, que deveria ser utilizado, se houvesse interesse específico que justificasse esta transferência de competências das administrações das regiões hidrográficas para os municípios. Em todo o caso, não encontramos razão que justifique que os bens em causa, mesmo que não tenham interesses portuários directos, deixem de estar na tutela do Estado para passarem para os municípios, até porque existem determinadas infra-estruturas e equipamentos que devem ser realizados pelo Estado e que os municípios não poderiam, obviamente, assumir. Mas vai mais longe: o projecto de lei do PCP, que se quer aprovado, exclui da actividade portuária os edifícios administrativos da autoridade portuária, os edifícios de serviços de comunicações e segurança, como o sistema VTS ou, mesmo, as zonas de recepção e expedição de mercadorias e as plataformas rodoviárias e ferroviárias. Colocam, assim, em causa a actividade económica que é a actividade portuária. Não foram, por isso, felizes os autores desta iniciativa! Em terceiro lugar, o ambiente. Este projecto de lei é bem demonstrativo da visão instrumental que o PCP tem das questões ambientais. Para o PCP, a orla costeira ou zonas terrestres ribeirinhas não constituem um património ambiental a acautelar e a preservar, são meros activos imobiliários, ao dispor de interesses localistas. Em vez de integrarem estes espaços do nosso território como um dos bem mais preciosos de que Portugal dispõe, que é, sobretudo, um recurso natural do ponto de vista ambiental, económico e social que deve ser protegido sem hesitações e com determinação, propõem colocar quilómetros da faixa costeira à gestão casuística de cada um dos municípios. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Somos favoráveis à partilha de responsabilidades na gestão de determinados espaços do território entre o Estado e as autarquias. Temos, até, bons exemplos dessa partilha de responsabilidade, como sejam a zona da ribeira de Gaia, o Jardim da Cantareira, no Porto, ou a forma como a APDL (Administração dos Portos do Douro e Leixões) se tem relacionado com a Câmara Municipal de Matosinhos, onde a gestão do território é exemplar. Mas não estamos de acordo que, de uma forma simplista e cega, sem acautelar o interesse geral público, passem para os municípios espaços do território que ao Estado compete gerir. Por isso, obviamente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não votará favoravelmente este projecto de lei. O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
0PS
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei enferma de um erro básico fundamental, que é o de transferir zonas terrestres de uma entidade, que são as administrações portuárias, para os municípios, quando as administrações portuárias não têm tutela sobre essas zonas. Por outro lado, devo dizer que li bem o projecto de lei. Sempre dissemos, e continuamos a dizer, que entendemos que deve haver uma partilha de gestão desses territórios entre as autarquias e o Estado. Citei bons exemplos, nomeadamente o da Administração dos Portos do Douro e Leixões e das Câmaras Municipais de Vila Nova de Gaia, do Porto e de Matosinhos. Portanto, estamos de acordo com isso. Contudo, o que não podemos aceitar é que se transfira de uma entidade que não tem a tutela, que não é proprietária dessas zonas, para os municípios. Quem tem a tutela é o Ministério do Ambiente. Além disso, devo dizer que também li o projecto de lei. Se o aplicássemos, um conjunto de edifícios, um conjunto de equipamentos ficaria excluído. Aliás, basta ler o artigo 2.º do projecto de lei, que define o que são actividades portuárias. E estão excluídos, por exemplo, edifícios de administração, as torres onde podem ser instaladas o VTS, os sistemas rodoviários… Tudo isso fica excluído,… O Sr. Renato Sampaio (PS) — … porque o artigo 2.º define claramente o que é actividade portuária. Por isso, não queria ir tão longe, mas penso que houve uma grande incompetência na realização deste projecto de lei.
0PS
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei do Partido Comunista Português tem, quanto a nós, apenas um mérito — o de identificar um problema que tem a ver com a relação entre a administração central e a administração local. Entre os princípios consagrados na Constituição de 1976, na autonomia do poder local, na Carta Europeia de Autonomia Local, está o de se criar uma verdadeira autonomização e descentralização. Ora, quando estamos a falar de matéria relativa aos portos, o que é fundamental fazer é conciliar o interesse nacional com o interesse local. E nós consideramos que, do ponto de vista estratégico nacional, o mar deve ser uma das prioridades do País. Esse é um interesse nacional, é um interesse do País, não apenas do Estado mas de toda a comunidade. São os portos a nossa «porta» para o mar. É aí que o País se completa. Portugal, por muito que às vezes se esqueçam, tem mais mar do que terra e, por isso, tem de garantir o acesso a esse recurso, que é o mar. Ora, os portos são fundamentais em termos de transportes e como actividade económica. Evidentemente, consideramos que compete ao interesse local definir as matérias de urbanismo e de ordenamento do território. Portanto, na conciliação entre os interesse nacional e local, entendemos que, em termos de actividade económica e de «porta» do País para o mar, os portos têm de ter salvaguardadas as zonas de actividade portuária, as faixas destinadas ao desenvolvimento dessas zonas de actividade portuária e à sua protecção. Do que já discordamos é que os portos se possam assumir enquanto entidades urbanizadoras ou urbanistas, o que significa que as matérias relativas ao planeamento têm de ser conciliadas entre o planeamento nacional e a estratégia nacional de acesso ao mar e os interesses locais de planeamento e urbanismo local. Mas esse é um problema que não é apenas dos portos, é de todos os edifícios do Estado e de todo o património do Estado. E nesse aspecto, o que consideramos é que, do ponto de vista de técnica legislativa, aquela que é prosseguida pelo Partido Comunista Português acaba por ser deficiente, porque através deste projecto de lei não acautela todo um conjunto de legislação que tem a ver com o planeamento, mas também com o licenciamento. Se consideramos que, em relação ao planeamento nas zonas que não estão adstritas ao desenvolvimento da actividade portuária, e que, no fundo, são zonas que, por razões históricas, ainda estão na dependência dos portos mas que, em termos de função, em actividade portuária, já não têm esse destino, as autarquias devem participar nessas matérias. Questão completamente diferente é a da sua propriedade. Ora, aquilo que o Partido Comunista propõe, depois das nacionalizações de 1974/1975, é a «autarquização de 2007», ou seja, de repente, todo o património imobiliário passaria a fazer parte do património das autarquias. É isso que consta do projecto do Partido Comunista. Do ponto de vista da técnica legislativa, ao proporem que tudo o que é domínio público passe para as autarquias locais, estão a esquecer-se de que há matérias que têm de ser separadas. Já quando estamos a falar do domínio privado ou da propriedade privada, justifica-se que as autarquias tenham o poder de licenciar, mas não se justifica que elas tenham de passar a ser proprietárias desse património. Em relação ao domínio público marítimo e em relação à água, é evidente que se justifica que se encontre um adequado modelo de gestão. E, neste domínio, já tivemos ocasião de chamar a atenção, por mais de uma vez, para a profusão de entidades que têm jurisdição sobre o litoral. Por isso mesmo, o CDS defende que deve ser criada uma agência para o litoral, porque, neste domínio, para além das autarquias, temos o Ministério do Ambiente, o ICN, o Ministério da Defesa, a Marinha, os Portos, as Capitanias, a Polícia Marítima, enfim, múltiplas entidades. Portanto, relativamente ao domínio público marítimo, o problema é, essencialmente, de excesso de entidades e, por isso, a solução deveria ser a criação de uma entidade que pudesse unir a acção em toda esta matéria. Agora, aquilo que consideramos é que, se o Partido Comunista Português pretendia alterar o regime actualmente existente, deveria ter feito propostas de alteração naquilo que diz respeito à legislação que regula os planos de ordenamento e as regras relativas ao licenciamento. A criação anómala deste projecto de lei, por si só, irá introduzir uma ainda maior complexidade no sistema. Portanto, se, em matérias que têm a ver com as competências e atribuições das autarquias, como o planeamento, o licenciamento, impostos, taxas, consideramos que não se justifica, em relação ao domínio privado e em relação às áreas não portuárias, um regime excepcional, da mesma forma entendemos que se deve manter um regime excepcional para os portos, porque são a nossa «porta» de acesso ao mar e, por isso mesmo, devem ser salvaguardados.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Em nome do Bloco de Esquerda, vou pronunciar-me sobre o projecto de lei n.º 135/X. E, sobre este diploma, tenho ouvido aqui, da parte de várias bancadas, referências a coisas que nele não constam e nem sequer resultam da sua leitura directa — se estivesse aqui o Deputado Jorge Strecht, diria que são considerações escatológicas do projecto de lei, mas, enfim, ele não está aqui para o dizer. Sigo as boas praxes e as boas normas de conduta lexical de alguns Deputados do Partido Socialista. Mas, indo à matéria, gostaria de fazer algumas observações. Nós partilhamos da ideia de devolver aos municípios a competência, a titularidade e a capacidade de gestão das zonas terrestres ribeirinhas. Não faz sentido que aquilo que não é directamente portuário seja gerido e administrado pelas entidades portuárias, embora esteja na titularidade geral do Estado. Não nos parece que isto faça sentido e são cada vez mais as vozes dos autarcas do Partido Socialista que o reclamam, a começar pelo Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, etc. Portanto, tudo isto vem até um pouco ao arrepio da intervenção do Sr. Deputado Renato Sampaio, em nome do Partido Socialista. Agora, na verdade, há alguns problemas nesta transição que, creio, deveria ter melhor atenção e melhores olhos da parte do Partido Socialista, até para que pudéssemos debater na especialidade algumas das soluções encontradas. É verdade que é necessário manter uma certa capacidade de investimento e que isso necessita de uma boa entente com a administração central, não para equipamentos directamente portuários mas para outro tipo de equipamentos. Creio, no entanto, que isto pode ser protocolado e que, nessa transição, poder-se-á encontrar um meio termo, dado que não se pode passar tudo, directamente, sem essa capacidade de investimento, para as autarquias locais. Também há problemas ao nível do planeamento que não se resolvem só com o ordenamento jurídico actualmente existente. Creio que, nestas matérias, é onde lamentamos a inexistência de uma entidade de nível regional, porque ela teria aqui, verdadeiramente, todo o cabimento, já que, sem capturar competências dos municípios, teria uma outra capacidade, nomeadamente do ponto de vista dos instrumentos de gestão do território, para adequar a escala para o conjunto das áreas portuárias, o que, assim, é difícil. O Partido Comunista procura encontrar uma solução para isto, criando uma plataforma dos municípios junto da administração central. Parece-nos uma solução aceitável, nesta transição, mas, em todo o caso, precária, sem a regionalização. Nós também temos, com certeza, preocupações ambientais, e várias, mas isto não significa que uma assembleia municipal, na plena posse de uma capacidade de decisão, vá decidir fazer, em determinado local, uma marina e todos os municípios, em cadeia, façam não sei quantas marinas. Não é isto que se pretende nem é isto que pretende este projecto de lei e é por isso que é preciso adequar os níveis de planeamento e de capacidade de decisão. No entanto, creio que, actualmente, os instrumentos de gestão territorial existentes não limitam às administrações portuárias aquilo que possa ser a especulação imobiliária e também não o fariam, futuramente, se fosse, eventualmente, aprovado este projecto do Partido Comunista, o que, na minha óptica, seria mais do que correcto. Mas creio que esta é uma outra discussão, sobre a introdução de um conjunto de normas-travão que não permitam que haja volumetrias excessivas nas frentes ribeirinhas, que haja implantação de imóveis que nada tenham a ver com o enquadramento paisagístico. Tudo isto são coisas que, infelizmente, hoje, já acontecem, pela mão das administrações portuárias e, portanto, podem também vir a acontecer pelos municípios, pelo que precisam de ser salvaguardadas. É que, se creio que a decisão mais próxima dos cidadãos e mais correcta será, com adequado nível regional, aquela que está na instância autárquica, do ponto de vista da regulação estatal, teremos de encontrar mecanismos-travão para que isto não venha a ser a «galinha dos ovos de ouro» de um orçamento de um ministro das finanças qualquer nem a «galinha dos ovos de prata» de uma autarquia, também ela dispersa e aflita, em face do seu orçamento. Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, concluo dando a concordância do Bloco de Esquerda a este projecto de lei, com as observações que aqui fiz. Creio que é um mau indício, até porque politicamente tropeço, estando toda uma série de autarcas do Partido Socialista a pedir esta medida, que não haja sequer a atenção, a sensibilidade e a consideração da bancada do Partido Socialista para prolongar o debate em comissão, deixando em aberto um dossier que está longe de estar fechado.
3BE
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a discutir o projecto de lei n.º 135/X que, para que não nos esqueçamos, diz respeito à gestão das zonas terrestres ribeirinhas. Propõe-se o Partido Comunista Português, com este projecto de lei, devolver aos respectivos municípios a jurisdição ou titularidade de gestão ou propriedade dos bens de um conjunto de terrenos que têm estado, indevidamente, desde há uma série de anos, à guarda das administrações portuárias. Esta é uma reivindicação de há longa data dos municípios e, de facto, é uma questão de mera justiça e de lógica, pois de duas, uma: ou os terrenos estão, de facto, afectos à actividade portuária, são indispensáveis para a sua efectivação, para a sua operacionalidade, em termos de segurança, etc. e, neste caso, devem estar sob a jurisdição ou gestão das administrações portuárias ou, então, assim não acontece e, neste caso, não devem estar à guarda das administrações portuárias mas, antes, afectos, porque é isto que faz sentido, no que diz respeito ao ordenamento do território, aos municípios que têm essa responsabilidade. Mas não é só isto que está em causa, porque, naturalmente, no ordenamento do território, não intervêm apenas municípios nem instrumentos ou planos de nível municipal, intervêm também planos de nível regional, sectorial e nacional, havendo, portanto, um conjunto de entidades nacionais com responsabilidades na área do ordenamento do território. Agora, o que não convém, nesta discussão, é estar aqui a «misturar alhos com bugalhos», apesar de termos assistido a isto, da parte das bancadas do PS e das direitas, ao trazerem à liça outras questões que não são, de modo algum, tidas nem achadas nesta situação. Isto não quer dizer que não haja uma preocupação permanente e muito séria, quando falamos da costa e da pressão imobiliária que a nossa costa tem vindo a sofrer, mas, agora, do que estamos aqui a falar não é disso, porque essas preocupações têm de ser salvaguardadas com adequados instrumentos de ordenamento do território, com adequados planos, com regras sérias e restritas, com fiscalização e com a implementação dessas regras, e isto opera-se a outro nível, a nível do ordenamento do território. Mas não é disto que estamos hoje, aqui, a falar, nem sequer da Lei da Água ou dos recursos hídricos ou do domínio público hídrico, matéria sobre a qual o Partido Socialista melhor faria em ficar calado, porque, de facto, com essa Lei vem abrir a possibilidade de entrega do domínio público hídrico a privados, a gestão privada, o que não me parece que seja a melhor solução quando falamos em salvaguardar os valores do ambiente ou o património, que é de todos. Portanto, estamos todos muito preocupados com a costa, mas há muito mais costa para além dos portos e, se querem falar da costa e da salvaguarda dos nossos mares, da nossa costa, que, aliás, com as alterações climáticas, será uma questão cada vez mais premente, então, teremos oportunidade de falar disso e do que não tem vindo a ser feito pelos sucessivos governos nessa matéria. Mas não é isto que está hoje, aqui, em discussão, pelo que me parece que os Srs. Deputados, ao quererem levar o debate para outros lados, estão não só a querer fugir à real situação em causa… Vou concluir, Sr. Presidente. Como estava a dizer, os Srs. Deputados, ao quererem levar a discussão para outros campos, estão a querer fugir à real situação em causa e até estranhamos esse comportamento, da parte do Partido Socialista, porque, quem lesse o Diário Económico, de 12 de Novembro deste ano, veria a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes falar de um conjunto de regras que irão ser alteradas a este nível e que pareciam vir exactamente ao encontro deste projecto do Partido Comunista. Por isso, ficamos um pouco baralhados com a intervenção do Sr. Deputado Renato Sampaio.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A quantos de nós não aconteceu já entrar numa superfície comercial, dirigir-nos à zona das frutas e legumes e não conseguir encontrar nenhum ou quase nenhum produto português? A muitos, certamente! E, tal como a vós, a muitos portugueses também já aconteceu este paradoxo: entrar num estabelecimento localizado em Portugal, muitas vezes detido por empresas portuguesas, onde se encontra produtos de todo o mundo (da Ásia, da Austrália, da América, da África, etc.), mas não se consegue encontrar bens alimentares cultivados em Portugal. É uma questão que consideramos preocupante, não por mero proteccionismo da economia ou da produção agropecuária nacional, como, à primeira vista, poderá parecer, mas por ter implicações mais vastas e que constituem preocupação do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes». O projecto de lei que hoje apresentamos trata não apenas de cuidar do interesse produtivo nacional, ao procurar fomentar o mercado dos produtos nacionais, regionais e locais, mas também da garantia de um direito fundamental do consumidor, o poder escolher, o poder optar por adquirir e consumir bens agrícolas produzidos no seu País — e isto só se garante se os espaços comerciais oferecerem esta possibilidade —, e ainda da criação de condições para que se reduza, com o auxílio das opções livres dos consumidores, a importação de bens do estrangeiro. Portugal, hoje, importa cerca de 75% do que consome; antes de entrar no mercado comum da União Europeia, importava apenas 25% e produzia os restantes 75% do que consumia. Este é um dado insofismável e bem demonstrativo da decadência do aparelho produtivo nacional e de uma perigosa dependência do exterior, porventura tão grave como a dependência energética, que também nos afecta e atinge a própria soberania nacional, neste caso a nossa soberania alimentar. Esta não é uma medida proteccionista, pese embora a economia e a produção nacionais se encontrem, de facto, cada vez mais depauperadas e pudessem beneficiar de apoios no escoamento de produtos, mas, sim, uma medida que compreende que existem múltiplas vantagens no consumir local, isto é, em consumir bens e produtos criados e produzidos o mais perto possível do local de consumo. Não é apenas a protecção do produto regional e tradicional que está em causa, pese embora estes valores também sejam merecedores de atenção e de medidas proactivas por parte do Governo para a manutenção da nossa cultura, da nossa biodiversidade própria, única e inimitável, património inestimável. Esta medida reconhece que estas vantagens passam não só pelo acesso a bens alimentares, por exemplo, mais frescos, seguros e saudáveis, de qualidade e de confiança — aliás, a qualidade é mais facilmente controlável e responsabilizável devido à proximidade do produtor ao consumidor — como pela melhoria da qualidade, pela dispensa de produtos de conservação com recurso a aditivos químicos de conservação ou a processos de congelamento ou de refrigeração, que sempre levam a perdas nutricionais significativas, e também por algo que é um objectivo mais global e que hoje todos reconhecemos: o combate às alterações climáticas. Ao contrário do que se possa pensar, não é de todo despicienda a quantidade de energia hoje consumida, que se reflecte em termos de consumos energéticos pouco inteligentes e de emissões de gases com efeito estufa para a atmosfera, relacionadas com o comércio mundial da agro-indústria. E a verdade é que o mercado não garante estes desígnios. Pelo contrário, o mercado sozinho subverte toda esta lógica irracional, ambientalmente insustentável e que não garante os direitos dos consumidores, nem preços justos para os produtores, o que leva a que 1 kg de maçãs na Nova Zelândia, no outro lado do planeta, cuja produção consumiu x kg de fuel e emitiu x kg de CO para a atmosfera, apareça numa prateleira de um qualquer 2 supermercado em Portugal mais barato do que 1 kg de maçãs produzidas ali, a 100 km, a 20 km ou a 500 m. O projecto de lei de Os Verdes prevê para os estabelecimentos de comércio por grosso ou a retalho de dimensão considerável — isto é, com uma área de venda contínua igual ou superior a 5000 m2 ou, no caso de empresa ou grupo, que detenha, a nível nacional, uma área de venda acumulada igual ou superior a 15 000 m2 —, a obrigatoriedade de apresentarem produtos alimentares produzidos em Portugal para que o consumidor possa escolher. Entendemos que os valores que esta iniciativa pretende defender justificam plenamente a obrigação que cria para estas superfícies comerciais, que, pela sua dimensão, não encontrarão grandes dificuldades na sua implementação. Aliás, a prová-lo estão algumas iniciativas privadas, que já reconheceram que a marca nacional é uma mais-valia económica e de marketing e que, por isso, têm apostado em promover campanhas de produtos e de produtores nacionais. Contudo, entendemos que tal não deve estar apenas na dependência da boa vontade de empresários, deve constituir uma regra do nosso mercado em defesa do ambiente, da saúde e segurança alimentar e do direito à livre escolha do consumidor.
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Sr. Presidente, quero apenas registar o facto de todas as bancadas consideraram simpático o projecto apresentado pelo Partido Ecologista «Os Verdes», só é pena que falte a coragem para dar um passo em frente, no sentido de defender os valores que o diploma apresenta. O projecto de lei não é, certamente, isento de falhas e poderia ser melhorado se fosse dada a oportunidade para discutirmos estas questões em sede de especialidade, em comissão. É pena que não seja dada oportunidade aos portugueses para consumirem produtos nacionais nas grandes superfícies.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes: Independentemente da boa intenção que possa estar subjacente a esta iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes», deve considerar-se, desde logo, que a identificação da origem dos produtos não é fácil. Hoje há realidades contrárias, mas que demonstram isso mesmo. Os produtos produzidos em Portugal que são armazenados, de forma centralizada, por empresas de grande dimensão em Espanha e que, depois, são vendidos em lojas em Portugal, na sua lógica, Sr. Deputado, são considerados produtos espanhóis, por virem de Espanha para serem vendidos cá; mas eles foram produzidos no nosso país! O contrário também é verdade! Ou seja, há produtos que são manipulados e vendidos por empresas portuguesas, mas, da sua composição, só alguns produtos são nacionais se não forem todos estrangeiros. Sr. Deputado, gostaria de saber qual é, para si, a origem destes produtos. Há zonas de fronteira e de grande indefinição. Aquilo que foi encontrado no quadro legal nacional, no que diz respeito às grandes superfícies e aos grupos de distribuição — porque as restrições que VV. Ex.as têm em relação aos 5000 m2 e aos 15 000 m2, em termos globais, abrangem umas dezenas de grupos estrangeiros que operam em território nacional e de grupos nacionais —, foi que este licenciamento fosse condicionado à origem dos fornecedores, ou seja, de fornecedores nacionais nestas grandes superfícies. Mas mesmo esta imposição está sujeita a vários processos levantados pela Comissão Europeia em relação à questão da origem, da nacionalidade dos fornecedores, que é até mais fácil de identificar do que a dos produtos, apesar de também aqui, muitas vezes, ser difícil ter certezas. Mais: a inclusão dos representantes das associações comerciais nas comissões que dão parecer vinculativo sobre estes licenciamentos — porque não cabe ao Governo licenciar ou não — também é questionada pela Comissão Europeia. Ou seja, por que é que quem está na área do comércio tem espaço para dar uma palavra sobre o licenciamento dos seus concorrentes? Há ainda mais: a impossibilidade de, à luz do quadro legal europeu do mercado interno, haver restrições extra-económicas à implantação, nomeadamente, de novas grandes superfícies ou à comercialização de produtos, sejam eles quais forem, do espaço interno comunitário. Ou seja, não vale dizer que só se pode vender português, que não se pode vender espanhol ou grego; não vale dizer que não se pode licenciar por ao lado já haver uma igual, porque esta é a lógica da concorrência no espaço comunitário. Ou seja, os produtos, independentemente da sua origem, concorrem pela sua valia, pelo seu preço, pela componente da sua inovação e do seu valor acrescentado e as empresas concorrem umas com as outras sem terem qualquer tipo de restrição. É também graças a isto que alguns produtos portugueses são vendidos (e desejamos que sejam cada vez mais) sem restrições em mercados que não o mercado nacional português. Ou seja, quando, porventura motivados pela melhor das intenções, pretendemos criar restrições, ainda que parciais, à venda de produtos, pondo uma componente nacional obrigatória, estamos, ao mesmo tempo, a criar o efeito simétrico, que é, porventura, outros, nos seus países, levantarem restrições à venda de produtos com origem em Portugal. Concluo já, Sr. Presidente. Portanto, percebemos que o Partido Ecologista «Os Verdes» tende a reagir às questões da concorrência, à afirmação da qualidade dos produtos portugueses, à capacidade de os portugueses, num mercado livre, se afirmarem por serem melhores, por fazerem melhor, por fazerem diferente e não, propriamente, por terem um quadro legal que crie impedimentos a outros, porque seremos os maiores prejudicados quando os outros tiverem um quadro legal que impeça os nossos produtos.
0PS
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» induz várias reflexões de diferentes ordens, mas julgo que vale a pena começar por fazer alguma clarificação. A intenção generosa que está subjacente a este projecto de lei, de melhorar a liberdade de escolha dos consumidores, não está, em termos daquilo que são as previsões do diploma, traduzida em nenhum constrangimento à superfície comercial de comercializar qualquer outro produto. Portanto, não entra naquilo que é a argumentação do Sr. Deputado Afonso Candal, pois não prevê restrições ou limitações à diversidade de produtos que são oferecidos por estas superfícies comerciais. A limitação que o diploma impõe é à gestão da própria superfície comercial, ao obrigála a ter uma variedade de produtos que permita a opção entre produtos de origem diversa. O Sr. Deputado Afonso Candal tem razão em grande parte quando diz que há muita dificuldade em definir a origem real de muitos dos produtos colocados à disposição dos consumidores. Esta é uma dificuldade. Mas esta discussão tem necessariamente de percorrer um caminho no sentido de clarificar as formas de resolver este problema, porque a União Europeia vai ter de analisar a distância que os produtos percorrem até chegarem aos consumidores, porque esta distância, Sr. Deputado, quer queira, quer não, traduz-se em consumo de carbono no transporte dos produtos. E este agravamento do efeito do transporte dos produtos em longas distâncias para os fazer chegar até aos consumidores tem de passar a ser considerado como um dos problemas da actividade comercial, seja à grande ou à pequena escala. Srs. Deputados de Os Verdes, esta é, justamente, a dificuldade. O Bloco de Esquerda apoia esta vossa iniciativa, apesar de encontrar alguma ambiguidade do ponto de vista da definição de «local». Isto porque os problemas colocados pelo aquecimento global obrigam-nos a equacionar a necessidade de reduzir a distância a percorrer pelos bens para chegarem aos consumidores, o que faz com que cada vez mais a definição de «local» não seja sujeita ao conceito de fronteiras ou de nacionalidade. E, na verdade, para um consumidor de Elvas é muito mais local um produto proveniente de Badajoz do que um produto proveniente do Porto ou de Viana do Castelo. Parece-me, portanto, que este conceito de «local» não vai totalmente ao encontro da alteração de paradigma, ao nível da nossa actividade comercial, que precisa de começar, desde já, a ser reflectida, discutida e equacionada.
3BE
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Traz o Partido Ecologista «Os Verdes», hoje, a este Plenário, o projecto de lei n.º 10/X, que estabelece o direito de consumir local. Trata-se de uma iniciativa que o partido proponente justifica com base na impossibilidade de ser atribuído aos consumidores, aquando da compra, o direito de opção entre produtos nacionais ou produtos de outra origem. Numa primeira leitura, este projecto não deixa, seguramente, de despertar um sentimento de simpatia, e mesmo de adesão, na medida em que, a ser aprovado, permitiria dar a possibilidade aos consumidores portugueses de poderem optar, preferencialmente, por produtos nacionais. Acontece, porém, que em Portugal, para além da legislação com origem nacional, vigora igualmente um conjunto alargado de normas com origem na União Europeia. A presente temática assenta, no fundo, no pressuposto da liberdade de comércio de produtos, independentemente da sua origem nacional ou do espaço comunitário, matéria esta que, entre outros diplomas conexos, se encontra já regulada pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, que aprova o regime jurídico da concorrência. Mas o que está aqui, fundamentalmente, em causa é uma matéria de direito da concorrência, sendo que as regras da concorrência que nos interessam neste caso se encontram enunciadas nos artigos 81.º a 89.º do Tratado CE. Delas resulta que qualquer vantagem administrativamente concedida pelos Estados ou através de recursos estatais é considerada um auxílio estatal sempre que confira uma vantagem económica ao seu beneficiário, seja atribuída de forma selectiva a certas empresas ou certas produções, ameace falsear a concorrência, afecte as trocas comerciais entre os Estados-membros. Diga-se, a este propósito, que a prática habitual, quer pela Comissão Europeia quer pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, tem sido a de interpretar a noção de «auxílio por parte de um Estado» de uma forma muito lata e que vai, inclusive, mais longe da estrita letra do Tratado de Roma. Efectivamente, as instâncias comunitárias têm considerado como «auxílio estatal» todos os auxílios públicos ou concedidos por uma entidade pública de carácter territorial. Sendo certo que o artigo 2.º do mesmo Tratado permite que, no âmbito da promoção do desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades económicas em toda a União e consoante o diferente desenvolvimento económico dos Estados-membros e das várias regiões, possam existir intervenções pontuais por parte dos Estados no sentido de pôr cobro a estes desníveis — podendo, pois, existir um certo número de derrogações compatíveis com o mercado interno —, com o presente projecto de lei assistimos, contudo, na prática, e sem qualquer razão justificativa do seu carácter excepcional, à existência de uma discriminação dos produtos alimentares provenientes de outros Estados-membros da União, por força da exigência da presença de uma quota de produtos nacionais em determinados estabelecimentos comerciais. Trata-se, a nosso ver, de uma proposta que choca com a regra da «não discriminação», directa ou indirecta, dos produtos de origem comunitária, desta forma violando o Direito comunitário e consagrando, na prática, um verdadeiro auxílio de Estado. Devo dizer, Srs. Deputados, que, vindo de onde vem, este projecto não surpreende. Afinal, os seus autores nunca foram defensores da economia de mercado. Um segundo aspecto prende-se com aquele que se nos afigura ser o claro desrespeito deste diploma relativamente ao princípio da igualdade, uma vez que, a ser aprovado, consagraríamos na lei o privilégio de um tipo específico de estabelecimentos comerciais, sendo que, apenas nesses, seria aplicada a obrigatoriedade da medida preconizada pelo Partido Ecologista «Os Verdes». Cremos que, ao invés da medida proposta, Portugal e os produtores portugueses lucrariam muito mais em apostar no aumento da qualidade dos seus produtos, desenvolvendo campanhas destinadas à promoção dos mesmos no mercado nacional. E aqui, sim, cabe ao Estado e ao Governo uma política de apoio ao comércio e aos comerciantes.
4PSD
2CENTER
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também não deixo de ter uma certa simpatia por este projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes», mas gostaria de voltar um pouco atrás. O risco e o problema que poderiam ocorrer, pelo menos olhando para a forma como o Governo socialista trata os agricultores e os produtos agrícolas, seria não haver, sequer, produto nacional agrícola para cumprir com esta lei, caso fosse aprovada. Este seria o grande problema. No entanto, passando por isto, o que é necessário não é o que estabelece esta proposta, que me parece simpática, mas, sim, que os produtos nacionais agrícolas ganhem escala para competirem no mercado europeu, através da sua qualidade e do seu baixo preço, em concorrência aberta e livre. Parece-me ser este de facto, o caminho; aliás, é o que está nos Tratados e nos acordos internacionais, pelo que esta medida legislativa choca também com isto. Para além de proteger o direito do consumidor a poder optar, há também o direito de a iniciativa privada e o próprio empresário oferecer o produto que entender, cabendo ao consumidor optar por um dos produtos. Mas o consumidor tem também a possibilidade de optar por produtos nacionais à venda não em grandes superfícies mas em lojas de associações ou de produtores nacionais, e há já inúmeros casos, não chocando, deste modo, com qualquer regra do mercado livre. Por outro lado, é dito no discurso que com este diploma se procura fomentar algumas medidas ambientais, mas isto, depois, não decorre da leitura do articulado. E parece-me, a exemplo de outros países, que estão a utilizar o argumento da emissão de CO como uma 2 medida encapotada de proteccionismo para eventualmente protegerem a produção nacional. Parece-me que até poderia ser uma forma imaginativa de um caminho que se poderia seguir. O que me parece lógico é não impor, ao arrepio daquilo que são os acordos da União Europeia e as regras do mercado livre, a obrigatoriedade da existência do produto nacional numa determinada superfície. O que está em causa é a existência, ou não, de produtos agrícolas portugueses de qualidade, que possam ser comprados em território nacional ou noutros. Gostava muito de ver a pêra rocha portuguesa à venda nos mercados europeus, como também ver que o tomate português era o melhor da Europa e que podia ser comprado em qualquer supermercado ou grande superfície da Europa, já para não dizer em supermercados ou grandes superfícies portuguesas. Portanto, esta legislação, parecendo-me simpática, não resolve o problema e é uma medida proteccionista que vai ao arrepio da legislação europeia e dos acordos que Portugal assinou.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Qual é o «crime» do projecto de lei n.º 10/X, de Os Verdes, para a política de direita do actual e de anteriores governos? Visar dois objectivos: a valorização da produção agrícola nacional e a livre opção dos consumidores entre produtos agrícolas nacionais e produtos agrícolas estrangeiros. Ou seja, o «crime» de dizer que nas lojas portuguesas dos grandes grupos da distribuição deve haver produção agrícola portuguesa! Os argumentos avançados, em particular, no relatório elaborado por um Deputado do Partido Socialista não têm sustentação material, apenas a leitura formal dos Tratados lhe permite concluir o que conclui, e contradizem até princípios, como o da liberdade de os consumidores poderem optar entre produção nacional e produção estrangeira. São usados três argumentos, que, supostamente, derivam do Direito comunitário e nacional. Primeiro, o conteúdo do projecto de lei discrimina, de forma abstracta e geral, os produtos comunitários. Falso! O que se propõe é que a produção nacional não seja discriminada pelo abuso de poder do mercado das grandes cadeias de distribuição. Segundo, o projecto de lei põe em causa o princípio da igualdade entre estabelecimentos comerciais. Falso! O que se propõe é o restabelecimento da igualdade, face à produção nacional. Terceiro, o projecto de lei acaba por materializar um auxílio do Estado. É auxílio do Estado uma intervenção na regulação para a igualdade dos agentes comerciais/produtores agrícolas, face ao mercado retalhista?! Poderíamos falar dos auxílios do Estado no presente momento, por exemplo, relativamente à episodia da doença da «língua azul» no Alentejo: enquanto o Governo português anda a pensar se a União Europeia permite ou não, em Espanha, duas comunidades, a Andaluzia e a Estremadura, já estão a dar esse ditos «auxílios do Estado». Por outro lado, os instrumentos apontados para resolver o problema da falta de produção nacional nas grandes e médias superfícies são as normas presentes na lei de licenciamento, a Lei n.º 12/2004. Mas a simples leitura do relatório de execução, elaborado pelo Ministro da Economia, sobre esta lei, mostra que tais normas não estão minimamente em execução, bem pelo contrário. Quem argumenta contra o projecto de lei em apreço esquece regras básicas para o livre funcionamento dos mercados e a igualdade de concorrência entre agentes, a existência de uma informação adequada e suficiente e não imperfeita e assimétrica, como é manifestamente o caso do mercado retalhista e por grosso, nacional e internacional da produção agropecuária. Depois, há as consequências da posição monopolista, do poder de mercado desses grupos a montante, junto dos seus fornecedores, e a jusante, junto dos consumidores. Se alguém tem dúvidas sobre o abuso do poder de mercado das grandes distribuidoras, sem que a Autoridade da Concorrência intervenha, leia os recentes estudos sobre comercialização da produção hortofrutícola, elaborados pelo Observatório dos Mercados Agrícolas. No estudo de Maio de 2006 demonstrava-se a existência de um desequilíbrio assinalável na distribuição do rendimento gerado pela comercialização, que não abrange apenas uma determinada fruta ou uma dada hortaliça mas toda a fileira analisada dos hortofrutícolas e abrangerá praticamente todas as outras fileiras do sector agrícola. Mais, diz ainda que esse desequilíbrio está no sector dos mercados retalhistas. Vou concluir, Sr. Presidente. Depois, se soubermos que, segundo o Índice Nielsen Alimentar, a percentagem de vendas de hiper e supermercados representava já em 2004 (antes da nova área comercial de 1 500 000 m2, permitida pela Lei n.º 12/2004) 83,6% do total do mercado e o conjunto dos cinco maiores operadores 67,5% do mercado de retalho, tiraremos as conclusões que se impõem. Uma conclusão final: certamente melhorado nos seus mecanismos, o País e a agricultura portuguesa bem precisavam de legislação como a que agora é proposta pelo Partido Ecologista «Os Verdes».
2PCP
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo traz a esta Assembleia da República o pedido de autorização legislativa para, no âmbito do processo contra-ordenacional do regime jurídico do transporte rodoviário de mercadorias, estabelecer a sanção acessória de apreensão de documentos do veículo, não tipificada no regime geral das contra-ordenações. Este pedido de autorização legislativa parte do pressuposto do impacto do transporte rodoviário de mercadorias realizado em território nacional e, consequentemente, da sua importância negativa, que se traduz na verificação de uma acentuada sinistralidade, envolvendo os transportes de mercadorias, como se plasmava no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, aprovado ao tempo dos governos da responsabilidade do Partido Social Democrata. E, tal como se defendia na altura, continua a ser essencial acentuar as medidas de prevenção, fiscalização e repressão, de modo a reduzir a sinistralidade e a contribuir para a segurança rodoviária. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O actual sistema sancionatório apenas se aplica ao transporte público ou por conta de outrem, pelo que a sua extensão aos transportes por conta própria configura uma medida de justiça e de equilíbrio própria de um Estado de direito. E uma vez que o transporte de mercadorias por conta própria não está sujeito a qualquer licença sectorial, não é passível de enquadramento no regime geral das contra-ordenações em vigor. Esta situação, de manifesta injustiça comparativamente a outros operadores, torna necessária a extensão do regime sancionatório ao transporte por conta própria, para o caso de repetidas infracções por excesso de carga, de forma a impedir o prevaricador de realizar transportes, tal como sucede para os transportadores profissionais. A solução mais equilibrada para se alcançar este fim passa, inquestionavelmente, pela apreensão do certificado de matrícula do veículo. __________________________________________________________________________________________________ Sr.as e Srs. Deputados: Todos concordamos que os objectivos de redução da sinistralidade devem ser prosseguidos pela via legislativa, sem descurar, é evidente, a educação, a sensibilização e a prevenção. Estas áreas, que este Governo lançou ao abandono, e das quais desafectou verbas de forma ilegal, como repetidamente temos alertado no que respeita ao Fundo de Garantia Automóvel, devem merecer uma especial atenção. Aliás, esperamos para ver o que o Governo vai fazer relativamente ao Fundo de Garantia Automóvel, ainda em 2006. Os custos sociais, humanos e económicos derivados dos acidentes rodoviários são de tal modo elevados que devem merecer o maior consenso entre todas as forças partidárias. A proposta de lei vem acompanhada do projecto de decreto-lei, pelo que as questões que, eventualmente, poderiam suscitar dúvidas ficam atenuadas. As sanções pecuniárias parecem-nos ajustadas e a malha utilizada para efeitos da aplicação da medida acessória de suspensão da licença ou de apreensão do certificado de matrícula do veículo automóvel afigurase-nos, igualmente, razoável. Estamos assim, na generalidade, de acordo com a proposta de lei. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD é um partido com sentido de Estado, que, em questões essenciais e estruturantes, está disponível para encontrar os consensos que potenciem uma estabilidade legislativa que dignifique o legislador e dê certeza jurídica aos cidadãos. O combate à sinistralidade é um dos vectores fundamentais para o nosso país que ainda apresenta números preocupantes ao nível de mortos e feridos graves. Não podemos continuar a pensar que as coisas só acontecem aos outros e, por isso, a violar sistematicamente as regras de segurança rodoviária. O Orador: — Pela segurança rodoviária todos somos responsáveis, todos devemos cumprir, todos devemos dar o exemplo, porquanto a nossa vida colectiva passa pelo respeito que devemos ter pela vida dos outros. Na verdade, e porque o transporte de mercadorias por conta própria não está sujeito a nenhuma licença sectorial, não é possível aplicar nenhuma das sanções previstas no artigo 21.º do regime geral das contra-ordenações, tornando-se necessário ir além daquele elenco e criar uma sanção acessória que iniba temporariamente o transportador particular de realizar transportes, em caso de violação repetida da norma que pune o excesso de carga. Propõe-se, assim, a apreensão do certificado de matrícula do veículo, que passará a constar do regime jurídico de acesso e permanência na actividade de transporte rodoviário de mercadorias. É este, também, o sentido da autorização legislativa prevista no artigo 2.º, que permite a aplicação desta sanção em caso de duas condenações em processos de contra-ordenação por excesso de carga praticadas por pessoas singulares ou colectivas que realizam transportes rodoviários de mercadorias por conta própria. Percebemos a intenção e até a compreendemos e acompanhamos, mas temos dúvidas se estas medidas não terão algum grau de excessividade. Afinal, estamos a falar de pessoas singulares, muitas delas que têm como única actividade e modo de vida este tipo de transporte, e, se é verdade que o excesso de carga comporta gravíssimos riscos para a segurança rodoviária — aliás, bem visíveis no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, elaborado em 2003 pelo CDS-PP —, não menos verdade é que terá de haver uma preocupação social na aplicação destas medidas inibitórias do exercício de uma actividade, que se devem reger pela proporcionalidade e pela adequação. Acresce, ainda, que, no que respeita à extensão da autorização legislativa, a nova lei irá prever que a entidade administrativa competente para a aplicação de coimas possa apreender os documentos relativos ao veículo, condicionando a aplicação da sanção acessória aos casos em que o infractor tenha sido sujeito a três condenações definitivas por três infracções da mesma natureza e que estas tenham ocorrido no decurso dos dois anos anteriores à data da prática da infracção que estiver a ser decidida. Esta sanção terá a duração máxima de dois anos, ficando os documentos depositados à ordem da entidade competente para a decisão condenatória. Ora, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a iniciativa legislativa esgotar-se-ia aqui e nada mais haveria a dizer, não fosse o facto de o pedido de autorização vir acompanhado do projecto de decreto-lei autorizado. No preâmbulo deste, podemos ler, designadamente, que o Governo também constatou ser aconselhável proceder a alterações ao regime de organização do mercado de transporte rodoviário de mercadorias ou que vai condicionar a validade do certificado de capacidade profissional do responsável da empresa a uma avaliação da sua gestão, e com boas práticas. Como é bom de ver, nenhuma destas matérias vem prevista na proposta de lei de autorização legislativa.
4PSD
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Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes, Sr.as e Srs. Deputados: Com a apresentação da presente proposta de lei, pretende o Governo obter autorização legislativa para estabelecer, no âmbito do processo contraordenacional do transporte rodoviário de mercadorias, a sanção acessória de apreensão de documentos do veículo. Este é o objecto da autorização legislativa, tal como vem descrito no artigo 1.º. Para tanto, e como aqui já foi dito, invoca que, estando em curso a revisão do transporte rodoviário de mercadorias, é oportuno proceder a ajustamentos que garantam condições de segurança na realização de transportes, independentemente da natureza pública ou particular dos mesmos, nomeadamente quanto ao excesso de carga. É verdade que o transporte com excesso de carga verifica-se com alguma frequência, sobretudo no transporte por conta própria, mas não existem, no regime sancionatório, mecanismos dissuasores da prática destas infracções. Daqui parece resultar, não apenas a existência de um regime penal mais favorável para o transporte por contra própria — por contraposição com o transporte público e por conta de outrem — como também a existência de condições de concorrência díspares. É este desequilíbrio que se pretende corrigir. Na verdade, e porque o transporte de mercadorias por conta própria não está sujeito a nenhuma licença sectorial, não é possível aplicar nenhuma das sanções previstas no artigo 21.º do regime geral das contra-ordenações, tornando-se necessário ir além daquele elenco e criar uma sanção acessória que iniba temporariamente o transportador particular de realizar transportes, em caso de violação repetida da norma que pune o excesso de carga. Propõe-se, assim, a apreensão do certificado de matrícula do veículo, que passará a constar do regime jurídico de acesso e permanência na actividade de transporte rodoviário de mercadorias. É este, também, o sentido da autorização legislativa prevista no artigo 2.º, que permite a aplicação desta sanção em caso de duas condenações em processos de contra-ordenação por excesso de carga praticadas por pessoas singulares ou colectivas que realizam transportes rodoviários de mercadorias por conta própria. Percebemos a intenção e até a compreendemos e acompanhamos, mas temos dúvidas se estas medidas não terão algum grau de excessividade. Afinal, estamos a falar de pessoas singulares, muitas delas que têm como única actividade e modo de vida este tipo de transporte, e, se é verdade que o excesso de carga comporta gravíssimos riscos para a segurança rodoviária — aliás, bem visíveis no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, elaborado em 2003 pelo CDS-PP —, não menos verdade é que terá de haver uma preocupação social na aplicação destas medidas inibitórias do exercício de uma actividade, que se devem reger pela proporcionalidade e pela adequação. Acresce, ainda, que, no que respeita à extensão da autorização legislativa, a nova lei irá prever que a entidade administrativa competente para a aplicação de coimas possa apreender os documentos relativos ao veículo, condicionando a aplicação da sanção acessória aos casos em que o infractor tenha sido sujeito a três condenações definitivas por três infracções da mesma natureza e que estas tenham ocorrido no decurso dos dois anos anteriores à data da prática da infracção que estiver a ser decidida. Esta sanção terá a duração máxima de dois anos, ficando os documentos depositados à ordem da entidade competente para a decisão condenatória. Ora, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a iniciativa legislativa esgotar-se-ia aqui e nada mais haveria a dizer, não fosse o facto de o pedido de autorização vir acompanhado do projecto de decreto-lei autorizado. No preâmbulo deste, podemos ler, designadamente, que o Governo também constatou ser aconselhável proceder a alterações ao regime de organização do mercado de transporte rodoviário de mercadorias ou que vai condicionar a validade do certificado de capacidade profissional do responsável da empresa a uma avaliação da sua gestão, e com boas práticas. Como é bom de ver, nenhuma destas matérias vem prevista na proposta de lei de autorização legislativa. Sendo assim, se o decreto-lei autorizado for aprovado nos exactos termos em que nos é apresentado, excede manifestamente o sentido, a extensão e o alcance da autorização legislativa que o Governo vem solicitar. É verdade que, nesta matéria do acesso e permanência na actividade de transporte rodoviários de mercadorias, estamos no âmbito da chamada «competência concorrencial», em que tanto o Governo como a Assembleia da República podem legislar. Mas significa isto que o Governo tem legitimidade para alterar o diploma legislativo em causa, podendo juntar as alterações legislativas decorrentes da lei de autorização com as restantes alterações para as quais é competente, num único processo legislativo? Não nos parece. Em nosso entender, o Governo deveria separar as alterações, pela simples razão de que o decreto-lei autorizado terá de mencionar a lei de autorização e nem todas as alterações pelo mesmo propostas se acolhem à lei de autorização, gerando assim, pelo menos de forma aparente, uma inconstitucionalidade formal. Em suma, o CDS-PP estará sempre disponível para viabilizar medidas que combatam a fraude à lei, reforcem a segurança rodoviária e permitam um mercado concorrencial justo e equilibrado, mas não a todo o custo e, sobretudo, com a violação de normas jurídicas constitucionais, regimentais e legais, o que nos parece que acontece neste caso. No entanto, é com esse espírito construtivo que iremos trabalhar na especialidade, de forma a garantir, por um lado, uma concorrência sã, por outro, a circulação segura destes veículos, mas também o cumprimento das leis.
1CDS-PP
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Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta-nos um pedido de autorização legislativa cujo objectivo essencial, como já foi referido, é o de poder aplicar como sanção a apreensão de documentos dos veículos que transportem mercadorias, em caso de excesso de carga. Esta é a questão central que está contida na «Exposição de motivos» desta proposta de lei de autorização legislativa. Desde logo, creio que seria importante que a Sr.ª Secretária de Estado tivesse em conta que a problemática da segurança, sobretudo a segurança que já aqui foi invocada hoje para justificar esta autorização legislativa, passa por muitos outros factores, designadamente pelas condições em que muitos trabalhadores são obrigados a exercer a profissão de motorista. A este propósito, devo dizer que o Governo dispõe de avaliações, feitas pelo anterior IDICT (Instituto para o Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho), que mostram que mais preocupante do que a carga é a inexistência de tacógrafos, o seu desaparecimento, a falta de controlo que efectivamente existe nesta matéria. __________________________________________________________________________________________________ Atentando bem na «Exposição de motivos» da presente proposta de lei, não teríamos questões de fundo se apenas se visasse a aplicação da igualdade de tratamento, que, aliás, é invocada. O que nos preocupa é o que está subjacente ao teor do que nos é proposto e que, no fundamental, parece dever-se ao facto de existirem demasiados pequenos empresários ou trabalhadores por conta própria na área do transporte de mercadorias, preocupação que está expressa no próprio documento. Creio que o regime jurídico do transporte de mercadorias, que vem anexo à proposta de lei de autorização legislativa e que é a questão de fundo subjacente à intervenção do Governo nesta área, é revelador de preocupações que vão no sentido de, por um lado, dificultar a vida àqueles que efectivamente fazem do transporte de mercadorias o seu modo de vida e, por outro, facilitar a vida às grande empresas. Podemos perguntar qual a razão por que se alteram normas, que inclusivamente estavam em vigor, como, por exemplo, a dos 3500 kg para estarem isentos, que a própria Comunidade Europeia não põe em causa em nenhuma das suas directivas, mas que o Governo, neste caso, baixa para 2500 kg. Porquê? Qual é a justificação para isto? Depois, aumenta-se o valor da capacidade financeira das empresas, para efeitos de início de actividade, de 50 000 euros para 125 000 euros. Porquê? Qual a razão desta medida? Depois ainda, em relação à capacidade profissional, dificulta-se o que a própria Comunidade Europeia permitia, ou seja, qualquer pequena empresa ou qualquer pessoa que exercesse esta actividade podia recorrer a uma pessoa que lhe desse a cobertura que ela poderia não ter para o efeito. Porém, a perspectiva contida no projecto de decreto-lei inviabiliza-o, na medida em que a pessoa que vai prestar essa garantia só pode fazê-lo em relação a uma empresa ou, para a prestar a mais de uma empresa, uma delas tem de ser detentora de uma grande parte do capital. Quanto à renovação das frotas, impõe-se, para quem tenha um ou dois veículos de 15 000 kg a 20 000 kg, que os mesmos tenham de ser novos. No entanto, a quem tiver uma grande frota, já só se impõe uma média de 10 anos de idade da frota, o que permite que, a par de veículos novos, possam existir veículos muito velhos, bem velhos — basta pensar na margem que dá uma frota de 30 ou 40 camiões para gerir a média dos 10 anos de vida da frota. Agora, quem tiver só um veículo, este tem de ser novo — porquê?! E depois, terá de vendê-lo ao fim de quantos anos? Qual é a idade máxima de um veículo para esta proposta? É que isso está omisso. Diz-se o que é ser novo — um ano após a primeira matrícula —, mas não se diz o que é ser velho. Quando é que termina a vida desse veículo? Na Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações e, sobretudo, na Subcomissão de Segurança Rodoviária, temos ouvido dizer que o parque automóvel do nosso país é bastante velho e, pela nossa parte, estamos de acordo que haja medidas que permitam renovar as frotas, quer de passageiros quer de mercadorias. No entanto, o que está previsto não vai no sentido de obrigar do mesmo modo as grandes empresas e as pequenas empresas. Assim sendo, parece-nos que toda esta legislação tem o seguinte sentido: o de dificultar a vida às pequenas empresas, aos que trabalham por conta própria, e, simultaneamente, o de criar melhores condições não para a competitividade mas para garantir uma maior quota de mercado aos grandes empresários do sector, o que, aliás, está nela expresso quando se diz que, ao contrário do que se previa, ainda há um número muito elevado de pequenas empresas neste sector, ou quando se refere que este sector até tem vindo a crescer. Portanto, o que nos preocupa neste diploma não são tanto as questões de segurança ou apenas a criação de uma punição equivalente para faltas iguais, mas todo um projecto, porque vai contra os interesses das pequenas e médias empresas.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, permita-me que as minhas primeiras palavras sejam de saudação muito especial a V. Ex.ª e de congratulação por termos terminado o ano de 2006 com uma nova diminuição substancial dos acidentes mortais de trabalho em Portugal. Penso que 10,6% representam uma diminuição significativa e que muito deve congratular V. Ex.ª, toda esta Câmara e o País. Foram 157 acidentes mortais, em 2006, contra 169 acidentes, em 2005, 197 acidentes, em 2004, e 219 acidentes, em 2002. Temos para nós que se trata de uma diminuição sustentada, porque no sector de maior risco, que é o da construção, também se verificou uma diminuição substancial dos acidentes mortais. Estamos certos de que esta diminuição não resultou de uma conjuntura de abrandamento da actividade económica mas, sim, da conjugação de um conjunto significativo de esforços, ao nível da prevenção, da sensibilização, da formação e da fiscalização. A propósito da fiscalização, é sabido que o número de inspectores do trabalho e o número de inspecções por ano são decisivos para uma diminuição dos acidentes de trabalho. Diz-nos a IGT que, no ano de 2006, os inspectores do trabalho realizaram acções de controlo inspectivo em número substancialmente superior às dos anos transactos: foram visitadas mais 3495 empresas do que em 2005. Trata-se de progressos extremamente importantes, Sr. Ministro. Entretanto, o Sr. Ministro determinou, recentemente, alterações orgânicas com incidência directa no corpo de inspecção, fundindo a Inspecção-Geral do Trabalho com o Instituto para a Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho, o que resultará numa futura «Autoridade para as Condições do Trabalho», decorrendo, eventualmente, do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado, e induz, necessariamente, às perguntas que lhe quero dirigir. Em primeiro lugar, o que é que as funções inspectivas, em matéria de inspecção das condições do trabalho, vão ganhar com esta fusão? É porque, aparentemente, havia alguma «antipatia» na cultura de ambos os institutos… Que meios financeiros vai V. Ex.ª conseguir libertar e economizar com esta fusão? Vai consigná-los, exactamente, ao reforço da acção inspectiva ou vamos assistir a uma restrição orçamental, de que, aliás, V. Ex.ª é acusado pela Associação Portuguesa dos Inspectores do Trabalho? São, no fundo, estas as primeiras perguntas que, hoje, lhe quero dirigir.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Traz o Governo a esta Câmara uma proposta de lei que visa regulamentar a reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais. O que se faz com esta proposta, tal como assumido pelo Governo na exposição de motivos, é a sistematização das matérias numa perspectiva de codificação. Porém, algumas alterações são introduzidas, e algumas com um significado bem expressivo. Mas, antes de mais, importa delimitar o âmbito em que se insere este debate. Segundo a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, todos os anos morrem na Europa cerca de 5500 trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho e ocorrem 4,5 milhões de acidentes de trabalho. Quanto à realidade em Portugal, deixo-vos os seguintes números para reflectir: segundo dados da Inspecção-Geral do Trabalho, em 2002, morreram 219 trabalhadores; em 2003, 181 trabalhadores e, em 2005, 169 trabalhadores. Só no ano passado, 157 trabalhadores perderam a vida vítimas de acidentes de trabalho. Apesar da diminuição, não poderemos deixar de encarar este problema como algo de muito preocupante. Tudo isto acontece porque, quer nos acidentes de trabalho quer em relação às doenças profissionais, temos de reconhecer que ainda há muito a fazer. Estes níveis de sinistralidade laboral são elevadíssimos e não são próprios de um país que se pretende moderno e evoluído. São, por isso, uma preocupação fundamental para o CDS-PP. Noutros países da União Europeia esta matéria tem conduzido à institucionalização de centros de apoio onde se desenvolve uma política de sensibilização e de envolvimento das entidades patronais na promoção dos problemas da saúde e prevenção de acidentes do trabalho. Em Portugal, o sentido parece ser o contrário. O Instituto para a Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho, criado pela anterior maioria e que está a desempenhar esta tarefa com resultados visíveis, está agora à beira da extinção, sem que percebamos com que justificação concreta. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O infortúnio de um acidente na vida de um trabalhador não pode ser transformado num número contabilístico. A cada acidente de trabalho corresponde um drama pessoal e familiar. Tantas vezes é restringido o único sustento de uma família. O sistema de segurança social, em sentido lato, tem de proteger adequadamente os trabalhadores em situação de diminuição de capacidade para o trabalho, assim como o direito dos trabalhadores à justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional. Neste sentido, o estabelecimento de pensões por incapacidade tem em vista a compensação pela perda da capacidade de trabalho dos trabalhadores resultante de infortúnios na prática de uma actividade laboral. Por isso, compreende-se que se tal perda não for demasiado acentuada, ou seja, se o acidente não implicar a futura continuação do desempenho do trabalho, se permita, se essa for a vontade do trabalhador, que a pensão possa ser transformada em capital, de modo a que seja aplicada em finalidades económicas porventura mais úteis e rentáveis do que a mera percepção de uma renda anual cujo quantitativo não pode permitir qualquer subsistência digna a quem quer que seja, caso, obviamente, o trabalhador escolha esta opção. Do exposto resulta que não deverá ser restringido o direito de opção do trabalhador vítima de acidente de trabalho. É importante que o trabalhador vítima do acidente possa escolher aquilo que se adequa mais à sua situação económico-social. Com o regime actual a lei presume, sem que nada concorra para tal presunção, que os trabalhadores a quem foi atribuída uma incapacidade permanente parcial inferior a 30% e, consequentemente, uma pensão de reduzido valor, mantêm uma capacidade de ganho que lhes permite subsistir sem o pagamento mensal da pensão que lhes foi atribuída, sendo obrigatória a remição da pensão. Assumindo esta presunção como boa, fica prejudicado o direito de opção do trabalhador, tratando de forma diferente o que na prática são situações idênticas, podendo, assim, estar-se perante uma discriminação materialmente infundada. Também o Provedor de Justiça sublinhou a natureza essencialmente social dos direitos dos pensionistas em causa na lei em vigor. Na opinião do Sr. Provedor de Justiça este regime jurídico sobre acidentes de trabalho acolheu, inegavelmente, uma pretensão há muito reivindicada pela globalidade das companhias de seguros. Ao admitir a remição de pensões de valor exíguo, nos termos em que foi consagrado na lei, o legislador contribuiu para a redução considerável dos encargos correntes das seguradoras. Paralelamente a esta opinião também o Tribunal Constitucional se pronunciou sobre a inconstitucionalidade de algumas disposições em vigor. O Tribunal Constitucional entende que o não estar previsto o poder de o trabalhador ponderar se, atento o diminuto quantitativo da pensão, se não se revelaria mais compensador a efectivação da remição redunda na consagração de uma discriminação materialmente infundada, actuando como um obstáculo a que o sistema de segurança social proteja adequadamente os trabalhadores em situações de diminuição de capacidade de trabalho e do direito dos trabalhadores à justa reparação quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional. Da decisão do Tribunal Constitucional pode concluir-se que a disposição em causa foi considerada inconstitucional, num primeiro momento, por restringir o direito de opção do sinistrado e, num segundo momento, por atentar contra os direitos dos trabalhadores constitucionalmente adquiridos. Sr.as e Srs. Deputados: O Governo, nesta proposta, em virtude da declaração destas inconstitucionalidades, propõe a alteração do regime vigente, deixando de ser obrigatória a remição para os casos de incapacidade superiores a 30% e sendo esta obrigatoriedade de remição apenas prevista para os casos de incapacidade permanente parcial a 30% ou inferior e desde que o valor da pensão não exceda seis vezes o valor da pensão mínima mais elevada do regime geral. Em bom rigor, continua a existir uma limitação ao direito que os trabalhadores sinistrados têm de optar, obrigando-os a resignarem-se com a remição da pensão. E, assim, o CDS entende que uma boa alternativa a consignar nesta mesma lei seria a possibilidade de o trabalhador poder requerer a remição anual ou plurianual da pensão e dentro dos condicionalismos previstos, assim se salvaguardando também quer o beneficiário da pensão quer a instituição pagadora, em função dos custos de transacção. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Registamos com agrado a regulamentação da ocupação e reabilitação do trabalhador. E registamos que o Grupo Parlamentar do PS e o Governo, afinal, dão razão ao CDS. Ao regular as intervenções do serviço público competente para o emprego e formação profissional promovida pelo empregador, na elaboração de um plano de reintegração profissional do trabalhador e através de acordos de cooperação com vista à sua reintegração, o Governo mais não faz do que acolher a proposta de alteração à Lei de Bases da Segurança Social apresentada pelo CDS a esta Câmara. Se bem se recordam, o CDS apresentou uma proposta de alteração ao artigo 107.º, n.º 2, da Lei de Bases da Segurança Social, sobre acidentes profissionais, em que pretendia que o regime jurídico de protecção obrigatória em caso de acidente de trabalho consagrasse «uma eficaz e coerente articulação com o sistema público de segurança social e com o sistema nacional de saúde, designadamente no que diz respeito à melhoria do regime legal das prestações, à tabela nacional de incapacidades, à prevenção da sinistralidade laboral, à determinação da actualização das prestações e à assistência adequada aos sinistrados com o objectivo de promover a sua reabilitação e reinserção laboral e social.» Esta proposta, espantosamente, foi rejeitada pelo Grupo Parlamentar do PS!! No entanto, verificamos com agrado que a mesma é igual àquela que hoje faz parte da proposta de lei do Governo, pelo que o CDS aplaude a evolução do Partido Socialista nesta matéria. Para terminar, temos de dizer também que o mesmo não fazemos quanto a algumas alterações substanciais nesta lei, as quais não merecem o nosso acolhimento, como, por exemplo, no cálculo de algumas prestações, em que é substituída a referência à remuneração mínima mensal garantida pela pensão mínima mais elevada do regime geral, desprotegendo alguns trabalhadores em situações muito concretas. O CDS entende que esta alteração é uma forma encapotada de reduzir significativamente algumas das prestações devidas aos sinistrados, o que agravará, certamente, o regime reparatório dos trabalhadores acidentados, já de si em posição debilitada. Também a questão prevista no artigo 41.º desta proposta, da ampliação da prestação suplementar da pensão, nos merece muitas dúvidas, que levantaremos no debate na especialidade. … reduzindo-o apenas e só à sua capacidade produtiva, tratando-o como mera peça de uma máquina. Continuar a considerar que os dispositivos reparatórios de acidentes de trabalho não tutelam o direito à vida e à integridade física do trabalhador, bens considerados constitucionalmente como fundamentais, apenas protegendo a redução da capacidade para o trabalho ou ganho, é continuar a tratar este problema com 10 I SÉRIE — NÚMERO 42 a maior das discriminações em comparação com outros regimes de reparação de acidentes, nomeadamente os ocorridos fora do trabalho. Era, pois, esperado que o Governo do Partido Socialista nos trouxesse aqui uma proposta de lei que melhorasse substancialmente a protecção nestas eventualidades, que, como bem se sabe, estão apenas e só a cargo das seguradoras, que, na sua perspectiva de máximo lucro, se desresponsabilizam a maior parte das vezes das suas obrigações, levando os sinistrados a terem de recorrer aos seus próprios meios, quando os têm, para melhor serem tratados e socorridos. Por outro lado, não se compreende por que o Governo apresenta uma proposta em que se prevê a remição facultativa para os casos das doenças profissionais sem carácter evolutivo e não permite tal remição facultativa para o sinistrado em caso de acidentes de trabalho. Não se percebe qual o motivo para esta benesse para as seguradoras. De facto, o Bloco de Esquerda refere no seu projecto sobre esta matéria — o qual, como bem se lembram as Sr.as e os Srs. Deputados, baixou à comissão por um prazo de 90 dias e já lá vai um ano… — que muitos dos sinistrados preferem receber ainda que pouco todos os meses do que receber o capital de uma só vez. Continuamos a considerar — e connosco estão também as organizações representativas dos sinistrados e associações sindicais — que o regime de remição das pensões deve ser facultativo, deve ser uma opção do beneficiário sinistrado, porque só assim se salvaguarda a sua liberdade de opção numa perspectiva de respeito pelos direitos e dignidade humana. Aliás, esta nossa opinião encontra perfeito acolhimento no Acórdão n.º 322/2006 do Tribunal Constitucional, onde se pode ler: «É certo que a obrigatoriedade de remição traz óbvias vantagens para a seguradora, obrigada a pagar, repetidamente e durante um longo período de tempo, inúmeras pensões de reduzido montante e que, por essa via, o novo regime se explica facilmente por critérios de racionalidade económica». Não se compreende igualmente a razão que leva o Governo a manter a disposição que confere a possibilidade de escolha do médico assistente somente à entidade responsável pelo pagamento. Mais uma vez se desrespeita também a vontade e os direitos dos sinistrados! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro manifestou aqui toda a disponibilidade e abertura para, em sede de discussão na especialidade, aceitar os contributos das diversas bancadas. Esperamos para ver e esperamos, sinceramente, que essa abertura se concretize. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Consideramos que a integração do regime de acidentes de trabalho e doenças profissionais no Código do Trabalho é uma opção errada. Esta é uma matéria que deve ser objecto de regulamentação autónoma e distinta do Código. Era suposto que o Governo e o Partido Socialista, que tão críticos foram na oposição ao «código Bagão Félix», se mantivessem fiéis a essa crítica e nos apresentassem, hoje, para discussão, uma proposta que consubstanciasse essa mudança de agulha. Esse distanciamento não aconteceu, porque o PS hoje é Governo. Longe vão os tempos.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 10 de Fevereiro de 2006, ocorreu nesta Assembleia uma importante discussão sobre os acidentes de trabalho e as doenças profissionais. Reafirmamos hoje o que então referíamos como intolerável e completamente absurdo: que, estando o mundo perante um desenvolvimento sem precedentes das forças produtivas devido aos avanços extraordinários da ciência e da técnica, todos os anos ocorram 270 milhões de acidentes de trabalho, segundo as estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Reafirmamos hoje o que então referimos como intolerável e completamente absurdo: que todos os dias morram, em média, 6000 pessoas devido a acidentes de trabalho ou doenças profissionais, totalizando mais de 2,2 milhões de mortes relacionadas com o trabalho, e que em cada 5 segundos haja, na União Europeia, um acidente de trabalho. Nessa discussão foi posição unânime de todas as bancadas que a lei existente sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais precisava de ser mudada no sentido de uma maior protecção aos sinistrados do trabalho. Era, pois, esperado que o Governo do Partido Socialista nos trouxesse aqui hoje uma proposta de lei que rompesse com um conjunto de conceitos constantes na actual lei e agravados pelo «código Bagão Félix», que desconsidera o trabalhador sinistrado enquanto ser humano e cidadão pleno, reduzindo-o apenas e só à sua capacidade produtiva, tratando-o como mera peça de uma máquina. Continuar a considerar que os dispositivos reparatórios de acidentes de trabalho não tutelam o direito à vida e à integridade física do trabalhador, bens considerados constitucionalmente como fundamentais, apenas protegendo a redução da capacidade para o trabalho ou ganho, é continuar a tratar este problema com a maior das discriminações em comparação com outros regimes de reparação de acidentes, nomeadamente os ocorridos fora do trabalho. Era, pois, esperado que o Governo do Partido Socialista nos trouxesse aqui uma proposta de lei que melhorasse substancialmente a protecção nestas eventualidades, que, como bem se sabe, estão apenas e só a cargo das seguradoras, que, na sua perspectiva de máximo lucro, se desresponsabilizam a maior parte das vezes das suas obrigações, levando os sinistrados a terem de recorrer aos seus próprios meios, quando os têm, para melhor serem tratados e socorridos. Por outro lado, não se compreende por que o Governo apresenta uma proposta em que se prevê a remição facultativa para os casos das doenças profissionais sem carácter evolutivo e não permite tal remição facultativa para o sinistrado em caso de acidentes de trabalho. Não se percebe qual o motivo para esta benesse para as seguradoras. De facto, o Bloco de Esquerda refere no seu projecto sobre esta matéria — o qual, como bem se lembram as Sr.as e os Srs. Deputados, baixou à comissão por um prazo de 90 dias e já lá vai um ano… — que muitos dos sinistrados preferem receber ainda que pouco todos os meses do que receber o capital de uma só vez. Continuamos a considerar — e connosco estão também as organizações representativas dos sinistrados e associações sindicais — que o regime de remição das pensões deve ser facultativo, deve ser uma opção do beneficiário sinistrado, porque só assim se salvaguarda a sua liberdade de opção numa perspectiva de respeito pelos direitos e dignidade humana. Aliás, esta nossa opinião encontra perfeito acolhimento no Acórdão n.º 322/2006 do Tribunal Constitucional, onde se pode ler: «É certo que a obrigatoriedade de remição traz óbvias vantagens para a seguradora, obrigada a pagar, repetidamente e durante um longo período de tempo, inúmeras pensões de reduzido montante e que, por essa via, o novo regime se explica facilmente por critérios de racionalidade económica». Não se compreende igualmente a razão que leva o Governo a manter a disposição que confere a possibilidade de escolha do médico assistente somente à entidade responsável pelo pagamento. Mais uma vez se desrespeita também a vontade e os direitos dos sinistrados! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro manifestou aqui toda a disponibilidade e abertura para, em sede de discussão na especialidade, aceitar os contributos das diversas bancadas. Esperamos para ver e esperamos, sinceramente, que essa abertura se concretize. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Consideramos que a integração do regime de acidentes de trabalho e doenças profissionais no Código do Trabalho é uma opção errada. Esta é uma matéria que deve ser objecto de regulamentação autónoma e distinta do Código. Era suposto que o Governo e o Partido Socialista, que tão críticos foram na oposição ao «código Bagão Félix», se mantivessem fiéis a essa crítica e nos apresentassem, hoje, para discussão, uma proposta que consubstanciasse essa mudança de agulha. Esse distanciamento não aconteceu, porque o PS hoje é Governo. Longe vão os tempos.
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Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão da iniciativa legislativa vertente permite-nos retomar uma temática já recorrente nesta Assembleia da República e que assume importância fundamental no quadro das relações laborais, em particular no plano dos direitos dos trabalhadores. Para o Partido Socialista, que assume o trabalho como um factor de cidadania social, a promoção e o reforço dos direitos dos trabalhadores face ao infortúnio laboral, seja no plano da prevenção seja no da reparação, deve constituir um dos eixos fundamentais das políticas laborais e sociais. A justa reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais constitui inegavelmente um direito de cidadania dos trabalhadores. Neste quadro, entendemos que uma sociedade incapaz de promover uma adequada e efectiva política de prevenção dos riscos em meio laboral e que não aposte seriamente na reinserção socioprofissional dos seus cidadãos, é uma sociedade progressivamente desumanizada e que põe em crise o direito a uma existência digna. Por isso, saudamos esta iniciativa legislativa do Governo que não se limita a manter o actual regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais. Antes pelo contrário, introduz-lhe diversas melhorias e aperfeiçoamentos no plano da sistematização e no plano das soluções normativas que integra, em particular no que respeita ao regime de remissão de pensões e à reinserção socioprofissional dos trabalhadores vítimas de infortúnio laboral, contribuindo, assim, para o aprofundamento dos direitos dos trabalhadores portugueses. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No domínio da reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, o Partido Socialista — todos hão-de reconhecer — tem andado bem. Permito-me, aqui, recordar que, durante mais de três décadas, os trabalhadores portugueses laboraram sob a égide de um edifício jurídico do infortúnio laboral, que se mostrava omisso, desajustado e prejudicial à tutela dos direitos dos trabalhadores. Esta situação só foi possível inverter graças ao governo do Partido Socialista, através da aprovação da Lei n.º 100/97 e respectiva regulamentação. A aprovação, em 1997, do novo Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, que se mantém ainda hoje em vigor, assentou claramente numa lógica de reforço dos direitos dos trabalhadores, traduzida, por exemplo, no alargamento do conceito de acidente de trabalho, na instituição de novos apoios e na revalorização das prestações. Entretanto, como é consabido, o Código do Trabalho, aprovado em 2003, procedeu à revisão e codificação da legislação laboral que se encontrava dispersa e, embora tenha abraçado o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, manteve em vigor o actual regime, até à aprovação de uma nova regulamentação. Ora, a proposta de lei hoje em discussão tem, precisamente, o objectivo central de regular o Código do Trabalho na parte atinente à reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais. Assim, mantendo o núcleo essencial do edifício jurídico aprovado pela Lei n.º 100/97 e respectiva regulamentação, a iniciativa legislativa em debate aponta claramente para uma significativa melhoria da sistematização das matérias a tratar, corrige as situações que se mostram inadequadas e inova em domínios fundamentais para a tutela dos direitos dos trabalhadores. Com efeito, passados quase 10 anos sobre a aprovação do regime jurídico de reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, importa proceder à sua avaliação, de modo a corrigir e a aperfeiçoar aspectos que se revelaram desajustados e desconformes face aos interesses em presença e incluir todos aqueles que concorram para um regime mais justo e equilibrado. Em nosso entendimento, os enquadramentos jurídicos, sejam quais forem, não podem nem devem permanecer imutáveis. Antes pelo contrário, devem adequar-se às novas realidades, sob pena de perder a sua eficácia. Neste contexto e sem prejuízo de poder vir a ser melhorada em sede de especialidade, nomeadamente nos aspectos aqui hoje referenciados pelo Sr. Ministro, a proposta de lei n.º 88/X incorpora já, à partida, soluções normativas, umas correctoras de situações desajustadas outras inovadoras, que se mostram justas e equilibradas e, nesse sentido, estamos seguros, a sua aprovação contribuirá para o reforço dos direitos dos trabalhadores. Entre os aspectos inovadores desta iniciativa legislativa que concorrem para uma melhoria significativa do regime de reparação em vigor, permito-me, Sr.as e Srs. Deputados, destacar, em traços gerais, pela sua importância para este debate, os seguintes: primeiro, o direito do trabalhador, no caso de acidente de trabalho provocado por actuação culposa do empregador, à pensão calculada nos termos aplicáveis aos casos em que não haja actuação culposa do empregador, sem prejuízo da indemnização dos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais; segundo, o reconhecimento ao beneficiário legal do sinistrado do direito ao pagamento de transporte sempre que for exigida a sua comparência em acto judicial; terceiro, a garantia do trabalhador sinistrado ou vítima de doença profissional à reabilitação e à reintegração profissional e à adaptação do respectivo posto de trabalho, cabendo ao empregador assegurar a sua ocupação e criar as condições adequadas à sua integração no mercado de trabalho; quarto, o direito do trabalhador sinistrado a um subsídio para a frequência de acções de formação para a sua reabilitação profissional; quinto, aperfeiçoamento e melhoria das normas relativas a apoios, nomeadamente em matéria de encargos com assistência de terceira pessoa ao trabalhador sinistrado e que se encontre em situação de dependência, bem como ao nível das ajudas técnicas, como seja a substituição e reparação de próteses; sexto, o abandono da regra segundo a qual a pensão por acidente de trabalho só pode ser revista no prazo de 10 anos posteriores à sua fixação, passando-se a permitir a sua revisão a todo o tempo, excepto nos dois primeiros anos em que só pode ser requerida uma vez no fim de cada ano; sétimo, a melhoria das regras aplicáveis à remissão obrigatória das pensões, impondo a verificação cumulativa das condições actualmente previstas, isto é, passarão apenas a ser obrigatoriamente remidas as pensões devidas por incapacidade permanente para o trabalho inferior ou igual a 30% e cujo valor anual não exceda um determinado número do indexante de apoios sociais (IAS) — com esta alteração é expurgada a inconstitucionalidade declarada pelo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 34/2006, e consagra-se um regime de remissão mais justo e equilibrado; oitavo, a regulamentação do trabalho a tempo parcial e da licença para formação ou novo emprego de trabalhador sinistrado ou vítima de doença profissional; nono, a intervenção activa dos serviços públicos de emprego no processo de reabilitação e reintegração profissional dos trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho ou doenças profissionais; décimo — e vou ficar por aqui, mas podia dizer mais —, a possibilidade de celebração de acordos de cooperação entre as entidades públicas e privadas, visando a reabilitação e reintegração profissional daqueles trabalhadores. Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como facilmente se constata, esta é uma iniciativa legislativa globalmente positiva, quer quanto aos objectivos quer quanto às soluções que apresenta, e que encerra transformações, cujos alcance e impacto social são evidentes. Por isso, repito, sem prejuízo de estarmos totalmente abertos e receptivos a todas as propostas que possam convergir para o aperfeiçoamento e a melhoria do quadro legal da reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais que se pretende aprovar, a proposta de lei n.º 88/X conta com o apoio inequívoco do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. O modelo de segurança deve assentar na gestão organizacional dos riscos e dos factores humanos. E, para alcançar este objectivo, é preciso levar a informação sobre a legislação para dentro das empresas e fazê-las compreender que as normas sobre segurança são um factor de produtividade. É aqui que nos deparamos com o nó górdio. Num país em que o tecido empresarial é constituído, em mais de 95%, por pequenas empresas, muitas delas com menos de 10 trabalhadores, e, pois, legalmente isentas de uma organização interna virada para a segurança; num país de baixíssimo nível de formação dos trabalhadores e dos empresários, convenhamos que corremos um sério risco em matéria de acidentes de trabalho. São, aliás, unânimes as conclusões dos diversos estudos sobre esta matéria, que apontam no sentido de que as principais razões para o baixo nível no cumprimento da legislação são as seguintes: falta de informação e de orientação específicas e transmitidas de forma compreensível; capacidades e competências reduzidas para gerir a segurança e saúde no trabalho; falta de recursos para assegurar uma formação básica adequada dos gestores e dos trabalhadores em matéria de segurança e de saúde do trabalho; acesso difícil a assistência técnica específica e especializada. Face a esta situação, que o Sr. Ministro tão bem conhece, impõe-se que se recomende vivamente ao Governo que canalize para esta falha o máximo de fundos que lhe vão ficar disponíveis no âmbito do Quadro de Referência Estratégica Nacional. Absolutamente indispensável! É precisamente sobre a eficácia dos programas de informação e formação que o PSD vai promover a mais vigorosa atenção e intervenção fiscalizadora da Assembleia da República durante este ano de 2007.
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